Pouco mais de 20 minutos depois, o ônibus fez uma curva pegando uma das saídas à direita. Fiquei encantada em ver a quantidade de árvores no caminho... era como ter tudo, floresta e mar, logo ali lado a lado. As ruas ficavam cada vez mais estreitas, o asfalto foi gradativamente sendo substituído por paralelepípedos, a quantidade de casas foi diminuindo e ficando cada vez mais espaçadas entre si. Eram significativamente maiores e mais luxuosas também.
Outra curva e estávamos de frente para um grande portão eletrônico. A placa presa ao portal fixo que existia sobre ele dizia “ Marai Spa & Health Center” em uma bonita letra cursiva.
Assim que passamos pelo portão já conseguia ver algumas das áreas principais, o lugar todo era bem maior do que eu tinha imaginado pelas fotos do site. Todas as construções haviam sido feitas com muito vidro por todos os lados, paredes e mais paredes de vidro, uma linda madeira de cor escura as emoldurava e lindas paredes brancas que se destacavam em meio a todo aquele verde fechavam a combinação. Luxuoso em sua simplicidade, delicado ainda que amplo... é eu sempre tive uma queda por design de interiores... sempre me sentia encantada quando percebia o equilíbrio perfeito entre formas, cores e texturas.
De onde estávamos era possível ver o restaurante panorâmico, feito praticamente todo em vidro e localizado na área central do imenso terreno. Era a maior construção de todas. A área de eventos ficava ao lado, um gigantesco salão preparado para receber até 60 pessoas durante cursos, workshops e palestras.
Eu sabia que ainda existia a vila de bangalôs para os hóspedes vips e o complexo de quartos mais simples (que no meu ponto de vista ainda estavam bem longe de poderem ser considerados simples). Eles ficavam mais afastados de tudo para serem poupados do barulho durante os eventos, mas eu não conseguia ver nenhum pedacinho de telhado disputando com o topo das árvores em lugar nenhum... assim não tinha nenhuma indicação de onde era o lugar.
O complexo do spa era formado pelas duas salas de massagem (cada uma com uma banheira em estilo ôfuro, gigantesca), suas respectivas saunas particulares e uma piscina natural inacreditável. Feita para parecer um lago de verdade tinha até peixinhos nadando por entre as plantas aquáticas estrategicamente posicionadas por todos os lados. Eu estava louca para ver isso com meus próprios olhos e dar um mergulho nela assim que possível, aquele lugar parecia ter uma magia própria.
Eu conseguia ver um dos lados dos spa, saltando por entre a vegetação, mais a direita e bem mais acima do morro em comparação ao restaurante. A trilha que levava até lá devia ficar lugar próximo á ele, e parecia ser bem íngreme. Algo me dizia que eu ia me exercitar bastante por aqui... querendo ou não.
Um pouco mais acima e ainda mais a direita, onde eu conseguia ver o pedaço de um outro telhado, devia ser a área de moradia dos empregados, tudo feito seguindo o mesmo estilo do restante do lugar: muito vidro e muita madeira. Não via a hora de ver meu quarto.
Lá em cima, quase no topo do morro havia uma casa imensa... ou algo mais como uma pequena mansão. Tinha um deque de madeira que abrangia toda a sua frente, e parecia ter uma piscina também.... Uau... Parecia coisa saída de filme... mas eu não fazia idéia se ainda era uma parte do Health center... Talvez aquela área já estivesse fora do terreno, e a casa pertencesse á um vizinho muito, muito bem de vida.
Fora isso ainda existiam vários pontos ao longo das trilhas, cantos de descanso e meditação que consistiam em pequenos e lindos quiosques decorados com cortinas brancas esvoaçantes e enormes almofadas, deques de onde se podia apreciar a paisagem e a vista do oceano, algumas com redes onde se podia deitar e olhar o pôr do sol com todo o conforto. E é claro a faixa de praia particular com guarda sóis enormes e bonitas espreguiçadeiras.
Esse lugar era um paraíso, me deixei enlevar novamente por toda a empolgação que havia sentido nos últimos dias e releguei à um canto todas as preocupações que estavam rodando pela minha cabeça e dando um nó no meu estômago nas últimas duas horas. O alívio durou pouco...
O ônibus parou no pequeno estacionamento e segui Raffaela para fora, tão rápido quanto o diabo foge da cruz, meu estômago revirava outra vez. Não queria passar por outra sessão desconfortável com todos os caras me encarando de um jeito estranho. Fiquei tão aliviada quando ela perguntou ao motorista, seu Pedro, se ele podia achar alguém para levar minhas malas para meu quarto e que se algum dos meninos perguntasse por ela, que por favor dissesse á eles que estaria no restaurante com a Cassie, que quase pulei no seu pescoço e a abracei.
Tive que me controlar para não saltitar de felicidade ao seu lado enquanto nos dirigíamos para o restaurante.
Assim que as portas automáticas de vidro se abriram a minha frente, fui completamente arrebatada pelo cheiro maravilhoso de comida. Eu sempre tive um dom especial para encontrar doces... não importava se estivessem escondidos entre as malas em cima do guarda roupa ou em um oco de uma árvore no meio de uma floresta, eu sempre os encontrava.
Chame de instinto... eu chamava de dádiva divina.
Assim não foi nada de mais quando meus passos me guiaram imediatamente até uma mesa lateral, nada pequena, do outro lado do restaurante como se eu já conhecesse o lugar como a palma da minha mão.
Nela estavam dispostas as opções doces para o café da manhã, três tipos diferentes de bolo, grossas e macias panquecas americanas, iogurtes e vários tipos de granola, geléias, salada de frutas, pãezinhos doces... e algo especial. Algo muito, muito especial.
Senti meus olhos marejarem levemente.
“Ah, Jesus! Vocês tem donuts!!!” Gemi instantaneamente enquanto travava extasiada em frente a linda e imensa pilha muito bem arrumada de donuts em forma de bolinha, polvilhados com açúcar e canela. Estava pensando em como ia conseguir ter coragem para profanar aquela obra de arte tão primorosamente arranjada quando ouvi a gargalhada da Raffaela ao meu lado. Não conseguia me sentir nem mesmo remotamente arrependida do meu arroubo espontâneo de felicidade, eu estava no céu dos donuts e era só o que importava.
Já dizia o ditado:
“A verdadeira felicidade está nas pequenas coisas...
Nas pequenas coisas macias, fritas, deliciosamente recheadas e polvilhadas de açúcar.”
Bom... essa era a minha versão desse ditado.
E eu pensava em mantê-la para toda a eternidade.
“Vem.” Ela disse me puxando pela mão e sorrindo feliz. “Vamos encher uma bandeja de delícias e vou te mostrar minha mesa preferida lá em cima.”
Meus olhos seguiram o movimento, e mal acreditei quando entendi ao que ela estava se referindo. Havia um mezanino que ocupava no mínimo um terço do espaço do restaurante.
“A vista lá de cima é fenomenal!” Ela continuou. “ Dá pra ver toda a praia. Juro que já tomei café da manhã enquanto via golfinhos, e até baleias uma vez, passeando próximo á costa.”
“Uau.” Meus olhos deviam estar esbugalhados enquanto imaginava se eu também teria a chance de ver algo tão especial assim.
Ela me levou até o balcão onde poderíamos pegar pratos e talheres, acenou para o pessoal da cozinha prometendo me apresentar á todos mais tarde, e então começamos a nos servir. A mesa com opções salgadas era muito mais farta que a de doces, arrumadas com o mesmo capricho... mas entre tudo o que havia lá, as únicas coisas que acabaram na minha bandeja foram um reles, porém apetitoso, pão de queijo e uma grande xícara de cappuccino.
Eu tinha um encontro marcado com aquelas bolinhas cobertas de açúcar, e nada ia me afastar delas.
Poucos minutos depois estávamos com nossos pratos cheios e indo em direção á escada do mezanino. Rafaella apoiou seu prato em um pequeno móvel encostado na parede para retirar a faixa de “área restrita” que impedia nossa passagem.
“Essa área fica aberta apenas quando temos hóspedes vips,”- ela me informou rapidamente - “no restante do tempo ela é só nossa.” Concluiu com uma piscadinha travessa.
Eu me senti paralisada assim que terminei de subir as escadas. Eu estava cercada pelo céu. Algumas gaivotas voavam á distância e eu conseguia ver a pequena enseada, a praia e o lindo mar azul que se estendia até o horizonte onde, então, se encontrava com o céu.
Rafaella já estava se sentando em uma das mesas mais próximas a gigantesca parede de vidro quando consegui voltar a me mexer.
Me sentei, vagarosamente, absorvendo o efeito daquele lugar em mim. Apoiei meus braços na mesa e fiquei perdida na sensação de simplesmente estar naquele lugar por alguns minutos. Quando olhei novamente para ela, percebi que partilhávamos a mesma sensação de arrebatamento.
“Obrigada Rafaella... nunca estive em um lugar tão lindo. É realmente especial.”
“É mesmo não é?” Ela desviou o olhar da paisagem. “Bom, disponha... e pode me chamar de Rafi. É como a maioria dos meus amigos me chama... Rafaella é tão formal.”
Sorri e concordei.
Me senti feliz.
Eu estava em um lugar maravilhoso, admirando uma vista incrível, com uma deliciosa pilha de donuts no meu prato, um cappuccino que exalava um cheiro fenomenal, Rafi estava ali comigo sendo um doce de pessoa e eu já me sentia confortável com ela, ia morar naquele lugar lindo e trabalhar com o que eu amava.
Eu me sentia grata e esperançosa.
Todo o resto, porque eu não podia simplesmente ignorar todo o resto, ficaria para depois. E eu lidaria com tudo o que acontecesse. Porque esse lugar definitivamente valia a pena!
Com um meio sorriso no rosto escolhi o primeiro donut a ser devorado, o peguei com apenas dois dedos e o coloquei inteiro e de uma só vez na minha boca. Eu mastiguei e fui parar no paraíso. Eles estavam recheados com creme da Bavária, eu não estava esperando pelo meu recheio preferido dentro daquelas bolinhas fritas e crocantes à perfeição. A explosão de sabor me fez fechar os olhos e gemer alto. O som que saiu da minha boca foi surpreendente até para mim... parecia que eu estava tendo um orgasmo com a comida. O que estava perigosamente perto da verdade, eu precisava admitir, aquilo estava simplesmente perfeito!
Uma sorte que estávamos apenas nós duas ali em cima ou ...
Um assovio alto cortou o ar.
“Uau!”
“Nossa mãe!”
“Acho que acabei de ter uma ereção...”
“Ok, eu tenho que experimentar isso!”
Eu abri os olhos surpresa.
Mas eu devia ter continuado com eles fechados... totalmente fechados... colados na verdade... enquanto eu derretia de vergonha e me transformava em uma poça no chão de madeira polida.
Não um, nem dois, nem três...
Claro que não, porque apenas três deles ainda não seria castigo suficiente.
Claro que não!
Quatro dos meus chefes tinham acabado de subir pelas escadas do mezanino e olhavam estabacados e de bocas abertas, com seus pratos e xícaras precariamente seguros nas mãos, para o meu rosto que já devia estar mais para um tom de roxo do que um vermelho escuro.
Porquê meu Deus?! Porquê?
O que eu fiz? Eu matei bebês foca em uma vida passada?!
Foi isso?!
Porque nada do que eu tinha feito nessa vida, podia merecer um castigo desse tamanho...
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