And who really cares
About the clothes you wear
or the skeletons downstairs
When we’re all in an affair
an affair with death
- Serpens Caput, your last caress
Desde que descobrira sobre seus sentimentos por Jack, Steve nunca havia realmente pensado na reação de seus pais. Ele queria contar para eles, queria que eles soubessem quem ele realmente é, o que ele realmente sente. Hel o havia feito querer tudo aquilo ainda mais.
Ele abriu a porta de casa rapidamente, ansioso para dar a notícia à sua família. Seus pais não estavam na sala de estar, então provavelmente descansavam no quarto, vendo TV.
O garoto subiu as escadas de sua casa de dois em dois degraus. Seus irmãos estavam em seus respectivos quartos, fazendo o que sempre faziam.
Sophie, a filha mais nova, estava brincando de bonecas em seu quarto. Ela era uma menininha adorável de seis anos, com cabelos loiros como os de Steve e olhos cinzentos. A garotinha se levantou e correu para o irmão, dando-lhe um abraço.
— Brinca comigo, Steve? — Ela pediu, animada.
— Claro, Sophie. — Steve respondeu, se abaixando e colocando uma de suas mãos sobre a cabeça dela. — Mas vai ter que ser depois, tudo bem?
— Jura de dedinho? — Ela perguntou, levantando seu mindinho para o irmão. Ele assentiu e entrelaçou seu próprio dedo mínimo com o dela.
— Juro de dedinho.
A menina voltou para o seu quarto saltitante. Quando Steve olhou para o quarto, viu sua outra irmã, Isla, de treze anos. Ela era a cópia idêntica de Steve: cabelos loiros e olhos castanhos, tinham o mesmo nariz e o mesmo tom de pele. A única diferença entre os dois (além da altura e dos sexos diferentes) era o cabelo cacheado de Isla. Ela era a única entre os filhos que havia herdado o cabelo da mãe, e não do pai.
Isla era muito parecida com Jack, de certo modo. Os dois tinham aquela cara rabugenta e eram calados de uma maneira geral. Não gostavam muito de conversar com pessoas que não conheciam bem, mas quando eles eram próximos de alguém, eram os mais engraçados.
— Isla — Ele chamou a irmã, que se deitava na cama encarando a parede. — Tudo bem com você?
Ela ergueu a cabeça e olhou para o irmão. Steve resolveu se sentar ali do lado dela. Por mais que estivesse ansioso para falar com seus pais, pensava que os sentimentos de sua irmã eram mais importantes. — Aconteceu alguma coisa na escola? — Ele perguntou.
— Nada demais. — Ela suspirou. — Há um garoto novo na nossa sala, e demora um pouco para se acostumar, eu só estava pensando nisso.
— Hm. Tudo bem, então.
Steve deixou a irmã pensando em paz, fechando a porta do quarto dela e voltando para o corredor. Ele foi ao próximo quarto, onde Ethan, de dez anos, jogava vídeo game. Suas cortinas estavam fechadas e ele se sentava próximo demais da TV. Steve entrou no quarto do menino e abriu as cortinas. Ele tinha claros cabelos castanhos e olhos cinzentos. Ou melhor, olhos avermelhados, que denunciavam o tempo que ele gastou jogando no escuro.
— Hey, Steve! — Ele reclamou, cobrindo os olhos com as mãos. — Você me fez perder!
— Você vai é perder a visão se continuar jogando nesse escuro. — Steve retrucou. — Você está muito perto da tela, Ethan.
O loiro puxou o garoto para longe da TV, ignorando os protestos do mais novo.
— Se você vai jogar com as cortinas fechadas, pelo menos acenda a luz. — Steve disse, saindo do quarto.
— Tá, que seja. — O mais novo bufou.
Além da cama de Ethan, havia outra cama vazia. Era a de Luke, seu irmão mais velho. Ele tinha vinte anos, estudava medicina na faculdade durante o dia e trabalhava durante a noite. Steve mal via o irmão, e não sabia como ele tinha tanta energia para tudo aquilo.
Ele se dirigiu até o próximo quarto, o de seus pais, que estava com a porta fechada. O sorriso que enfeitava seu rosto há poucos segundos havia desaparecido. Seu coração estava batendo acelerado e ele suava, ansioso. Sua cabeça começara a doer, como se algo a pressionasse incessantemente.
“Não, agora não” Ele pensou, já sentindo as lágrimas em seus olhos.
Ele saiu correndo para o quarto, subindo as escadas do sótão de dois em dois degraus para chegar mais rápido e fechando a porta rapidamente depois de entrar, sem esquecer de trancá-la. Steve foi até a janela e a abriu, respirando desesperadamente como se o ar de dentro da casa fosse tóxico. Estava com dificuldades em respirar.
Ele apoiou as costas na parede e desceu lentamente até o chão, segurando a cabeça com força. Estava tonto e trêmulo, suava muito e simplesmente não conseguia parar de se mexer.
— Merda. — Ele disse entre soluços.
“Cinco coisas que você pode ver, Steve” Ele se lembrou da voz de Jack em sua cabeça. O que podia ver?
Podia ver suas roupas espalhadas pelo chão de seu quarto. Podia ver as luzes de natal pregadas em sua parede. Podia ver sua cama bagunçada, sua porta fechada e uma pilha de livros didáticos ao lado de sua escrivaninha.
“Quatro coisas que você pode tocar” Podia sentir suas calças jeans ásperas, a madeira fria em suas costas, seu rosto molhado e seus sapatos apertando seus pés.
“Três que pode escutar” Conseguia ouvir o barulho da televisão de seus pais e de Ethan gritando com seu videogame. Conseguia ouvir o barulho de pássaros cantando, também.
Ele já se sentiu mais calmo, se distraindo do que quer que tenha provocado o ataque e focando no que era real, no que ele podia confiar que realmente estava lá, que era de verdade.
“Duas que você pode cheirar, Steve” Não conseguia sentir o cheiro de nada. Seu nariz estava entupido. Respirou fundo pela boca, tentando se acalmar. Poderia pular aquela parte. O que vinha depois?
“Uma coisa cujo gosto você pode sentir” Não havia nada que pudesse colocar na boca, pensou nisso enquanto praticamente mascava seu lábio inferior. Se concentrou na sensação de mordê-lo, sentindo como estava áspero e machucado. Não demorou muito para que sentisse um gosto metálico em sua boca.
“Relaxe o corpo” Se lembrou. Fechou os olhos, esticando suas pernas e abaixando seus braços. Não percebeu o quão tenso estavam seus ombros até que ele finalmente conseguiu relaxá-los. Sua respiração estava entrecortada e era difícil se acalmar.
“Lembre-se de que está tudo bem, Steve. Você vai ficar bem” A voz de Jack terminou. Ele repetiu “Está tudo bem” de novo e de novo em sua cabeça, como um mantra.
— Steve! — Ele ouviu a voz de Sophie o chamando. — Podemos brincar agora.
Ele limpou a garganta e respirou fundo. — Já estou indo, Sophie. Me dê só cinco minutos. — Sua voz saíra normal, e ele se orgulhara do fato. Respirou fundo e se levantou lentamente. Ele tirou a blusa calmo, sem pressa para descer. Limpou as lágrimas com a peça de roupa e a jogou em cima da cama, tirando as calças logo depois. Vestiu uma calça de moletom e ficou sem camisa. Já sabia do que Sophie queria brincar, e não queria que ela derrubasse esmalte em cima da blusa dele, como acontecera da última vez.
Ele desceu as escadas rapidamente e chegou ao quarto da irmã, já com o rosto seco e limpo.
— Steve! — Sophie exclamou quando ele entrou no quarto. Ela estava sentada no chão e apontou para o espaço na frente dela, dizendo: — Sente-se!
Ele fez como ela pediu. — Então, o que faremos hoje!
— Vamos brincar de salão! — Ela disse, sorrindo e mostrando os inúmeros vidros de esmalte, bases, sombras, lápis, delineadores, blush.... Haviam coisas ali que ele nem sabia o nome, mas sabia que por causa delas, ele ficaria sentado ali por muito tempo. — Isla, vem brincar com a gente.
Steve olhou para a garota, que abrira a boca para dizer não. Ele lançou um olhar para ela, e depois de alguns segundos ela levantou de sua cama e sentou-se ao lado de Sophie, que olhou para ela com um brilho nos olhos, querendo saber por onde deveriam começar.
— Primeiro vamos limpar o rosto de Steve. Temos que ir ao banheiro para isso. — Ela disse, se levantando e arrastando o irmão pelo corredor até o banheiro.
Elas lavaram o rosto dele e aplicaram um creme estranho que ele não sabia o que era. Depois, aplicaram outro creme, que ele também não fazia ideia do que era. Então, Isla passou um pó estranho que ele sabia ser base.
— Agora é o blush? — Sophie perguntou, recebendo um aceno de cabeça de Isla. Ela sorriu, animada. — Eba!
Então, ela pegou um blush de tom rosa e tentou ir até Steve, mas foi parada por Isla. — Essa cor não combina com ele, Sophie. Vamos achar outra, ok? — Ela disse. A pequena assentiu, perguntando se escolher a sombra depois. Isla assentiu.
Depois de alguns minutos, as duas já tinham passado tanto pó no rosto de Steve que ele pensava estar parecendo um palhaço. Não que ele não confiasse nas capacidades de suas irmãs, mas ele sentira tantos cremes diferentes cobrindo sua pele e tantas discussões sobre qual sombra era melhor para realçar seus olhos que não sabia mais se estava com a mesma aparência de antes.
“Só falta decidirem que querem que eu use um vestido e uma peruca” Ele pensou, rindo um pouco. Isla se aproximou para passar lápis em seus olhos, e ele nunca sentiu mais medo de uma discussão raivosa em toda a sua vida. E se as duas começassem a discutir e Isla furasse o olho dele com aquele lápis?
Enquanto as duas o maquiavam, ele pôde pensar em sua situação. Ele queria muito que seus pais soubessem que ele gostava de garotos. Queria que eles soubessem do fato e que dissessem que o amavam do mesmo jeito. Queria saber que aquele tipo de coisa não importava para os dois, nem para suas irmãs e irmãos. Queria saber que continuaria sendo o Steve de sempre, mesmo se aparecesse em casa com um garoto ao invés de uma garota.
Ele se sentiu completamente desconfortável em seu próprio corpo. Sua família nunca havia se posicionado em relação à homossexualidade, e ele simplesmente não sabia o que esperar. Eles aceitavam pessoas de cores, nacionalidades e religiões diferentes, mas ainda assim, era diferente com sexualidade. Sempre parecia ser. Uma pessoa diria como era inumano julgar alguém pela cor de sua pele, mas julgaria outra por quem ela ama. Diriam que não importa o Deus que você ame, mas que era uma coisa completamente nojenta amar alguém do mesmo sexo. Ele odiava quando as pessoas usavam sua fé para justificar seus comportamentos idiotas.
— Steve! — Isla exclamou.
— Anh? — Ele disse, surpreso.
— Você estava viajando, em? — Ela disse. — Você está pronto. Já até pintamos suas unhas, cara.
— Você está lindo, Steve! — Sophie exclamou.
Os três ouviram um barulho de chaves girando. Eles se entreolharam, sabendo que só podia significar uma coisa.
— Luke? — Os três disseram em uníssono.
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