Carlos e Serena subiram a escada; chegaram até a sala de estar da casa. Carlos avistou Kelvin fazendo palavras cruzadas no sofá. Com toda aquela situação, havia se esquecido do homem que o trouxe até aquele lugar, ele era um cúmplice de toda aquela falcatrua. O Crescente não falou nada, não reclamou do fato de ter sido trazido para uma armadilha, apenas seguiu Serena e esperou ela começar a falar sobre seus planos.
A médica disse para Carlos sentar-se no sofá, ele sentou-se. Ela foi até um quarto; demorou um pouco. Voltou com alguns papéis em mãos. Os jogou na mesa de centro e sentou-se em um sofá de frente para ele.
— Então. O que tenho que fazer? — indagou Carlos.
Serena cruzou os braços e começou a falar.
— Melissa é a líder de uma organização chamada Horizon. Essa organização age pelas sombras na cidade. A população acredita que ela é apenas uma lenda criada por moradores de rua para assustar aristocratas. Felizmente, tenho vários contatos pela cidade e descobri informações úteis sobre eles.
— E que contatos são esses? — Carlos estava com um olhar de dúvida, suspeitando dessas afirmações. — Se me permite saber.
— São moradores de rua... — Ela parecia não estar muito feliz em ter que revelar isso.
— Então você está confiando em moradores de rua? — Ele arregalou os olhos brevemente. — Não acho que eles sejam parâmetro para informações.
— E algumas outras pessoas que possuem envolvimento com o governo. Essas informações são confiáveis, não se preocupe. Eu mesma confirmei isso.
— Quem são essas pessoas? Por que alguém conseguiria informações tão facilmente de uma organização secreta?
— Chega. — Serena estava com o olho direito piscando de tão irritada. — Você faz muitas perguntas.
— Preciso saber no que estou me metendo. Preciso da maior quantidade de informações possíveis.
Serena ficou em silêncio por um momento. Estava pensativa, não sabia se continuava a dar informações ou se ia direto ao assunto. Foi quando Kelvin se intrometeu na conversa.
— Acho que você devia contar a verdade para ele. — O relojoeiro o olhou fixamente, sabia da força dele por conta dos ferimentos que ele possuía. — Esse homem é um pouco mais esperto e parece ser mais forte do que a maioria que eu trouxe aqui, fora que não é uma informação tão relevante para ele.
Ao ouvir aquilo, Carlos não se surpreendeu. Já imaginava que aquilo teria acontecido várias vezes. Aqueles dois estavam fazendo isso há muito tempo, pensou ele. Com certeza, sempre enganavam pobres viajantes para realizarem seus trabalhos sujos.
— Tudo bem — disse Serena hesitante. Não estava muito contente por ter que revelar como ela descobriu todas as coisas podres dessa cidade. — Todas essas informações, eu mesma as consegui.
— E posso saber como? — Carlos aceitou aquela afirmação, ouviu uma sinceridade na voz de Serena, e aquilo parecia mais plausível do que mendigos dando informações.
— A própria Melissa me disse isso. — Serena hesitou em terminar a frase, mas não teve outra saída a não ser fazê-la. — Porque ela é a minha irmã.
Carlos estava analisando tudo desde o começo. Não ficou surpreso com nenhuma afirmação anterior porque já esperava tudo aquilo. É o que acontece quando você presta atenção em pequenos detalhes a sua volta, mas isso era impossível de descobrir. Saber que a prefeita é irmã de Serena pegou ele de surpresa.
— Então, você quer acabar com a sua própria irmã?
— Não quero acabar com ela. Apenas quero... — Serena pensou, nem mesmo ela tinha certeza do que queria naquele momento. — Apenas quero que ela pare com essas atrocidades.
Carlos pensou em continuar questionando o motivo de ela estar fazendo tudo aquilo, mas decidiu não se meter. Entendera os sentimentos da médica. Aquilo era assunto de família e não importava para ele, apenas queria terminar tudo isso logo.
— Entendo. Então, prossiga com as informações.
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No alto de um prédio enorme, o maior de Waft, uma mulher está sentada em sua mesa, olhando pela janela que se estende por toda a parede. Ela usa um vestido vermelho chamativo onde é possível ver sua perna; uma prótese de metal está no lugar de sua perna direita, é um metal reluzente que faz com que sua perna seja bela e chamativa. Observa a cidade serenamente enquanto segura em suas mãos uma taça de vinho. Seu olhar está perdido em meio a pensamentos, mas também revela aflições no coração.
A mulher se levanta, resolve se aproximar da janela, sua perna metálica faz um pouco de barulho, mas ela não se importa; já havia se acostumado com isso. Uma vasta cidade é vista no horizonte, nesse momento, sente-se vazia e sozinha em meio a uma cidade tão grande. Olha para a direita da cidade procurando algo, mas parece que nada encontra. Olha para a esquerda da cidade e novamente tem o mesmo resultado. Não sabe ao certo o que está procurando, mas sabe o que a aflige. A mulher morde o lábio superior.
De repente, ouve-se batidas na porta. A mulher responde com um “entre”.
Um rapaz entra na sala e caminha lentamente em direção a ela. Esse rapaz, que utiliza uma cartola que não combina com a sua aparência jovem, chama-se Finn Azerath — uma pessoa com um sobrenome peculiar naquela região. — Ele imediatamente chama pela mulher.
— Senhorita Melissa?
A prefeita de Waft demora a responder. Ainda estava vislumbrando a cidade pela janela. Aquele ar acinzentado a encantava de uma forma diferente. Muitas pessoas poderiam dizer que aquela cidade era feia por conta do ar, mas Melissa não pensava assim, achava que Waft tinha sua própria beleza.
— Olá, Finn — ela respondeu com uma voz distante.
— Você ainda está olhando para essa janela?
— Sim. A vista daqui é linda.
— Sim. Essa cidade é bela, apesar de tudo.
Ela deu um pequeno sorriso e um gesto concordando. Largou a taça na mesa e mudou de assunto, conseguia sentir no olhar dele que o rapaz tinha vindo com alguma notícia.
— E então, o que o traz aqui?
Finn se aproximou mais para conseguir conversar melhor com ela.
— Ouvi relatos de algumas pessoas dizendo que na área norte da cidade houve um tumulto.
— Que tipo de tumulto? — Ela arqueou a sobrancelha, franziu um pouco a testa e o encarou com atenção. — Me conte com detalhes.
— Parece que houve uma luta. Alguns membros da FMU lutaram contra um viajante. As pessoas diziam que a roupa dele era meio estranha.
— Houve feridos? — Sua expressão não escondia a preocupação no rosto.
— Sim. — Ele olhou para um documento em suas mãos. — Esse aqui é um relatório do que aconteceu. Parece que houve uma morte de um membro de uma equipe de estagiários da organização. Três pessoas ficaram feridas, eles também eram dessa equipe.
— Alguma pessoa da cidade ficou ferida?
— Não. Elas apenas ficaram assustadas, as baixas foram apenas essas que citei, além de alguns danos ao patrimônio da cidade.
— Entendo. — Melissa suspirou de alívio por não ter tido mais vítimas, mas estava sentida pelo o que aconteceu aos outros. — Entrarei em contato com a FMU e informarei do ocorrido. Diga a Reinhard para manter a guarda em vigilância. Não podemos permitir que essa pessoa saia impune.
— Imediatamente, senhorita — Finn colocou o documento na mesa da prefeita. — Deixarei o relatório aqui para que você leia.
— Obrigada.
Finn se despediu e saiu da sala deixando-a a só. Ela pegou o documento e começou a folear.
“Uma pessoa com uma roupa estranha. Preciso saber mais” — pensou ela. — “Será que Serena tem algo a ver com isso?” — Olhou a página que dizia sobre a morte de um membro da equipe da FMU, e começou a raciocinar — “Hum, não acho que ela faria algo contra aquela organização. Ela sempre direcionou seus ataques contra mim. Isso parece ser um caso isolado.” — Lembrou-se do fato de os membros da organização serem fortes. Sem perceber, colocou o dedo indicador nos lábios — “Se essa pessoa conseguiu matar algum membro daquela organização, provavelmente também deve ser forte, algumas pessoas relataram que essa pessoa disparava gelo das mãos. Isso parece meio exagerado, mas não impossível. Se existe alguém tão forte, com certeza minha irmã tentará usá-lo contra mim. — Largou os documentos na mesa.
— Preciso avisar isso para todos os membros da Horizon — disse ela enquanto saía da sala.
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