Lynda estava confortavelmente sentada em um banco, jogando xadrez com seu mordomo. Usava um vestido preto e branco cheio de babados com detalhes em rosa ornamentados simetricamente. Era algo bem chamativo para uma criança, mas apesar de ser tão infantil ainda possuía certa elegância. Seu cabelo era loiro, grande e dividido ao meio formando duas longas madeixas que eram presos com duas fitas brancas.
Lynda tinha uma expressão de superioridade no rosto. Também parecia estar concentrada. Olhava tão fixamente para o tabuleiro de xadrez que parecia não existir mais nada no mundo além dele. Sua concentração parecia inabalável.
Teve que fazer uma pausa, isso pareceu irritá-la muito. Sua expressão mudou drasticamente ao notar que alguém estava lá fora observando a mansão.
— Geffrey. — Ela olhou para o mordomo que estava jogando com ela. Era um homem velho. Sua pele era morena, seu cabelo grisalho e bem curto. Vestia uma típica roupa de mordomo, também parecia ser bem elegante. — Tem alguém observando a mansão.
— Eu checarei isso, se me permite. — Ele formalmente colocou a mão direita no peito.
— Sim, claro. Continuaremos depois.
O mordomo se levantou e reverenciou-se. Andou calmamente até a janela e observou o homem que estava espiando. Ele estava sentado no banco lendo um jornal.
— É apenas um homem lendo um jornal, madame. Se isso a incomoda, eu posso cuidar dele.
— Não é necessário. Enquanto ele estiver em minha visão não será um empecilho. O grande problema — ela olhou seriamente para o tabuleiro — é que preciso me concentrar no jogo. Se eu observar essa pessoa poderei perder cinco por cento da minha concentração.
— Eu não acho que isso será um problema, madame. Eu não ganharia nem com setenta por cento de vantagem.
Lynda olhou para o mordomo e fez um olhar pronto para dar um sermão.
— Quando jogo, Geffrey, gosto de dar o meu máximo. — A garota cruzou os braços aborrecida. — Não temos a chance de evoluir quando não jogamos para valer. Esses 5 por cento fazem diferença.
— Eu entendo. O que quer que eu faça?
— Nada. Vamos continuar a jogar e observar. É possível que ele vá embora, e se fizer algo, lidaremos com ele.
Geffrey voltou a se sentar na cadeira e retomou o jogo de xadrez com Lynda. Ambos se concentraram enquanto a garota mantinha seus olhos na pessoa suspeita.
— A7 para C6 — disse Lynda enquanto movia o cavalo. Estava observando o rapaz lá fora que parecia estar fazendo um movimento suspeito.
No momento em que ia mover a peça de xadrez. Algo que a garota não esperava aconteceu. Uma pedra quebrou a janela. Estilhaços voaram por toda a parte enquanto um enorme barulho se alastrou pelo quarto. A pedra caiu certeiramente na mesa de xadrez derrubando várias peças. A surpresa fez com que Lynda desse um pequeno grito agudo.
— O-o que foi isso? — Ela olhou para a pedra em cima do tabuleiro. Estava suando um pouco por causa do susto. — U-uma pedra.
Imediatamente o mordomo correu para a janela e tentou pular, mas foi parado por Lynda.
— Espere, Geffrey. Foi aquele homem suspeito. — Lynda tentou se recompor do susto que tomou respirando fundo.
— Eu irei atrás dele, madame.
— Não é necessário. — Ela se levantou, caminhou delicadamente até a janela, tomando cuidado para não se machucar com os estilhaços de vidro. Olhou pela janela quebrada, avistou duas pessoas correndo na rua. Ficou pensativa por um momento, tentando imaginar o porquê daquilo. Olhou para os guardas que estavam lá em baixo e os analisou. Após um tempo descobriu. — Entendo, então ele descobriu. Eu não esperava que alguém fosse fazer isso.
— O que ele descobriu, jovem senhorita? — O mordomo estava curioso para saber o que ela havia descoberto. Sempre ficava entusiasmado por dentro ao ouvir as análises de Lynda.
— Uma de minhas habilidades. — Ela voltou para onde estava a mesa de xadrez — aquele homem fez o movimento inicial e está em vantagem. Ele voltará.
— A senhorita tem certeza? — indagou o mordomo enquanto limpava os estilhaços de vidro.
— Sim. E acho que essa noite vai ser bem divertida — Lynda sorriu. Algo que Geffrey não havia visto por muito tempo. Pegou a peça do rei branco e a olhou fixamente. Estava ansiosa pela sua partida contra aquela pessoa.
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Carlos e Kelvin estavam correndo freneticamente há algum tempo. Ambos estavam fadigados por correrem tanto. O relojoeiro estava meio confuso com toda aquela situação. Não havia entendido o porquê de Carlos ter jogado uma pedra na mansão de Lynda sendo que ele mesmo havia dito para serem discretos.
— O que. — Kelvin tentava falar enquanto respirava ofegante. — O que você fez? Não era para sermos discretos?
Carlos parou por um momento e recuperou o fôlego. Pediu para Kelvin esperar, também aproveitou para se recuperar.
— Acho que eles não estão nos seguindo — disse Carlos enquanto olhava para trás a procura de inimigos.
— Então por que estávamos correndo tanto?
— Sei lá – Carlos deu de ombros. — Pode ser que eles nos sigam, não é? Não acho que alguém ficaria feliz por terem quebrado o vidro de sua casa.
— Pode me explicar o que foi aquilo? — O relojoeiro estava cada vez mais impaciente por uma explicação.
— Espere aí. — Carlos respirou. — Vamos andando enquanto eu explico. Preciso planejar o que fazer.
— Minha casa fica mais perto do que a de Serena, podemos poupar tempo indo para lá.
Os dois conversavam a caminho da casa de Kelvin. A rua estava um pouco vazia por conta do horário. Apenas algumas pessoas andavam por aquele lugar. Não havia nenhum sinal de pessoas os seguindo, então estavam confortáveis para falar sobre os planos.
— Enquanto observava. — Carlos começou a relatar o que descobriu. — Notei que havia algo de errado com aqueles guardas.
— E o que é? Não notei nada. — Kelvin fez força para se recordar de algo, mas foi em vão.
— Eles pareciam bem estáticos e, quando eu joguei a pedra na janela, nenhum guarda esboçou reação. É minimamente comum que alguém reaja de alguma maneira quando vê algo acontecendo.
— Isso quer dizer o que? — Kelvin se lembrou de que os guardas realmente não se mexiam, mas não sabia onde Carlos queria chegar com aquilo. Ainda mantinha a expressão de dúvida no rosto.
— Que talvez eles sejam marionetes. — Carlos falou com naturalidade, mas o relojoeiro fez uma cara de espanto.
— Marionetes? Isso não é um pouco absurdo? — Nesse momento ele achou que o rapaz era louco.
— De onde venho não é. — Seu olhar era convincente o suficiente para o relojoeiro não lhe questionar mais. — O que importa é que consegui uma informação, e isso nos dá uma vantagem.
— E você pretende usar essa informação como?
— Te direi depois. Posso contar com você? — Carlos estava um pouco apreensivo, mas não demonstrou isso. Não gostava da ideia de ter que contar com a ajuda dele.
— Hehe, mas é claro — Kelvin deu sua famosa risada contagiante que, apesar de tudo, não deixou Carlos mais confortável. — Estamos quase chegando em minha casa.
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