Todos do vilarejo começaram a se juntar em volta da casa em destroços, ninguém sabia o que estava acontecendo e muito menos se havia alguém vivo lá. Pelo menos até ouvirem a voz de um homem gritando de dor:
— Alguém me ajuda!! Eu vou ser morto por essa pirralha!
Helena estava em cima do homem, segurando e puxando suas asas com força, quase arrancando-as. De repente, ela abriu suas próprias asas e começou a bate-las, ninguém podia acreditar que aquela criança amigável que todos viam brincando todos os dias, seria capaz de carregar alguém pelos ares daquela maneira.
— Devolve... a vovó... — Helena disse isso enquanto arremessava o homem novamente para os destroços. Mas era diferente, pois agora, sua voz não era mais a mesma, não era a voz melíflua de sempre, era diabólica, cruel, soava como se tivesse um ser ecoando dentro daquela criança, fazendo de tudo para sair.
O homem já estava sem forças, havia cortes na sua cabeça causados pelas garras de Helena, ele jamais viu algo assim, e mesmo com seu rosto ensanguentado, caiu em gargalhadas enquanto Helena se aproximava aos poucos.
— Eu não posso acreditar que vossa majestade criou algo tão incrível... imagine no futuro, quando crescer! Se for treinada corretamente, você pode até se tornar... minha futura rainha? — Este homem já aparentava estar fora de si, sua risada deixava todos do vilarejo assombrados.
Helena não aguentou mais ouvir a voz dele e colocou a mão em sua boca, fincando suas garras nas bochechas dele e depois arrancando com força. Os gritos de dor causavam agonia em qualquer um que escutasse, era como uma sessão de tortura. Como se não bastasse, Helena encheu o homem de chutes, até que o ultimo chute foi tão forte que o levou até o final dos destroços. Mas mesmo com tudo isso, ele não perdeu a felicidade.
— Eu posso não ter como te levar agora, mas enquanto você continuar liberando o seu poder... nós vamos te achar, nós vamos trazer você para o nosso lado... *ele* está te esperando. Saiba que um dia eu vou devolver toda a dor que você me causou. — Ao terminar de falar, ele se envolveu numa nuvem escura e desapareceu. Isso enfureceu Helena mais ainda, que quando viu todos os moradores assustados, sorriu de forma doentia, da mesma forma que o homem de antes, mas desta vez, os moradores tinham razão em sentir medo.
Com tanta energia maligna sendo liberada naquele local, aqueles que podiam senti-la, não poderiam deixar de lado. Estava na hora de Lillian entrar no jogo.
Lillian estava andando pelos corredores da associação de exorcistas, seu andar era confiante, sua expressão era de superioridade. Já que era uma mulher alta e muito bonita, era dona de muitos olhares pela associação, mas claro que ela não se importava com isso, pois seu único foco era exterminar demônios, mas tudo iria mudar naquele dia, logo após sentir vibrações malignas vindas da zona rural, vibrações tão poderosas que ela não foi a única, todos os exorcistas do corredor se assustaram com aquilo. Lillian não perdeu tempo, nem se preocupou em vestir o uniforme, sua regata e calça preta eram o suficiente para encarar a missão.
— Eu não vou demorar muito, me passa a localização dessas vibrações que eu vou para lá agora. — Disse Lillian enquanto colocava suas facas na sua perna. Por mais que seu estilo de luta fosse na base de socos, era melhor se prevenir.
— Senhorita Lillian... você tem certeza? Tinham dois focos de energia e agora tem apenas um, se tinham dois demônios brigando, com uma energia dessa, esse demônio deve ser muito forte. — Assustado, pois até mesmo o rapaz da area tecnológica não tinha bons pressentimentos.
— Pois é, meu anjo... parece que você esqueceu com quem você está falando. — Ao dizer isso, esticou os braços como se estivesse se alongando. — vai lembrar quando esse pontinho vermelho na sua tela sumir. Estou indo.
Dito isto, Lillian saiu em direção à zona rural, onde se encontrava o vilarejo. Chegando lá, era realmente o que ela esperava, caos para todo o lado, pessoas machucadas no chão, várias casas destruídas. O demônio que estava lá, na percepção de Lillian, era um dos grandes.
Lillian se agachou perto dos destroços onde haviam pessoas no chão, com um pouco de sangue em suas roupas.
— Está tudo bem com vocês? Sabem se tem gente ferida em baixo dos destroços?
O senhor que estava no chão de repente segurou os ombros de Lillian, com uma expressao de pavor, era como se tivesse acabado de descer ao inferno.
— Ele é pequeno... ele segurou minha esposa e jogou ela contra a parede! Como eu ia imaginar? — Continuou, agora chorando nos braços de Lillian. — Me perdoe, querida... se eu soubesse não teria brigado com você na ultima noite... eu jamais teria falado aquelas coisas... me perdoe!
Lillian olhou em volta e viu que havia uma senhora deitada no chão, na frente de uma parede um pouco rachada. Mas Lillian sentia que ainda havia energia correndo pelo corpo da senhora, então ela ainda estava viva.
— Se sua esposa for aquela senhora... pode ficar aliviado, ela com certeza está viva. — Lillian levantou, agora um pouco mais irritada — Só espere eu acabar com toda essa merda.
Após dizer isso, Lillian sentiu a energia aumentando atrás de um muro alto. Sem nem pensar, pulou pelo muro com muita velocidade, mas perdeu o equilíbrio na hora de aterrissar quando viu quem era o demônio. De joelhos, com uma expressão de indignação, cerrou o punho e olhou nos olhos da criança demoníaca.
— Tinha que ser agora, Helena?
Ela sabia que não podia ficar só olhando, precisava agir, antes que Helena chegasse a matar alguém. Era seu dever cuidar para que isso não acontecesse. Então ela se posicionou, estendeu suas mãos e abriu um círculo mágico, mas Helena não iria deixar tão fácil. A criança começou a erguer pedras enormes e mirou todas na Lillian, que teve que desviar de todas, contudo, enquanto desviava, chegava mais e mais perto de Helena, até chegar o momento em que estavam frente a frente. Lillian aproveitou a chance e agarrou a Helena, colocou uma mão em sua cabeça e ativou seu círculo magico em cima da cabeça da criança. Uma luz branca foi emitida pela mão de Lillian que estava na testa da Helena, após a luz sumir, a criança perdeu sua face demoníaca, voltou a ser aquela garota fofa de antes, mas estava inconsciente.
Lillian abraçou a criança.
— Você fez uma grande bagunça, hein...
Algumas horas depois, Helena acordou.
— Nossa, demorou hein. Bem que sua mãe dizia que você seria que nem uma pedra na hora de dormir.
Lillian entregou uma caneca chocolate quente para Helena.
— Eu... o que houve? — Helena segurava a caneca, apenas olhava para seu próprio reflexo.
— Você fez uma bela bagunça no seu vilarejo, mas está tudo bem agora, ninguém morreu, afinal.
— E a minha avó!?
Ao ouvir isso, Lillian desviou o olhar.
— Ah... entendi... — Helena se encolheu dentro dos cobertores. — Então alguém me trouxe pra sua casa?
— Não. Na verdade, eu te trouxe pra cá. Eu vou cuidar de você, agora. — Colocando a mão no ombro da Helena. — É muita informação, mas você precisa saber de algumas coisas.
— Eu já sou crescida. — Disse isso com os olhos marejados e fazendo bico, segurando as lágrimas. — Pode falar, fui eu que matei a vovó. Eu sou um monstro!
Lillian não aguentou e a abraçou com força. Helena sentiu aquele calor, sentiu que era familiar, era como se sua mãe estivesse aquecendo seu coração e secando suas lágrimas aos poucos.
— Nunca. Jamais diga uma coisa dessas. Você não matou ninguém, você só descobriu algo novo aí dentro, e eu to contigo pra te ajudar no que precisar. — Lillian acariciou a bochecha de Helena. — Então, sei que faz tempo que eu não te vejo, e que tenho muito para lhe contar, mas será que eu posso ver aquele sorriso radiante que minha sobrinha sempre deu?
Helena deu um leve sorriso, aquela demonstração de afeto acalentou o coração da criança, e o tirou daquele estado de confusão.
— Obrigado, tia.
Depois de um tempo, Helena já estava mais calma e já havia terminado seu chocolate quente. Lillian podia começar a falar.
— Okay... é agora. Vamos lá. — Olhou nos olhos da criança. — Eu vou te explicar tudo.
Helena estava concentrada e abraçando os joelhos, com uma mistura de nervosismo e curiosidade. Lillian tentou explicar de uma forma que uma criança poderia entender.
— Então, Helena. Você já deve ter percebido que você não é uma criança normal. A verdade é que você tem algo dentro de você que é forte, muito forte, mas também é malígna, ou seja, você *não* pode usar isso dentro de você. Essa coisinha dentro de você, crescer quando você sente algo negativo, então sempre que você sentir que vai estourar, que não consegue segurar suas emoções, você vem falar comigo imediatamente, tudo bem?
Helena encarava ela, com um olhar de criança confusa.
— Então é por isso que quando eu chorava alguns pratos e copos caiam do armário?
— Sim! Isso mesmo, que bom que está prestando atenção. Sua avó já te falou algo sobre exorcismo?
— Não... eu sei que são pessoas que lutam contra bichos maus, já que eu espiava você e a vovó conversando...
Lillian fez uma expressão de desconfiada.
— Depois vamos conversar sobre isso. Mas não está errado, é exatamente isso que fazemos, sua mãe era uma ótima exorcista, acabava com todos os bichos maus. Tínhamos sua idade quando descobrimos sobre isso, mas é algo secreto, não pode contar pra ninguém, entendeu?
— Sim, tia. Eu nem tenho amigos, eu perdi meu único amigo.
— Sério? Quem?
— O Shawn...
Lillian rapidamente se lembrou da pelúcia que Helena sempre zelou com muito carinho.
— Não se preocupe, ele com certeza sempre teve muito orgulho de você, assim como eu.
Com poucas palavras, Lillian fazia Helena se sentir um pouco melhor. Após aquela conversa, como já estava tarde, Helena caiu rapidamente no sono, e Lillian foi até a varanda.
Diante das estrelas e da lua cheia, que iluminavam levemente o rosto de Lillian. Será que ela estava fazendo um bom trabalho em ser a responsável por Helena, como ela esconderia o fato de que Helena também era um demônio. O fato de esconder um demônio da associação de exorcistas, poderia ser considerado como traição. Lillian não sabia o que fazer, a única coisa que ela tinha certeza, era de que aquela criança era sua responsabilidade, algo que foi deixado por sua irmã. Lillian precisava fazer aquilo.
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