02° Estrofe
Um menino se aproximou. “Minha mãe disse que se fizer mágica demais você acaba virando um encantado.”
Ele riu. “Não se preocupe meu campeão, pois existe um método para se evitar anos de estudo, nem mesmo ter grande quantidade de magia no corpo.”
“Como?”
“A técnica de magia vanciana . Todos pensam que cajados e varinhas mágicas são instrumentos para usar a própria magia dos feiticeiros, mas os magos vancianos usam artefatos, varinhas e cajados com energia armazenada e feitiços prontos, feitos por magos que passaram anos estudando. Use itens, como joias, pergaminhos e cartas. Não existe perigo de contaminação ou corrupção se toda magia é feita por uma varinha e não por você. Não é a sua magia, mas a que foi armazenada. Assim não se limita a dois feitiços por dia.”
“Eu já vi varinhas de repetição descartáveis.” Ilha Bela levantou a mão. “Isso não é trapaça? Magia não devia ser feita pela mesma pessoa?”
“Não.” Ele respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. “Não comemos comidas cultivadas por outras pessoas? Não vestimos roupas feitas por outras pessoas? Moramos em casas construídas por outras pessoas? Alguém é menos caçador por que suas flechas e arcos foram feitos por outras pessoas? É tanta trapaça quanto juntar dezenas de magos para fazer um feitiço que levaria anos sozinho.”
Olhos de águia a falcoa levantou uma sobrancelha. “Magos colocando feitiços em varinhas para outros usarem não me parece certo.”
“Pois não devia parecer. Além dos magos que fazem esses feitiços serem pagos se beneficiam com a troca.”
“Troca? Que troca?”
“A troca de feitiços.” Ele girou uma varinha e soltou fogos de artifício. “Um mago vende os feitiços prontos que ele conhece e usa as magias prontas que não conhece. Assim quem é especializado em magias de cura pode usar magias para plantas. De que adianta passar anos estudando um tipo de feitiço e não poder usar todos os outros?”
”Acho que ai faz sentido.” Ilha Bela concordou.
“E o mesmo vale para todas as pessoas. Não existe motivo algum para não comprarem um feitiço pronto que facilite suas vidas.”
Algumas pessoas na multidão comentaram sobre aquela afirmação.
“Magos vancianos se especializam em usar objetos carregados com feitiços prontos, sem se fatigarem. E qualquer um de vocês pode experimentar como é ser um mago vanciano com as varinhas de condão descartáveis e outros objetos encantados, aqui na barraca da Trupe do Pica-pau amarelo.”
O mago puxou uma lona que estava no chão e ela revelou uma grande barraca e se acomodou como o telhado. O mago continuou fazendo a demonstração de alguns produtos e pedindo voluntários. “Um pote que transforma leite azedo em iogurte. Um sabão que recupera a cor das suas velhas roupas desbotadas. Um shampoo que não arde nos olhos e ainda acaba com suas pontas duplas. Venham ter um pouco de mágica dentro das suas casas.”
Impressionada, a multidão bateu palmas e se levantou para ver os itens mágicos a venda e em pouco tempo metade dos itens já haviam sido levados. As duas vendedoras trabalhavam rapidamente para atender a todos.
Apenas Ilha bela não estava interessada.
“Algum problema?” O mago perguntou.
Ilha bela olhou as varinhas decepcionada. “Pensei que iria me ensinar alguma magia que as tanzeks se negaram a me ensinar.”
“As feiticeiras tanzeks são cheias de regras e tradições complicadas.” Ele colocou a mão no queixo.
“Feiticeiras tanzeks não é um pleonasmo?” Olho de águia perguntou.
“Eu diria que é mais uma especialização, como um soldado lanceiro.” Ele bateu palmas. “Não posso nem dizer que sei fazer magias tanzeks, pois é contra a lei um homem saber dessas coisas, mas dependendo do que for, posso te ensinar agora mesmo.”
“Uma coisa simples.” Ilha bela se aproximou e cruzou os braços. “Pode me ensinar a fazer um gira?”
“É só uma língua de fogo. Qualquer menininha consegue aprender.”
“Pode ser, mas ninguém quis me ensinar em minha tribo.” Ela deu de ombros. “Como eu tenho afinidade com vento acham um desperdício que eu aprenda um feitiço que ficará fraco.”
Ele mexeu no tipo de relógio de pulso e olhou para ela. “Em dez minutos você faz até um begirama.” Então esticou a mão. “Um tostão de bronze.”
“Achou que eu não teria?” Ela entregou.
“Tenho certeza que teria.” Ele fez uma rápida prestidigitação e fez a moeda desaparecer em sua mão. “De onde eu venho chamamos de míssil mágico.”
O mago a fez relaxar e explicou como controlar sua respiração, canalizar as ondas de fluxo e sentir a magia. Ele explicava melhor do que qualquer tanzek de sua tribo ou livro que tivesse lido. Ela canalizou o fluxo, sua agressividade e moldou o feitiço em sua mente e quando recitou o encantamento. “Gira!” A energia percorreu seu peito pelo braço e o tal míssil mágico de fogo apareceu e estourou em um muro de pedras a frente.
Ilha bela ficou ofegante e emocionada. As pessoas se levantaram interessadas nos produtos do Pica-pau Amarelo.
“Reparei no seu arco.” Ele falou para ela. “Você pode canalizar o gira através das flechas. Vão sair mais forte e ir muito mais longe.”
“Qualquer um pode fazer um gira fácil assim?”
“Não mesmo.” Ele riu e mostrou o relógio. “Eu vi que você tinha um talento natural para isso.”
“Como?”
“Ele deu uma girada com o braço e seu bracelete se abriu revelando ser um relógio, com muito mais funções.”
“Isso é um relógio?” Olho de águia se inclinou para ver.
“É um relógio, com uma bussola e um tricorder.” Elas olharam para uma lenta que mostrava vários ícones se movendo em volta das pessoas e coisas. “Uma das vantagens das engenhocas vancianas.”
“Como se interpretam esses símbolos e desenhos?”
“Levaria mais tempo para te explicar do que levou para fazer o gira.” Ele fez um movimento brusco com o braço e os mostradores se fecharam, voltando a ser uma pulseira. “Ele faz uma varredura de uma área e dá todo tipo de dado, principalmente a quantidade de magia e assim posso extrapolar seu potencial.”
“Mas isso é impressionante.” Ilha bela começou a olhar a barraca. “O que o mestre tem para vender? Varinhas de condão descartáveis?”
“As varinhas com dez e vinte feitiços, são dos artigos mais vendidos.” Ela começou a ler alto as plaquinhas indicando cada variedade de varinha. “Curar ferimentos leves. Limpar sujeira. Tirar manchas. Esterilizar alimentos. Controlar animais. Concertar rachaduras. Tirar dor de dente. Trocar fraldas. Recuperar cor de tecidos desbotados…”
“Algum problema, minha linda?” O mago perguntou.
“Eu nunca vi varinhas descartáveis com feitiços assim.” Ela respondeu frustrada. “Não têm varinhas de fogo dos céus, tempestade de gelo, força arcana instável ou encantar pessoas?”
“Esse tipo de varinha é para aventureiros.” O mago deu uma risada. “Os yrkerianos não usam feitiços domésticos? Estas varinhas são para pessoas normais usarem no dia a dia. Aqui! Parece uma caneta, mas é uma varinha mágica adaptada para analfabetos. Você pode ditar uma carta e ela escreve até dez mil palavras. O apagador mágico é vendido a parte.”
“Seu mago, não tem nada para aventureiros?”
“A maioria desse material tem sido enviado para o conflito com os Abadari do outro lado do país. E essas coisas nunca venderam bem mesmo.” Ele pegou uma varinha. “As varinhas para desatolar animais vendem mais do que todas as de ataque juntas. Não sei como tanto bicho fica atolado.”
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