Voltando ao assunto, Ilídia e Doze se teletransportam para uma dessas ruas da capital Alter. Contudo, para a surpresa e alívio dela, seu amigo não é mais uma criatura grande e peluda andando por aí em suas pernas finíssimas. Talvez o oráculo tivesse senso para perceber que um Treze não sairia despercebido. Logo, então, teria o transformado em uma espécie de cavalo – um pouco robusto e peludo demais, quase um búfalo. Chamativo ainda, porém melhor do que antes e obviamente mais baixo.
Os dois caminham pela rua, olhando em volta, tentando não parecer tão estrangeiro. A roupa dela e grandeza do animal que a acompanha, todavia, não ajuda muito.
- E agora, Doze... – diz baixinho, cavalgando sem sela no novo Treze. – Acho melhor descansarmos em algum lugar, deixar com que esqueçam de nós um pouco. Tenho certeza que meus pais vão vir nos procurar e tudo terá sido em vão se nos achar.
Quando vê a primeira placa escrito “Hospedaria”, encaminha-se até ele, desce de Doze e entra no estabelecimento.
Um tanto pobre para seus padrões e talvez um pouco sujo, mas perfeito para se esconder e passar algumas noites. Não reclamaria se, pelo menos, ali suprisse suas necessidades básicas. Um homem barbudo, jovem e enrolado em um cobertor, está sentado atrás do balcão. Pela cor de seu rosto e ponta do nariz, provavelmente está gripado.
A menina põe a mão no bolso lateral da bolsa e joga algum dinheiro no balcão.
- Bom dia... Eu gostaria de saber quantos dias esse dinheiro cobre.
Ele observa atentamente Ilídia, desconfiado.
- Três. – responde o barbudo, com dificuldade, por causa do seu nariz entupido. – Só assinar aqui. – coloca um livro todo rabiscado a frente dela, apontando para o final da página.
- É realmente necessário?
- Por quê, criança? Não deveria estar – um espirro – aqui?
As tossidas seguintes dele proporciona tempo para que Ilídia pensasse. É uma assinatura mágica, não tem como falsificar por muito tempo. Além do mais, é crime assinar um nome falso. Só teria um dia e meio até a magia se dissipar, o recepcionista perceber a fraude e acionar a guarda.
- Tudo bem.
Quando coloca a mão sobre o espaço indicado e conjura um feitiço - “Rose Cycon” aparece, brilhando uma luz cinza envolta. O barbudo olha atentamente de novo, no fundo dos olhos de Ilídia, como se não acreditasse no blefe. Mas, para o alívio dela, ele simplesmente fecha o livro e guarda embaixo do batente.
- Bom, segundo andar, porta A6. Os estábulos ficam atrás da casa, pode levar seu cavalo estranho pelo corredor lateral. Não servimos qualquer refeição... digo, servimos, mas não o bastante para satisfazer alguém completamente. – informa, entregando a chave para a menina. – Aconselho comer no restaurante aqui do lado. Muito melhor. Aliás, eu sou o dono de lá também.
- E Doze... meu cavalo, quem o alimenta?
- Dê seu jeito! – responde ríspido, voltando a sentar na cadeira e enrolar-se no cobertor. Após espirrar, volta a falar de novo. – Trabalho há anos aqui, sei quando tentam me ludibriar. Não me importo com o seu nome ou por que fez isso, contanto que me pague. Não vou cuidar de cavalo algum, a não ser que tenha dinheiro a mais nesse seu bolso furado. Dê o fora daqui em dois dias, no máximo. Sabe que magias de fraude assim fede, vou ter que denunciar logo.
Ilídia suspira de alívio.
- Não agradeça. Se eles vierem aqui, vou ser o primeiro a querer acertar as contas com você. Sendo uma criança ou não, negócios são negócios.
- Prometo que sairei em um dia e meio.
Antes que Ilídia subisse, ele acrescenta: - Só por garantia. Nada de trazer homens ou mulheres... acompanhantes em geral. Se for, irá pagar taxa extra e também limpará o quarto sozinha.
- O quê?! Não! Não pretendo... – e sai rapidamente, desistindo perante tamanha vergonha estampada em suas bochechas.
Depois de acomodar Doze no estábulo, Ilídia volta para dentro e sobe.
No segundo andar, as portas são identificadas por letras e números. O espaço é literalmente um cubículo, só há uma cama, armarinho e uma luz de centro. O banheiro fica no corredor do andar térreo. Sem muito o que fazer, tranca a porta e deita na cama. O sono já a chama, a viagem através do portal do “Poço das Almas” do líder da manada cansou ambos.
Antes que seus olhos fechassem, lembra de algo.
Sua família mencionou um lugar ou algo uma vez, localizado em Alter, no qual deveriam ir caso precisassem de mais poder. Estranhou no momento, mas decidiu ignorar na época. Com o nome claro em sua mente, considera perguntar ao recepcionista sobre onde ficava ou o que era exatamente. Essa é a sua primeira e única pista do que o oráculo queria que fizesse.
Talvez as coisas se resolvessem agora… não é?
Ok…
é claro que não.
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