Ainda se recuperando do incidente, Sebastian flagra Adam mais uma vez no meio da madrugada sentado na porta do vagão, os dois estavam se abrigando em uma antiga estação de trem, um lugar completamente isolado, destruído e congelado no tempo.
— Eu ainda não consigo acreditar — diz Adam prestes a chorar e tirando seus óculos. — Ele ainda está lá, nós deixamos ele para trás, isso não é justo.
— Aquele lugar continuar existindo, isso sim não é justo, você precisa superar isso logo Adam vem, vamos sair um pouco desse vagão, tem uma floresta aqui por perto a gente pode caminhar, e sei lá, esfriar um pouco a cabeça.
Adam impaciente responde:
— Como sempre você evitando esse assunto, ele ter ficado lá foi sua culpa, e não venha tentar me animar com um “caminhar para esfriar a cabeça” — Ele responde sarcasticamente. — Só, me deixa em paz.
Um climão silencioso permanece entre os dois por um longo tempo, até que Adam se levanta e sai do vagão, caminhando para os bancos velhos da estação, onde se encolhe e olha para o céu.
— Desculpa, é que eu realmente preciso de um momento sozinho, e eu sei que conversar sobre o que aconteceu ainda te assombra, mas isso não pode durar pra sempre.
Sebastian ainda permanece em silêncio, e sai para caminhar pela floresta.
A cada barulho que Sebastian escutava ele se escondia, o tempo todo olhando a sua volta, com medo de ser flagrado por alguém, era como andar em um campo minado.
—Não, não foi minha culpa, eu não sabia, eu só queria me proteger, nos proteger. —Sussurrava Sebastian para si mesmo repetidamente, enquanto caminha em uma longa trilha de vaga-lumes na úmida floresta.
A noite aparentemente estava calma, nada de viaturas nem notícias nos jornais, pois os dois estavam sem acesso à televisão, e nunca tiveram um celular para se informar de algo em tempo real. Eles estavam sendo o alvo principal da cidade toda, mas que de noite podiam ter seus devidos descansos.
— Tá tudo bem, tá tudo bem. — Repetia Sebastian, olhando para os vaga-lumes, para o chão e para as pegadas que seus sapatos faziam na areia,o tempo todo desconfiado de qualquer barulho vindo dos arbustos ou da avenida que estava distante, a cada passo ele começava ficar com uma falta de ar, seus passos foram ficando cada vez mais lentos, seu corpo cada vez mais pesado, até que ele se senta no chão, com os olhos cheios de lágrimas e uma expressão de angústia.
— Eu não queria, nada disso foi culpa minha. — Ele fala em voz alta, causando um pequeno eco aos arredores da floresta, ele continua no chão, tentando se recompor, e cada vez mais o sentimento de culpa o consumia enquanto ele limpava seu rosto com a manga do seu uniforme social já desgastado.
—O que não é culpa sua? —Grita uma voz não tão distante.
Sebastian imediatamente se levanta, e um frio toma conta de todo seu corpo o deixando paralisado.
Ele olha ao redor da floresta, e entre alguns arbustos a sua frente ele vê um jarro de vidro, cheio de vaga-lumes, uma mochila amarela do lado e alguns livros.
—Eu até faria a famosa pergunta “tem alguém aí?”, mas eu não sou burra, e também tenho certeza de que você está aí. —Diz a voz feminina mais uma vez.
Ainda com uma falta de ar, e agora com medo de quem possa ser, Sebastian grita de volta:
—O que você quer?
—Eu que te pergunto, o que você tá fazendo por aqui?
—Honestamente nem eu sei. —Ele responde com um tom deprimido.
—Acho que eu te conheço de algum lugar. —Responde a menina.
Automaticamente Sebastian corre, ele corre o mais rápido possível, pensando que alguém o reconheceu e está atrás dele, não deu tempo nem de identificar de onde veio a voz, muito menos de respondê-la.
Depois de tanto correr, e olhar para trás, ele finalmente volta para a estação, onde encontra Adam ainda encolhido no banco.
—Adam a gente precisa sair daqui agora!
—Por que? o que você fez dessa vez? — Ele responde se levantando o mais rápido possível.
—É meio rude deixar uma pessoa falando sozinha .
Lá estava ela, os encarando com o celular na mão, em silêncio absoluto. Enquanto os dois estavam completamente paralisados, aceitando o fato de daqui alguns minutos estariam no carro da polícia, ou algo do tipo.
A garota de moletom roxo e com um cabelo cacheado enorme,estava segurando o jarro de vidro com vaga-lumes que Sebastian havia visto.
—Já que ninguém toma iniciativa, Prazer Kiara, chegar aqui foi fácil, o cabeça raspada ali tava chorando aqui por perto e eu apenas segui ele, então não foi muito difícil, e por que vocês tão usando a mesma roupa? — Diz Kiara, vasculhando todo o vagão, enquanto olha para eles pelo vidro quebrado.
—Chorando? Sebastian tá tudo bem? — Adam pergunta.
—Eu to bem, não foi nada. — Ele desvia o olhar.
Então os três permanecem lá em silêncio.
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