***
Na noite de sexta-feira Luana terminou com Stevan por telefone. Segundo ela, a mesma estava cansada da família de Stevan se meter no relacionamento deles e que num momento de fragilidade ela conheceu um cara que lhe mostrou um ombro amigo e antes que pudesse perceber… estava apaixonada!
Por mais que doesse, ainda era uma dor suportável, desde que seu pai não ouvisse sobre o assunto, todavia o golpe final veio de seu primo, Víctor, que o ligou para dizer tudo o que os demais parentes do professor já diziam de sua ex-namorada pelas costas. E ao tentar argumentar a favor de sua ex, o presidente e orgulho da família disse que a “seduziu” em poucas horas e a única coisa que precisou foi dizer que era primo de Stevan e era o candidato mais provável a ficar com a fortuna da família.
Devastado Stevan saiu para beber, convidou alguns conhecidos e juntos, os cinco, após afogarem as mágoas do companheiro em uma boate, foram expulsos de três bares. E mesmo depois de se separar dos amigos, Stevan ainda se sentia machucado, embora tivesse consciência o suficiente para reconhecer que nenhum estabelecimento decente aceitaria sua presença, ele não estava pronto para encarar o apartamento cheio de memórias de Luana e que havia sido re-decorado por ela para que se parecesse mais com um apartamento de casal.
Stevan se sentia patético e sem rumo.
Com medo de causar algum acidente ele não dirigiu, mas nem por isso ele deixou de vagar a noite por onde quer que a claridade dos postes mandassem. No entanto, com o passar das horas, quando os primeiros raios de sol despontavam pela manhã, ele se dirigiu ao seu prédio, mas sem ter certeza de que entraria em casa. Por sorte o sono o atingiu em cheio enquanto esperava pelo elevador, assim ele poderia entrar em casa e dormir. Sem pensar ou sentir.
Era isso que o professor se lembrava ao ser acordado pelo barulho do liquidificador. Quem estava na casa dele?
Stevan tentou abrir os olhos, mas a luz do sol estava forte demais para alguém com ressaca. Na verdade ele achava que era forte demais para qualquer um.
Involuntariamente Stevan soltou gemido e pouco depois ouviu o som excruciante da cortina sendo arrastada. Ele ouviu uma respiração pesada de quem contém o riso. Com certo esforço ele abriu os olhos e não teve certeza do que enxergava, com mais força ainda, ele se sentou e percebeu que os móveis e, até mesmo, as cores da parede pareciam erradas. Enquanto tomava notas disso, um par de mãos femininas pôs um prato de sopa a sua frente. Quem? Luana? Ela ainda tinha a chave do apartamento, mas parecia pouco provável. Sem vontade para brincar de adivinhação ele seguiu as mãos para descobrir a identidade de sua dona e se surpreender ao se deparar com Lilian.
-Segundo Laura, é uma sopa que ajuda aliviar a ressaca. - disse a aluna deixando o prato e indo para a cozinha - Mas volta e meia ela aparece de ressaca no trabalho, então não sei se resolve.
-Nunca testou? - disse com um sorriso morto, lamentando o estado que a aluna o via.
-Não gosto de beber. - disse dando de ombros.
-Então sou sua cobaia?
-Algo do tipo. - disse ela voltando da cozinha com dois pedaços de pudim num prato e se sentando na poltrona ao lado com os pés em cima do estofado.
O professor estava se sentindo de mal humor, envergonhado e humilhado por isso relutou em aceitar o bom gesto da aluna, mas ao vê-la com o doce, sentiu seu estômago vazio e não havia dúvidas de que estava fraco, por isso se obrigou a comer.
-Me informaram que não tem um gosto bom. - disse a jovem ao ver a careta do mais velho após a primeira colherada.
-Podia ter avisado antes.
-E você não precisava dormir em frente ao elevador. - disse antes de terminar de devorar o primeiro pedaço da sobremesa, respondendo a pergunta que Stevan não queria fazer.
-Obrigado por isso…
-De nada. - a menina comeu uma colher do outro pedaço e continuou: - Um conselho: não encha a cara por quem te usou. Use sua energia para algo mais produtivo, como vingança.
-Como…?
-Você me contou algumas várias coisas e Giulia me disse para ter cuidado com você e sua ex, porque “quem escolhe aquele tipo de roupa não pode ser boa pessoa, tão pouco quem anda com ela”.
-Preconceituosa, não? - disse ao terminar a sopa - Sua amiga.
-Talvez, mas normalmente não. E não acho que ela julgaria um livro pela capa. As roupas dão a primeira impressão, mas a… rede de fofocas dela é impressionante. - uma leve mentira para justificar a suspeita por trás do assunto. - De qualquer jeito, não sei se deve seguir o meu conselho. Minha única experiência no ramo é ajudando a enfermeira que me passou a receita dessa sopa, mas quase nunca tem tempo para prepará-la…
-Sabe, eu tenho pensado nisso já faz um tempo, mas você deveria aproveitar melhor a vida.
-... - Lilian fez força para conter sua reação e simplesmente encará-lo - Eu já tive namorado se é o que está insinuando, só que o nosso término foi bem parecido com um acordo (ele tinha que se mudar, eu queria ficar e ele tinha medo do que poderia acontecer se eu o seguisse...), mas planejo me divertir mais a partir de agora. - disse com um sorriso ao terminar o outro pedaço da sobremesa.
Apesar da aluna manter a voz baixa, a cabeça de Stevan latejava ao menor ruído e tudo o que ele queria era dormir mais, nem que fosse por mais cinco minutos.
-O quão ruim é a sua visão de mim?
-Não é a pior pessoa que conheço, por quê?
-Se eu voltar a dormir, ela vai piorar?
-Não se preocupe com isso. Na verdade, você não deveria se preocupar tanto com o que os outros pensam de você.
-Hm… boa noite, então. - ele se deitou de costas para a estudante e voltou a dormir. Qualquer outro problema seria resolvido após alguns minutos de sono e se ele fosse atrapalhar os planos de Lilian, o professor suspeitava que a garota o acordaria.
Bem, ele estava errado, mas por sorte ela não tinha planos para o dia.
Comments (0)
See all