Pela segunda vez na semana, Lari acordou bem mais cedo do que o normal, mas dessa vez, cheia de energia. Por que ela se sentia tão ansiosa? Era só a menina que vendia um bolo maravilhoso. Cujo sonho ela tinha invadido. Pra fazer sexo com ela. Sentia uma certa culpa em relação a Lô, primeiro pela foto e depois pelo sonho. Estava fazendo muita coisa sem a permissão dela. Mas tinha outra coisa ali além da culpa, ela só não tinha um nome para isso ainda..
Ponderou se saía mais arrumada que o normal. Talvez afastar o cabelo desfiado para mostrar mais o rosto, usar um pouco de maquiagem ou vestir uma blusa mais decotada para valorizar os seios. Ela e Manuela eram bem idênticas fisicamente, então Lari tinha uma noção do quão sensual poderia ficar se tentasse. Depois de experimentar algumas coisas, decidiu manter o cabelo bagunçado e as blusas folgadas. A estética sensual era a praia da irmã, Lari se sentia bem mais à vontade com algo mais relaxado.
Tentou ao máximo prestar atenção na aula pois semiótica era um assunto que lhe interessava bastante, mas o professor desorganizado não ajudava a manter o seu já prejudicado foco. O que diria para Lô quando a encontrasse? Tentaria ficar com ela pra suprir sua necessidade? Pediria desculpas e seguiria seu caminho? Como faria um pedido de desculpas? Ela devia esquecer isso tudo. Talvez Manuela estivesse certa. Era mais fácil usar um pouco de glamour, apagar sua presença das memórias da moça e problema resolvido né? Mas ela nunca poderia apagar as próprias memórias e sabia que não esqueceria a garota do bolo tão facilmente.
Saiu da aula e caminhou até o pátio. Não teria aulas pela tarde mas também não tinha nenhum outro compromisso. Arranjou um banco desocupado para sentar e puxou a câmera. Quando já havia ficado entediada de fotografar o mesmo gato dorminhoco e os pombos que pousavam por perto para desafiar o perigo ela ouviu uma voz chamando seu nome.
- Lari! Te achei!
Lari ergueu os olhos da câmera e reconheceu de longe a moça acenando. Ela usava uma blusa amarela florida e leggings pretas, um ótimo look para se mesclar no departamento de ciências humanas da universidade.
- Oi, desculpa se te deixei esperando! Tinha um bocado de gente jogando futebol atrás daquele outro bloco então eu fiquei por lá pra vender meus bolos.
- Não precisa pedir desculpas, a gente não tinha marcado nem nada assim…
- Ah mas eu disse que te encontrava hoje, então pra mim já é um compromisso. - Disse enquanto abria sua caixinha de isopor. - Ó, guardei um bolo de brigadeiro e um de doce de leite, não sabia qual tu iria preferir.
- O de doce de leite tá ótimo pra mim.- Respondeu Lari, um pouco envergonhada com o entusiasmo da moça.
- Você tá ocupada agora? Tava fazendo o quê?
- Não, nada… só passando o tempo.
- Eu ainda tenho mais um bolo pra vender antes de encerrar o dia. Quer vir procurar um comprador comigo?
Lari queria negar. Lari queria muito negar. Mas aquele sorriso tinha um poder de convicção surpreendente. E também não é como se ela tivesse algo melhor pra fazer.
A moça falava bastante, o que era ótimo já que Lari queria falar o mínimo possível. Descobriu que Lô era apelido de Eloíse, que ela fazia um curso de confeitaria não muito longe dali e que estava juntando dinheiro para abrir um negócio. Logo encontraram um dono para o bolo de brigadeiro, sentaram numa calçada com o pretexto de descansar os pés e continuaram a conversa.
- E você? Eu falei tanto de mim e não perguntei nada sobre você, desculpa.
- Ah, imagina! - “Oh não” ela pensou.
- Você tem aula de quê aqui?
- Eu tô no curso de audiovisual. Quero trabalhar com direção ou algo do tipo, mas ainda não faço ideia de como entrar no mercado.
- Eu vi você com uma câmera quando eu cheguei, usa ela pra faculdade ou hobby?
- Os dois, um pouco mais de hobby… - Lari hesitou por um momento enquanto escolhia as palavras. - Inclusive eu tenho que te pedir desculpas.
- Ué, por quê?
- Alguns dias atrás eu tava tirando umas fotos pelo campus e acabei tirando uma foto sua sem permissão.
- Ah. - Lô não parecia nem um pouco chateada. Que mulher estranha. - Eu posso ver?
Lari puxou a câmera e navegou pela galeria digital até chegar na determinada foto.
- Eu adorei! - Disse Lô chegando um pouco mais perto pra olhar a foto. - Tu precisa me mandar ela! Eu vou usar de foto de perfil em todas as redes sociais.
- Então você não quer que eu apague?
- Claro que não, é uma ótima foto. Eu não tenho nenhuma foto onde eu tô com a expressão espontânea assim.
- Tudo bem, - respirou aliviada. - quer que eu te envie como?
- Aqui, me dá seu celular, eu vou adicionar meu contato. E você adiciona o seu aqui. - Disse enquanto entregava seu celular nas mão de Lari.
Trocaram números e devolveram seus respectivos celulares. Toda aquela cena era estranha para Lari. Como Lô podia ser tão amigável com alguém que tinha acabado de conhecer? E ela mesma estava à vontade com aquela companhia. Será que era assim que as pessoas extrovertidas se sentiam? Seu pensamento foi interrompido por Lô se levantando subitamente.
- Eu tenho que ir pegar meu ônibus logo se eu quiser evitar o trânsito do fim da tarde, você se incomoda se eu te mandar mensagem depois?
- N-não, sem problema. - Resposta errada, pensou Lari.
Para uma súcubo, ela era bastante influenciável.
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