Uma mulher alta de cabelos pretos encaracolados surgiu entre os arbustos.
- Líder Ellen. - falaram e abaixaram as armas, curvando-se.
- Grupo 9, atenção à avaliação. - as outras abriam caminho por onde ela passava analisando a situação - Fogueira, 6… Localização, 8… - ela preenchia um papel, sem expressão no rosto - Barulho, 3. - tornou a olha-las - Há muito o que melhorar. Foquem-se, isso não é apenas uma aula, mas também uma missão e avaliação… Mas não posso culpá-las por estarem ansiosas, ainda mais uma iniciante em um time incompleto. - então, abriu um pequeno sorriso - Posso ajudá-las?
O grupo se olhou, despreparado. Então, olharam para Alseri, que engoliu seco e falou:
- O que devemos esperar para as próximas semanas?
- Pelas nossas estimativas, considerando que eles vão enviar quem estava na reunião próxima do deserto, reforços dos monstros devem chegar em uma ou duas semanas. Então vamos mudar a estratégia de defesa para procurar ativamente por uma pedra astral. - respondeu Ellen.
- E se não acharmos? - indagou Alseri.
- Isso é confidencial.
- … Os monstros realmente vão nos ajudar? - Alseri continuou, em voz baixa.
- Se eles realmente estão em busca de paz, de um ponto de vista tático, é do interesse deles nos ajudar e mostrar boa fé. - então Ellen olhou para o céu, parcialmente escondido pelo topo das árvores e nuvens - Mas se você quer saber se eu, pessoalmente, acredito neles… - ela cruzou os braços e olhou para cada uma delas - Eu sou velha o suficiente para olhar para as lutas do passado e querer que isso seja verdade. E eu sou velha o suficiente para olhar para as lutas do passado e duvidar se elas vão acabar assim tão fácil.
- Por causa dos monstros? - Greneva perguntou dessa vez.
- Por causa de ambos. - Ellen corrigiu.
Um silêncio desconfortável começou a se estabelecer. Ellen começou a guardar as anotações e falar:
- Os monstros podem ter o foco agora no deserto, não na nossa região, mas agora outras cidades já sabem que pedimos ajuda deles e estão observando a situação para avaliar as intenções deles. Eu não posso dizer para vocês não se preocuparem, mas… Mesmo que não seja sincero, eles devem se sentir forçados a ajudar por agora.
- Observam, mas não nos aju—
- Obrigada pela informação, líder. - Alseri interrompeu Greneva e curvou-se, seguida das outras.
- Bom trabalho hoje. - virou-se e acenou em despedida com a mão, porém logo tornou a olhá-las - Ah. Meila e Greneva, vocês receberam uma carta de suas famílias. Vão recebê-las assim que terminarem essa rota. - acenou novamente.
Meila tornou-se pálida. Curvou-se, rígida e tensa, junto com Greneva, enquanto Ellen desaparecia em meio às árvores.
– Oh, ela foi legal com você. - Gwenny comentou para Greneva.
– Com o que?
- Ela obviamente fingiu não ouvir sua reclamação da realeza. Ela poderia ter te algemado imediatamente. - seu tom de voz estava entre um aviso e uma bronca - E você nem percebeu as indiretas? Bem, vamos continuar, - Alseri apagava o fogo - estamos quase lá.
O grupo completou a trilha sem surpresas e adentraram os portões da cidade, onde alguns poucos times já estavam esperando o retorno dos demais. Greneva ponderou sobre o que acontecera… Ela era aquele tipo de pessoa que não percebe atmosferas, não é mesmo? Ótimo, mais um defeito para arrumar.
Entregaram os mapas para um líder que já havia terminado sua rota e brevemente reportaram algumas observações. Tiveram então que esperar os times restantes voltarem e que se certificassem de que ninguém havia sido deixado para trás. Ao serem dispensados, Alseri ofereceu:
– Quer que eu te acompanhe ao correio?
– Obrigada, mas não precisa desviar o caminho, eu posso ir com a Meila. - Greneva disse.
– Eu acho que ela preferiria estar sozinha… - Alseri explicou, em um tom de voz mais baixo.
– Você tem razão. - disse, também diminuindo a voz, e olhou para Meila enquanto ela conversava com Gwenny a distância - Meila Mannah, huh? Ainda é um pouco incrível pensar que temos uma Mannah no nosso time.
– Ela não gostaria de ouvir isso. Mas tenho que concordar. - admitiu, também tornando a olhá-la.
Todos sabiam sobre os Mannah. Uma família de grandes magos importantes que sempre participavam de lutas contra os monstros em várias cidades e eram famosos principalmente pela alta taxa de sucesso em invadir as antigas torres formadas pelos monstros e derrubá-las. Seu símbolo era o Semaf, o cajado que Meila empunhava e que permitia que o seu dono, quando experiente o suficiente, pudesse usar as três magias naturais ao mesmo tempo. Aquele quem empunha o Semaf normalmente se torna o representante da família, mas… Há um longo tempo, a família perdeu o cajado em uma tentativa falha de derrubar uma torre em Icem. Não conseguiram recuperá-lo até a geração de Meila. Os detalhes a partir desse momento se tornam confusos e nada mais do que rumores, mas mesmo Meila carregando o Semaf não sabem se ela será a próxima representante da família ou não. Especulações sobre os motivos variam desde brigas internas até questionamentos sobre sua habilidade ou até se o Semaf atual é apenas um falso para salvar a família da irrelevância nos tempos atuais.
– É bastante pressão. - Greneva comentou.
– Nem me fale… - voltou a olhar para Greneva - Você quer que eu vá com você ou não?
– Eu— - Greneva percebeu que Meila saía, deixando Gwenny sozinha. Balançou a mão distraidamente para Alseri enquanto andava na direção da outra em um passo apertado - Não, vá para o nosso quarto mesmo. Eu preciso resolver alguns assuntos eu mesma. Obrigada.
– Hã? - Alseri tentou ver o que Greneva estava observando. - Ah, ok. Até mais, então. - retornou a despedida com a mão, mesmo percebendo que Greneva não veria.
Gwenny já havia terminado de arrumar seus itens e começaria a andar para os dormitórios quando ouviu um “espera!”. Virando-se na direção do som, viu Greneva aproximando-se.
– Ah, Ne, como’cê está? Precisa d’algo? - sorriu, prestativa.
– Oi, Gwenny. Sim, eu… - ela hesitou, começando a mexer em suas próprias mangas inquieta - Eu quero falar sobre… Bem…
– É sobre o seu irmão?
– Não, é sobre você. - ela viu Gwenny corar, e levantou as mãos defensivamente - Não, não desse jeito! É sobre, bem… - abaixou os braços e desviou o olhar - “Melhores amigas”? De onde veio isso?
– Alseri te diss’isso? - ela soltou uma risada envergonhada - Bem, eu ach’que estamos nos dando bem nos últimos meses.
– E a parte “de infância”?
– Hã? - ela também desviou o olhar - Alseri deve ter entendido errado, eu só diss’que nos conhecemos desd’a infância.
Greneva passou a olha-la novamente, braços cruzando. Alseri não era dessas. Gwenny então retornou o olhar, explicando:
– Respeito minh’amiga Alseri, mas conversa não é seu forte. E Meila tem seus próprios problemas. Eu pensei que’cê precisaria d’um ombro amigo, sabe?
– Por que a preocupação comigo?
– Você é parte da equipe. - disse, sorrindo.
– Não estou falando disso. Ou a equipe é motivo o suficiente?
– Não. - sua expressão tornou-se séria, sorriso sumido - Greneva, eu‘stava brava quando seu irmão me pediu para tomar conta de você.
– Ele pediu isso? - sentiu vergonha dominá-la.
– Sim. Eu tinha evitado pensar mal d’ocê por um bom tempo, até que alguém me disse p’ra eu me valorizar mais. E então seu irmão pediu aquilo esse ano. Mesmo sabendo’que aconteceu, eu só pude pensar “sério, aquela metida?”. - Greneva tentou falar algo, mas Gwenny continuou sem dar-lhe espaço - Ele disse que sabia qu’era um pedido egoísta, então eu disse apenas qu’tentaria. Mas aí eu vi você. E convivi com você. E’u vi que a dor te mudou.
– O que você quer dizer?
– Eu te perdôo. - disse, colocando uma mão sobre o ombro da outra e sorrindo calorosamente.
– O quê? - recuou um passo, tirando a mão de Gwenny de si - Sério? Eu não sinto que fiz nada para merecer isso. Droga, eu nem pedi desculpas! Eu devia ter falado desculpas primeiro! - sentiu algumas lágrimas brotando e tentou enxugá-la com as mãos antes que caíssem.
Não. Não. Não. Por que isso estava acontecendo de novo? Um perdão sem merecimento é pior do que nunca ser perdoada.
– Você pode sempre trabalhar p’ra merecer o próprio perdão. - Gwenny confortou-a.
Greneva deixou as palavras da outra ecoarem em sua mente por alguns momentos. E então concluiu, voz ainda trêmula:
– Você tem razão.
– Você devia ir antes que o correio feche. Quer qu’eu te acompanhe?
– Não, obrigada. E… - inspirou e exalou profundamente- Desculpe. E, se você precisar qualquer ajuda e não conseguir me achar, saiba que eu gosto de ficar na costa perto do colégio.
– Ess’é um bom primeiro passo. - disse, com uma voz mais aguda.
– Obri— Ei, você está me tratando como seus irmãozinhos?
– Hahah, você me pegou. É o único jeito qu’eu sei cuidar d’alguém! - se explicou.
– Eu não sou uma criança! - reclamou, rindo - Bem, até mais! - Greneva partiu para o correio, vendo Gwenny acenando em despedida atrás de si.
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