Vazio… O gentil som de um rio calmo entra em teus ouvidos e ecoa dentro do teu corpo oco. À distância, você pode escutar pássaros cantando com calor e felicidade, como se estivessem declaram seu amor um pelo outro. Você pode se espelhar levemente com os seus sentimentos, porém outra emoção, mais fria e triste, parece querer gritar mais alto dentro de você.
O som de asas batendo se aproxima e depois se torna mudo, te acordando um pouco mais e provocando os teus olhos a abrir. As macias nuvens são meros borrões no quase infinito laranja crepusculante céu, tal beleza te traz a mesma sensação de conforto que um sentiria sentando-se ao lado de uma lareira em uma noite fria de inverno.
Inesperadamente, um bando de pássaros voa brevemente pelo teu campo de visão, sendo depois seguidos pelo fraco som de algo batendo em um pedaço de metal. O som se repete outra vez, agora com um tom levemente irritante, uma nova repetição segue outra e mais outra e mais outra… A cada uma, o som torna-se mais desconfortável ao ponto de começar a espalhar uma dor aguda por todo o teu corpo, intensificando-se e, eventualmente, causando-te a erguer o teu tronco do chão de forma abrupta, espantando um corvo que parecia estar sobre o teu peito.
Sentado, você instintivamente começa a tatear a tua frente procurando por algo, apenas para ser quase que imediatamente parado por uma dor aguda no teu ombro direito. Olhando para baixo você vê um pedaço brilhante de metal preso nele, o qual causa uma dor insuportável no teu braço com até mesmo o mais cuidadoso dos movimentos. Bom senso contraindicaria a remoção sem o uso de equipamento médico, mas a tua mão esquerda age por vontade própria e envolve a parte do fragmento que está para fora da tua carne, primeiro puxando com gentileza e depois com mais força. Entretanto, o fragmento parece estar preso.
Respirando fundo, você o puxa com toda a tua força alcançando sucesso mas o doce gosto de vitória é rapidamente amargurado por uma dor que causa os teus pulmões a expelirem todo – e mais – ar que os ocupavam em um grito estrênuo, e então o teu corpo trava em agonia, começando a tremer brutalmente meras frações de segundo depois.
Ainda sentado mas agora também sentindo a cabeça leve, você observa o fragmento, – ou mais precisamente – a substância negra como petróleo escorrendo e acumulada em uma casca endurecida na parte que estava dentro do teu ombro. Você tenta entender o que é essa substância ou como ela veio parar dentro de você – junto com o fragmento de metal – mas imagens, flashbacks de terror e violência piscam perante os teus olhos, causando o teu coração a palpitar doentiamente e a você derrubar o maldito objeto enquanto arrastando-se para trás. Porém, antes que possa se sentir seguro novamente, rosnados e gritos horríveis começam a te rodear, exponencialmente tornando-se mais altos e numerosos a cada segundo. Você se levanta com notável dificuldade e logo começa a correr em direção à floresta sul da tua localização, tropeçando e caindo repentinamente.
Com árvores e moitas já ocultando por completo o rio e a clareira de onde veio, enquanto você é atacado pelos galhos em teu caminho vozes começam a chamar por um nome, entre os horríveis latidos e rosnados. Envolto pelo medo, você faz uma curva as cegas para a esquerda e – apenas – alguns metros depois tropeça e cai de cara em uma pequena estrada de cascalho. Você sente sangue escorrer pela tua face mas o desespero te levanta quase que imediatamente e força-te a continuar correndo enquanto as vozes ganham um certo nível de compreensão:
– Or-
O som de tiros ecoa de algum lugar próximo e obstrui as vozes, porém apenas por um curto momento:
– Or...
– Ori…
Conforme os tiros se aproximam cada vez mais, as vozes aumentam exponencialmente em resposta e, absolutamente abafando os gritos e rosnados que se distanciam, o nome pelo qual chamam trona-se explícito:
– Ori… Orion!… Orion?! ORION!
Com você já não conseguindo reconhecer o nome ou aguentar mais esta assombração, o teu pesadelo aproxima-se de um fim quando o chão sob os teus pés começa a tremer incrementalmente e um grito- Não, um rugido, um horrível rugido te provoca a olhar para o lado, momentos antes de ser atropelado por uma silhueta grande que – no impacto – te nocauteia imediatamente.
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