Você está em uma feira. Atrás de você há uma mesa cheia de comida e à tua esquerda um homem saboreando uma sobremesa – que parece estar muito deliciosa – ao mesmo tempo que segura um prato transbordando de comidas. De alguma forma, ele parece muito familiar, quase como se você o conhecesse a um bom tempo, porém não importa o quanto tente, a tua memória oferece nada exceto mais perguntas.
Olhando para o céu noturno tentando pensar, você distrai-se com as estrelas, com como elas quase formam imagens, mas de repente alguém pega o teu pulso e te puxa para entre a multidão dançando, uma mulher de cabelos longos e dourados e uma face de beleza inestimável e familiar sorri para você, tão cativante quanto a melodia tocada pelo quarteto de cordas. A música então passa para uma composição mais calma, romântica e vocês começam a dançar, a sua doçura te perplexa, causando o teu olhar a prender-se à ela, que notando isso, pergunta:
– O que foi?
– O-O que o que foi?
A tua resposta falta tanta inteligência quanto a tua expressão falta graça mas você finge que ela fez sentido. Provocando uma leve risada da dama:
– Haha, você está me olhando daquele jeito engraçado de novo.
– Ah! Desculpe-me… É que você está mui-.
Antes que possa terminar as tuas palavras, uma forte sensação de déjà-vu te acerta junto às imagens e sons se misturando em uma bagunça embaçada e cacofônica, que logo te provocam a acordar.
A confortante sensação de felicidade que te preenchia é agora trocada por uma gélida dor e, ao olhar para fora da janela, o céu cinzento te convida uma forte vontade de chorar.
– “… Por que estou tendo esses sonhos?”
– “Que-Quem são essas pessoas?”
– “As minhas memórias... Es-estão retornando…?”
Mais indagações inundam a tua mente, piorando uma dor de cabeça que você só nota ter agora. Com um ronco mais alto do que um trovão, o teu estômago te retorna à realidade e assim, você se levanta e ajeita as tuas roupas para logo seguir em direção ao salão. Lá, enquanto toma um assento do balcão, você cumprimenta a Thaís e o Jorge:
– Bom dia, bom dia.
– Bom dia!
Ambos respondem com uma notável felicidade – quase que suspeita quando vinda de alguém que acordou cedo – enquanto Thaís coloca à tua frente uma tigela de frutas, um pedaço de pão branco, um “pratinho” de carne, assim como um copo com cerveja. Ela depois pergunta:
– Dormiu bem?
Você apenas balança a cabeça em resposta, já tendo a tua boca muito cheia para falar. Imediatamente tomando um grande gole de cerveja, você depois pergunta ao notar que o Jorge limpa um rifle:
– Para que isso?
– Eu vou ajudar o Lord Édouard a procurar a fera hoje.
Ele responde sem o menor tom de hesitação em sua voz. Quase que imediatamente, as portas da frente da taverna abrem com a chegada do lord acompanhado por um garoto.
– Bonjour.
Ele diz de maneira tão indiferente, tão desinteressada que sugere ter dito apenas por educação. Após todos responderem e ao se aproximar, ele percebe a tua presença e te pergunta:
– Está melhor hoje, Orion?
Você apenas balança a tua cabeça, de novo tendo a tua boca cheia demais para falar. Ele depois procede a apresentar o garoto:
– Orion, este é o Sigmundo. Sigmundo, este é o Orion.
Cumprimentando o garoto, você nota que ele olha para sobre o teu ombro invés do teu rosto e notavelmente evita olhar para os teus olhos. Ele parece ter 17 anos, é magro e possui um sotaque ainda mais críptico do que todos os outros que você já ouviu desde acordar. Com ambos você e o Sigmundo não estendendo os cumprimentos para além de um mero “Prazer”, Lord Édouard procede:
– Eu, Jorge e ele vamos caçar hoje, deixarei a Thaís para te mostrar a vil-
– Não, não, não, não, não…
Thaís o interrompe de maneira que seria mal-educada se não fosse pelas expressões comicamente perplexas nas faces de todos – menos na do lord, que permanece indiferente –.
– Não pense que só porque sou uma mulher sirvo apenas pra cozinhar e cuidar dos outros. O Sigmundo pode mostrar a vila para o Orion, ele é muito jovem para caçar ainda.
Ela então cruza os seus braços olhando de forma séria para o lord, aguardando a sua resposta. Com uma sugestão – mas ainda não uma expressão – de surpresa no seus olhos, ele por vez, procede levemente curioso:
– Você já teve alguma experiência de caça ou com armas antes?
Com o fim das palavras do Lord Édouard, Jorge vira seu rosto para o lado quase se engasgando com uma risada que segura por respeito, enquanto a Thaís alcança para de baixo do balcão e depois coloca sobre ele um rifle de longo alcance – aparentemente de fabricação customizada/específica – e anuncia com orgulho:
– Em casa eu fui campeã nacional de tiro esportivo quatro vezes seguidas.
O lord Então olha para Jorge quase como se não acreditasse nas palavras da Thaís mas a sua – minuta, quase que imperceptível – surpresa indica que é mais como se questionasse por que não foi informado disto antes. Jorge fala, ainda recuperando-se da risada:
– Hehe... Meio que é difícil de discutir com ela quando ela se decide de alguma coisa, Milord…
– Nos encontramos em frente dos portões em cinco minutos, alors.
Mais uma vez, as suas palavras são tão indiferentes quanto a sua expressão, enquanto segue para fora sem pressa.
Sigmundo olha para todos como se estivesse confuso sobre o que fazer, causando Thaís a colocar o rifle de lado e o perguntar se já tomou café. Ele balança a sua cabeça vagarosamente de um lado para o outro, ainda com uma expressão de confusão na sua face. Thaís então procede a lavar as mãos e depois a preparar para ele o mesmo café da manhã que fez para você antes – menos a cerveja, é claro –.
Momentos depois, quando ela e o Jorge estão prestes a sair, um pedido é feito para você e o Sigmundo, que – por acaso – resulta no Jorge a apresentar uma expressão de como se tivesse entendido o porquê de algo que viu ou ouviu antes:
– A! Uma última coisinha... a Maebh concordou em ficar de olho na taverna até voltarmos, aí tudo bem se vocês a esperarem chegar? Ela já deve ta vindo.
Você e o Sigmundo concordam unanimemente e eles partem então, conversando entusiasmadamente.
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