A sala de reuniões não era tão luxuosa quanto as outras salas. Era um lugar simples, afinal ninguém reside no castelo há vinte e cinco anos; o castelo de Titânia foi esvaziado em 976, quando a revolta do proletariado matou o rei e diversos nobres da corte.
No fundo do sala retangular havia uma mesa com alguns papeis e um mapa mundi. A parte esquerda da retangular mesa continha quatro velas. Atrás do elegante móvel de madeira tinha uma bela cadeira acolchoada. No centro do salão ficava a mesa de reunião, não era muito grande, era uma mesa retangular mediana, contendo espaço para seis poltronas.
Eduardo estava sentado na poltrona que ficava de frente para a porta, de onde conseguia ver os dois soldados que protegiam a entrada. Estava com o cotovelo direito apoiado sobre a mesa, sua mão cobria a boca e parte do nariz, de modo que quando respirava sentia uma breve brisa bater em seus olhos. Sua mão esquerda tamborilava sobre o tampo da mesa. Não tinha um olhar fixo, seus olhos se moviam em todas as direções, sua respiração mostrava que sua paciência já havia acabado há um certo tempo.
– Estou cansado de esperar. – Disse o rei Milos, batendo a mão sobre a mesa. – Isso aqui é uma reunião ou um casamento, onde temos que esperar a noiva? Você? Não está cansada de esperar? – Perguntou o rei para Elis.
– Não me incomodo de esperar. – A rainha de Helênia respondeu calmamente.
– Sinto muito pela demora, mas só podemos iniciar nossa reunião assim que todos estiverem presentes. – Eduardo respirou fundo e apoiou sua mão esquerda na testa. Começou a olhar para o chão e balançar a cabeça negativamente.
– Já estamos aqui faz um bom tempo, se fosse no meu reino… – Milos foi interrompido.
– Mas não estamos em Azhard, ou será que estamos? – Magnólia entrou sem ser anunciada. A bela mulher de pele clara, cabelos ruivos e olhos azuis puxou uma poltrona bem ao lado de Eduardo, na parte direita da mesa.
Um jovem rechonchudo chegou na sala ofegante de tanto correr. Tinha vindo para anunciar a rainha consorte de Berila, mas ao ver que a mesma já estava sentada junto dos outros reis virou-se e foi embora. Elis sorriu disfarçadamente ao ver o triste semblante do rapaz gorducho.
– O que é isto? Uma festa infantil? – Resmungou Magnólia Fernanda Polat. – Só vejo crianças aqui.
Eduardo a olhou seriamente. “Essa vadia vai estragar tudo”, pensou.
– Com exceção de você, Eduardo! – Continuou. – Quem é você garota? De onde vem?
– Essa é Elis Helena Lykaios Baran. – Respondeu Eduardo, ao perceber que a jovem estava um pouco intimidada com a presença da rainha de seu país vizinho. – Ela é a nova rainha de Helênia.
– E como consegui tamanho cargo, bela dama?
– Meus pais foram mortos no massacre em Troi, majestade.
– Tenha dó. Majestade? Todos temos nessa sala possuem o mesmo cargo, querida. Não precisa me chamar de majestade. O massacre de Troi, isso ocorreu quando Polian tomou a cidade, estou certa?
– Isso mesmo. Eu não estava lá no dia do ocorrido, estava em Corínia, por isso sobrevivi.
Milos não tirava os olhos dos seios de Magnólia. Olhava-a fixamente, enquanto a rainha direcionava a palavra para Elis. Tentava disfarçar o olhar, mas era difícil para ele não imaginar o quão belo seria aquele corpo despido. O rei de Azhard só tinha quinze anos e não tinha esposa, sua mão dizia que ainda não era o momento para se casar, também não deixava o jovem se encontrar com meretrizes. Tudo o que o jovem rei tinha era sua imaginação e isso ele usava com muita frequência, ora para fugir da vida real e de seu dever como rei, ora para visualizar como era estar a sós com uma mulher.
– E você garoto? Não cansa de me olhar? Onde está Alexia, sua mãe? Não veio lhe acompanhar, ou você dispensou os serviços dela?
O jovem ficou desconcertado ao notar que durante todo o tempo estava sendo observado pela soberana de Berila. Tentou disfarçar o olhar, fingiu que não tinha entendido as perguntas que a bela ruiva havia feito.
– Como disse? – O rei de Azhard olhou para baixo.
– Ah, não finja que não me escutou, garoto. – Magnólia pôs a mão no queixo do rapaz e ergueu sua cabeça, direcionando o rosto de Milos para seus olhos azulados. – Perguntei onde está sua mãe, a rainha regente.
– Ordenei que ficasse na capital. – Disse baixinho. – Precisava de alguém de confiança no trono.
Magnólia soltou uma gargalhada. Elis virou o rosto para não notarem que estava compartilhando da risada da rainha consorte. Eduardo se levantou, cruzou as mãos nas costas e estufou o peito. A rainha ruiva, percebendo que foi longe demais com sua brincadeira, largou o rosto do menino, adotou uma postura seria, respirou fundo e esperou o belo rei Eduardo começar o monólogo.
Elis, que estava esparramada na cadeira, brincando com o belo pingente azul de seu colar prateado, adotou a mesma posição que Magnólia, exceto pelo exibicionismo dos seios, pois não tinha muito o que mostrar.
Milos ajeitou seu manto vermelho, sentou-se de maneira ereta e apoiou seu pé direito sobre a perna esquerda, cruzou os braços e estufou seu tórax magrelo.
– Como todos sabem estamos vivendo tempos difíceis. – Eduardo iniciou seu discurso. – Depois que Solaria se tornou um império e fechou as portas para o sistema de trocas, vivemos uma grande crise. Como se não bastasse Menetuf deu início ao seu plano de expansão. Dominou todo o lado leste do continente Éspio e as Ilhas Aurora. – O rei foi interrompido.
– Precisamos mesmo ouvir… – O rei Milos calou-se, diante do olhar severo de Magnólia.
– Para simplificar… – Eduardo puxou sua poltrona e sentou novamente. – precisamos nos unir para protejer nossos reinos.
– Acredito que esse seja o melhor a se fazer, – Magnólia brincava com o pingente dourado com uma pedra de rubi, da pequena tira de couro de sua manta. – mas devo lembra-lo de que meu país não está em guerra, com Polian, por isso não vejo motivos para me unir a essa aliança.
– O imperador invadiu terras a mais de seis mil milhas. Invadir Berila é uma questão de tempo. – Retrucou Milos.
– Tenho que concordar com as palavras de meu amigo. Temos que nos unir para vence-lo. Helênia e Azhard já tiveram cidades invadidas, é apenas uma questão de tempo para Menetuf nos massacrar por completo.
– Falando em união, onde está Alessandro? Acredito que o rei de Letos também deveria estar aqui.
– Alessandro não foi convidado. – De acordo com a geografia política de nosso novo mapa, Letos fica na outra face do mundo, portanto pertence ao Novo Mundo.
– Ora, Parte de Berila e Azhard também ficam na outra face do mundo, mas mesmo assim estamos aqui.
– Disse bem, Milos, parte. – Magnólia revirou os olhos. – Significa que a maior parte de nossas terras fica deste lado, além do mais, para Menetuf chegar a Letos precisará passar por todos nós.
– Creio que a questão aqui não seja geografia política, nem mesmo Letos. Diga, Eduardo, o que você tem em mente? Creio que tenha algo a nos oferecer.
– Menetuf pretende me atacar em duas frentes. Uma frota de navios virá de Aurora para atacar Antífes, a outra virá de Polian, para fortificar a atual tropa de Pontar. Meus generais tem ótimas técnicas de batalha, meus ferreiros produzem ótimas armas, todavia meu contingente não é suficiente para lutar em dois lados opostos. Minha intenção hoje é oferecer a vocês algo que lhes falta e eu lhes ofereço algo que vos falta.
– Por que deveria me unir a você, pacificador? Por acaso não ficou sabendo o que seu filho e sua feiticeira fizeram em minhas terras? Deveria me unir ao imperador, ao invés de me juntar a você. – Disse Milos de forma alterada.
– Vá em frente. Una-se a Menetuf. Pergunte aos reis Artropos, Thânatos, Truv'hel, Uruv'hel e Aurora com é servir a ele. – Falou Magnólia de modo que o jovem sentiu medo.
– Ele não pode. – Sussurrou Elis, ajeitando sua negra, curta e ondulada cabeleira.
– Verdade. Ele não pode. Estão todos mortos. Isso é a primeira coisa que ele faz quando chega a capital e isso será a primeira coisa que ele fará com você quando se unir a ele. Então se estiver disposto a tomar trinta facadas durante o sono, ou ter sua pequena cabecinha presa em uma estaca vá em frente, se não cale-se e deixe um rei e homem de verdade falar. – A rainha conserte deixou o jovem rei com o semblante enfurecido.
– Peço desculpas pelo ocorrido em sua cidade, Milos. Não era de meu conhecimento o que meu filho e minha fugitiva conselheira fizeram em suas terras. Tomo um pouco de água, Magnólia. Sirva-se também, Milos.
Eduardo estalou os dedos, um servo veio e entregou a todos uma taça de ouro, ornamentada com diferentes pedras preciosas, o outro servo, logo em seguida, veio com uma jarra e serviu a todos com água fresca.
– Digamos que eu aceite sua proposta, eu lhe daria homens e você me retribuiria com o que? – Perguntou Milos, após beber duas taças de água.
– Poderia se casar com minha filha, assim manteríamos uma aliança política duradoura. Teríamos ajuda mútua de armas, soldados, navios e poderíamos trocar diversos produtos, sem pagar taxas de alfandega, tarifas e impostos.
– Uma oferta tentadora, todavia terei de recusa-la. Não é nada pessoal, mas eu não gosto de mulheres de cor. – Milos foi bem rude em sua resposta.
Magnólia respirou fundo. "Esse moleque ainda não aprendeu o significado de casamento arranjado, nem os benefícios que isso trás.", pensou. "Se não tomar jeito não durará muito tempo no trono e nem desfrutará da companhia de mulheres.
– Sua proposta pode não interessar Milos, mas me deixou interessada. Berila tem poucas terras e pouco produzimos nela, saber que poderia contar com dois grandes reinos me oferecendo diversos tipos de produtos e armas é como música para os meus ouvidos. – Magnólia estava empolgada com o provável negócio que iria fechar. – Lis precisará de um marido para governar Berila, assim que meu marido partir. Poderia casa-la com Odilon, isso se ele não fosse um foragido, contudo fico satisfeita de casar Evylin, minha filha mais nova com Otis seu filho mais novo. Claro que isso ocorrerá quando ambos tiverem idade para isso, mas gostaria que o pequeno príncipe fosse levado para meu reino desde agora, para que aprenda tudo de nossa cultura, política e todos os assuntos que um rei adequado precisa saber para não falar besteiras em reuniões importantes.– A ruiva mulher lançou um olhar debochado para o jovem Milos.
Elis Helena riu disfarçadamente. Embora achasse o rapaz uma besta quadrada, sentia uma certa atração por sua beleza. Os olhos verdes e cabelos loiros de Milos pareciam hipnotiza-la, embora gostasse mais de jovens morenos.
– Como sempre você se mostra uma bela negociante. – Mentiu Eduardo, passando a mão em seus liso cabelo preto.
"Entregar meu futuro herdeiro nas mãos dessa degenerada.", pensou. " Fazer o que, se eu não o entrega-lo não terei um reino para ele governar."
– Considere nossa aliança feita, contudo Otis não está aqui, por isso peço que me de dois, três meses no máximo para que eu possa prepara-lo para esse viajem.
– Está bem. Elis, querida, está tão calada. Diga o que pretende oferecer e o que espera pedir. – Disse Magnólia gentilmente. – Sente-se aqui, princesa. – A rainha consorte apontou para a poltrona que estava na sua frente.
Elis se levantou delicadamente. Eduardo, mesmo sentado puxou com sutileza a cadeira para que a jovem pudesse sentar mais perto dos outros monarcas.
– O que pretende pedir, Elis? – Disse Eduardo, dando uma golada em sua água.
– Meus generais me informaram que falta material de guerra. Muitos de nossos soldados estão sem equipamento de defesa, carros de guerra, armas… materiais bélicos no geral. Se me fornecer todo o equipamento necessário, posso entregar a Sístia e a Antífes mil e quinhentos soldados de elite, dois mil soldados de infantaria, oitocentos arqueiros e setecentos arqueiros, além de lhe presentear com um navio repleto de especiarias, tecidos e tudo o que Helênia tem de melhor.
– Como pode oferecer soldados, se não tem armamentos? – Questionou Milos, gesticulando com a mão esquerda.
– Elis não precisa mandar os homens trajados, eu mesmo posso fazer isso, contanto que me mande os homens. – Retrucou Eduardo. – E você? Já decidiu o que pretende pedir e oferecer?
– Eu imagino o que posse oferecer a você, mas não faço ideia do que podes oferecer a mim? Meus conselheiros me disseram que Sístia e Antífes ainda devem aos bancos Azhardianos o empréstimo que fizeram para financiar a pacificação.
– Realmente tenho minhas dívidas com os bancos de Azhard, todavia se Menetuf invadir minhas terras não terei como sanar minhas obrigações financeiras.
– Quanto a minha oferta? – Perguntou Elis, ajeitando seu vestido branco com detalhes dourados.
Milos olhou disfarçadamente quando a jovem rainha de Helênia passou a mão sobre os seios. Magnólia percebeu o olhar de cobiça do jovem e o beliscou por debaixo da mesa. O soberano de Azhard deu um salto da poltrona, olhou para os lados e retomou a postura.
– Sua oferta está acertada, minha querida. – Falou Eduardo. – Em troca lhe darei todo o material necessário para suprir seus homens. Assim que encerramos essa conversa assinarei um documento, com ele você poderá solicitar material bélico sempre que precisar, no entanto complemento sua proposta. Aceito sua primeira oferenda, mas ao invés de me fornecer mantimentos e tecidos apenas uma vez, sugiro que façamos um acordo de livre troca, assim como fiz com Magnólia.
– De acordo! – A jovem não quis aplicar o truque de barganha, que seus mestres a ensinaram antes de viajar. Respondeu sem hesitar, primeiro porquê não fazia questão de negociar, era uma menina rápida em suas decisões, segundo porquê já não aguentava mais ficar enfurnada dentro daquela pequena sala.
– Não quero apressar as negociações – Disse Fernanda. – mas pretendo partir para Berila ainda essa noite. Milos, resolva-se.
– Você tem um reino muito grande, Eduardo. Um reino que não está sendo capaz de gerir.
– O que quer dizer, rapaz? – Eduardo adotou um ar de descontentamento.
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