— Sete vezes e contando — comentou Lucas, ao ver Gael ser derrotado novamente por Vinícius, coberto de areia da cabeça aos pés, como se tivesse sido empanado.
Gael já tinha atacado o guardião de Elysium sete vezes, mas em todas elas, acabava no chão, sem conseguir avançar na luta.
— Mas você não tinha dito que nasceu pronto, hein? — provocou Lucas, rindo, enquanto via Gael frustrado por não conseguir nem arranhar Lubu — O mestre nem está usando seus elementos contra você! Vamos, levante-se e tente de novo.
— Falar é fácil, ele não tem nenhuma abertura! — retrucou Gael, indignado, tentando encontrar algum ponto fraco, enquanto Lucas, mesmo provocando, buscava uma maneira de ajudá-lo.
— Quando estiver pronto, pode começar de novo — disse Vinícius, de braços cruzados, agora mais perto da água. Aquele era seu território, mas, mesmo assim, ele não precisou usar sua energia elemental para derrotar Gael.
Lucas se aproximou do garoto e tentou incentivá-lo:
— Há uns 5 mil anos, nos termos do seu mundo, Vinícius me escolheu para ser seu aprendiz.
Gael olhou para Lucas, chocado com a revelação:
— Você tem mais de 5 mil anos de idade?
— Isso é até tranquilo comparado à quantidade de anos que meu pai e minha mãe possuem. Para vocês, eles são chamados de deuses, mas como Vand explicou, eles são apenas bem-aventurados com a manipulação da energia elemental. Meus pais são Afrodite e Hefesto — Informou Lucas, dando mais um ponto para que Gael ficasse chocado, mas o garoto não podia perder a piada.
— Pelo jeito, você puxou toda a beleza do seu pai — Gael retrucou pela primeira vez as provocações que o aprendiz estava lhe dirigindo durante todo aquele treinamento.
Lucas se sentou na areia, enquanto Gael recuperava o fôlego deitado ainda no chão. Não conseguia mais movimentar o seu corpo, pelo menos não por agora.
— É, eu mereci isso — Riu Lucas pela primeira vez, agora que Gael havia retrucado suas provocações — Como dizem por aí, toda lenda tem um pouco de verdade, e sim, meu pai não é a pessoa mais bela que existe na face da terra, mas ele me criou muito bem. Já a minha mãe, sempre aturou a união dos dois como um castigo, já que foi forçada por Zeus a isso, pois ela causava muita confusão pelo reino por causa de sua beleza. Então já sabe como cresci, mas em uma seleção para aprendiz de guardião de Elysium, Vinícius mudou minha vida.
— Sinto muito por toda essa desgraça — Lamentou Gael sobre o passado de Lucas — Mas por que você está me contando isso?
— Como disse, minha vida mudou quando a seleção veio. De vários filhos e filhas de bem-aventurados, sejam eles bem-aventurados puros ou mesclados com seres humanos, eu fui o único que passei no teste — Lucas olhava para Vinicius quando falava aquilo. O garoto com cabelos alaranjados que aparentava ter a mesma idade dele olhava para o oceano como se aquele lugar pertencesse a ele — Eu consegui encostar um dedo na testa do meu mestre e fui aceito como seu discípulo. Aquele recusado pela mãe e com um pai muito complicado podia ter algo especial. Você também conseguirá achar uma abertura.
— E como você conseguiu? — Perguntou o garoto curioso sobre o que conseguiria com aquela informação.
— Como você falou, ele não tem pontos fracos, é você que precisa criar um. Eu vi você falando sobre alguns personagens, são os mangás e animes que alguns humanos acompanham, certo? Pense em uma forma como eles conseguiram derrotar seus adversários, veja se encontra um jeito nessas histórias que você acompanha.
Deitado na areia, com o som das ondas quebrando na beira da praia, Gael começou a pensar nos animes e mangás que já havia assistido e lido. Sua mente o levou de volta à época em que ele e seu amigo Luis Felippe tinham entre 12 e 13 anos. Lembrou-se de um dia em especial, quando Luis chegou à sua casa, empolgado para mostrar algo novo.
Naquela época, para eles, desenhos e animes eram a mesma coisa. Eles subiram juntos as escadas da casa de Gael, enquanto Luis falava animadamente sobre um anime chamado “Hunter X Hunter”. Ele descreveu a série como uma obra cheia de poderes complexos, com uma história envolvente e um simbolismo profundo sobre a amizade entre o protagonista e um personagem secundário.
O mais interessante para Silva era o apetrecho principal de Gon, o protagonista da obra, que carregava uma vara de pescar e sempre criava estratégias incríveis com ela. Se um garoto de 12 anos conseguia vencer seus inimigos com aquele objeto, ele conseguiria criar uma abertura na defesa de Vinicius também.
Gael sentou na areia e olhou para o guardião mais uma vez. Lubu estava na beira do mar apenas com água na altura do calcanhar. Ele havia traçado uma estratégia e dessa vez ele tinha convicção de que daria certo.
O garoto se colocou de pé, bateu a areia do corpo e se dirigiu até uma distância de 5 metros de Vinicius. Gael olhou para o guardião e falou:
— Você está pronto?
— Eu que pergunto se você está pronto, abusado! — Disse Vinícius em um tom humorado, mas com as águas do mar se agitando um pouco mais.
O guardião havia percebido que havia algo diferente em Gael e que aquela rodada não seria com as 7 anteriores:
— Existe um brilho diferente em seus olhos agora. Lucas deve ter falado algo para ele que lhe ajudou a criar uma estratégia, veremos o que será capaz de fazer agora!
Com Silva sendo derrubado sete vezes apenas com golpes físicos, ficou claro que ele não precisava se preocupar com ataques de média e longa distância. O perigo só viria se ele se aproximasse demais do guardião sem se proteger adequadamente. Vinícius havia decidido não usar seus elementos, pois isso tornaria a tarefa impossível para Gael. A estratégia estava definida; agora, era hora de colocá-la em prática.
O garoto abriu os braços e disse:
— Ignis! — Uma parede de fogo se levantou pela praia e fechou completamente a visão de Vinicius.
— Se você não tem um ponto fraco, eu criarei um!
Diferente da divisão de fogo que o garoto havia criado na sala onde os guardiões se reúnem, essa tinha uma encurvadura que pegava a margem da praia e, inclusive, queimando sobre a água, deixando Lubu cercado pelo elemento de Silva.
— Excelente ideia, Gael. Tentar tirar meu campo de visão — Disse Vinícius ainda com os braços cruzados entre o fogo e a água do mar — Mas o que será que você vai fazer? De qualquer lugar que você decidir sair, eu vou conseguir te ver.
E o guardião estava certo. A meia lua de fogo que Gael havia criado fez todos os pontos daquela parede ficarem de frente para Lubu. De qualquer lugar que o garoto fosse sair, ele conseguiria confrontá-lo. No mano a mano, o garoto ainda estava à anos-luz de ser alguém bom em combate.
— Vamos, será que vem a sua oitava derrota? Eu me lembro que você disse que nasceu pronto, será que esqueceu de como havia nascido? — Vinicius olhava a parede de fogo na sua frente buscando de onde Gael viria, tentando provocar o aprendiz de guardião.
Gael estava quieto e não respondia a nenhuma das provocações que Vinicius havia feito, o que havia aprendido nas primeiras vezes quando foi enviado diretamente para comer areia. Lubu olhava em todas as direções buscando de onde o ataque de Silva viria, e ele veio.
Vinícius ouviu o som de algo rompendo a barreira. Ao olhar para a esquerda, percebeu que não era Gael que vinha em sua direção, mas sim a espada do garoto, em uma parábola pelo ar. Lubu sorriu, entendendo a estratégia que Silva estava tentando usar.
— Ele usou a espada para encontrar a minha posição, foi uma sacada bem inteligente.
O guardião olhou a arma de Silva vindo na sua direção, mas ele só teria o trabalho de desviar dela em vez de defender o golpe, se defendesse, o garoto descobriria sua posição pelo lado de fora da barreira.
A lâmina negra brilhava com o reflexo do fogo, Vinicius apenas deu um passo para o lado, desviando da espada. Não daria essa colher de chá para que o garoto conseguisse saber sua localização. Ele criou aquela barreira, ele tinha que se virar para descobrir um modo de derrotá-lo, mas o que o guardião não imaginava era que cairia na armadilha que Gael havia criado do outro lado do muro de fogo.
Ao tomar a iniciativa de não defender o golpe com energia elemental, Vinícius deu tempo para que Gael atravessasse a barreira e avançasse em sua direção com velocidade extrema. A cada passo que o garoto dava na areia, a água que vinha do mar secava. Quando o guardião percebeu o que havia causado ao se mover para o lado, já era tarde; o protetor da Terra estava diante dele, como um leão diante de sua presa.
Silva esticou o braço, com os pés envoltos em chamas, o que lhe dava uma aparência imponente enquanto se preparava para acelerar em alta velocidade. Vinícius, ao perceber Gael voando em sua direção, reagiu instintivamente, lançando a força do mar contra o garoto. A água se ergueu como uma parede colossal, pronta para engolir tudo em seu caminho.
Antes que a onda o alcançasse, Gael conseguiu tocar de leve a testa de Lubu, mas foi imediatamente lançado para longe da praia pela força do mar. O poder do oceano reverberou ao redor, criando um cenário deslumbrante, com gotas d'água brilhando como diamantes suspensos no ar.
Gael foi lançado uns 10 metros de distância pela onda criada por Vinícius, voando pelo céu temporariamente até alcançar o fim da força da água. O garoto, então, pousou na areia, tossindo o líquido que havia entrado em seus pulmões.
Lubu correu em direção a Silva, preocupado com a besteira que havia feito por instinto. O cenário ao redor deles parecia ainda mais vivo, com o som das ondas se chocando contra a costa, criando uma trilha sonora épica para o confronto dos guardiões:
— Você está bem? — Exclamou Vinícius, espantado com a burrice que havia cometido.
Gael terminou de tossir a água que havia aspirado, e sua tosse se transformou em risada ao ver o feito que acabara de realizar. Seu coração transbordava de emoção, e um sorriso brilhante adornava seu rosto. Ele sabia que, mesmo diante dos desafios, estava crescendo e se tornando mais forte, pronto para enfrentar o que viesse pela frente.
— Sim — respondeu o garoto, deitando a cabeça na areia novamente. Mas dessa vez, com uma sensação de vitória no coração e um sorriso radiante no rosto, exclamou — Eu consegui!
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