É quase meia-noite quando Breno, Nando e Anderson voltam da pizzaria.
A noite está estrelada e com aquele clima fresco que vem com todo o verão, Breno não sabe explicar, mas parece muito com como se o ar tivesse ficado mais puro, talvez fosse só porque ele agora tinha tempo para analisar a qualidade da noite, diferente de quando ele está muito mais ocupado com escola e tudo mais.
Breno e seus pais entraram em casa e Nando e Anderson foram imediatamente dormir. Breno subiu para o quarto pouco tempo depois, abrindo a janela e olhando o horizonte da vizinhança até onde se deixava ser visto. Ou pelo menos, até onde se deixava ser visto com aquela árvore em frente à janela de Breno.
Breno não sabe o que o fez fazer aquilo, talvez fosse mais fácil pôr a culpa nas noites de verão, porque ele tirou o celular do bolso, desbloqueou e abriu sua conversa com Sol no WhatsApp rezando para ela estar online.
Breno: oi, sol.
Breno: espero não estar te atrapalhando...
Eram 15 para a meia-noite, era óbvio que ele estava atrapalhando, ou se não estava, iria atrapalhar porque o plano doido não saía de sua cabeça!
Para a surpresa de Breno, Sol o respondeu no mesmo minuto.
Sol: não não
Sol: não está atrapalhando...
Sol: aconteceu alguma coisa?
Breno: podemos conversar sobre ontem?
Sol: sobre nos beijarmos!
Sol: **????
Breno: tipo isso
Breno: eu espero que eu não tenha ultrapassado os limites?
Dessa vez, Sol demorou um pouco mais para responder. O que aquilo poderia significar?
Sol: ué
Sol: mas eu também quis.
Sol: você não ultrapassou limite nenhum.
Ok, agora. Ele tinha que fazer o plano agora antes que amarelasse. Mesmo que todos os seus instintos gritassem direções contrárias dentro de sua cabeça sobre a ideia maluca.
Breno: então...
Breno: eu tô com essa ideia estranha...
Breno: de te chamar para um sorvete.
Breno: você quer?
Sol: agora?
Sol: quase dando meia-noite?
Breno: péssimo horário?
Ok, era isso, ele só precisava saber se era real. Agora ele sabe que não é. Ele preferia ir dormir e sonhar com a imaginação de ele e Sol tomando sorvete e resolvendo as coisas enquanto ainda estavam frescas. Melhor que as coisas tenham se encerrado antes mesmo de começar para não dar trabalho depois.
Sol: me encontra na pracinha.
Sol: no início da rua.
Sol: eu vou despistar minhas mães e já estou indo.
Breno: ok, vou ficar esperando ;)
Atenção, atenção! O universo finalmente está dando uma chance para Breno acertar em sua vida amorosa pela primeira vez na vida! Finalmente! Ou ele deveria praguejar por isso? Criar laços ainda mais íntimos com Sol só o faria se ferrar ainda mais no futuro… Ou talvez ele não precise quebrar a cara.
Breno encara a mensagem por dois minutos completos antes de bloquear o celular e cair na cama com um sorriso no rosto. Ele não podia imaginar que estava acontecendo, na verdade, ele se sentia feliz e confuso com tudo isso, porque tudo o que ele conseguia pensar era que ele não deveria estar se sentindo assim só porque iria tomar um sorvete com Sol, mas isso não fazia seu sorriso diminuir. Ele decidiu esquecer a razão por um segundo para pensar se deveria pular pela janela e ir ao encontro de Sol ou pegar as chaves reservas de casa e sair pela porta da frente.
E da mesma forma sem sentido que seu coração batia, ele colocou as chaves reservas no bolso e saiu pela janela do quarto com a ajuda da árvore perto da sua janela. Breno Tavares-Silva era tão louco, romântico e apaixonado quanto o pai havia sido quando mais novo. Fato. Com a pequena diferença que Breno ainda guardava como um segredo revelado para poucos.
Sol chegou ao início da rua como havia combinado com Breno antes mesmo que ele pudesse chegar até lá. O sorriso dela era algo indecifrável e aquilo fez todo o interior do garoto se estremecer com força. Com muita força. O que estava acontecendo com ele?
― Atrasado, hm? – Sol debochou.
― Nunca. – ele rebateu divertido.
― Aposto que a sorveteria está fechada. – ela rebateu, o sorriso nunca deixando seus lábios. Breno via aquilo e tinha certeza de que estava do mesmo jeito, só o vento frio na noite mais quente e o sorriso machucando suas bochechas.
― Sempre temos um McDonald's 24 horas, certo?
― Garoto esperto.
E aquilo foi o suficiente para eles começarem a andar até a lanchonete, tinha um drive-thru no bairro, apenas algumas quadras de distância e, apesar de toda a questão do horário e violência, o bairro era um dos mais seguros de Lima Preta. Dificilmente algo ruim aconteceria. E se acontecesse, ele não morreria indigente, e muito menos infeliz.
O silêncio era confortável, mas mesmo assim Breno se pegou desejando algo para puxar assunto, e mesmo assim não conseguia pensar em nada.
Sol riu, a cabeça virada para baixo e afogando suas mãos ainda mais dentro do casaco fino feito para quebrar o vento mais frio que fazia de noite.
― O que foi? – Breno perguntou.
― Isso aqui está parecendo mais um daqueles filmes adolescentes, sabe? – ela se encolheu no casaco, mas os olhos focaram em Breno. Os dois ainda andando como se gravitassem um ao redor do outro. ― Escapadas no meio da noite, caminhadas sob o luar, beijos inesperados, festas, metas, aspirações... Tudo isso num verão brasileiro. Se fosse nos Estados Unidos, aposto que a Netflix faria uma adaptação.
― Não era você que estava com raiva da Netflix outro dia?
― Ela cancela muitos programas incríveis e retira vários mais legais ainda, o ódio por ela é quase impossível de não se ter... Mas às vezes ela faz algumas comédias românticas que eu gostaria de participar.
― Por exemplo? – Breno quis saber.
― Por exemplo, aqueles filmes de romance que giram em torno da dança, uma hora eles estão dançando e na outra estão se pegando loucamente, ou bem perto disso, mas fica toda aquela tensão e tem sempre um casal de idiotas que demora o filme inteiro pra ficar juntos.
Sol termina quase frustrada, completamente animada. Breno a admirava como se ela fosse uma estrela, seu estômago revirou quando o reflexo da luz bateu em seus olhos castanhos. Foi um aviso gigante de seu cérebro dizendo que ele estava oficialmente apaixonado por Sol novamente. E tudo por conta de um beijo e um laço de cumplicidade forte. Mas também era bem mais que isso, era sobre a história deles que vivia numa tensão monótona, meio chove-não-molha até Sol o beijar na festa.
Ele decide continuar agindo como se o cupido não o tivesse atingido.
― Eu já não estou entendendo mais nada. – e ri. ― Você quer viver um romance da Netflix ou produzir um novo show?
Sol estava um pouco mais à sua frente, ela tinha passos maiores para alguém que era menor do que Breno, quando ela foi até ele, o coração dele disparou, não sabia o que estava acontecendo, ela chegou tão próximo que era impossível não olhar dentro dos olhos castanhos escuros e sentir a respiração dela contra sua bochechas, os narizes à um micro centímetro de se tocarem.
Muito perto. Eles quis tentar falar. Mas ficou calado.
Ele fechou os olhos e Sol o presenteou com um selinho longo com final curto, porque mal ele sentia vontade de usar a língua e Sol já havia escapado.
― Viemos tomar sorvete, começa a andar, Brê. – ela disse rindo.
E Breno voltou a andar. O ar mais leve e romântico e cheio de mil borboletas metafóricas. Em algum momento, Breno se viu correndo atrás de Sol até o McDonald's, pedindo o sorvete de baunilha e pagando extra para colocarem calda em cima. Ele pagou o próprio sorvete e tentou pagar o de Sol, mas ela já havia pago quando ele não estava vendo.
Eles tentaram ficar sentados do lado de fora, enrolando por mais um tempo, mas sabiam que tinham que voltar para casa antes que o relógio batesse às duas da manhã. Nenhum dos dois conseguia descrever o momento, mas olhando do lado de fora, era como se fossem um casal, os dois se sentavam e interagiam muito perto, roubando pequenos pedaços do doce um do outro, rindo escandalosamente sem ter algum motivo aparente, e com aquele olhar por frestas, porque as bochechas estavam tão esticadas que dificultavam a visão total. Breno estava tão entregue e indefeso por causa de um estopim em forma de beijo que a visão de Sol era suficiente para ele.
Quando eles chegaram na rua do condomínio onde se encontraram mais cedo, Breno sentiu que fora uma boa madrugada, um bom passeio, um bom tudo, tudo dentro dele estava quente e borbulhante e ele gostava da sensação, Sol estava mais perto do que quando estiveram ali algumas horas atrás, todo o ambiente parecia em paz.
Breno puxou Sol pela cintura e a beijou, beijou calmo, tranquilo e cheio de desejo, cheio de sentimentos borbulhantes de certeza dentro de si. Mais uma noite de verão. Mais um amor que iria durar dentro de Breno mais do que um verão.
― Foi um bom passeio. – Breno disse.
― Foi um bom encontro. – Sol corrigiu rindo e continuando: ― Eu meio que já sabia que daria nisso, não podia perder a oportunidade, né? Se tiver tudo bem para você, claro.
Ela o beijou mais um pouco, nenhum dos dois queria dizer adeus, como quebrar aquela bolha se ela estava tão confortável? Como se despedir e voltar para casa para dormir os sonhos dos justos e apaixonados? E o melhor, os sonhos dos justos e apaixonados correspondidos.
Breno não soube responder nenhuma das dúvidas, ele só sabe que em algum ponto voltou para casa, a sensação nos lábios sendo a única prova de que era real, que tudo aquilo fora real. Todos os sentimentos e ações. E aí ele dormiu.
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