Existem dois tipos de pessoas no mundo, aquelas que amam comprar material escolar (Giovanna) e aqueles que preferem a morte do que ir comprar material escolar (euzinho). A tia Olívia pediu duas folgas naquela semana. O motivo? Comprar os materiais para o ano letivo.
Com certeza, eu era o mais básico de todos, um caderno e caneta já eram suficientes, mas os meus irmãos, ô gente complicada. Até que a lista da escola não era tão grande, só que a Giovanna e o Richard não cooperavam.
— Richard, não vamos comprar um grampeador para você colocar na mochila. — repreendi meu irmão, tomando o grampeador das mãos dele.
— Droga. - murmurou Richard, ficando emburrado.
— E, Giovanna. Você não vai levar esse bambolê. — falei para minha irmã que segurava um enorme bambolê que mudava de cor.
— Nessa escola nova não tem canto coral. Preciso focar em outra atividade e optei por ginástica rítmica. — disse Giovanna, como se fosse a coisa mais simples do universo.
— Claro. Optou. Sozinha. Esqueceu de mim e da titia? — questionei, dessa vez, tomando o bambolê das mãos dela que se assustou e retrucou.
— Com licença. Meu corpo, minhas regras!
A melhor coisa de fazer amigos, pelo menos, na visão da tia Olívia era ganhar o suporte de outros pais. A mãe da Letícia indicou para nós o melhor lugar de Manaus para comprar material escolar, o Centro da cidade. Chegamos cedo e tomamos café em uma daquelas vendas de produtos regionais. O clima logo começou a esquentar e o calor nos presenteou com sua presença.
O Centro de Manaus era um lugar peculiar, lembrava o Saara do Rio de Janeiro e a 25 de março de São Paulo. Apesar da multidão, os preços eram imbatíveis e faziam toda diferença. Ainda mais para a nossa situação monetária atual.
Quem não gostou nada das opções foi a Giovanna. Reclamou de todos os itens que a gente via nas lojas. "Cadê o brilho?", "Onde está o Rosa?" e "Não tem caderno da Black Pink?". Já o Richard, só queria brinquedinhos novos e roubou o gato do dono de uma das lojas. Sim, minha vida é uma luta sem fim.
Depois de muitas horas batendo perna no Centro de Manaus, metade delas por causa da Giovanna, a gente conseguiu comprar tudo o que era necessário. Até que foi mais barato do que pensei, a titia nem precisou mexer na nossa poupança.
Enquanto batíamos cabeça com os materiais da escola, a Letícia tentava decorar texto para o teste de um comercial de sabão em pó. Ela era esforçada, porém, não conseguia memorizar uma linha. As outras meninas fizeram o papel de maneira perfeita, isso despertou o lado competitivo da minha amiga. Finalmente, uma produtora a chamou para a sala do teste. Haviam dois homens com cara de poucos amigos.
— Boa tarde. — desejou Letícia, animada, entrando na sala.
— Pode começar. — pediu um homem gordinho usando uma blusa do Aerosmith.
— Bem. - Letícia pegou o sabão em pó das mãos de uma produtora. — Sabão em Pó... - ela não conseguia lembrar a fala e teve um acesso de riso.
— Tem alguma coisa engraçada? — perguntou o segundo homem, que parecia um pouco confuso.
— Desculpa. É que o texto é bem engraçado, né?! Sabão em Pó, Natirux, o cheiro da Amazônia. — soltou Letícia, tentando não perder a pose.
— E onde tá engraçado?— questionou o homem gordinho tirando o óculos de grau.
— A Amazônia cheira a mato, né? Qual sabão em pó vai querer deixar a roupa com cheiro de mata?! — Letícia explicou para eles rindo.
— Você acha que estamos brincando aqui? — quis saber a produtora que entregou o sabão para Letícia.
— Não, senhora. Claro que não. — tentando ficar em uma postura melhor e escorregando no chão.
Os dois homens se olharam e começaram a rir. De acordo com eles, o teste de Letícia foi o mais divertido do dia. Eles prometeram que entrariam em contato, pois, Letícia possuía o perfil de algumas propagandas e, com certeza, seria chamada para algum trabalho.
***
Para aproveitar os últimos dias de férias, a Ramona decidiu fazer uma festa do pijama. Ela mandou no grupo uma arte muito bonita com a nossa foto e a frase: Festa do Pijama da Ramona. Pensei que não seria nada mal dormir de novo com o Zedu, já que na primeira vez, tive que respeitar a dor do meu amigo.
Respondi a mensagem com dificuldade com um emoji de coração azul. Foi muito difícil levar todas as compras para o carro, nem sei como, mas conseguimos.
Compramos o almoço no caminho, não tínhamos forças para fazer nada. Apesar do cansaço, a rotina com os meus amigos me fez ficar um pouco ansioso para o início das aulas. Afinal, não gostava de ficar tanto tempo em casa, ainda mais sendo babá de dois pestinhas. Sei lá, o sentimento é confuso, infelizmente, a alegria acabava nos primeiros dias.
Após o almoço, capotei na minha cama. Ela é tão confortável, parece o abraço de um amigo, quente e macio. De repente, tenho um pesadelo com a escola nova. Estou sendo perseguido por um grupo de adolescente. Corro para a cantina e me escondo na dispensa.
— Vem, Yuri! Se esconde com a gente! — gritou um saco gigante de batata frita.
— Eles querem me matar. — informei para o saco de batata, como fosse a coisa mais normal do mundo.
— Acho que podemos nos esconder no frigorifico. — sugeriu um pacote de biscoito enorme.
Sim. Tenho pesadelos com humanos e comidas, não me julguem. Não é algo que posso controlar, ok. A tia Olívia abriu a porta do quarto e me viu dormindo tranquilamente. De uma forma delicada, ela senta na cama e toca no meu ombro.
— Querido. Acorde. Preciso conversar com você.
— Me ajuda, batata. — acordei assustado e olhei para a titia. — Tia, o que houve? — perguntei disfarçando.
— Que batata? — ela quis saber.
— Batata? Ninguém disse batata. — falei soltando um riso abafado e tentando mudar de assunto. — A senhora deseja algo?
— Enfim. — tia Olívia soltou, enquanto arruava os óculos de grau. — Uma das redes da empresa no interior precisa de uma inspeção e o chefe vai me enviar. Quer saber a melhor parte?!
— Quero. — disse limpando a baba do meu rosto.
— Vou ganhar R$ 600 por dia. — ela informou mais animada que o normal.
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