Resumo da ópera. Quatro dias de viagem e o Yuri de babá. Nada de novo na minha vida. De repente, lembrei da festa do pijama e perguntei se poderíamos realizar o evento em casa. A tia Olívia demorou, mas no fim, acabou topando. Só passou um sermão de 20 minutos sobre responsabilidade.
Ótimo. Tudo o que eu precisava era ser babá dos meus irmãos por quatro dias. Se bem que eu, praticamente, já fazia o serviço. A minha tia deixou tudo encaminhado e deu dinheiro para aguentar os dias que ela ficaria fora. Ela preparou uma pequena mala e partiu para a cidade de Parintins, a terra dos bois bumbás, ou algo do tipo.
Anunciei para os meus amigos o novo endereço da festa. A Ramona acabou topando também, ela disse que nunca tinha dormido na casa de um amigo, só da Letícia. Expliquei para os meus irmãos as regras da casa, gostava de atazanar eles de vez em quando. Contei também sobre a festa do pijama.
— Festa do pijama? Pareço ter que idade? — ela perguntou, sentando no sofá e cruzando as pernas.
— 12. — respondi de forma seca.
— Eu sou tão incompreendida.
— E você? — questionei para o Richard passando a mão no cabelo dele. - Vai querer brincar com furadeira? Martelo? Serra elétrica?!
— Olha lá fora. — pediu meu irmão com um riso estampado no rosto.
— O que tú já aprontou? — eu quis saber indo até à porta da sala e abrindo.
Um gato com um rato amarrado na calda entrou correndo para dentro de casa. Não preciso nem dizer que odeio ratos, quase desmaiei quando vi aquilo. Fiquei desesperado, Giovana pulou pro sofá quando viu o rato. Ficamos os dois gritando, enquanto isso, o Richard ria e tentava pegar os bichos.
— Faz alguma coisa! — pedi, desesperado, para Giovanna.
— Claro. Vou fazer... Socorro!!!! — gritou a minha irmã.
Subi no sofá e liguei para a primeira pessoal que apareceu nos meus contatos, o Zedu. Não demorou muito e o José Eduardo chegou, como um príncipe de armadura para salvar duas princesas. Quando ele nos viu em cima do sofá não aguentou e riu. Fiquei puto, porém, quando lembrei do rato deixei ele zoar com a minha cara.
Ainda incrédulo, Zedu perguntou do Richard como ele fez tal arte. Confesso, que apesar de arteiro, o meu irmão é inteligente demais. Ele viu em um artigo científico que os gatos sentem medo dos ratos e queria provar essa teoria. Eles começaram a bolar um plano para resgatar e separar os animais.
Depois de muita confusão, eles conseguiram capturar o gato, enquanto Zedu segurava o bichano, o Richard libertou o ratinho. O coitado do Zedu ficou todo arranhado. Meu irmão foi devolver o rato no quintal e Giovanna estava horrorizada demais para sair do quarto. Peguei um kit de primeiros socorros no banheiro para limpar as feridas de guerra do Zedu.
— Desculpa. Olha o que aconteceu. — falei pegando o braço do Zedu que estava todo arranhado.
— Por algumas pessoas vale a pena lutar. — ele disse sorrindo.
— Tá, vou passar o álcool. Vai doer. — avisei colocando um pouco de álcool no algodão e aplicando no braço do Zedu.
— Aí. — ele reclamou, mas sem perder a pose.
— Desculpa... doeu? — perguntei erguendo o braço dele até perto da minha boca e assoprando, igual minha mãe fazia comigo.
Nossos olhos se conectaram. Eu sentia um carinho muito grande pelo José Eduardo, maior até do que meus sentimentos pelo Léo (desgraçado). Soprei várias vezes e, por causa da posição, os nossos olhos se encontraram. O Richard voltou para a sala e acabou com o clima. 2x0, moleque.
— Estou brincando. — disse Zedu rindo.
— Bobo. Não me assusta assim. — falei passando mercúrio nos arranhões. — Ah, obrigado. Sei que você deve tá me achando um maricas por ter medo de rato, mas...
— Ei. Para com isso. Você é meu amigo. Nunca te deixaria na mão. E outra, não uso tal palavra, caro, Yuri.
Sério. Faltou muito pouco para eu não beijar a boca do Zedu. Ainda bem que o Richard apareceu. Não imagino qual seria a reação do Zedu se eu tivesse essa coragem. Depois que o susto passou, a gente relembrou da situação com o gato e começamos a rir. Claro, que deixei o meu irmão de castigo.
***
A tia Olívia levou apenas alguns minutos para chegar em Parintins. Logo que pisou no pequeno aeroporto da cidade encontrou o motorista da empresa. Ele a levou para o hotel que ficava perto de um grande rio. Ela ficou impressionada com as cores tão vibrantes do local.
Ao fazer o check-in, ela se surpreendeu mais ainda ao encontrar Carlos no saguão. O estagiário explicou que a coordenação ofereceu a oportunidade para ele viajar também. Eles subiram para o corredor e os quartos deles ficavam um de frente para o outro.
— Amanhã temos uma reunião na empresa, deixa eu ver. — falou Carlos olhando o celular. — Depois do café, então é bom levantar cedo. E no sábado vamos fazer uma visita em um dos fornecedores.
— Claro. Vou pro quarto. Estou precisando tomar um banho. — Titia disse ainda chocada ao ver Carlos no hotel.
— Se quiser podemos dar uma volta pela cidade. Aluguei uma moto.
— Sim. Adoraria. Quero ver como é a noite em Parintins. — Até depois.
Lá em casa deixei tudo pronto para a festa do pijama. Claro, que não era "a festa" que a Giovanna esperava, entretanto, ela gostou de interagir com as minhas amigas. O Richard ficou de castigo no quarto, mas tenho certeza, que ouvi barulho de martelo no quarto dele.
A gente assistiu filmes, jogou 'Just Dance', quer dizer, os meninos jogaram, eu apenas assisti. Antes da meia noite, resolvemos fazer brigadeiro. Comecei a preparar com o Zedu e a turma ficou jogando Mario.
— Escuta. Somos amigos, né? — perguntou do Zedu, enquanto, me passava os ingredientes do brigadeiro.
— Claro. Vocês são meus primeiros amigos na verdade. — confessei sem fazer contato visual com ele.
— Sério, e no Rio?
— As pessoas podem ser muito maldosas quando elas querem, principalmente, os jovens. Sempre fui motivo de chacota entre meus colegas de aula. Ninguém se aproximava de mim, por que quando meus pais morreram eu tive um colapso nervoso na frente de todos da escola. Duas vezes. Fizeram da minha vida um inferno. — pela primeira vez, contava essa história para outra pessoa que não fosse meu terapeuta.
—Você não merecia passar por isso, Yuri. Você é o cara mais bacana que existe.
— Eu me acostumei. Ou a gente, tipo, se acostuma ou pode fazer alguma besteira. — tentei usar bem as palavras para não assustar o Zedu.
— Por exemplo, o quê?
— Me matar. Eu não podia. Fiz tratamento no Rio. E tive que lutar por causa dos meus irmãos. Eu sou tudo o que eles tem. — falei para o Zedu, enquanto, misturava os ingredientes do brigadeiro.
— Olha. Você não deve se importar com o que as pessoas falam de você. Eu queria te perguntar uma coisa e acho que isso tem haver.
— O que tem haver? - ele quis saber.
— O Leonardo, irmão da Letícia, é um escroto. Ele por acaso mexeu com você? Naquele dia na piscina, vi ele saindo da sala que você estava. Fiquei preocupado. Não gosto dele.
De repente, uma tristeza tomou conta do meu coração. Comecei a tremer e o Zedu percebeu. Congelei por um tempo, o suficiente para o brigadeiro quase queimar. O Zedu veio por trás de mim, segurou minha mão e continuou a mexer o brigado. A gente ficou assim por um tempo.
O corpo dele estava colado ao meu. Naquele momento, tudo parecia tão certo. Eu gostava do Zedu, de verdade, mas a questão de sua namorada da escola ainda martelava na minha cabeça. Acabei desligando o fogo e me afastando do meu crush.
— Zedu. O Léo não fez nada. Não se preocupa. Obrigado por ser um bom amigo. — agradeci pegando a panela e colocando o brigadeiro em um prato. — Ah, pega cinco colheres. — pedi.
***
Em Parintins, a minha tia encontrou com Carlos no saguão do Hotel. Eles foram à um restaurante japonês. À noite que não foi tão planejada saiu melhor que a encomenda. Naquele lugar tão exótico, os dois puderam se conhecer mais. Ela descobriu que antes de fazer o curso de Direito, Carlos era motorista de aplicativo e, por isso, precisou trancar a faculdade várias vezes.
Depois de muitos saquês, eles pegaram um triciclo, famoso meio de transporte em Parintins. Afinal, eles não queriam furar às leis para chegarem ao hotel.
— Ei. Obrigado pela noite. — agradeceu Carlos abrindo a porta do quarto e esperando a tia Olívia entrar.
— Eu que agradeço. — entrando.
Os dois entraram em seus quartos, mas não demorou muito e eles voltaram para o corredor. Se olharam, aproximaram, começaram a se beijar. Um beijo quente e apaixonado. Todo o desejo acumulado nos últimos meses acabou transbordando. Eles escolheram o quarto do Carlos para fechar à noite.
***
Em Manaus, a Giovanna deu um tutorial de como fazer creme para pele usando metade de um abacate e iogurte natural. Minhas amigas pareciam animadas com as dicas.
— Gente, quero dormir, mas antes vou experimentar essa máscara. — anunciou Ramona levantando. — Vamos, Lê?
— Boa noite, meninos. — disse Letícia levantando.
— Tchau, rapazes. Boa noite. — desejou Ramona saindo junto com Letícia e Giovanna.
O Zedu e Brutus eram tão heteronormativos. Sério. Nunca pensei em ter tanta química com pessoas assim. Acho que o único detalhe que eles não sabiam da minha vida era o fato de eu ser gay, porém, aquilo não era importante, pelo menos, naquele momento. Ficamos até tarde conversando sobre o crush de Brutus na Ramona. E, também, sobre o relacionamento do Zedu com a tal de Alicia, que não conhecia, mas já detestava.
— Yuri, já se despede do Zedu. Quando ele voltar para a coleira da Alicia...
— Cala boca, babaca. — falou Zedu, jogando uma almofada na direção de Brutus. Esse ano sinto que vai ser diferente. Vamos ver o que a vida me reserva.
— Que misterioso. — brincou Brutus, jogando a almofada de volta.
— Né? — soltei um pouco decepcionado.
Naquela noite não consegui dormir. Continuava pensando no Leo. Sim, ele foi um escroto comigo, só que era muito bonito e curtia gordos, então, ficava imaginando como seria nossas vidas junto. E, perto de mim, lindo e adormecido, estava o Zedu. Olhar para ele era como ver um sorvete de morango com calda de chocolate. O Zedu já era comprometido e, claro, eu não tinha a menor chance.
No dia seguinte, a Tia Olivia acordou com uma forte dor de cabeça. Ela levantou e foi até o banheiro, retornou e deitou na cama. A minha tia sentiu alguma coisa ao seu lado, ela ergueu o cobertor e encontrou Carlos, pelado, deitado ao seu lado.
— Merda. — soltou ela, tentando achar suas roupas no meio da bagunça.
— Demorou, hein. — disse Carlos de olhos fechados e se cobrindo com o cobertor. — Pensei que ia embora na primeira vez que levantou.
Um grande erro. A minha tia queria se jogar em um buraco. Ela lembrava de tudo o que aconteceu na noite anterior, entretanto, continuava achando que era um erro. Carlos tentou apaziguar a situação, pois, querendo ou não, eles ainda eram chefe e subordinado.
***
Eu acordei e não queria levantar. O ar-condicionado é tão lindo, nem parece que do outro lado da janela fazia 30 graus. Olhei para os meninos e eles estavam dormindo, um por cima do outro. Aproveitei para tirar uma foto, afinal, teria que ter provas contra eles, caso um dia precise. Juntei coragem e fui tomar banho.
Desci e preparei um café caprichado. Acordei 7h, ou seja, tive tempo de preparar pratos deliciosos, incluindo, panquecas no estilo americano. Comprei na internet, uma dessas máquinas que faz panquecas. A primeira que apareceu na cozinha foi a Letícia, coberta pela máscara da Giovanna.
Aos poucos, os meus amigos foram descendo. O único que continuava dormindo era Zedu. Eles ficaram impressionados com meus dotes culinários. O Richard chegou correndo e mostrou uma aranha gigante para as meninas, no susto, a Ramona derrubou um copo de suco em cima de mim.
— Droga. — soltou Ramona se desculpando em seguida.
— Eita, que bagunça. — disse Letícia se afastando.
— Tudo bem, Ramona. Richard, devolve a aranha para o local que você pegou. Mais dois dias de castigo. — repreendi o traste, antes de sair da cozinha.
Subi o mais rápido que pude, tirei a blusa e entrei no banheiro. Ele estava lá. Ele estava pelado. E, eu fiquei o encarando durante 10 segundos que pareceram cinco horas. O Zedu era perfeito, Deus havia colocado ele na fila da beleza e repetiu a dose umas três vezes. Não sabia para onde olhar. 10 segundos é pouco tempo. Peitoral perfeito, abdômen maravilhoso, uma virilha linda e poucos pelos no corpo, a maioria se concentrava nas pernas.
— Yuri! — ele gritou se cobrindo com a toalha.
— Desculpa. Eu... Eu... — tentava falar, mas não encontrava as palavras corretas.
— Eu sei que a casa é sua, mas você poderia, tipo, sair do banheiro, por favor. — ele pediu desesperado.
— Claro. — saindo do banheiro, fechando a porta e escorando na parede. — Merda!!!
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