Eu não consigo dormir. Não com o Adam do outro lado do corredor. Cacilda, a gente se beijou. E não foi um beijo fofo e calmo. Foi a experiência mais louca da minha existência gay. Ele me pressionou contra a parede. Os nossos pênis eretos pareciam lutar para conseguir espaço. Loucura!
Agora, cá estou eu. Igual um idiota. Estou suando em um frio de rachar o bico. E se eu der uma espiadinha nele? Caso contrário, não vou conseguir dormir.
Reúno a coragem necessária para sair. Coloco a mão na maçaneta e abro a porta. Eu quase desmaio quando vejo o Adam parado na frente do meu quarto. Ele está usando uma camisa de manga comprida cinza e uma calça de flanela. A minha única reação é puxá-lo para dentro.
Um beijo é inevitável. A boca do Adam é macia e saborosa. Eu não tenho muitas experiências com beijos, mas ele sabe beijar. As minhas pernas começam a fraquejar e o abraço. De uma maneira bruta, o Adam me carrega para cama. Somos uma bagunça silenciosa, uma vez que o papai deve estar dormindo no quarto.
A pegada do Adam é forte e consistente. Ele não me deixa respirar, mas eu não me importo. Quero aproveitar tudo o que ele pode oferecer. Os caras que ficaram comigo, sempre evitavam os beijos. "Não é coisa de hétero", eles diziam. Nas mãos deles, eu era apenas um brinquedo. Eu estou cansado deste sentimento de impotência. Eu mereço mais. Mereço muito mais.
— Isso! — eu solto, quando o Adam beija o meu pescoço.
— Você está gostando? — ele questiona, entre um beijo e outro.
— Sim. Você tem uma boca deliciosa. — digo.
— Eu não tenho noção do que estou fazendo. — confessa Adam, que solta uma risada deliciosa.
— Nem eu. É difícil ter caras iguais a gente. — eu me arrependo de dizer isso e espero o Adam surtar.
— Verdade. — Adam confirma dando uma risada nervosa. — Eu fiquei com medo de você me rejeitar. Acho que não sou muito bom com sentimentos. — a confissão dele me faz rir. — O que foi?
— Você é a pessoa mais séria que eu conheço. Fiquei até surpreso que você sabe rir. — disse, tocando no rosto do Adam que fecha os olhos. — Você é lindo.
— Você é muito mais. — ele afirma, o que me deixa muito feliz.
Adormecemos juntos na minha cama, mas, pela manhã, não há traços do Adam. Ele já levantou e está fazendo o café da manhã. Eu me aproximo, um pouco preocupado, afinal, não sei o que se passa na cabeça dele. Finjo que estou arrumando algumas louças. O meu coração parece uma artilharia de guerra, batendo em um compasso frenético.
O Adam anda na minha direção, mas para atrás de mim e me beija no pescoço. O meu corpo todo estremece com a energia do beijo.
— Ah, não se preocupe, o seu pai não está aqui. Ele saiu mais cedo. Vamos tomar café? — ele pergunta deixando a chaleira sobre a mesa.
— Entendi. — solto, quase como uma respiração. — E eu compreendo se você quiser ficar longe e...
— Ei. — Adam para de maneira engraçada e coloca a mão na cintura. — Está tudo bem. Eu estou gostando de te roubar beijos. — ele assumiu.
Ok. Não vou surtar. O Adam é de boa quanto ao nosso envolvimento. Porém, eu ainda prefiro deixar as coisas no sigilo. Só eu sei o que sofro com os preconceituosos deste lugar. Após o café, seguimos para o banheiro. No trajeto, vamos conversando sobre aleatoriedades e o Adam conta algumas coisas que lembra.
Será que o Adam é um espião? Isso explicaria a maneira como ele luta. Ao lado dele, eu me sinto seguro, como se nada pudesse me atingir. Só que por outro lado, o fato dele ser um espião pode pegar mal na comunidade. Espero que não seja o caso.
Chegamos ao banheiro e tomamos banhos, mas, evitamos beijos e carícias. O Adam é um cara reservado, diferente de mim. Ele é o tipo observador e vai comendo pelas beiradas. Por duas vezes, tentei saber qual pedido que o papai fez na noite passada. Sabe o que o Adam respondeu? Nada.
Infelizmente, não posso acompanhar o Adam em sua primeira caçada. Na verdade, ele vai explorar a região com o meu pai. Eles partem com dois cavalos, até pensei em separar a Luna para o Adam, mas o Coronel poderia ser contra. Achei melhor evitar o estresse.
O dia passou sem mais problemas. Trabalhei na limpeza da cozinha e do estábulo. Parei para almoçar e continuei o meu trabalho normalmente. Que dia mais chato. Eu estava com saudades do Adam. Eu devo estar muito louco das ideias, não é? Sentir falta de uma pessoa que é estranha para mim.
Pego todos os meus pertences e volto para casa. Espero todos os outros irem tomar banho e jantar, então, vou ao banheiro para fazer a minha higiene. Em seguida, explico para as mulheres responsáveis pela cozinha que o Coronel está em missão e elas me dão uma panela com sopa de legumes.
Estou inquieto, porque a noite cai e o clima esfria. Será que os dois estão voltando? Eu deito na cama e penso nos beijos do Adam. Como um homem tão bruto pode ser tão passional? Ele tem uma pegada que me arrepia e desarma. Adormeço, mas sou acordado abruptamente com alguém deitando na minha cama. É o Adam. Eu não digo nada, apenas o abraço e faço carinho nele.
— Você está muito cansado? — pergunto, o acariciando.
— Hum rum. — ele murmura se aninhando no meu peito com uma respiração pesada.
A minha relação com o Adam só melhorou nas semanas seguintes. A gente acabou criando uma cumplicidade que nunca tive com outra pessoa. Claro, que os burburinhos iniciaram e pensei que iam incomodar o Adam, porém, ele é o tipo de cara que não dá a mínima para a opinião alheia.
Era a minha vez de caçar. Fui para o estábulo preparar a Luna. Ela é uma égua dócil e prestativa, até parece que entende os meus comandos. Dou água e ração. De repente, o Adam aparece com uma mochila e uma escopeta. Eu levo alguns minutos para compreender, mas, aparentemente, ele pediu permissão do meu pai para caçar comigo.
É normal ficar animado? O Adam escolhe um cavalo marrom e partimos pela estrada principal. Vou contando todos os segredos e armadilhas que escondemos nos últimos anos. O objetivo é conseguir seis coelhos e seis preas. Fácil. Após duas horas, chegamos no limite da região. Achamos um prédio para deixarmos os cavalos. Pego um balde de água e deixo próximo a eles.
Perco o Adam de vista. Ele chama por mim, em cima de um prédio antigo. Como ele subiu? Jesus. Não demora muito e consigo achar um caminho para o telhado. Não sou a pessoa mais indicada para subir em lugares altos, mas desafio os meus limites. Chego arfando na parte superior do prédio e uso um binóculo para analisar a área.
Alguns prédios vazios e detonados por bombas. A natureza, como sempre implacável, tomou conta das ruas e avenidas. O edifício ao lado parece ter sobrevivido ao abandono e continua de pé. O Adam sai correndo e pula sem dificuldades para o outro lado. Sério?
— Você é louco?! — grito, olhando para baixo.
— Vem, Cris. — ele me chama, como se pular mais de 3 metros fosse algo fácil. — Eu não consigo.
— Claro que consegue. Você tem o tipo físico ideal para o salto. Confia em mim? — Adam pergunta do outro lado.
— Sim? — questiono de maneira engraçada.
Eu não acredito. O Adam me dá algumas dicas de como cair do outro lado. "Rolando", ele explica me mostrando a forma como se cai. Ele é um profissional. Ok. Não deve ser tão difícil, não é? Respiro fundo. Tomo uma distância segura e corro. Na ponta da laje, eu dou um impulso com o pé direito e salto. Eu acho que vai dar ruim, entretanto, aterrizo de maneira tranquila.
Olho incrédulo para o Adam, que me abraça e beija meu pescoço. Ele decide me dar uma aula de parkour, uma espécie de modalidade esportiva. A aula demora horas. Paramos um tempo para almoçar, trouxemos frutas e verduras cozidas. Dou um pedaço de banana na boca de Adam. Ele pode não parecer, mas é o tipo de pessoa que gosta de ser paparicado.
— Onde você aprendeu esses movimentos? — perguntei, enquanto como um punhado de milho.
— Não sei. — ele confessa. — Mas, é algo natural. Tem algumas coisas que são instintivas. Eu me sinto em casa quando saio pulando e me pendurando por aí. — explica, coçando a cabeça.
— Eu quero aprender. — afirmo animado, deixando um milho escapar da minha boca.
— Fofo. — diz Adam, pegando o milho e comendo.
— Verifica por ali. — alguém fala.
Nos olhamos e vamos rastejando até a beira do telhado para verificar. São dois homens utilizando um fardamento diferenciado. Em um movimento ligeiro, o Adam pega a mochila e corre em direção a parte de trás do edifício. Ele desce de uma maneira extraordinária. Respiro fundo e o imito, só que sem a mesma habilidade.
Vamos nos esgueirando pelos cantos, com o objetivo de ouvir a conversa entre os dois homens. Infelizmente, eles conversam sobre uma missão suicida. Será que foram esses homens que invadiram a vila com uma bomba?
Percebo uma mudança no comportamento do Adam. Ele está suando mais que o normal e age como se estivesse em transe. Os meus joelhos estão ardendo, não costumo ser tão atlético assim. Os dois homens ouvem os relinchos dos cavalos. Os seguimos. Somos como sombras.
Os homens acham a Luna e o seu parceiro. O meu coração está acelerado. Eles decidem sacrificar os animais, antes que eu pudesse pensar, o Adam pula em cima dos homens e os ataca. O primeiro, que possui um cavanhaque estranho, leva um soco no nariz. O outro, o mais novinho, é jogado no chão e tenho certeza que o Adam quebrou o braço dele.
Só que o cara de cavanhaque se recupera e pula em cima de Adam. Os cavalos ficam agitados e o macho dá um coice em Adam. Estou abaixado. Tremendo de medo. O homem pega uma faca e parte para cima do Adam. Estou desesperado. Preciso fazer alguma coisa.
— Luna, avante! — gritei, chamando a atenção do homem, que leva um coice certeiro da Luna.
Irado, o Adam levanta do chão e quebra o pescoço dele. Vai na direção do segundo e faz a mesma coisa. Eu fico ali, olhando. Tenho certeza que a minha expressão é de pânico.
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