Elliot só teve coragem de abrir novamente os olhos muitos segundos depois, quando recuperou os sentidos e percebeu o vento batendo em seu rosto. Já não era mais tudo tão bonito quanto algum tempo atrás. As árvores pareciam normais e escuras, sombras assustadoras tomaram o lugar das encantadoras criaturas brilhantes que fizeram companhia à sua falta de senso momentânea. Somente quando se realizou de que a paisagem passava rápido à sua volta foi que reparou estar sendo carregado. Ao olhar para cima e perceber os olhos amarelos, seu coração disparou novamente.
Mas, dessa vez, foi de alívio.
Com um sorriso fraco, observou o lobisomem carregá-lo rapidamente para longe da área demarcada pelo Fio Vermelho. Pouco tempo depois ele estava no chão, os pés pouco firmes na terra coberta por folhas que caíam das grandes árvores. À sua frente, outro lobisomem, dessa vez um pouco menor, consolando Peter.
A questão é a seguinte: os lobisomens, em época de lua cheia, são os melhores amigos do homem. Como os gnomos (conhecidos como anjos da guarda da Floresta) são pequenos demais para ajudar em determinadas situações, costumam pedir auxílio aos lobisomens. E dessa vez não foi diferente.
Quando Elliot foi cuidadosamente colocado no chão, Peter se virou e o abraçou com força, antes de deixar um tapa na parte de trás de sua cabeça, indignado.
— Pelo amor dos Deuses, Elliot, no que você tava pensando?
— Eu... Não estava pensando.
— É, claramente! O que você foi fazer lá?
— Eu não tava conseguindo dormir, aí levantei e pensei em tirar mais algumas fotos... Fui andando e, quando vi, tava caído nos braços de um vampiro.
— VOCÊ O QUÊ?
— Isso mesmo que você escutou…
— Agora a gente ta fodido mesmo, a gente precisa voltar AGORA! Vamos. — segurou com força o pulso de Elliot e o puxou.
— Espera! — ele parou no lugar, forçando Peter a parar também, então se virou. — Obrigado por nos ajudarem. — os dois lobisomens deram um aceno de cabeça, como que dizendo "de nada". — Quais os nomes de vocês?
— Pode me chamar de Kahn — o menor respondeu.
— Meu nome é Ronion — o outro completou.
Os dois garotos agradeceram, se despediram e tomaram rumo ao acampamento novamente.
Quando chegaram, faltavam poucas horas para o amanhecer, ou seja, tinham pouquíssimo tempo para voltarem para a barraca e se ajeitarem antes que as pessoas começassem, uma a uma, a acordar.
— Eu não entendo... Não ficamos tanto tempo lá dentro. Não foram mais que duas horas!
— Depois a gente conversa sobre isso, Peter, se o professor descobrir isso a gente não sai vivo.
Elliot estava extremamente agoniado com aquilo tudo. Não queria demonstrar, mas estava confuso e com medo. Confuso sobre como chegara lá, como fora salvo por um vampiro e saiu vivo, como voltara para o acampamento tantas horas depois do momento em que saíra. Frustrado por ter perguntas demais e respostas de menos, virou-se para o outro lado no saco de dormir e fechou os olhos.
Embora tanto esforço, nenhum dos dois conseguiu voltar a dormir. Já estavam mais que acordados quando o professor chamou todes ês alunes para o café da manhã e foram os primeiros a sair.
— Olha só, dessa vez não tive que te chamar três vezes para você acordar, não é, Elliot? — Peter forçou uma risadinha do comentário do professor e os dois se sentaram na grama.
Depois de comerem, todes voltaram à Floresta para continuarem suas pesquisas. Enquanto ês outres tiravam fotos e exploravam, os dois melhores amigos foram atrás dos lobisomens que os salvaram poucas horas antes. Precisavam de ajuda, e sabiam que eles conseguiriam sanar suas dúvidas.
— Há quanto tempo estamos andando?
— Quase quarenta minutos. — Elliot respondeu, olhando o relógio.
— Será que eles estão por aqu-
— Espera. — o garoto interrompeu, ficando em alerta. — Eu ouvi um barulho…
— Deve ter sido só algum pássar-
Um vulto escuro cruzou seu caminho alguns metros a frente. Os dois paralisaram, tomados pelo medo.
— Peter…
— Eu não se-
O vulto voou para cima de Elliot.
#
Quando voltaram a abrir os olhos, estavam sentados na grama macia de uma parte mais aberta da Floresta, onde era possível observar o céu. Mas o céu estava... mais escuro. Elliot olhou o relógio mais uma vez.
— CINCO DA TARDE? — indagou, abismado.
— SHHH! — Peter ordenou, preocupado.
— Relaxem, aqui vocês estão a salvo — uma terceira voz declarou.
— AAAAAAAAAAH!
Os dois se entreolharam, e então entraram em desespero. Não viam uma terceira pessoa — ou criatura — ali.
Até que uma figura muito, muito alta saiu de trás de uma árvore.
— Quem... O q-que... É você...?
— Ah, fala sério. Nós já passamos por essa tour.
A silhueta saiu da sombra, tornando-se visível. Os dois suspiraram em tremendo alívio. A figura diminuiu praticamente metade de sua altura, e agora eram duas.
— Ronion, Kahn, precisavam mesmo nos assustar assim? — Peter questionou, frustrado.
— Ah, qual é, foi engraçado. — Ronion comentou quando Kahn desceu de seus ombros, enquanto este apenas ria, abraçando a cintura do maior.
— Não foi! — Elliot estava quase revoltado.
— Ok, ok. Perdão. Não vamos mais fazer isso. Mas vocês deveriam nos agradecer! Salvamos suas vidas duas vezes em menos de vinte e quatro horas!
— Então... Aquele vulto…
— Sim, Elliot, aquele vulto era Gael.
— Eu sobrevivi a ele duas vezes? — seus olhos brilhavam, mas ele não sabia se era de desespero ou alegria.
— Sim, mas você conhece o ditado. É possível enganar a morte duas vezes, mas na terceira…
— Sim. E acho bom vocês saírem daqui logo e voltarem para o acampamento, já está escurecendo. — Kahn completou.
— Espera. Nós saímos do acampamento antes das dez da manhã e andamos por somente quarenta minutos, agora já são cinco da tarde. Ontem nós ficamos muito menos tempo do que disseram que ficamos, fora a madrugada de hoje, em que não ficamos aqui por tanto tempo assim. A gente precisa entender isso. — Elliot pediu com um semblante muito sério, não condizente com seu jeito sempre brincalhão.
— Meninos, meninos... Nós temos algumas coisas muito importantes para explicar a vocês. — os dois lobisomens disseram juntos, observando em silêncio a lua Iki tornar a surgir no céu limpo.
Comments (0)
See all