A maior lua, Iki, brilhava alta e solitária no céu e Elliot ainda não havia conseguido pregar os olhos. Sentia a adrenalina percorrer suas veias, e seus batimentos aceleravam a cada vez que fechava suas pálpebras. No escuro total do pensamento, a única coisa visível aos olhos fechados de Elliot eram os olhos vermelhos de Gael encarando sua alma. Sentia-se vigiado mesmo que dentro de sua barraca. Sentia que algo aconteceria se continuasse ali. E uma voz dentro de si o dizia que não era algo bom.
Foi necessário algum tempo para que o garoto encontrasse toda a coragem necessária para sair mais uma vez do conforto abrigo e obedecer à voz que o chamava.
Dessa vez, já agasalhado e ainda extremamente assustado, deixou a câmera dentro da mala. Sentia que seria melhor não arriscar mais do que sabia que não deveria.
Com um suspiro profundo de olhos fechados, esfregou as palmas uma contra a outra na tentativa de se aquecer um pouco, e foi. Sem olhar para cima, apenas deixou suas pernas o levarem de forma automática de volta à árvore que abrigava os tão bonitos, mas igualmente perigosos fungos elípticos.
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Lá estava Elliot novamente: no centro da Floresta, encarando o Fio Vermelho. A lua já não estava mais cheia, então Ronion e Kahn não estariam ali para ajudá-lo caso se metesse em problemas. Mas algo dentro de si dizia ser seguro prosseguir. Uma pequena voz o pedia para ultrapassar mais uma vez a linha proibida, e dessa vez não era a mesma voz que o guiara junto do seu melhor amigo a um buraco cheio de mini aranhas voadoras.
Sentindo que algo forte o chamava, ultrapassou mais uma vez o Fio, e viu a Floresta escura e assustadora a sua volta ser magicamente substituída pelas árvores alegres e cheias de Criaturas magníficas e brilhantes que vira na vez anterior. Igualmente encantado com a preciosidade do local, andou devagar para apreciar tudo, se deixando levar. Com o maior sorriso do mundo, seguiu um bichinho que parecia um fofo coelho, porém de pelagem azul-turquesa e tamanho de um cachorro de médio porte, que o hipnotizou com seus pulinhos e piruetas.
Maravilhado como estava com o bonito animal, não foi capaz de perceber uma rápida movimentação atrás de si. Só notou algo diferente quando a saltitante bola de pelos azul disparou a se esconder em meio a um arbusto.
Tudo era silêncio. Estava sozinho em meio a tanta tensão. Até mesmo a grama luminosa parecia brilhar menos. Os únicos sons que Elliot conseguia distinguir eram sua respiração pesada e as fortes batidas de seu coração. Estava em alerta, e sentia medo.
Mas o barulho cessou. Um par de mãos pousou firmemente em seu corpo por cima do tecido macio, uma em sua cintura e a outra em seu peito, prendendo o movimento de seu braço esquerdo, segurando-o com possessividade. Uma respiração lenta e quente tocava a pele arrepiada de seu pescoço, ao passo que sua própria respiração estava presa na garganta em meio à sua aterrorizada paralisação.
Cada milésimo de segundo parecia eterno e Elliot simplesmente não sabia o que fazer. Ao mesmo tempo em que sua mente corria uma maratona na tentativa de processar algo, seus pensamentos eram um branco total. A única coisa que o garoto tinha certeza era de que estava fodido. Sobrevivera ao vampiro mais temido de todo o Espa duas vezes, seria simplesmente impossível sair vivo daquela.
Ele até tentaria escapar daqueles braços tão fortes e decididos se tivesse alguma força restante em seu corpo, mas sabia que talvez seria pior. Percebendo que não tinha saída, fechou os olhos e respirou fundo. Em silêncio, despediu-se de Sammy e de Triscan. Agradeceu ao professor por tudo o que havia lhe ensinado e tudo com o que lhe havia ajudado. Desculpou-se com Ronion e Kahn por ter sido tão insistente e inconsequente mesmo após ter sua vida salva por eles tantas vezes seguidas. Ouviu em sua mente a voz irritada de Peter gritando consigo enquanto o abraçava forte, depois de lhe ter dado um belo de um tapa na parte de trás de sua cabeça.
Não sabia o que viria a seguir, mas estava pronto. Apertou as unhas contra as palmas das mãos que suavam frio, com medo, certo de que sentiria os dentes afiados roçarem seu pescoço a qualquer momento.
Mas ele não sentiu. Elliot abriu os olhos num misto de susto e confusão quando Gael o girou repentinamente, encarando seus olhos escuros a uma distância desconfortavelmente curta. Dessa vez, a sensação era de que a criatura a sua frente não só lia e analisava sua alma, mas tinha posse de todo o seu espírito. Ser observado tão de perto por esses olhos tão poderosos e ameaçadores foi, sem dúvidas, a experiência mais traumatizante que o pequeno garoto já havia vivido (logo seguida pelo episódio das mini aranhas voadoras, claro).
As mãos de Gael continuavam segurando com certa força a cintura de Elliot, de forma que este não conseguia ao menos se mover. Com o coração extremamente acelerado e todos os pelos de seu corpo arrepiados, o estudante seguia sentindo a pele indescritivelmente clara do rosto do Vampiro perto até demais da sua própria, e era simplesmente incapaz de mexer voluntariamente um único músculo. Seu corpo estava tão tenso quanto o ar ao redor dos dois. O clima ali era quase palpável.
Quando Gael finalmente amenizou o toque no tronco de Elliot e o deixou respirar um pouco mais tranquilamente, a tortura acabou. Ou pelo menos parte dela. O olhar se intensificou, como se o vampiro desejasse, por meio daquele encarar, conhecer tudo sobre sua vítima. Bem, dizem que os olhos são a janela da alma.
Sem se afastar, a criatura levantou um pouco a cabeça, cheirando os macios cabelos do garoto a sua frente. Mais confuso ainda, o menor continuou quieto, tentando acalmar a respiração. Depois do topo da cabeça, cheirou a testa do humano. Então desceu para suas bochechas, e logo para seus ombros. Parecia um cachorro farejando as compras do mês que chegavam do supermercado, mas de uma maneira menos eufórica.
Elliot pensava que todo o "reconhecimento-olfatal" havia acabado e que estava a salvo, quando seus olhos encontraram novamente as assustadoras íris vermelhas. Com um suspiro lento, a mão gelada tocou suavemente a pele macia de seu rosto.
Seu coração voltou a bater rápido em desespero.
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