Pássaros cantam, anunciando o amanhecer, e um céu azul claro é iluminado pelos feixes amarelos da luz do sol. Samuel abre seus olhos com um feixe de luz solar entrando pela janela, ele joga sua coberta para longe, se levanta de sua cama bagunçada e caminha em direção a cozinha, de onde vem um doce cheiro de pão fresco. Ao entrar na cozinha, Samuel se depara com seu irmão, Zack, que está preparando um sanduíche enorme, com muitas fatias de presunto e queijo.
- Bom dia. – Diz Samuel.
- Bom dia maninhoooo! – Estefani, que estava escondida atrás da porta, pula nos braços de Samuel. Uma garota baixinha, com duas maria-chiquinha prendendo seu cabelo, usando uma jardineira branca e uma camisa vermelha, seu rosto é estampado por um sorriso enorme, mostrando sua felicidade para todos. – Eu fiz pão.
- Só você, menininha? – Pergunta Marcela, a mãe de Samuel, Zack e Estefani. Ela usa um vestido florido, com fundo branco e flores rosas, por cima de sua roupa, um avental de cozinha, com um desenho de um tigre no peito. Seu cabelo é castanho, da mesma cor que seus três filhos, e está preso em uma única trança que cai por seus ombros, por baixo das mangas de seu vestido, é possível ver tatuagens tribais que descem até seus cotovelos.
- Tá boooom... Nós duas que fizemos maninho.
- Fem cume cara…Ta bem goxto… – Diz Zack, com metade do sanduíche em sua boca.
- Não fala de boca cheia, menino! - Marcela acerta a cabeça de Zack com uma colher de pau, que estava em cima da mesa.
Samuel ri e se senta na mesa junto de seu irmão e sua mãe, Estefani corre até a mesa e se senta no colo de sua mãe, e toda a família toma café da manhã juntos.
- Vocês vão treinar hoje? – Pergunta Marcela, aos gêmeos.
- Vamos sim, queremos treinar novos movimentos. – Responde Zack, empolgado.
- Só não se machuquem. E cuide de seu irmão. - Marcela olha para Samuel. - Não quero que ele venha com mais uma cicatriz no rosto.
- Eu cuido dele. - Responde Samuel, comendo um sanduíche muito menor que o de seu irmão.
- Eu consigo me cuidar sozinho. - Diz Zack, preparando mais um sanduíche.
Depois de alguns minutos sentados à mesa, a família termina de comer. Zack se levanta e volta para o quarto que divide com seu irmão, lá dentro, ele pega sua mochila e sua espada e as põe em suas costas, ele olha para sua cama bagunçada e pensa em arrumá-la, mas uma grande preguiça bate nele e a deixa do jeito que está. Enquanto isso, Samuel também se levanta da mesa e começa a ajudar sua mãe a recolhê-la, enquanto Estefani fica sentada à mesa e brinca com uma boneca que estava em seu bolso.
- Menininha, não vai ajudar?! – Pergunta Marcela.
- Eu já ajudei a fazer pão. – Responde Estefani, deitando sua cabeça na mesa.
- Deixa ela, mãe. – Diz Samuel, com um sorriso no rosto.
Zack retorna para a cozinha, carregando sua mochila e sua espada nas costas, ele passa por Estefani, que continua com o rosto deitado sobre a mesa, e acaricia seus cabelos.
- Zack, vamos pegar algumas goiabas do vizinho, quando você voltar? – Pergunta Estefani.
- Vamos!! Temos que catar umas goiabas do pomar do Lau. – Zack solta uma risadinha. - Bora Samuel.
- Obrigado pelo pão, mãe. - Samuel agradece sua mãe e segue em direção à porta, junto de Zack.
Os gêmeos saem de casa e começam a ir em direção ao portão da vila. É um dia ensolarado, e o sol ilumina as casas de pedras acinzentadas, com telhados em madeira escura e brilhante, muitos adultos saindo de suas casas e colocando as roupas no sol, crianças correndo pelas ruas e idosos na varanda rindo e conversando.
As pessoas passam pelos gêmeos os parabenizando pelo ritual de passagem que passaram noite passada, e também, pelo aniversário de 17 anos que acontecerá á alguns dias atrás. Alguns são mais enxeridos, os pedindo para que possam ver suas novas tatuagens que receberam do ritual.
- Eu achei que as tatuagens não iam cicatrizar em nós. – Diz Zack, passando a mão em suas costas.
- Eu não estava preocupado, Bandur não nos deixaria fora de nosso ritual de passagem. – Responde Samuel.
- Graças à Bandur. – Zack junta suas mãos e olha para o céu.
- Você gosta dessa camisa florida, não é mesmo? – Diz Samuel olhando para o rosto de Zack.
Zack Nigeta di Lectos, usa sua camisa florida preferida, com fundo azul do céu, folhas pretas e brancas, usa também uma bermuda azul escura, seu cabelo está com um corte novo, é um moicano caído para a esquerda, e em sua orelha direita, está seu brinco dourado que todos da vila reconhecem de longe. Seu rosto sempre expressa uma felicidade imensa, e todos à sua volta se sentem alegres ao seu lado, mesmo que sua cicatriz, que vai de sua sobrancelha esquerda e passa por cima de seu olho, desse medo em certas pessoas. No lado esquerdo de suas costas, tampada pela camisa, á uma tatuagem tribal cortada ao meio, que desce pelo seu braço esquerdo e vai até seu cotovelo, e em seu pulso do braço direito, uma grande cicatriz em forma de chamas se encontra. Zack carrega em suas costas sua mochila, e sua espada embainhada, com uma faixa enrolada no cabo e uma bainha preta com petalas vermelhas.
- Mas é claro... – Responde Zack enquanto desabotoa sua camisa. – É pra impressionar as gatinhas.
- Isso deve mais afastar do que impressionar elas.
- Pelo menos não é igual esse seu coque. – Zack dá um soco nas costas de seu irmão.
Samuel Nigeta di Lectos, usa um quimono branco com detalhes em azul e aberto na frente, que cobre toda sua tatuagem, igual a de seu irmão, mas que fica ao lado direito de suas costas. Usa também uma calça e uma camisa, ambas pretas, e uma faixa branca amarrada em sua cintura. Seu cabelo é raspado nos lados, e em cima forma um coque samurai, em seu queixo tem uma cicatriz em forma de X e seu rosto expressa uma serenidade e calmaria, que muitos na vila admiram, e diferente de seu irmão, Samuel não carrega nenhuma arma, e seus punhos sempre estão todos calejados.
Os dois continuam andando em direção ao portão de saída, enquanto observam o movimento nas ruas, mas sem aviso prévio, o azul do céu se transforma em um cinza escuro de nuvens carregadas, raios podem ser vistos, e ao longe, uma visão amedrontadora aparece ao lado de fora dos muros de madeira que cercam toda a cidade.
Um monstro gigante, de 15 metros de altura, chifres enormes, pele esverdeada e olhos brancos, brilhantes e vazios, seu corpo é comprido e magro, e seus dois braços são grossos e compridos, sendo arrastados pelo o chão ao andar, sua cabeça é tão seca que parece que o crânio está exposto e seu rosto parece sem expressão enquanto olha para a vila, sua boca saliva, e a cada passada do monstro, o chão treme. Sem hesitar, Zack parte para cima do monstro.
- Corre, ele não pode chegar nas casas! – Grita Zack, correndo em direção do monstro.
Zack saca sua espada, tira de sua mochila uma garrafa com óleo e molha a lâmina, ele cospe fogo na espada para incendiá-la e corre em direção ao monstro, Samuel não fica parado e corre atrás de seu irmão. Zack pula o mais alto que pode e Samuel o auxilia lançando um jato de água para jogá-lo na cabeça do monstro, mas antes que pudesse chegar perto da cabeça da criatura, ele recebe um tapa que o lança na direção de Samuel. Antes dele cair no chão, seu irmão lança outro jato de água para pará-lo.
- Você está bem? – Diz Samuel, enquanto levanta Zack.
- Estou, esse bicho é muito forte.
- Eu sei, ele é gigante. – Samuel então olha para o monstro, enquanto tenta bolar um plano. - Rápido, cortina de Vapor!
- Entendi! – Responde Zack, confiante.
Samuel lança um jato de água muito potente para o alto, e Zack cospe fogo para transformar a água em vapor. Com tanto vapor, o monstro não consegue mais enxergar, e esse é o momento de atacar.
No meio da névoa, ocasionado pelo vapor do ataque em conjunto, Samuel lança um jato perfurante na direção da enorme fera, que passa de cima a baixo, cortando fora um dos braços do monstro, mas de uma maneira impossível, seu braço se regenera no mesmo instante. Zack se assusta, mas não se deixa abalar, ele queima sua lâmina novamente e pula para cima do monstro, mas antes que pudesse acertar sua espada no monstro, Zack é rebatido no ar, e com uma força brutal, Zack é jogado para longe, na direção da selva.
- Zack! - Grita Samuel.
Samuel joga um jato de água no chão e voa na direção do monstro, mas antes que pudesse fazer algo, ele é pego no ar. O gigantesco monstro o observa e olha no fundo de seus olhos, antes de lançá-lo na mesma direção que Zack foi jogado. Ainda no ar, Samuel só consegue ver as nuvens escuras que o monstro trouxe, e em sua cabeça uma única palavra soa.
- Nós falhamos...
Samuel acorda no meio de uma noite nublada, ele olha em volta, e a única coisa que vê são árvores ao seu redor e nem um sinal de seu irmão.
- ZACK!!!! - Samuel grita.
Um clarão laranja aparece entre as árvores, e imediatamente, Samuel corre em direção ao clarão. Deitado no chão, em meio a árvores quebradas, está Zack, com seus braços quebrados e ossos expostos.
- Por que demorou tanto?! - Zack pergunta, com um tom irritado. – Tô no chão há horas.
- Ainda não se curou? – Perguntou Samuel.
- Não tá vendo que o osso tá pra fora? Preciso da sua ajuda.
Samuel se ajoelha ao lado dos braços quebrados de Zack, que jorram sangue por todo o chão, e com calma, ele põe os ossos de seu irmão no lugar.
- AAAA! – Zack grita de dor. - Mas que merda!
- Pare de reclamar. - Samuel enfaixa os braços de Zack e o ajuda a levantar. - Você está vivo, isso que importa.
- Não tô reclamando, só estou com raiva.
- A quanto tempo estamos desacordados? – Samuel pergunta.
Zack suspirada e então responde. - Eu não sei cara, já tá de noite, então faz tempo.
- Suas pernas não estão quebradas, vamos logo.
Zack se espreguiça e vai até sua espada, que está fincada em uma árvore ao seu lado, Samuel se levanta e olha para o topo de uma árvore, onde se encontra um corvo olhando diretamente para Samuel. Os dois se encararam por alguns segundos até que o corvo levanta voo em direção à vila.
- Isso é um mal sinal. – Diz Samuel, olhando para o topo da árvore, agora vazio. – Pegou sua espada?
- Peguei... – Diz Zack tirando sua espada da árvore. – Bora pra Vila.
Zack e Samuel começam a andar em direção à vila, e depois de alguns minutos andando, os gêmeos chegam ao seu destino. Mas a visão que os irmãos têm é algo assustador, os muros de madeira, que antes protegiam a vila, agora estão derrubados e esmagados por conta do peso do monstro, as ruas onde antes crianças corriam, agora estão cheias de poças de sangue e pedaços de corpos dilacerados e as casas onde idosos e adultos conversavam alegres, agora estão todas pisoteadas.
Vendo toda a destruição, Zack corre em disparada.
- Espera Zack, você não vai aguentar! – Samuel grita, enquanto corre atrás de Zack.
Correndo pelas ruas ensanguentadas, Zack não enxerga mais nada, a única imagem em sua mente, é a imagem de sua mãe, de sua irmã e de seu irmão juntos, comendo o café da manhã que sua mãe preparou. Mas essa imagem desaparece de sua mente ao chegar em frente à sua casa.
Samuel chega até Zack que está imóvel olhando para a casa, sangue escorre pelos escombros e Zack consegue ver a mão de uma criança, coberta de cortes e sangue escorrendo. Desesperado com aquela visão, ele corre em direção da mão e começa a retirar todos os escombros de cima.
- Zack, não faça isso! – Samuel grita tentando tirar Zack de cima dos escombros.
- Eu vou salvar ela, eu vou salvar ela, eu vou salvar ela... – Zack apenas repete essas palavras enquanto retira os escombros de cima de sua irmã.
Quando Zack termina de retirar o ultimo escombro, ele vê uma visão que nunca mais tiraria de sua mente, sua irmã ensanguentada sendo abraçada por sua mãe. A mente de Zack escurece, mais nada se passa por sua cabeça, e um único sentimento acomete seu corpo. ÓDIO! Zack explode em uma grande chama, tão grande que clareia a vila inteira.
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