Corriam por um imenso labirinto, onde qualquer pessoa poderia se perder, até mesmo as três garotas. Ao notar que não deixariam de correr tão cedo, Ashley soltou seu pulso e se afastou dando poucos passos para trás. Lembrou-se do conselho de sua guardiã, não podia confiar tão depressa em alguém, mesmo que essas pessoas parecessem garotas bobas e inocentes. Quem sabe não estivessem bolando uma emboscada para ela, afinal, descobriram seu segredo proibido.
As duas olharam para trás e logo se deram conta do quão longe foram. Observaram o céu e dirigiram seus olhares para os muros de sebe como se estivessem perdidas, mas não queriam passar essa impressão, já que não queriam ser vistas como meninas tolas e irresponsáveis, uma impressão que acabavam por oferecer aos que não as conheciam muito bem.
A gêmea de cabelos lisos encostou uma de suas mãos em meio aos seios enquanto ainda carregava o livro com a outra, dirigindo seu olhar para Ashley e logo se desculpando de maneira educada.
— Oh, perdoe-nos. — Assim, balançou a cabeça com delicadeza como se negasse, continuando a falar: — Não nos demos conta do tanto que corremos.
Ela vestia um longo vestido rosado com mangas bufantes, babados prateados que iam até metade da parte superior de seu braço, logo tendo mais um pano formando uma manga soltinha e branca; também haviam babados em seu decote, cinza e cintilante. Já em sua cintura, dava-se abertura para uma longa saia lilás, sendo coberta por panos ao seu redor, os quais seguiam a cor da parte superior; ambos encostando-se ao chão; e uma corda negra amarrada em um longo laço bem caidinho. Também usava um colar de pérolas e uma delas usava uma tiara delicada de prata e rubis na forma de losango, o que Ashley acabou por deixar passar, assim nem ao mesmo percebendo aquelas jóias, pois temia pelo o que as duas planejavam.
— Quem são vocês? — Abraçava a cesta mais uma vez, tremendo. Queria correr, mas... Para onde iria? Poderia acabar por se perder naquele labirinto. Bem, já estava perdida, todavia, ir além só iria piorar sua situação.
— Quem somos nós? — A dos cabelos enrolados apontou para si. Vestia o mesmo modelo de vestido que a outra, todavia, o rosa fora substituído pelo azul, seguindo o gosto de cada uma. — Não nos conhece?
— Eu deveria? — Tal resposta foi capaz até mesmo de tirar o ar das duas meninas, que olhavam surpresas para a garota. Sabia que sua irmã surtaria a qualquer momento, então decidiu tomar a frente para que as coisas não saíssem do controle.
Deu uma gargalhada gentil, levando a mão em frente à boca enquanto fazia, então deu um sorriso sereno e começou a falar: — Está tudo bem, afinal, nem ao menos nos apresentamos, não? — Olhou para a de azul, que revirava os olhos em descontentamento. Limpou a garganta chamando a atenção da mesma, que logo deu um sorriso forçado, assim, dirigiu o olhar novamente para Ashley com aquele mesmo sorriso de antes. — Meu nome é Moly Schulz.
— E eu,... — Apontou para si apoiando a outra mão na cintura, fazia pose. —... Britney Schulz. Somos irmãs gêmeas! Isso não é legal?
De fato era, já que ambas conseguiam fazer diversas travessuras tendo essa vantagem, sendo uma a melhor amiga da outra, mesmo que ainda tivessem suas pequenas intrigas. Mas que irmãos não têm, não é mesmo?
Ashley permaneceu em silêncio, não sabia o que responder. Agiam como se fossem íntimas, pedindo uma opinião boba de repente. Além do mais, continuava com medo, não sabia qual a índole das pessoas daquele reino, nem se ao menos eram semelhantes ao do outro em que vivia. E depois daquela conversa sobre a caça às bruxas... Como confiaria em alguém que estava com seu objeto proibido em mãos? E se... E se usassem aquilo contra ela? Bastava tão pouco para que uma tragédia acontecesse...
Vendo que a menina não era de falar muito, a dos cabelos lisos deu um passo se aproximando e voltou a tentar puxar assunto:
— Mas e você? — Sua voz era doce. — Qual o seu nome?
— Ele é tão belo como a donzela? — Enfim a outra decidiu ser mais gentil, elogiando a menina em sua pergunta. De fato, Ashley era muito bonita, deixando até mesmo elas admiradas. Imaginavam que caso seus irmãos tolos a vissem, inundariam o reino de tanto babar, do jeito que eram atrevidos e mulherengos.
Mas para a infelicidade das duas, mesmo que Ashley fosse uma boa moça, era um pouco fria tendo o exemplo de Clerence para si. Era doce, confesso, mas ainda assim era direta e talvez indelicada aos sentimentos de quem a ouvisse.
— Não posso dizer meu nome para estranhos...
"Estranhos" foi o suficiente para que as duas moças ficassem ali, boquiabertas e em choque. Não eram quaisquer umas, já sendo um desaforo ter de se apresentar a uma plebeia que ousou caminhar pelas ruas nobres da vila. Por mais que uma ainda tentasse permanecer calma, a outra quase explodia em fúria.
— Oras! — Britney fechou os punhos e os levou para baixo violentamente expressando sua frustração. — Acabamos de nos apresentar! Você quer mais o quê?
Moly suspirou, colocando uma mão sobre o ombro da mais nova. — Já não somos mais estranhas, minha querida. Não precisa ter medo. — Ainda segurava o diário, o levando para mais próximo de si, o que chamou a atenção de Ashley a lembrando dele.
— O diário... — Deu um passo para frente, enfim mostrando coragem. — Devolva-me!
— Ah, isso? — A de azul apontou para ele dando um sorriso irônico, então tomou da mão da irmã e o dirigiu violentamente para cima, provocando a outra. — Só se você se apresentar!
—... Por favor... Ele é importante para mim... — E era, de verdade. Mesmo que a dos cabelos negros ainda não soubesse o porquê.
— Diga o seu nome, agora! — Perdia o restante de sua paciência.
Com toda aquela movimentação, não demorou muito para que a raposa sentisse que sua nova dona estava em apuros. Pulou da cesta e se posicionou para que pudesse defendê-la se preciso, o que assustou as outras duas, que se abraçaram e se afastaram em pânico.
— AAAAH! — Britney gritava. — UMA CRIATURA FEROZ!
— ELA IRÁ DEVORAR A GENTE! — Lágrimas pulavam dos olhos de Moly como uma cachoeira. Pode parecer maldade, mas creio que se você pudesse ver essa cena com certeza daria boas risadas dessas duas.
— Oh... — Ashley se abaixou colocando a mão sobre as costas do animal, em seguida o pegando em seu colo e levantando. Acariciava o rosto macio e peludo do filhote, tentava acalmá-lo. Era uma raposa tão bonitinha. Pequeno, mas muito valente. — Está tudo bem, pequenino... — Apesar disso, a raposa continuava encarando as duas como se dissesse com os olhos que as devoraria; assim como elas disseram; caso tentassem algo contra a dos olhos azuis.
— Ela está com essa besta da floresta no colo! — Britney apontava para os dois ao mesmo tempo em que ainda agarrava sua irmã. Ambas pulavam como se o chão estivesse em chamas, um exagero total.
— Ele é bonzinho... — Respondeu.
— Bonzinho? — Moly perguntou. — Quase nos devorou!
Suspirava. — Ah, claro... Aguentaria as duas em seu pequeno estômago.
— O que quer dizer com isso? — Britney deu um passo à frente soltando a irmã brutalmente, quase a empurrando para trás. — Está nos chamando de gorda? Ora, sua...
— Ashley...
— Hã?
— O meu nome é Ashley... — Colocou o animal no chão novamente e caminhou até elas com calma. Se perguntava o porquê de ter ficado com tanto medo de meninas bobas como aquelas duas, quais achavam que um filhote tão pequeno podia fazer algo como aquilo com elas. — Poderia devolver meu livro? — Estendeu a mão.
— Oh, Ashley... — A dos cabelos lisos voltou a sorrir como se não tivesse dado aquele show há pouco. — Belo nome.
— Sim, bonito. — Britney voltou a erguer o livro para os altos, era maior do que Ashley, a provocando. — Mas não vamos devolver isso. — Deu mais um de seus sorrisos irônicos. — Sabe quais são as regras de nosso reino, não? Plebeias não lêem.
— Mas... Mas vocês prometeram! — Se aproximou, indignada.
— Não prometemos não. — Moly segurou as mãos atrás de suas costas, continuava a sorrir. Oh, céus. Tolas e irritantes.
— Se descobrirem que você carrega isso, será condenada antes do meio-dia!
Ashley recuou abraçando a si própria. Lembrava-se de quando estava decidindo o que fazer mais cedo, se obedecia a sua senhora ou se seguia seus caminhos. Ah... Como queria estar na floresta... Mesmo que não fosse prudente, ainda sim podia gozar da paz do lugar ao invés de temer por sua vida naqueles instantes.
Ao mesmo tempo, as gêmeas observavam a menina, achando graça de tudo aquilo. Olharam uma para a outra e enfim Moly pegou o livro das mãos de sua irmã e se aproximou da menor o devolvendo.
— Ah, qual é? — Britney cruzava os braços. Falava como um de seus irmãos mais velhos.
— Nós estávamos brincando, florzinha. — A outra juntou as mãos agora em frente a suas coxas. Mesmo que seu sorriso chegara a incomodar Ashley poucos instantes atrás, ainda sim transmitia tamanha paz.
— Você não tem senso de humor?
Abraçou o livro, suspirando em alívio. Por pouco pensou que seria seu fim, condenada por causa de uma de suas paixões. Logo se abaixou para pegar a cesta quebrada, a mesma que havia caído quando a raposa pulou dela para defender a dona. As duas olhavam para ela, compartilhando a mesma dúvida, até que Moly tomou a frente mais uma vez:
— Sobre o que é o livro? — Se aproximou abaixando para que pudesse ajudá-la.
— Ah... — Olhou para a capa. Não tinha nem ao menos visto a primeira página, quem dirá saber do que se tratava. — Ainda não sei...
— As letras são curiosas. — Colocou a mão em seu queixo com dúvidas. — Nunca vi tal alfabeto antes. Consegue entender?
— Sim... Aqui diz: O Diário de Agatha.
— Agatha? — De repente, a expressão da menina mudou. Arregalava os olhos e se levantava dando passos para trás, logo sendo segurada por sua irmã, que também não parecia confortável com aquele nome.
— O que houve? — Já pronta, se levantou.
— Se for quem estamos pensando... Essa miserável acabou com a vida de nossa tia. — Britney parecia furiosa.
— Oh, céus... Pobre tia Rose... — Moly quase chorava.
O que dizer perante tal situação? Não conhecia Agatha e se espantava sempre que descobria mais sobre ela. Mesmo assim, a tristeza dos contadores de histórias há poucas horas atrás consolou seu coração. Talvez pudesse ser um mal entendido, quem sabe?
Caminhavam pelos corredores do labirinto, as gêmeas na frente e a outra atrás com a raposa. Não conseguia parar de pensar na má reação das duas. O que encontraria naquele diário, afinal? Seria Agatha tão ruim como diziam? Ou seria ela uma vítima das mentiras que acobertavam iniquidades praticadas por aqueles que julgavam as pobres mulheres?
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