— Hadria. — Foi tudo que conseguiu dizer, a voz falha.
Fazia oito anos desde a última conversa, quando ela lhe amargurara o coração. Quando seu rancor fez com que jurasse vingança e quase guerra ao sistema do Conselho Mágico. Quando disse a si mesma que, na próxima vez em que visse Hadria, elas estariam em lados opostos, e ela provaria seu valor negado perante a feiticeira.
— Diana! — A garota declarou, a abraçando rapidamente, em um tom extremamente casual. A bruxa não poderia estar mais confusa naquele momento.
Diana se livrou do abraço e encarou a outra, incrédula.
— Você não devia estar aqui.
— Faz muito tempo, né? Não está feliz de me ver?
— Não — respondeu, seca. Não queria proximidade, não queria sequer dar chance para isso. Um turbilhão de sentimentos diferentes a atropelava naquele momento, e não tinha certeza a qual dar espaço primeiro: raiva, surpresa, mágoa, tristeza, alegria? Não, alegria definitivamente não. — Por que está aqui? Como me achou? Por que está agindo assim?
— Não somos amigas?
— Deixamos de ser há muito tempo.
“Quem é ela?”, ouviu uma voz em sua mente. Apesar de estar diferente, sabia que se tratava do conglomerado. Ótimo momento.
“Não é da sua conta”, pensou em resposta, imaginando que assim o conglomerado ouviria.
Hadria, é claro, não sabia o que se passava.
— Você está diferente — declarou a conselheira, reparando na aparência de Diana. De fato, além de uma cicatriz no rosto, metade de seu cabelo estava esbranquiçado, num tom tão claro quanto os fios de Hadria. Um dos seus olhos também estava com outra cor, como se estivesse apagado, e ela não conseguia discernir a íris da pupila, o que era bastante estranho. Apesar disso, não estava tão surpresa quanto fingia estar.
Afinal, era a mesma aparência da sua visão de mais cedo.
— Estamos ambas diferentes — disse a bruxa, em resposta. Não parecia nem um pouco feliz pelo reencontro, e Hadria ia fazer outro comentário sobre isso, até que algo lhe chamou a atenção.
— Espera. Por que tem corpos aqui?
Diana estava tão imersa em seus pensamentos que havia esquecido dos magos desmaiados no quarto. A pergunta a fez despertar, um pouco mais alarmada.
— Não estão mortos.
— Não foi o que eu perguntei.
— Não tá em posição de fazer perguntas.
— São magos do Conselho, Diana. Por que estão aqui?
— Bom, isso é o que eu gostaria de saber. — A bruxa estava cada vez mais incomodada com o rumo da conversa, até que uma chave se virou dentro de sua mente. Ela encarou Hadria, os olhos semicerrados.
— O que foi?
— Não importa quantos anos se passaram, ainda te conheço. Não vou cair nessa conversa. Me diz por que realmente está aqui. O que você quer? — Agora que a cabeça estava mais em ordem, parecia muito estranha e quase inconcebível a ideia de a velha conhecida ter aparecido por “coincidência”, logo depois de um ataque de magos do Conselho.
A expressão da mulher de cabelos brancos se manteve inalterada por um instante, como se ponderasse sobre a situação. Então, pareceu ter percebido algo e suspirou.
— Você sempre torna tudo mais difícil. — Seu tom de voz havia mudado, retornando para a arrogância que Diana se lembrava da última vez em que a vira. — Preciso te levar até o Conselho Mágico. Agora você só me deu mais um motivo — completou, indicando com a cabeça os magos inconscientes.
A bruxa deu alguns passos para trás, e sentiu a própria testa se franzir enquanto encarava a outra, um misto de raiva e decepção se acumulando em seu peito. No geral, não estava realmente surpresa. Mas doía o fato de sua desconfiança estar certa, e ela se odiou por isso. Depois de tudo que Hadria havia feito e falado, alguma coisa lá dentro ainda tinha uma tola esperança. Pequena, quase apagada, mas estava ali.
O mais puro ódio a consumiu, e ela permitiu que isso assumisse o controle.
Chamas surgiram em suas mãos depois de praticamente cuspir o encantamento. A magia era difícil, mas a bruxa tinha certeza de que nunca a havia recitado tão rápido quanto daquela vez. Em um instante, fogo voava na direção da outra.
Hadria, porém, não era uma feiticeira do Conselho por mero capricho.
Um escudo mágico simples foi erguido, e ela nem mesmo tremeu na posição em que estava, sem desviar o olhar de Diana um instante.
Algo — ou alguém — pareceu de repente muito incomodado dentro de Diana, mas ela evitou dar atenção. A realidade é que ainda não tinha chance contra a antiga amiga, então precisava pensar em um jeito de escapar dali.
Hadria foi mais rápida que seu pensamento, e lançou um feitiço com correntes encantadas, prendendo os pulsos e calcanhares de Diana. A bruxa sentiu sua pele queimar em contato com a magia pura, e cerrou os dentes, se debatendo em vão.
— Pensa que pode me enfrentar? — indagou a conselheira, com um sorriso debochado no rosto. Diana se sentia mais frustrada a cada segundo, se culpando por não ter fugido no instante em que avistou a mulher à porta.
“Me deixe cuidar disso” ouviu alguém dizer dentro de sua mente. Antes que pudesse elaborar uma resposta, a voz continuou. “Você podia não ter chance antes, mas agora você tem a mim. Viu do que sou capaz. Posso pelo menos ganhar tempo”.
Diana se sentiu dividida entre o orgulho, a desconfiança e a lógica da voz em sua cabeça, mas a ideia de ser capturada pela mulher que jurou derrotar um dia foi mais forte em sua mente.
Ainda iria derrotá-la com a própria força, em algum momento. Mas não seria naquele.
Sentiu a visão começar a turvar enquanto deixava o conglomerado assumir o controle.
Autoria: Pedro Peixoto
Revisão e preparação: Luisa Peixoto
Título tipografado: Pedro Peixoto
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