Peter havia chegado em casa mais tarde naquele dia. Tia May veio recebê-lo, mas depois de beijá-la e se cumprimentarem rapidamente, ele correu para o quarto, o que deixou May desconcertada. Peter estava mais organizado desde a última vez, seus murais e anotações eram em seu computador agora, as únicas coisas penduradas em sua parede eram fotos de Ben, Gwen, Max e Harry. Muito havia acontecido no “Ano da Aranha” como ele chamava, muita gente que dependia dele com quem falhou, suas fotos nos murais eram o lembrete, ele não precisava mais do que isso. Mas seu documento no computador só tinha um tema em comum: a Oscorp. Ele estava anotando as últimas informações que havia angariado daquele dia quando May veio a bater na porta.
- Pete, querido, posso entrar?
- Só um momento, tia. — Ele acionou a tranca automática e abriu a porta, logo depois de fechar seus documentos
- Você nunca vai tirar isso, né? — May apontou para a tranca — Posso falar com você?
- Claro, senta aí.
- Filho… Eu fico muito feliz com tudo o que você tem feito no último mês. Você finalmente sai do quarto pra fazer alguma coisa, um trabalho remunerado que pode te qualificar para o MIT, as únicas coisas na sua parede são as fotos dos seus amigos que você não quer esquecer, eu realmente aprecio isso. Mas algo vem me incomodando em você, está tudo realmente bem?
- To sim, Tia May, na medida do possível.
- Certeza?
- Claro, o trabalho tem me deixado ocupado.
- Isso é o que eu tenho medo.
- Poxa, mas uma hora você está preocupada que eu não faço nada, na outra que eu faça demais?
- Existem muitas formas de luto, Peter. Você tem que reconhecer e saber lidar com elas.
- Mas como? — Peter começou a bater o pé, um pouco irritadiço — Você raramente fala de tudo o que aconteceu, só bate a bola pra frente. Parece que você nem quer lidar com isso.
- Não pense assim, garoto!
- Olha, May… Eu só tô ocupando minha cabeça pra ela não ter espaço pra pensar em outra coisa. Eu não sei se eu estou preparado pra tentar outra coisa.
- Peter… — Ela se levantou — Pelo menos promete pra mim que você não está fazendo nada da Oscorp neste computador.
O jovem olhou para a tela do computador, e depois desviou o olhar, envergonhado. May colocou uma mão no ombro dele, dizendo “não pode, não é?”, e saindo do quarto dele logo em seguida. Ele decidiu começar a ser o mais franco e verdadeiro possível com ela desde quando finalmente começou a fazer outras coisas além de visitar o túmulo de Gwen. Ele decidiu que estava na hora de vestir o uniforme e sair nas ruas mais uma vez. Ele observava a cidade do todo do Empire State, as luzes da noite iluminando a cidade que nunca dorme. Não demorou muito pra ele descer em alta velocidade e balançar por entre os prédios atrás de uma corrida intensa da polícia a um assalto de mão armada em um dos bancos da cidade.
As notícias ressoavam nas mídias de toda Manhattan, o Homem-Aranha estava de volta. Especulações sobre a possível ausência do herói circulavam entre as pessoas, alguns diziam que ele poderia estar doente depois do embate com Electro, devido a alguma espécie de radiação eletromagnética depois da morte do vilão. Outros diziam que ele simplesmente tinha decidido que estava na hora de suas merecidas férias, que debaixo daquela máscara uma pessoa, que havia defendido as pessoas de todo tipo de crimes, grandes e pequenos, ainda existia, um “cara” como um deles descreveu, que precisava de descanso. Algumas teorias da conspiração surgiram desde o último dia em que tinham visto ele no sistema de energia elétrica da Oscorp, que uma espécie de Duende Voador foi visto se dirigindo pra lá no mesmo dia, e que o Homem-Aranha passou todo esse tempo caçando ele, mas essas teorias eram ignoradas como ilusões causadas pela batalha com Electro e pela escuridão causada pelo blecaute.
Mas agora não era hora de discussões ou rumores, o herói aracnídeo estava de volta, e as pessoas podiam contar com sua proteção e seu bom coração mais uma vez, e o Homem-Aranha podia honrar o sacrifício de tantas pessoas que ele perdeu por causa da responsabilidade da qual ele não podia escapar. Mais uma vez no topo do Empire State, ele observou o edifício da Oscorp, como se suas janelas espelhadas emanassem um brilho verde sobrenatural, mas os segredos por trás daquele lugar não o assombravam tanto quanto a pessoa que deveria estar lá. Toda vez que ele pensava em Gwen Stacy, ele pensava no que ela desejaria pra vida dele, que o homem que salta dos precipícios daquela cidade estivesse lá para zelar por aqueles que não devem, que o amigo da vizinhança estivesse lá para trazer a esperança de que ele tanto falou para Harry. Esse amigo que ele não sabe mais onde está, mas esperava que pudesse encontrar de novo, para explicar tudo o que aconteceu, para que pudesse se desculpar. Mas não havia por que pensar nessas coisas agora, ele estava de máscara, era hora de entrar em ação.
Alguns desses rumores sobre a volta do aranha atingiram a boca dos funcionários da Oscorp, onde, no outro dia, Parker e Whitman começaram a compartilhar uma mesa ao passo que Peter finalmente tinha liberdade de continuar sua pesquisa nano tecnológica enquanto Debra terminava de arquivar sua última contribuição pro projeto que vinha trabalhando nas últimas semanas. Mas houve uma visita inesperada, uma pessoa veio levar os caixotes da pesquisa, os caixotes com o composto de injeção especificamente, trazendo uma prancheta virtual, veio o carismático Morris Bench, entregando a prancheta para Debra preencher, e se aproximando de Peter, com um largo sorriso no rosto.
- E aí, Queens!
- Opa, como anda Bronx! — Os dois se cumprimentaram — O que você veio fazer aqui?
- Transporte Marítimo, Pete. Eu vim pegar o carregamento do “Projeto Hídrico” pra levar pra uma estação em alto mar da Oscorp. Aparentemente, qualquer traço químico é pra ser rigidamente armazenado em seu devido lugar.
- Uau, não esperava que a Debra fosse fazer tanto escândalo, hahaha.
- As pesquisas vão pra… Opa, não posso falar — Morris deu um sorriso brincalhão — Então já sabe, vou sumir por uns dias. Peter, olha, queria te dizer uma coisa…
- O que?
- Não sei por que, mas eu to com a sensação de que eu devia te dizer… — Ele se aproximou do rapaz, sussurrando — Chama ela pra sair.
- O que?! Não… Eu não to com cabeça pra isso.
- Eu quero que você me escute, rapaz. Você sabe que eu fui da marinha, certo?
- Sim.
- Nunca te contei por que eu não sou mais. Olha, eu sempre fui um rapaz muito brilhante no que eu fazia, assim como você, mas eu também tive que escolher entre o que eu faço, e com quem eu convivo. Eu tinha uma missão muito importante no Oriente Médio, mas eu também tinha uma mulher e um filho que precisavam de mim, meu filho tinha uma condição nos ossos, precisava de tratamento especial. Não pensei em acompanhar eles, precisavam de mim e eu só pensava na grana, então eu fui. No meio de um dos conflitos… Eu deserdei. Fugi da batalha com medo de nunca mais ver minha família. Fui dispensado da Marinha, não tinha mais dinheiro pra tratar o meu filho e… Quando ele morreu, ela me deixou.
- Nossa, Bench… Meus pêsames.
- Não, Peter. Eu fui um fraco, eu não soube quando aproveitar minha vida, quando… Dar atenção pro que importa. Você tá sozinho, neste prédio gigantesco, se afogando no trabalho. Você precisa de alguém pra botar seus pés no chão. Promete pra mim que vai chamar ela pra sair, um favor pra um velho marinheiro.
- … Tudo bem, Morris, eu vejo se chamo ela pra sair qualquer dia desses.
- Meu garoto! — Bench apertou firme o ombro de Peter — Já terminaram de levar os caixotes, preciso supervisionar. Você tem uma semana para fazer o que eu te disse, hein!
Ele gritou, deixando o escritório, acenando para os dois jovens, que continuaram suas pesquisas. Peter o viu indo embora, e estranhamente, sentiu aquele sexto sentido dele alertá-lo para alguma coisa, mas não tinha certeza do que. Pouco tempo depois, a figura de Gustav Fiers se encaminha mais uma vez para o Instituto Ravencroft, dessa vez não fazendo questão de parecer incógnito. Harry estava fazendo flexões no chão de sua cela, realmente não esperava a visita de seu comparsa tão cedo.
- Dois dias consecutivos, sentiu saudades de mim? — Osborn brincou.
- Estamos transportando os químicos do Projeto Hídrico para… A nossa nova base de operações.
- Isso eu sei. Qual o motivo de você ter vindo aqui hoje?
- Como você viu, o composto já funciona em seres vivos, até certo ponto. O rato do vídeo, ele morreu apenas a algumas horas atrás, então há uma maneira de estabilizar artificialmente, se assim houver tempo.
- Você está sugerindo que façamos testes.
- Sim, precisamos de um candidato.
- Me diga… Há alguém de dentro da Oscorp que possamos encobrir e utilizar?
- Não exatamente, o transporte é quase todo automatizado, apenas uma tripulação mínima irá levar a carga ao alto mar, podem ser quaisquer um desses — Fiers projetou o holograma do efetivo do transporte.
- Espere… Morris Bench. Esse é o homem que mais tem tido contato com Peter, não é mesmo?
- Sim, os dois interagem amigavelmente numa base contínua.
- Muito bem então. Pode ser ele. Arme um acidente, qualquer coisa que faça com que ele seja exposto a esses químicos. Não todos, ainda precisamos de alguns para nosso plano.
- E qual deveria ser o elemento injetado?
- Fiers, por favor — Harry sorriu maleficamente — Um acidente em alto mar, não está óbvio o suficiente?
O cavaleiro acenou que sim com a cabeça, e se retirou do Instituto. Mais tarde naquele mesmo dia, o sol se punha em um dos portos de Nova York, Morris Bench estava com sua prancheta fazendo as últimas checagem de carga. Então, ele e mais algumas pessoas embarcaram no navio e o procedimento automático de desatracação iniciou a viagem deles. Dali pra frente, as coisas eram relativamente tranquilas, Bench se reuniu com a equipe, amigos de serviço com quem já tinha feito muitos transportes, e começou uma amistosa partida de cartas. Mas para desconhecimento deles, a rota programada foi ligeiramente alterada, e um dia de viagem depois, eles estavam na frente de uma grande tempestade marítima, e se aproximavam a cada minuto. Morris fez sua checagem de rota diária e pareceu confuso.
- Pessoal! Vocês sabem se a nossa rota de entrega mudou?
- Não — Uma voz longínqua respondeu — Por quê?
- Parece que estamos com um itinerário diferente!
- Deve ser reajuste automático, deixa isso!
Ele grunhiu de dúvidas, e achou melhor se certificar que os contêineres na área de carga ao céu aberto estivessem devidamente assegurados, e se dirigiu para a cabine de ferramentas para se preparar para o procedimento. Quando ele saiu da cabine de comando, eles tinham, a pouco, entrado na tempestade, e os mares estavam afoitos. Ele correu para checar as amarras, sua sorte é que não eram muitas, mas sem o conhecimento dele, Fiers o observava da sala de comando da Torre Oscorp, esperando o momento correto. Morris se aproximava do contêiner armado, Gustav flutuava seus dedos em cima de um botão holográfico em sua mesa. Então, quando o inocente marinheiro se aproximou da mais longínqua carga que o atual diretor das indústrias acionou o mecanismo, fazendo com que as amarras se soltassem automaticamente.
Bench ficou desesperado ao perceber isso, chamando por reforço em seu intercom, e correndo para tentar agarrar a pesada caixa. Mas para sua surpresa, a caixa era ridiculamente frágil, e ela começou a se desmanchar em suas mãos por causa da turbulência marítima que ele teve de enfrentar ao se debater múltiplas vezes, expondo o conteúdo dos frascos de químicos de dentro. Ele não conseguiu segurar-se por muito tempo, uma grande onda fez com que o enorme barco de metal se inclinasse num ângulo muito íngreme, o que fez com que ele caísse em cima da caixa, despejando todos os produtos químicos em sua pele. Ele começou a gritar de dor, coisa que espantou os colegas que se aproximavam dele, mas a tempestade era muito violenta, e eles não conseguiram chegar ao amigo a tempo, tendo de se segurar nas amarras mais próximas enquanto ele era lançado para além do barco e dentro do alto mar, seus olhos observando desoladamente o colega sumir para dentro das ondas do mar.
Comments (0)
See all