Academia Gotham. A escola onde as crianças mais privilegiadas da cidade podem ter acesso a um nível de educação da mais alta qualidade. Algumas crianças estavam lá por que tinham o dinheiro para tal, outras porque realmente eram dotadas o suficiente para merecerem seu lugar lá. De qualquer maneira, a academia era o lugar onde a segurança e o futuro de Gotham se criavam, onde os jovens de todas as idades poderiam construir suas vidas em meio ao caos desgovernado de uma cidade em chamas. Pessoas como Dick, estavam lá por serem apenas excepcionais e ganharem seu lugar, outras, como Barbara, estavam não só por este, mas como por outros motivos, como o fato em particular dela ser a filha de um famoso delegado e acabar recebendo uma bolsa parcial, mas apenas se ela mantivesse as boas notas, é claro.
Barbara esperava por Dick na frente da movimentada entrada da academia todos os dias, ela sempre chegava primeiro, mesmo ele morando muito mais próximo de lá do que ela. Naquele dia, Dick chegou de carro com seu pai, John, alguém que Babs não via com muita frequência, ironicamente. Eles trocaram rápidas palavras e ela se despediu alegremente do antigo Grayson Voador. Sempre que ela se encontrava com algum dos pais do amigo, o sentimento sempre era muito gratificante, uma vez que eles realmente gostavam dela e da companhia que ela fazia pro único filho deles. Entrando juntos, como sempre faziam, eles caminhavam pelos extensos corredores do que, outrora, era a maior mansão de Gotham, com suas decorações góticas e sua iluminação baixa. Comentavam um com o outro as matérias e a rotina que cada um teria, uma vez que a pequena diferença de idade entre os dois causavam muitos desencontros no tempo que passavam juntos.
- Química avançada quase o dia todo e Álgebra. E você? — Barbara iniciou
- Ah, todo o tipo de matérias, Cálculo, História Internacional e ainda tenho treinamento do time de vôlei mais tarde.
- Estamos com o dia todo cheio, então?
- Sim…
- Bom, vamos aproveitar o resto do tempo que a gente tem hoje, então.
- Pros planos de mais tarde, presumo eu. — Dick abriu um sorriso junto com a porta de seu armário, revelando o interior estilizado com uma temática circense forte — Vamos aos negócios.
- Vivo esquecendo como seu armário é uma bagunça. — Barbara olhou de cima a baixo enquanto o amigo revistava entre as pilhas de livros, cadernos, quadrinhos e uniformes escolares por um item em específico — Você poderia decorar esse canto com algo que combine mais com o que a gente vai fazer, talvez umas fotos de caverna, uns morcegos…
- E deixar igual o seu armário?
- Não posso me culpar por ter bom gosto. — Ela sorriu, e se afastou para dar espaço para Dick ressurgir da pilha de pertences dele
- Aqui… — Ele segurava um caderno, um que a própria Barbara decorou, com o retrato falado do Batman e vários símbolos de morcegos colados em volta, colorido em suas bordas por azul e amarelo. — Deixe-me só achar o projeto… Catacumbas, aqui. Peguei muito do fórum do Guardião Silencioso, você sabe como existem teorias que o Batman se movimenta por lá, então alguns outros usuários lá do seu bairro rastrearam uma possível localização naquela área através de documentos antigos da biblioteca municipal.
- Oh… E você quer levar uma garota pra um lugar escuro e longe de todos pra fazer o que, hein?
- Cai fora! — Dick respondeu, com um tom de ironia, mas com um olhar nervoso — Eu e você? Eu iria acabar enlouquecendo!
- Sei… — Ela procurou olhar nos olhos do garoto, que desviou o rosto, tentando esconder o rosto vermelho, apenas para encontrar um rosto desagradável.
- Bu! — Harley disse para Dick, com a língua pra fora — E aí, Dick?
- Ah… Oi Harley. — Barbara respondeu, claramente entediada
- Eu não falei com você, Babs! — Ela retrucou, ainda com a língua pra fora — O que os dois pombinhos andam aprontando?
- Nossa, essa sua implicância em fazer da gente um casal com certeza é evidência de uma necessidade por ser parte de um! — Dick ressaltou, cruelmente. Harley voltou a encará-lo, realmente zangada
- Não é isso que seu rosto vermelho tava dizendo, passarinho! — O rosto de Dick voltou a ficar vermelho — Era o que eu pensava! Sabe, eu gosto do seu armário, o dia que você se encher dessa aí, vem falar comigo, garanto que curto muito mais o mundo circense do que ela.
Harley era, assim como Dick, uma das pessoas que mereceu o lugar na academia, e isso sempre deixou a dupla dinâmica em dúvida, porque eles nunca entenderam como alguém como ela tem os neurônios para ser parte de uma das escolas mais bem conceituadas do país, ainda mais dado o histórico criminoso da família. Ela fez que ia sair, mas foi agarrada pelo braço por Barbara.
- Você não tem nada melhor pra fazer do que pensar só em você mesma? — Gordon respondeu, irada
- Ora, mas todos me amam, você nunca percebeu isso? Veja minha quantidade de seguidores! — Quinzel pegou o celular, mas Barbara bateu em sua mão, a fazendo derrubar o celular no chão
- Ninguém aqui gosta de você, Harley. Só todos esses seus seguidores que são falsos o suficiente pra fingirem que te admiram.
- Mas como ousa… — Harley levantou a mão para bater em Barbara, mas foi impedida por outra mão
- Chega de confusão, vocês duas. — A voz de Helena Bertinelli era calma, mas dura
- Fica fora disso, Hel! — Harley replicou zombando, irada
- Não… Não, ela tem razão. — Barbara se afastou — Obrigada.
- Eu só não quero dor de cabeça, e vocês duas já me causaram muita. — Ela soltou Harley, seu olhar apático congelando a espinha das duas — Se comportem, e vejam se me deixem sozinha.
- Tá bom… Ai. — Harley esfregou o pulso, que latejava com a força que Helena havia empregado para pará-la. Ela seguiu seu caminho, quieta.
- Valeu mesmo, Helena. — Dick finalmente se manifestou, no meio da situação toda
- Por nada, Richard. Com licença… — Ela continuou caminhando, como se nada tivesse acontecido.
- Salva pelo gongo, hein Babs.
- Ou por uma Bertinelli de saco cheio de mim, no caso.
Helena Bertinelli era uma daquelas que estava na Academia Gotham porque a família dela tinha o dinheiro para isso. O pai tinha fama muito além de ser um “empresário” bem sucedido da cidade, mas a polícia nunca conseguiu prender ele por nada definitivamente incriminador, então lá continuava os Bertinellis com o bolso cheio de dinheiro. Apesar de tudo, Barbara ainda respeitava o espaço de Helena, ela sabia como poderia ser a vida de alguém com uma família instável e atarefada, ainda mais depois do que aconteceu nos últimos dias com seus pais, então ela procurava olhar para a colega com olhos mais humanos dos que ela tem para Harley. Depois de passar mais algum tempo com Dick, eles seguiram suas rotinas escolares e combinaram seu encontro na entrada mais tarde.
Mas é claro que todo esse tempo estudando passou como um piscar de olhos para ela, aquele dia, mais do que em qualquer outro, era um que tirava a atenção da jovem de outras coisas. Os pensamentos sempre nebulosos com seu pai, a quem ela só iria rever no final de semana como de costume, e com seja lá o que Dick estava aprontando para ela. As possibilidades sempre deixavam sua mente fumegando, mas algo que acabou chamando a atenção dela, eventualmente, era a possibilidade de ver o Batman. Uma ideia, um plano surgiu, tecido pelas maquinações hiperativas de sua jovem mente, mas ela não sabia se poderia pô-lo em prática, a não ser que o momento correto chegasse, e isso estava a cargo do tempo dizer. Quando o horário de estudos havia terminado, o período de recreação estava instaurado, os dois correram para pegar um táxi, queriam alcançar as docas e investigar a suposta entrada das catacumbas antes do toque de recolher, o que era uma das desvantagens de se estudar em um internato.
Foi às beiras da costa que os dois se encontravam, tentando se esgueirar por qualquer paredão íngreme o suficiente para ser uma possível passagem para o subterrâneo. Ambos se divertiram muito na movimentação, e Dick pode exibir sua expertise como ginasta para a amiga, e ela sempre se revirava com a necessidade que ele tinha de exibir suas habilidades como acrobata sempre que possível.
- Você não precisa mostrar o tempo todo as juntas flexíveis que você tem… Ou a falta delas…
- O que foi? — Dick deu uma breve risada brincalhona e colocou a mão esquerda em volta do ouvido, estava curtindo o momento
- Nada, querido. — Barbara mostrou a língua para Dick, o sorriso dele de orelha a orelha com o elogio da amiga, do qual ele sempre tirava vantagem
- Foi o que eu pensei.
- Ta entardecendo… — Ela fitava o horizonte do porto, o pôr do sol em Gotham era vermelho, o céu era muito poluído e a coloração era, ao mesmo tempo, bonita e aterradora
- Vermelho sempre foi uma das minhas cores favoritas — Dick ressaltou, parando de se movimentar entre a pedreira para também admirar o evento
- Sabe… Eu sei exatamente porque o céu é vermelho nessa hora do dia, eu deveria ficar… Revoltada, eu acho.
- Mas você não fica?
- Não completamente… Digo, me traz um conforto estranho. Eu nasci e cresci aqui, não é de se admirar.
- Falando em coisas pra se admirar… Vem cá.
Os dois se aproximaram de uma deformação estranha naquele parapeito de pedra no porto. Se entreolharam por alguns segundos e começaram a tatear a superfície, procurando por qualquer pista que pudesse os levar para a tão falada passagem. A que descobriu o segredo foi a própria Barbara. Ao deslizar uma de suas mãos em uma abertura, ela chamou o parceiro para perto, e juntos, eles tentaram mover uma das pedras da parede. Demandou de muita força até que ocorresse um deslize, e uma grande pedra se deslocou para fora do encaixe na parede. Eles tomaram um momento para respirar e avaliar o que tinham acabado de fazer. Os dois se posicionaram, Barbara empurrava a pedra de um lado enquanto Dick puxava do outro, e não demorou muito para que o esforço dos dois desse resultado.
A pedra deslizou, quase rolando por cima de Dick, que teve de se jogar na água para não ser atingido. Ela caiu a pouco mais de um metro da onde Barbara estava, mas a garota só reagiu ao amigo que se acidentou, gritando para ver se ele estava bem. Depois que recebeu a resposta ao ver ele nadar para a costa, ela se virou para onde a abertura da pedreira. Uma abertura muito sombria, quase como se tudo o que ela pudesse ver deixasse de existir a alguns centímetros na frente dela, a passagem realmente era real! Ao observar a escuridão, ponderou se o melhor a se fazer era esperar o amigo, ou tomar coragem para entrar no desconhecido por ela mesma. Estava realmente curiosa por saber se podia encontrar alguma estrutura lá dentro, alguma catacumba real ou só uma caverna.
- Babs?! — Dick gritou, ainda tentando secar a roupa
- Oi?! — A voz dela ecoou para dentro da passagem, um eco longo e profundo
- Tá tudo bem?!
- Eu…! — Ela acabou perdendo as palavras, a escuridão parecia muito movimentada pro gosto dela
Sons de bater de asas ecoavam dentro da passagem noturna, e ela não conseguia ter nenhuma reação a não ser esperar, seus olhos transfixados pela descoberta e pelo desconhecido. Dick acabou percebendo o olhar dela, algo que nunca realmente resultava em boa coisa, e então ele tentou correr para alcançá-la. Quando finalmente se aproximava de Barbara, algo saiu da passagem. Não só uma coisa, mas várias. Toda uma colônia de morcegos enfurecidos, despertados pela voz de Barbara, voando para fora da abertura, como uma massa disforme de trevas, uma gestalt de criaturas noturnas que engoliram a jovem Gordon, que ainda se encontrava estática no meio delas. Grayson não sabia o que fazer, e tomou alguns segundos até realmente pensar em qual ação tomar, correndo de volta para suas bolsas, e rapidamente puxando um sinalizador dentro dos itens que eles trouxeram.
Suas roupas ainda estavam úmidas, e toda essa correria piorava a situação, seu corpo muito frio, ele tremia muito enquanto tentava não tropeçar no meio do trajeto. Ao estar perto da nuvem de roedores, ele acendeu o sinalizador, e se jogou para dentro, começando a dispersar o tumulto. Não demorou muito para que eles começassem a voar de volta para dentro da caverna, revelando a figura de Barbara novamente, em uma situação que Dick não imaginava. Ela estava parada, estática no mesmo lugar, o capuz da blusa que estava vestindo levantado, seus dedos estendidos, fazendo movimentos suaves com o vento. Ele colocou a mão no ombro dela, esperando uma reação, mas ela continuava silenciosa enquanto os últimos morcegos voavam por entre seus braços.
- Barbara? — Ele sussurrou
- … Sim? — Ela finalmente virou a cabeça para ele, ainda de costas para o amigo. Dick nunca havia a visto tão calma e sequer parada.
- Você…?
- Eu não me machuquei. É só ficar parada.
- Tudo bem. Você quer ajuda? — Dick se aproximou, mas ela tirou a mão dele do ombro e se afastou
- Não. Vamos continuar?
- Na verdade, tá ficando tarde, a gente devia voltar. Na verdade, a gente devia passar na casa dos meus pais antes e pegar uma troca de roupas secas pra ninguém perceber lá na academia.
- Oh… Sim. — Ela lembrou do que havia tramado, retirando seu capuz e volta à postura de sempre — Vem comigo.
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