Já era uma escura noite do outro dia. Barbara escalava as escadarias laterais de um prédio na Velha Gotham. De fato, um que ficava de frente ao que ela e seu pai moravam. Ele já devia ter acabado de chegar do serviço, era o final de um ciclo de 48 horas de serviço constante, ele estava se preparando para finalmente dormir. Barbara usava uma jaqueta preta com leggings, e pra finalizar, uma máscara que Dick teve a gentileza de arranjar, uma máscara improvisada de morcego, é claro. Apesar dela achar as orelhas um pouco demais, ela fazia a função de esconder a identidade de Barbara e chamar a atenção de um certo alguém.
Ela armou o cabo de vassoura que tinha encontrado em um dos tambores de lixo numa posição que parecesse uma sniper, e ficou em posição, apenas esperando. Podia ver seu pai na janela do outro lado. Ele parecia muito cansado, estava procurando algo na geladeira no momento que ela começou sua vigília, imaginava como havia sido o dia de trabalho. Às vezes, ela não parava pra pensar no tipo de rotina que seu pai tinha. Quais eram os trabalhos e os desafios de um importante delegado de polícia, quais provações que ele tinha que enfrentar e não contava pra ela. Se lembrava de dias que ele chegava em casa com um semblante sombrio, de dias que havia visto coisas que ele se recusava a compartilhar com a família pela maneira que elas haviam o afetado.
A vida naquela cidade nunca era fácil, pra ninguém que já viveu lá. Os noticiários sempre relatavam algum crime violento ou algum tipo de assalto e latrocínio. Programas infantis eram seguidos de plantões urgentes falando de execuções em escolas públicas, nem mesmo as crianças eram poupadas dessa realidade, sejam em suas casas ou nas escolas. Barbara gostava de pensar que isso moldava caráter de alguma maneira, que isso tornava a força e a personalidade das pessoas mais definidas e rígidas, mas a verdade é que isso só causa sofrimento, angústia e ira. Foram em meio a estes pensamentos divagantes que ela, de repente, viu um vulto no topo do prédio de sua casa.
Foi bem rápido, mas chamou a atenção dela. Ela procurou focar sua visão para identificar algo, até que… Foi rápido demais, um morcego veio voando em sua direção e atingiu seu cabo de vassoura. Bom, foi o que ela percebeu inicialmente, até ver o resultado logo após. O tal “morcego” era algum tipo de arma que cravou perto do rosto dela, fatiando o cabo de vassoura ao meio, um dos pedaços despencou prédio abaixo. O susto momentâneo deu lugar à dúvida, aquilo era… Uma espécie de lâmina. Uma lâmina num formato de morcego, numa curvatura estranha, seria um bumerangue? Seus pensamentos não tiveram tempo de se ajustar, pois uma voz pesada e sombria vinha de trás dela.
- Você não é um assassino de aluguel… — Soou, tranquila e devastadora ao mesmo tempo
- Você… — Barbara se virou para encarar a alta e imponente figura preta, um manto escuro cobrindo todo o seu corpo, uma máscara preta ocultando toda a face de um ser de olhos brancos e com orelhas de morcego. Ela estava sem ar, e sussurrou — Batman…!
- O que você está fazendo, garota? Saia daqui.
- Eu sempre quis conhecer você.
- Eu disse para sair, você está correndo perigo — Sua voz era exigente, mas tinha um claro tom de preocupação
- Não não, você não entendeu…
- Agora! — Ele se virou para ir, mas parou em meio aos passos quando ouviu o que Barbara disse
- Fui que coloquei aquele anúncio na Dark Web! É… Fui eu, eu precisava fazer aquilo.
- Porque…? — Batman se virou para encará-la
- Pra falar com você, é claro. — Ela apontou para a máscara, e ele finalmente percebeu como ela estava trajada — É muito bom saber que você é real…
- Você está jogando um jogo muito perigoso, garota, você não faz ideia.
- Ah, mas eu faço, Batman. Eu preciso te avisar de uma coisa, um problema…
- Não aceito missões de civis.
- É um problema real! Pessoas podem morrer! A polícia não vai acreditar em mim, eu preciso de você! — Ele permaneceu em silêncio, os olhos semicerrados — Existe algum tipo de terrorista na Torre do Relógio, ele planeja um ataque à rota de transporte das Indústrias Stagg, mas tem muito mais envolvido do que eu sei, tem algum planejamento nefasto que vai afetar a cidade toda. Você precisa investigar e parar ele, eu não sei o nome mas sei o codinome: Rei Relógio.
- Eu investiguei relatos de contrabando de explosivos na Torre do Relógio a alguns dias atrás. Posso garantir que não achei nada além de relógios desmontados por lá. A senhorita devia voltar para casa e deixar com que eu lide com essas coisas, criar especulações em cima de aparições prévias minhas não é saudável nem seguro para você. — Batman respondeu, resoluto
- Mas é verdade! Eu vi ele, eu monitorei as atividades e comunicações, pelo amor de Deus, ele quase me matou!
- É comum atividades de crime organizado em instalações abandonadas.
- Você precisa acreditar em mim! — Ela se levantou, tentando se aproximar no justiceiro
- Não. Se. Aproxime. Você é apenas uma criança, volte para casa, deve haver alguém que precisa e se preocupa com você.
- Mas…
Batman saltou do prédio, na borda oposta da de Barbara. Ela correu para ver o vigilante em ação, mas ele havia sumido pela noite. Barbara estava desolada, não sabia o que fazer, Batman não acreditou nas palavras dela, a polícia sozinha não ia acreditar e muito menos dar conta da situação sozinhos. Ela retornou para a Academia se sentindo derrotada, o que ela poderia fazer agora? Quais as opções que ela teria para enfrentar um terrorista sozinha. O destino de Gotham estava na balança, e apenas Barbara Gordon II sabia disso, mas ela estava desamparada para ajudar. Ou é isso que ela pensou até aquele momento. Se aproximou do estranho bumerangue que Batman havia deixado para trás. Havia algo de mais humano do que sobrenatural naquela figura… Se o protetor silencioso de Gotham era mais homem do que morcego, então ela também poderia fazer alguma diferença.
Talvez Barbara Gordon fosse tudo do que Gotham precisava, talvez, e apenas talvez, ela tivesse tudo o que precisava para derrotar o Rei Relógio. Afinal, foi ela que se infiltrou na Torre, foi ela que localizou o Batman e foi ela que teve a coragem e a determinação para ir atrás daquilo tudo sozinha. Se tem algo que ela havia aprendido vivendo naquela cidade, e vendo o seu herói agir, é que a persistência e a determinação podem ajudar as pessoas a realizarem maravilhas. E talvez aquele fosse seu momento de brilhar, talvez… Fosse o momento de Barbara descobrir quem ela realmente é, sem pai, sem mãe, sem amigos, apenas ela.
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