Em meio as risadas, percebi que Uryu e Aki agiam de forma meio estranha. Quando olhei para o lado, também avistei que Kronus voltava a ser mais sério.
– Algum problema pessoal? Vocês parecem estranhos...
Eles se encaravam e acenavam com a cabeça. Uryu puxava uma flecha de sua aljava, Kronus terminando de polir seu machado, o segurava com sua mão direita. Todos pareciam preparados, como se alguma ameaça estivesse por vir.
Aquela curiosidade me agoniava, até que Aki, enfim, quebra o silêncio.
– Nós já percebemos que tem gente no meio desse mato. É melhor mostrarem a cara, senão eu vou tacar fogo nessa merda toda! – O ruivo parecia falar de maneira agressiva aos ventos, eu não percebia ninguém a minha volta que não fossem os três meninos.
Após as ameaças, finalmente, algumas entidades surgiam de dentro da escuridão da noite. Estávamos cercados. Cinco pessoas vestidas em trajes escuros saíram da mata. As roupas eram de pano e couro, similares aos itens de Salteadores. Devem ser versões de nível mais alto.
Aki me puxou para atrás dele. Kronus e Uryu também levantaram preparando as armas. Os três formando um círculo ao meu redor.
– Ora, ora, ora, o que temos aqui... – Um dos jogadores deu um passo à frente. O aparente líder do grupo. A armadura dele era mais detalhada. Duas cimitarras de aparência sinistra balançando no quadril. O nome Viper flutuava ao lado da cabeça dele, junto do nível 60 e alguns outros detalhes. – Quatro peixinhos perdidos. É perigoso andar por aqui a noite, sabe? Zona de PvP e coisa e tal...
– É, realmente... – Aki assentiu. – Ouvi dizer que tem um bando de esquisitões andando por aí pilhando outros players. O sorriso de vendedor do Salteador vacilou por um momento.
– Isso foi cruel. Nós somos apenas um grupo de negociantes. Por exemplo... – ele pausou sua sentença. Sacando cimitarras gêmeas, os dois jogadores a direita e esquerda dele também sacaram suas armas. O da direita empunhava uma espada curta. O outro trazia consigo um enorme porrete. O som de mais armas indicou que os outros dois tinham feito o mesmo, assim como meus companheiros. – Vocês me dão todos os seus itens e a gente te dá o presente de não surrar vocês por eles. Um ótimo negócio, não?
– ... Cara, essa foi a coisa mais edgy que eu ouvi o dia inteiro. – Aki se manifestou. – Frase típica de filme de adolescente.
Silêncio desceu sobre o acampamento. Eu percebi os capangas olhando meio apreensivos para o líder deles, cujo sorriso oficialmente tinha quebrado.
– Olha, estávamos tendo uma conversa bem maneira antes de vocês chegarem, será que dá pra vocês só irem embora antes que a coisa fique feia? – Aki avisou, mais sério que o normal. A espada dele brilhou levemente, vermelha como fogo. O olhar do líder passou pelos membros do grupo até pousar em mim. Eu fiz o melhor que pude para fazer uma pose de luta tentando parecer tão valente quanto Aki. Ao julgar, pelo sorriso de Viper, não funcionou muito bem.
– Vocês são bem confiantes, hein? Pra um bando de níveis 25... Limpem el–... Um flash piscou na minha visão periférica. Eu me virei por reflexo e o que eu vi foi o jogador à nossa direita desmoronando ao chão, balestra caída ao lado do corpo, uma das flechas de Uryu cravada entre os olhos. Viper deu um passo para trás, Medo e surpresa piscaram nos olhos do ladino líder.
Uryu calmamente ajeitou os óculos. Em nenhum momento ele havia tirado o olhar do líder.
– Menos um. Restam quatro. – Sua fala era séria e mais serena que esta noite.
– Quer dizer, dois! – Kronus correu igualmente a uma biga romana de encontro ao jogador com o porrete. Ele o agarrou pela perna em pleno ar e o jogou contra outro jogador mais distante, e em seguida foi atrás deles. Aki envolveu a espada em chamas.
– Eu cuido do tiozinho. Uryu, nos dê cobertura. – O Arqueiro apenas assentiu, não parecendo muito tenso. E eu conseguia ver o porquê.
Kronus facilmente segurava aqueles dois jogadores. E eu não duvidava que ele pudesse encarar uns quatro de uma vez. O jogador do porrete tentou atacá-lo, e Kronus o agarrou pelo braço e, para minha surpresa, usou o próprio jogador como arma para bater no outro. E Aki também não parecia estar com muita dificuldade. Ele e Viper dançavam um balé mortal, o ruivo claramente estava ditando a batida.
As cimitarras gêmeas do ladino dançavam e dilaceraram o ar, sempre próximas, porém nunca acertando o alvo. Os gritos da luta vinham quase exclusivamente da frustração do salteador. Todos os oponentes já estavam praticamente derrotados, alguns apenas inconscientes e outros haviam perdido seus personagens, pois não foram capazes de aguentar o dano massivo do pequeno bárbaro.
Os quatro jogadores estavam derrotados, mas espere... Não havia mais um?! Uryu e eu viramos para o lado. O último jogador inimigo, o com a espada curta, também estava observando a luta. E quando enfim notou nós dois olhando, rapidamente ergueu a espada para lutar.
– E-eu não tenho medo de vocês! – A espada dele brilhou esverdeada com o poder de alguma habilidade. Ele se posicionou numa posição de estocada, preparando-se para atacar. E no momento seguinte foi jogado para trás com uma flecha na cabeça. Os dois últimos capangas foram logo depois.
Eu não sei se Kronus planejou ou não, mas enquanto ele usava o jogador do tacape de arma, o último golpe no quarto capanga acabou com a vida dos dois. Os avatares explodiram juntos numa nuvenzinha de brilho e pixels.
– Isso! Eu adoro quando é sincronizado. – O Bárbaro gritou entusiasmado. Um grito mais alto roubou a nossa atenção. Eu me virei a tempo de ver o líder ladino cair sentado e a cimitarra se cravar no chão a alguns metros deles. A espada gêmea não estava em nenhum lugar a vista. Ou Aki jogou para outro lugar, ou havia quebrado no combate.
– ... Como? COMO? Isso não faz sentido! Como um jogador nível 25 pode ser tão forte?
Viper não conseguia entender a diferença de poder, seu nível era praticamente mais que o dobro dos três garotos. Quando olhei para os meninos buscando entender se eles o responderiam de forma clara, percebo que eles sorriam orgulhosos.
– Né que essa função de esconder o level realmente é útil, Uryu? – O Cavaleiro Flamejante colocava sua espada apoiada nos ombros numa demonstração de relaxamento.
– Eu falei pra você. – O Arqueiro ajeitava seus óculos de forma confiante, parecendo ter tido sucesso em algum plano.
Eu não entendia o que estava acontecendo, até observar as expressões de Viper e perceber que seus olhos eram de puro pavor. Anteriormente ele demonstrava um medo mesclado com confusão, mas agora seu rosto apenas era o pânico de ter presenciado uma entidade acima do real.
Minha confusão parecia ainda maior, por que jogadores de nível tão baixo causavam tanto medo há um jogador tão mais poderosos?
– E-essa... E-essa estrela... É, é... – O Líder dos Salteadores gaguejava palavras sem sentido. Que estrela ele tanto estava falando?
– Pois é, só percebeu agora não é? Andar com essa configuração desligada é ótimo pra pegar alguns PK's de surpresa. – Aki olhava bem fundo nos olhos do salteador, ele se sentia apavorado. Quando Aki falou sobre uma configuração, pensei que a resposta para minhas dúvidas estariam nos Registros de Jogador.
Foi então que ao abrir o menu e verificar as informações de meus novos colegas, percebi que havia uma estrela em baixo de seus nomes com a insígnia representada pelo número 1. Ao clicar naquela opção, recebi as seguintes informações em meu visor
"Cavaleiro Juramentado do Fogo Prestígio 1, Nível 25", "Arqueiro Arcano Prestígio 1, Nível 23", "Bárbaro Prestígio 1, Nível 22".
– Prestígio... Um? – Era uma função nova para mim. Nenhum de meus colegas possuía aquela estrela e pelas reações de Viper, aquilo definia algo muito importante.
Aki se aproximava em passos lentos do Líder, enquanto ele rastejava no chão em busca de escapar do perigo eminente.
– Por favor, eu te imploro, não me mate! Eu sou apenas um cara querendo jogar pra me divertir, eu não sabia que vocês eram jogadores de nível máximo! – Ele implorava em lágrimas, Aki o olhava com o mais puro desgosto que seus olhos poderiam declarar.
– Jogadores de Nível máximo?! – Falei para mim mesma. O choque em minha mente era explícito, então esse tempo todo, esses meninos eram jogadores de nível máximo? Por isso eles eram tão despreocupados, por isso não estavam com medo e por isso parecem tão fortes!
– Sabe, eu não tenho nada contra em jogar pra se divertir, acho que é pra isso que um jogo serve, mas... – Ele suspirava, ativando o fogo de sua espada, seus olhos conseguiam ser mais vermelhos que o próprio fogo. – Eu odeio jogadores que estragam a diversão de outros.
Aki gira sua espada no ar, invocando seu familiar, uma pantera-negra flamejante. Ela engole Viper nas chamas, fazendo-o gritar de pavor e desespero. Mesmo sendo um jogo, toda a imersão fazia daquilo algo muito real e assustador para qualquer um que presencia-se.
As chamas se apagavam e apenas pixels restavam quando o corpo de Viper havia sido brutalmente consumido.
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