Os Doze Celestiais de Taisui estavam reunidos na Câmara Zodiacal para uma cerimônia: um deles iria descender até o Reino Mortal em meia hora.
Na verdade, eram Treze Celestiais. A novidade que ainda não havia se espalhado entre os humanos era que o Celestial Gato havia sido convidado pelo Imperador de Jade para se juntar ao zodíaco.
Havia um impasse sobre quem deveria partir daquela vez. O Celestial Gato achava auspicioso partir para uma Provação ao assumir seu lugar na Câmara Zodiacal, mas outros imortais o julgavam novo demais para aumentar seus méritos cósmicos e fortalecer sua constelação, que mal brilhava à noite. "Por que esse moleque que mal se provou no mundo comum ascendeu mesmo?", alguns pensamentos desse tipo eram frequentes; todos duvidando, em segredo, da capacidade do Imperador de Jade de retomar o cargo do Gato no céu de Taisui.
Os então Treze Celestiais formavam um círculo na Câmara, e a recém ocupada décima terceira posição do Gato foi posta ao lado da cabine do Celestial Javali. A única vazia. Eles estavam distantes um dos outros, cobertos por um véu translúcido com o ideograma representando seus animais. Por trás da cortina, era possível ver a silhueta de cada um. Aquelas cerimônias costumavam ter galinhas voando e cachorros pulando. Ninguém aguentava ficar sentado por muito tempo, preferindo debater no centro do círculo, onde uma plataforma de pedras ocultava o redemoinho que servia como portal para outras dimensões.
O Celestial Rato era totalmente contra à presença do Gato na Câmara e quase não compareceu ao evento por isso. Era visível como os dois eram incompatíveis e jamais se dariam bem outra vez. Alguma hora, isso traria problemas.
A Celestial Tigre, por outro lado, era muito próxima do Gato, antes mesmo de ele se tornar um Celestial da Câmara. Ambos cobriam os olhos com um tapa-olho, em lados opostos, o que era uma mera e engraçada coincidência – por mais que o Gato gostasse de brincar dizendo que se inspirou naquela charmosa mulher para deixar sua aparência excêntrica. Uma mentira.
— Ouvi dizer que a venerável Celestial Tigre acabou de retornar de sua Provação — o Gato disse, se movimentando de forma bastante confortável com o espetáculo. — Por favor, me diga como foi. A Provação me parece muito mais divertida que qualquer uma das coisas habituais do Reino Imortal.
— É divertido! Sempre acabo indo para perto do mar em aventuras que quase me matam. Estou pronta para partir para mais uma — ela anunciou, cheia de energia. — Hum? O que acham? Se ninguém quiser...
— Outro imortal deve ir. Essa é a regra.
O mais velho deles, o Celestial Dragão, só fez aquele comentário e voltou a se calar. Mantinha os braços cruzados o tempo todo, observando a conversa paralela — naturalmente, alguns queriam se provar para aumentar seu poder, enquanto outros se mantinham quietos, tornando-se sombras em meio à discussão.
O correto seria o Celestial Dragão ter dito "via de regra", pois já acontecera duas Provações seguidas de um mesmo Celestial antes. O resultado disso era que a Celestial Serpente era a mais forte dentre todos atualmente. Seu poder marcial era imensurável e sua constelação brilhava como nenhuma antes. Se ela descesse ao mundo humano para outra Provação, não havia ninguém que apostaria em sua falha, por mais difícil que o desafio fosse.
Exceto por...
— Mesmo? É uma regra? Por que a Celestial Serpente finge que ela não existe? — O Celestial Macaco pousou a mão na cintura, arriscando um olhar para a figura da mulher do outro lado do salão. A face dela era inabalável, sem dizer uma única palavra. — Se acha melhor que todo mundo. Nojenta.
— Ei, Celestial Macaco, quer um conselho?
— Não.
Mas o Celestial Cachorro já estava dizendo antes de ouvir a voz desgostosa:
— Eita! Veja, não subestime o poder das palavras, você ascendeu há pouco tempo, ainda está aprendendo como as coisas funcionam. Quando eu cheguei, a Celestial Serpente já me dava arrepios. Eu disse para ela que ela não mandava em mim. Ha-ha... — Ele tossiu em meio à risada. — Ugh, nem pergunte o que aconteceu depois. Além do mais, tenha mais respeito pela sua mãe!
Esse comentário fez o Celestial Macaco, muito mais baixo do que o Celestial Cachorro, trincar os dentes.
— O que você disse, seu cão desdentado? Minha o quê?
O Celestial Cachorro não tinha medo de nada nem ninguém — pelo menos, não que deixasse transparecer. Quando o Celestial Macaco lançou aquele olhar frio e fulminante, o homem deu risada. Era um imortal de Taisui, ninguém podia derrotá-lo!
— Qual é? Vocês são tão parecidos! Além do mais, em uma das Provações dela, a Serpente teve um filho, certo? Não era vo-...
Suas bochechas foram seguradas bruscamente, amassando a pele. O Celestial Macaco não poupou força para puxar o rosto do Celestial Cachorro para perto. Como o Celestial Cachorro era muito mais alto, foi obrigado a se inclinar completamente.
— Somente alguém tão estúpido quanto você para falar isso — disse o Celestial Macaco, enojado. — É uma pena que o Imperador de Jade não permite que matemos uns aos outros. O prazer que eu teria de te cortar em pedacinhos e jogar ao Reino Mortal...
— Já sei! — As palavras grogues vieram de um ponto distante. A pessoa segurava uma garrafa quase vazia, mas suas bochechas nem estavam coradas. — Por que vocês dois não fazem uma Provação juntos? Seria divertidíssimo de assistir! Hehe.
O Celestial Macaco ainda apertava as bochechas do grandão, mas soltou tão bruscamente como quando agarrou, estalando a língua.
— Boa, Celestial Cavalo! Vamos juntos para uma Provação, Celestial Macaco! Você pode saciar essa sua vontade. Quem sabe o destino da Provação não seja você me matar?
— Felizmente, não estou interessado em ir dessa vez. Muito menos iria com um inútil feito você.
— Dois Celestiais não podem fazer a Provação juntos. — O Celestial Dragão pontuou por cima. Ao contrário do Celestial Cavalo, este tomou um gole curto de sua xícara de chá. Mesmo de olhos fechados, era como se estivesse olhando para alguém especificamente ao seu lado. — Que fedor. Também não podemos trazer bebidas alcoólicas para a Corte Marcial, Celestial Cavalo...
— Não podemos?! — o Celestial Cavalo exclamou, abrindo a boca em um "o" indignado. Depois, escondeu a garrafa nas costas. Ela desapareceu e o Celestial deixou seu posto para se aproximar do Dragão, dando tapinhas amigáveis nas costas dele, fazendo cena. — Quem ousaria trazer bebida à Corte Marcial, não é? Pfft. Só um bêbado sem amor à vida!
— Celestial Cavalo, você é um bêbado sem amor à vida... — disse o Celestial Boi, a expressão neutra, sem ter entendido a ironia nas ações do Celestial Cavalo. Seu senso de humor era realmente algo à parte, levava tudo para o lado literal e contava as melhores piadas.
— Como é? Você acha que eu, o Celestial Cavalo, sou um bêbado sem amor à vida? Bem, você é um piadista sem talento e deveria seguir mais o exemplo do Celestial Javali nos estudos. Hum... e deveria apreciar mais o aroma do vinho das centelhas douradas. Oh, falando nele, veja só quem chegou! Achamos que não apareceria, Celestial Javali. É muito bom tê-lo aqui conosco! — O Celestial Cavalo era o que sempre saudava a todos que chegavam, sua educação e bom humor ajudavam a manter o ambiente o mais leve possível.
O Celestial Javali olhou para todos com desdém, como se estivesse diante de um bando de idiotas.
— Não me digam que vocês ainda não decidiram quem vai.
A Celestial Cabra se aproximou sorrindo, sem se sentir intimidada pelo olhar duro do Javali.
— Você não tem interesse em ir? Você nunca foi...
— Não tenho necessidade de ter minha Provação agora. — Ele cruzou os braços. — Prefiro estudar e obter bastante conhecimento, para não correr o risco de falhar.
Todos na sala estremeceram. O medo de falhar em uma Provação era um dos sentimentos mais palpáveis entre os Celestiais, mas que ninguém ousava falar em voz alta, como se trouxesse mau agouro.
As Provações eram parecidas com as reencarnações humanas. Eles desceriam ao Reino Mortal com toda a vida planejada, mas se esqueceriam de tudo assim que abrissem os olhos. A diferença era que, se humanos falhassem, voltariam para a roda do Samsara e fariam tudo outra vez, até que seus erros fossem extirpados e eles alcançassem a plena evolução.
Os Celestiais não tinham essa sorte. O Imperador de Jade era severo com as suas existências. Eles já eram divinos, suas performances deveriam ser mais do que excelentes. Um único erro, um passo fora da linha, e suas almas poderiam perder sua centelha celestial.
— Mas a graça é justamente essa! — Riu o Celestial Cachorro, dando uma cotovelada nas costelas do Javali, que fechou ainda mais a cara. — O que é a vida sem nenhum desafio? Fica muito chato!
O Celestial Javali o olhou de cima a baixo.
— Faça o que preferir da sua existência, eu não me importo. A minha eu vou conduzir do jeito que achar mais adequado.
— Não adianta, Celestial Cachorro. Ele se acha superior a todos nós, mesmo no fundo sendo um maldito covarde. — A voz da Celestial Galinha ressoou por todo o ambiente.
— Se você acha que se preparar melhor é covardia... — O Javali deu de ombros, virando os pés e voltando para onde tinha vindo, nem se prestando à sentar-se com os outros, aquele antissocial. Antes de ir, parou na porta: — Eu só acho que, se formos falar de covardia, quem teria que ir é o Celestial Coelho. Já está mais do que na hora dele superar seus traumas e seguir em frente.
E saiu da Câmara. Todos os olhares se direcionaram para o Celestial Coelho, que estava sentado quieto num canto, sem se pronunciar até então.
— Como ele ousa julgar alguém se ele mesmo nunca nem tentou? — A Celestial Galinha grunhiu indignada. — Se o Celestial Coelho voltou traumatizado é porque pelo menos ele se arriscou, ao contrário de você! — Ela correu até a porta e gritou, mesmo que o Celestial Javali já tivesse ido embora.
— Celestial Galinha, não se preocupe... Ele está certo — O Celestial Coelho falou, pela primeira vez. — Não posso mais ficar aqui me escondendo, tenho que continuar minha jornada. — Olhou para todos ao redor e se curvou, levando os braços para frente. — Eu gostaria de assumir essa Provação, se todos concordarem.
— Você não precisa ir se não estiver preparado ainda, não deixe que aquele porco desgraçado mexa com sua cabeça.
— A Celestial Galinha tem razão — o Celestial Dragão reiterou educadamente, ainda bebendo chá.
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