A última provação do Celestial Coelho havia reunido todo azar em uma existência precária. Era verdade que aquele Celestial tinha o poder de dar dádivas ou azarações, mas a consequência para tal habilidade era uma lâmina afiada dos dois lados. O Coelho se cortou na Provação passada quando descendeu, e sua existência foi resumida em arruinar tudo que tocava. Foi realmente difícil de assistir enquanto ele seguia exatamente o que era dito no Livro do Destino.
Suas vidas nos planos mortais não era segredo; mas eles se esqueciam dos pontos importantes que deveriam ser seguidos meticulosamente durante a Provação — sejam eles bons ou ruins. Esse era o desafio. Cumprir os pontos da Provação sem vacilar, sem serem impedidos por humanos, tentações ou espíritos famintos. Não poderia haver desvios e nem sabotagem, por isso outros Celestiais eram proibidos de intervir na Provação um do outro.
A forma da morte também era igualmente importante. Se estava escrito que iria morrer afogado e morresse de fome...
Isso era considerado uma falha na Provação.
Caso conseguissem cumprir, eles ganhavam um mérito e acumulavam mais energia espiritual celestial. A imortalidade continuava, e as veias de cultivo eram fortalecidas, pois teria se provado digno de continuar ocupando sua posição.
Além do mais, aquela existência em Taisui era tediosa. Talvez fosse por isso que o Imperador de Jade tivesse criado o Livro do Destino e suas Provações.
Quem não tinha coragem de ir, ficava cada vez mais para trás, enfraquecido e limitado a não experimentar os anseios de uma vida (quase) mortal. Tempo em excesso sem se arriscar significava a perda de crentes de suas constelações no Reino Mortal. Quanto mais perdiam, mais fracos ficavam, correndo o risco de serem descartados da Câmara Zodiacal. Fazer a Provação e falhar era ainda pior, porque você desaparecia, era substituído por outro imortal — exatamente o que havia acontecido com o antigo Celestial Macaco.
Então qual era o lado bom de ser um celestial da Câmara Zodiacal?
O Imperador de Jade prometera a realização de um desejo para quem cumprisse as missões com excelência. Cada uma daquelas treze pessoas tinha suas próprias ambições para se empenharem. Por isso a Celestial Serpente era a mais poderosa — enquanto todos tinham cerca de uma ou duas habilidades únicas, ela possuía três.
— Ele vai mesmo — assobiou o Celestial Macaco, com o sorriso cínico no rosto, ao observar o Celestial Coelho se levantando, e vagarosamente indo até a Espiral que interligava os mundos.
Com o Celestial Coelho liderando, todos se aproximaram do redemoinho que não dava trégua em sua agitação. Suas águas eram tempestuosas ao redor do olho no centro da espiral, por onde apenas os seres aquáticos gigantes, como ilusões em uma tela, eram capazes de escapar. Digno do maior portal entre o Reino Imortal, era por ali que os Celestiais mergulhavam para vivenciarem suas Provações.
Havia aqueles clãs que os cultuavam, mas também havia dimensões nada prósperas, que nem sabiam de suas existências. Era aleatório. Essa informação não vinha escrita no Livro do Destino. O que era desesperador, pois isso influenciava diretamente no nível de dificuldade da Provação.
O portal abaixo de seus pés estava próximo de uma plataforma flutuante que continha o pergaminho chamado de Livro do Destino. O voluntário deveria ir até lá e repousar a mão sobre o papel para ativar suas escritas sobre que tipo de vida o Celestial levaria. Saber sobre a vida aliviava um pouco a pressão, mas de nada importava. Assim que renascesse, o Celestial iria se esquecer de tudo. Quer dizer, doze deles se esqueceriam totalmente.
Essa era a vantagem do Celestial Coelho: suas visões.
O Celestial Coelho tinha visões que brincavam com a linha temporal, resgatando momentos do passado ou do futuro. Isso iria ajudá-lo quando nascesse no Reino Mortal, pois os poderes eram vinculados ao seu Núcleo. Em algumas dimensões, havia a Sinalização Celestial, na qual astrólogos analisavam o mapa astral de uma criança que completava oito anos de idade para verificar o desenho formado pelas estrelas, casas e signos. Se houvesse uma posição de alinhamento muito específica entre todos os planetas, demarcava a presença de um Celestial e então ele assumiria uma posição de poder e sua família ganharia prestígio. Mas era muita sorte ir para uma dessas dimensões.
O Celestial Coelho voou com um pulo até a plataforma e esticou a mão em cima do pergaminho. Respirou fundo, buscando os resquícios de coragem em seu interior, e tocou na superfície áspera que definiria seu destino.
Sua visão nublou e a mente foi atingida por imagens que o perfuravam como flechas. Tudo o que aconteceria na próxima vida – suas tristezas, alegrias e superações... não tinha mais como voltar atrás. Seria outra Provação difícil.
— Que ótimo — resmungou o Celestial Coelho, esfregando a mão na testa.
— O que foi? O que você viu? — perguntou o Celestial Boi.
O Celestial Coelho deu um sorrisinho sarcástico.
— Vocês vão ter que me assistir para descobrir.
O Celestial Coelho inspirou fundo, olhando para a água que nunca parava de girar, pronta para devorar mais uma existência e cuspi-la para outro plano. Antes de se jogar, ele se virou para se despedir do grupo da Câmara Zodiacal. Ele nunca diria isso, mas da sua visão através da plataforma, eles juntinhos quase pareciam com uma família, mesmo que alguns ali jamais se rendessem à definição. Alguns se isolavam, outros se admiravam. Havia os que se odiassem. Mesmo assim, o Celestial Coelho até conseguiu enxergar o Celestial Javali com os braços cruzados, encostado em uma pilastra distante. Ele tinha voltado para ver sua partida.
O Celestial Coelho sorriu com tristeza. Talvez não passasse daquela vez.
— Boa sorte! — A Celestial Galinha fez uma concha com as mãos para sua voz alcançar a plataforma. — Estaremos vendo você e aguardando a sua volta!
— Lembre-se de não revelar seu verdadeiro nome outra vez! — alertou o Celestial Cavalo, dando tchauzinho com a bebida em mãos.
Continua...
No próximo capítulo...
Mo Tian está organizando o festival mais importante de Lanhua, mas acaba se esquecendo de um elemento muito, muito importante. Será que ele vai conseguir achar ou irá sofrer da ira do líder da seita?
No próximo capítulo: "Uma fofoca"
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Até dia 2 de novembro, para aproveitar bem o feriado!
Beijos felinos,
Mork
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