Eu gostava de você. Você gostava dos Beatles. Eu não gostava disso, desse tipo de banda, desse tipo de música. Ouvi todo o repertório em coisa de uma semana, porque achei que se gostássemos de uma mesma coisa, eventualmente você iria gostar de mim também. A ficha caiu e percebi que não é bem assim que as coisas funcionam. O único gosto em comum que basta é o amor mútuo entre duas pessoas, de resto, nem Beatles salva. Foi assim que terminamos num relacionamento: eu e Eleanor Rigby, você e seu novo amor.
Certa vez te disse que não havia beleza até você chegar. Havia, houve, ainda há, apesar dos pesares. Eu apenas nunca me atentara ao mundo ao meu redor até te ter por perto. Admirar o luar, o canto de pássaros, bobeira dessas.
Você despertou meu lado apaixonado, romântico e observador.
Abri esse blog porque você levou consigo essa pessoa que você descobriu dentro de mim. Me raptou. Agora me sinto só, sem você e sem mim.
E, sei lá, creio que um dia, tudo aqui será datado. Essas letras, as frases próprias. Nos comunicaremos através de memes e nos julgaremos pelas escolhas deles. "Uau, mais um da Gretchen?", "De novo esse do Pica-Pau?". Não sei se isso mais me apavora ou mais me atrai. Talvez a segunda opção, me indispus com as letras desde que você se foi.
Beatles já é datado agora, a molecada de hoje mal os conhece por nome. Lembra que eu até achei graça quando você me disse que gostava deles? Eu tinha pesquisado o nome de celebridades do pop mais famosas do ano só para puxar papo contigo. Não lembro mais quem eram, mas tua resposta me quebrou por completo e eu só consegui pensar nisso. Talvez nem lembraria mais se você tivesse dito Ariana Grande ou Shawn Mendes. Beatles foi engraçado. Ou talvez sim, eu tinha um vício real em você, não tinha?
— Era minha paixão adolescente. Logo passa.
Foram tuas palavras, não foram?
O que não reparei é que ainda éramos adolescentes, naquela pressa de crescer. Eu disse que também tinha dessas.
— Gosto de MPB, quem sou eu para te julgar?
Sem graça, você até me confessara que logo se interessaria por outras coisas. Outras bandas, outras músicas. Beatles era só a porta de entrada do mundo que você queria fazer parte.
Sendo assim, você já devia ter superado essa banda a essa altura do campeonato, assim como eu já devia ter superado você. Em vez disso, você ainda posta a letra das músicas românticas deles no twitter, e eu ainda as leio como se fossem para mim.
Não existia Beatles, até que eu te conheci. Não existia amor, até que eu te conheci. Não existia dor, até que você se foi.
Sei que meu texto soa repetitivo e clichê, você me disse que eu não levava jeito para escrita. E como sempre: você tinha razão. Sempre me perco nas ideias e as repito, porque as sinto de novo e de novo enquanto escrevo. Continuo sentindo as mesmas ideias. Você sabe, sou uma pessoa básica. Amor, dor de cotovelo, fome. Você era um ser mais complexo. Também não sei como funciona essa coisa de "estrutura de texto", mas te culpo por me distrair com a tua língua nos nossos estudos da língua.
Teve um dia em que eu postei uma foto nossa com a letra daquela música que não saía mais da minha cabeça porque você estava na fase inicial dos Beatles.
"There is one thing I am sure of
I will love you forever
For I know love will never die"
A ingenuidade de primeiro amor ao postar algo do tipo, não é?
O Facebook me lembrou dessa foto dia desses, e a frase "te amarei para sempre" me assusta agora no tanto exato que me empolgava antes. E meu olhar apaixonado para você naquela foto também interrompe meus pensamentos de chuveiro. Transparente e previsível, a criatura apaixonada só se lasca.
Que esse amor eterno meu morra, porque sei que o teu já passou da missa de sétimo dia há meses.
Lamentar não adianta mais, né? Não alivia o peso da culpa. Você disse que eu me arrependeria, e acertou na mosca outra vez.
Perder alguém como você é imperdoável.
Você já não deve lembrar mais, mas tocava Mr. Moonlight quando demos nosso primeiro beijo. Aquela bitoquinha de nada que me arrancou um sorrisão. Meu primeiro beijo, você já era mais experiente. Você disse que eu era uma pessoa engraçada e deu um sorrisinho constrangido contra meus lábios. Até consigo ouvir Mr. Moonlight só de lembrar desse dia. E sinto o mesmo sorriso involuntário que dei em teus lábios. Eu tinha me viciado nessa música, a primeira dos Beatles que gostei de verdade (é, eu menti sobre All You Need Is Love, foi mal). Agora troquei ela pela do Bruno Mars. Sem você, estou só, falando com a lua e tentando te alcançar. Essa do Bruno Mars é fichinha perto do chororô que abro toda vez que ouço a voz arrastada do Lennon evocando o luar. Estou chorando agora e a música está só na minha cabeça. É a vida. Uma hora o choro reprimido sai.
Deveria focar nas tuas partes que me fazem falta e tirar logo essa saudade do meu peito. Te deixar ir pra valer dessa vez.
Gostava do teu cabelo fazendo cócegas no meu rosto pela manhã, gostava dos teus braços em volta do meu corpo pela noite. Gostava do teu beijo, abraço, carinho, cafuné. Gostava do teu cheiro, voz, olhar. Gostava do ser humano completo que você era. Gostava dos teus passos, risos, abraços. Sim, eu disse abraço duas vezes. Saiba que eu amava estar nos teus braços, mais do que estar em mim.
Eu te amava mais do que me amava. Você era a parte boa em mim, eu sou o resto. O chocolate do Napolitano. Sei que não soa saudável, parece que perdi a cabeça, mas minha cabeça também era a parte boa minha — você — então, na verdade, nunca bati muito bem das ideias. Você sabe disso.
Eu ouvi a vida inteira que ficar de chororô não resolve nada, por isso, paro por aqui. Não quero arruinar a festa com o teu novo amor.
Estou voltando para onde vivem todas as pessoas solitárias: para longe do teu coração.
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