Japão, cidade de Tóquio. - Segunda-feira (06:00AM).
A manhã parecia ter chegado, eu ouvia os sons dos pássaros cantando na janela, as cigarras com seu barulho característico e o sol surgindo discretamente para me desejar bom dia. Meu despertador também sentia vontade de me aconchegar em seu barulho nem um pouco invasivo aos ouvidos, não havia jeito, era hora de acordar. Levantei aos poucos, em passos lentos e preguiçosos. Me espreguiçava e fazia alguns alongamentos para evitar dores e aquecer o sangue. Após isso, ia ao banheiro, lavava o rosto e começava a me arrumar para meus afazeres cotidianos. Toda essa aventura matinal me consumia ao todo uma hora, não sou o tipo de pessoa que o principal favorecimento é a agilidade.
Enquanto preparo meu café da manhã, me foco a tentar estudar um pouco minhas obrigações, terminando meus estudos me vejo com trinta minutos livres onde me atento às notícias, leio algo que gosto e preparo meu psicológico para o resto do dia. Enfim, o momento de descanso se encerra, são oito horas da manhã e meu metrô leva vinte minutos para chegar em meu objetivo, me deixando com dez minutos de antecedência, está na hora de partir. Antes de finalmente dar adeus ao meu pai, resolvo pentear uma última vez meus cachos loiros e ajeitar um pouco da maquiagem, porque ainda não me acostumei com esse tipo de moda feminina. Eu sou Aiko Valentine e hoje vou mais uma vez à faculdade.
Caminhar pelo Japão de manhã é sempre algo reconfortante, mesmo havendo um lindo sol, a brisa do ar é relaxante e todas as pessoas parecem bastante educadas e simpáticas. Dizem que imigrantes não são muito bem-vistos, mas nunca tive problemas com ninguém por aqui. Algumas meninas mais malvadas implicavam com a minha altura, mas aos poucos fui entendendo que os padrões de moda de cada país fazem você acabar se destacando bem mais do que gostaria. Minha vizinhança é calorosa, sempre me desejando um bom dia quando passo e me oferecendo ajuda quando preciso. Sempre acreditei que gentileza gera gentileza, então, mesmo quando não me pediam, oferecia ajuda e estava disposta a fazer o melhor pelas pessoas à minha volta. Isso me garantiu uma boa margem de simpatia pelo local. Por mais que a beleza natural do Japão seja algo espetacular, os prédios também são surpreendentes! Eles possuem uma beleza urbana que não consigo descrever, ao mesmo tempo que são simples, a forma como são organizados me admira muito.
Bem, infelizmente é hora de deixar a beleza de lado e encarar meu maior inimigo... Os metrôs. De longe, a coisa que mais odeio neste país. Onde eu morava, era muito comum viajarmos de trem para os lugares e era uma viagem aconchegante, muitas vezes até divertida, principalmente quando passávamos por algum campo florido... Mas aqui, toda essa ilusão de diversão foi completamente esquecida pela massa assustadora e claustrofóbica de trabalhadores e estudantes, se empurrando para conseguir um espaço. Algo que admiro nos japoneses é a sua incrível responsabilidade com deveres, trabalhos e obrigações. Eles estão sempre dedicados a fazer um ótimo serviço e se exigem tanto que não se importam de viver iguais a sardinhas enlatadas para conseguir chegar até seu destino. Infelizmente, isso foge bastante da minha realidade e mesmo morando aqui há uns anos, ainda é bem desconfortável. Vinte minutos de desespero depois... Estou na minha faculdade.
Ela é bem bonita, sua estrutura me passa um ar de importância e parece ser uma das melhores universidades aqui do Japão para poder estudar a profissão que gostaria de seguir. Diferente de onde moro, as pessoas aqui são um pouco mais fechadas e focadas no que estão fazendo. Eu não tenho do que reclamar, é extremamente difícil ingressar em um ensino superior, então imagino que aqueles que estão aqui fazem de tudo para conseguir se manter. O prédio principal possui ao todo dez andares e ainda existem outros prédios menores ao redor. O tamanho do Campus é considerável e parece até uma mini cidade dentro de outra cidade. Entrando no prédio, cumprimento algumas pessoas, verifico minha sala que constantemente vive mudando e sigo em diante buscando meu professor. Eu sou aluna da terceira turma de psicologia da faculdade e me dedico com firmeza para garantir que minhas notas sejam agradáveis aos meus educadores. Todos me tratam muito bem e me sinto mais acolhida aqui do que quando estava no ensino médio. Embora infelizmente, por conta de tudo que já passei... Mesmo as pessoas me tratando bem, acabo sendo um pouco fechada e evitando ficar muito tempo falando com uma pessoa. É errado da minha parte estudar para uma profissão que te ajuda a lidar com os problemas e eu mesma não ter coragem de lidar com os meus, mas entendo que isso é algo que vencerei com o tempo.
Sempre vejo meus colegas de turma animados, se divertindo, dando risada e brincando uns com os outros. Sinceramente, nem parece que estou em uma sala com adultos, todos são bem extrovertidos e acho que isso é minha principal barreira. Eu vim de uma região da Escócia onde nós somos bem amigáveis e receptíveis, então minha vida inteira tentei trazer um pouco da minha cultura para fora. Só que quando tentei ser assim no ensino médio, não fui bem recebida e isso me trouxe dezenas de problemas na infância, que me transformaram numa pessoa que esqueceu suas origens e apenas se isola em um canto lendo alguns livros de fantasia ou de história. O livro que estou lendo agora, enquanto a aula não começa, é sobre uma jovem que vivia uma vida feliz com sua família, mais um dia teve os pais assassinados por salteadoras e agora ela busca se vingar usando as antigas armas de seu pai. É uma história bem emocionante e acho impressionante o quão bem construída é a evolução da personagem desde sua infância até a idade adulta.
– Ei, garota! – Ouço uma voz que parecia ser redirecionada a mim, por instinto, acabo levantando minha cabeça e vendo quem está falando. – Sobre o que é esse livro que você está lendo?
Um rapaz de cabelo bagunçado e óculos parecia tentar puxar assunto comigo. Ele tinha um rosto jovem, deveria ser alguns anos mais novo que eu e vestia um casaco escuro.
– P-perdão... Está falando comigo? – Mesmo que ele estivesse olhando na minha direção, a pergunta havia sido tão repentina que quis confirmar a situação.
– Isso, desculpa te interromper! É que o pessoal ali atrás estava conversando e viram que você estava lendo e queriam saber o que era. É fantasia, não é?
– Bem... Sim e não... – Eu falava um pouco receosa. – É uma história baseada na era dos Vikings, porém não existe nenhum relato verídico e às vezes tem algumas situações envolvendo a cultura religiosa do povo antigo, então creio que pode ser encaixado como fantasia sim.
– Wow... Nossa... Você realmente fala igual uma princesa de livros de história! – O rapaz brilhava seus olhos e parecia admirado com meu jeito de falar. Muito do que aprendi em japonês foi lendo livros clássicos e isso fez com que minha utilização de palavras fosse bem diferente da comunicação cotidiana das pessoas daqui.
– O-o que você quer dizer com isso?! – Eu corei com a afirmação. O jeito que ele disse aquelas palavras parecia bem bizarro.
– Desculpa, é que a gente já havia reparado que sempre que você apresenta trabalho, você sempre fala usando palavras difíceis ou de um jeito mais formal, fica parecendo até que você veio de outra época haha! – Ele soltava uma risada descontraída. – Achamos que era comum do seu país falar desse jeito, você é inglesa?
– Não, sou mestiça. Minha mãe é uma japonesa e meu pai é escocês. – Era automático da minha parte não dar muita brecha para conversa, não sou do tipo que fala muito sobre mim para pessoas desconhecidas.
– Oooh! Desculpe o engano, é que você tinha todo jeito. – Ele fazia uma reverência enquanto sorria envergonhado.
– Não se preocupe. É um erro comum. Dizem que somos muito parecidos, mas os ingleses são um pouco menos amigáveis. – Embora nunca tenha conhecido um britânico, esse era o tipo de coisa que meu pai sempre me dizia.
– Entendi... – Ele parecia ficar sem assunto, então resolvi ir direto ao ponto.
– Você gostaria de alguma coisa ou só queria perguntar sobre o que eu estava lendo?
– Ah! Sim, é claro... – Ele parecia se recuperar. – Na verdade, eu e o pessoal queríamos saber se você não ia querer se juntar com a gente. O professor pediu para montarmos um grupo na última aula de oito pessoas e acabamos percebendo que contamos errado e está faltando uma pessoa para completar. – E ele finalmente ia para a parte que importava. – Vendo o livro que você estava lendo, pensamos que você seria uma garota legal e queríamos chamar você.
– Bem, já que esta é a razão... Acho que posso me juntar. – Por mais que eu demonstrasse firmeza e seriedade por fora, por dentro eu estava chorando igual uma garotinha. Sabia que toda a minha pose desmoronaria assim que eu entrasse em contato com mais três pessoas.
Eu me levantava, respirava fundo e seguia para o grupo dos fundos da sala, para conhecê-los e entender o que deveríamos fazer no trabalho em grupo. O que achei estranho, porque não me lembrava de nada que envolvesse fazer grupos.
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