- Tragam o prisioneiro. - Ambrose ordena e logo as grandes portas de madeira se abrem, dois lobos entram guiando um terceiro lobo, que está acorrentado.
- Curve-se diante do Rei! - um dos guardas o empurra, forçando o lobo a se ajoelhar diante de Ambrose e Desmond, que está sentado ao seu lado.
- Tem noção do por quê está aqui ? - o Rei o questiona, mas o lobo permanece de cabeça baixa e em silêncio.
- Vamos, fale! - o guarda golpeia seu ombro com a base de sua lança. Ambrose ergue a palma de sua mão, pedindo para que ele pare.
- Sendo bem sincero, não importa se vai tentar se defender ou não. Seu destino foi selado quando se voltou contra minha família.
- Família ? Que piada! - o lobo ri e cospe no chão.
- Um branco não merece estar nessas terras! - ele esbraveja e rosna, olhando diretamente para Desmond, que apenas o observa indiferente.
- E quem é você para decidir quem pode ou não estar nesse país ? Está se esquecendo de qual é o seu lugar, criado! - Ambrose fala em um tom intimidador, fazendo todos os guardas ao redor estremecerem.
- Gaia nunca aprovaria isso. Esse maldito branco em nossas terras trará desgraça ao povo!
- Como ousa... - Ambrose cerra seu punho, mas é interrompido por Desmond, que se levanta e caminha em direção ao lobo.
- Senhora! - o guarda fala preocupado.
- Tudo bem. - ele acena com a cabeça e se abaixa, segura o rosto do prisioneiro e o encara fixamente.
- Está tentando falar sobre religião para mim ? Que patético! Eu sou o lobo escolhido por Gaia. - Desmond segura seu rosto com mais força, cravando as unhas em sua pele.
- Não me importo se está insatisfeito com isso, mas sugiro que tenha cuidado, não deixarei que nenhum lobo tente passar por cima de mim! - ele o encara com um olhar furioso e penetrante, que é mais intenso e aterrorizante do que o de Ambrose, fazendo o lobo estremecer.
- Levem ele, já sabem sua sentença. - Desmond se levanta e caminha de volta até seu trono, se senta e observa enquanto os guardas erguem o lobo para levá-lo de volta para a cela.
- Vai se arrepender disso, Brenhin! Vai perder tudo por causa dele! - ele grita enquanto é arrastado para fora.
- Gaia irá se vingar, guarde minhas palavras!
- Calado! - um dos guardas bate em sua nuca, o deixando meio desnorteado e fazendo com que ele finalmente se cale.
- Que problemático... - Ambrose suspira ao vê-lo sair e esfrega os olhos.
- Agora que está resolvido, preciso ir. - Desmond se levanta, mas antes de que pudesse sair, o Rei agarra seu antebraço e o puxa para perto de seu corpo.
- Precisamos conversar!
- Não me lembro de ter nenhum assunto a tratar com você.
- Não se faça de idiota, sabe do que estou falando!
- Ah! sobre fodermos na cozinha ? Esqueça isso, Ambrose. Foi um erro.
- Um erro ? - ele contrai sua mandíbula.
- Sim, eu estava bêbado e excitado, por isso me deixei levar. Não foi nada de mais.
- Não foi um erro para mim!
- Ambrose, vamos ser sinceros. Não sou eu quem você realmente deseja, não é ? - Desmond sorri e acaricia seu rosto.
- Desmond, isso... - o lobo hesita por um instante.
- Por favor me solte, tenho um compromisso. - ele fala de forma tranquila e puxa seu antebraço.
- Desmond... - Ambrose sussurra aflito.
- Obrigado por hoje. Nos vemos depois. - Desmond sorri e se afasta, indo em direção a saída.
- Não me esqueci da minha promessa! - o lobo fala um pouco alto, para que ele o ouça com clareza. Desmond para por um instante, mas não diz nada e sai do salão.
- Conseguiu alguma coisa ?
- Não. Desde que foi julgado não abriu mais a boca. - Lyter suspira. Sendo o braço direito do Rei e fazendo o trabalho sujo, já teve que lidar com todo tipo de lobo, mas aquele com certeza estava o tirando do sério.
- Não importa, sua execução acontecerá logo e supostamente tudo será esquecido.
- Supostamente ? - ele ergue uma de suas sobrancelhas.
- Desconfio de que haja algum tipo de movimento rebelde no país.
- Nunca ouvi falar nada sobre isso... - Lyter acaricia os pelos de sua barba, pensativo sobre a situação.
- Se não existe, é uma possibilidade. Você sabe que qualquer cidadão desse país pediria a cabeça de Desmond no momento em que descobrisse que ele faz parte da família Bianchi.
- Entendo. Tem razão. Vou investigar isso a fundo, e caso seja necessário, cortarei o mau pela raiz.
- Ótimo. - Ambrose acena com a cabeça.
Uma semana depois. Dia do Festival.
- Está pronto ? - Ambrose estende sua mão esquerda em direção a Desmond.
- Claro. - ele força um sorriso gentil e segura sua mão. O cortejo começa com os sacerdotes em uma fila indiana, indo em direção ao templo principal, que está localizado no centro do Distrito Brenhin. O casal real segue logo atrás dos sacerdotes, cada um com uma oferenda para a deusa.
Enquanto caminham, os olhares do povo estão sobre eles, alguns de surpresa ou admiração, já outros de desconfiança. Um humano caminhando por suas ruas ao lado do Rei não era algo comum.
- Estamos quase chegando... - Ambrose sussurra ao notar seu desconforto.
- Estou bem. - Desmond força um sorriso doce e volta seu olhar para frente, mantendo sua cabeça erguida e uma expressão séria.
O cortejo segue e após alguns minutos andando, finalmente chegam ao templo. No local há um grande coreto, com plantas enroscadas em seus pilares, logo atrás dele, uma enorme estátua de Gaia, coberta por algumas poucas flores que Desmond nunca havia visto antes, com suas mãos próximas ao seu ventre, além de uma árvore, que diferente do resto da vegetação não parece sofrer com a escassez de água e luz solar.
- Nossa... - ele murmura surpreso, aquele local parecia ser totalmente diferente do resto do país. Apesar de toda dificuldade que enfrentam, o templo estava impecável.
- É lindo, não é ? - Ambrose sorri ao vê-lo surpreso.
- Sim! - Desmond sorri animado.
- Tragam suas oferendas irmãos, vamos elevar nossas preces a Gaia! - o sacerdote mais velho fala animado próximo ao coreto, ele ergue suas mãos para o alto e está sorrindo.
- Vamos, precisamos dar nossas oferendas. - Ambrose o guia até o coreto, onde há um monumento feito de pedra, com um simbolo entalhado nele. Ali, o Rei e a Rainha se ajoelham e deixam seus presentes.
- Faça um pedido. Talvez se realize! - Ambrose sorri e junta as palmas de suas mãos, fecha seus olhos e permanece em silêncio.
- Eu duvido... - Desmond suspira e revira os olhos, mas acaba fazendo o mesmo. Era tradição que o Rei e a Rainha façam as primeiras oferendas e as primeiras preces.
- χαίρε γαία! - Ambrose murmura e toca no simbolo como um sinal de respeito e devoção.
- χαίρε γαία! - Desmond repete suas palavras e também toca na pedra com a palma de sua mão. Ao fazer isso, sente uma estranha sensação de queimação, como se sua pele estivesse sendo marcada com ferro quente.
- Ai! - ele resmunga e tira sua mão rapidamente, ao olhar para sua palma, vê um pequeno simbolo nela, que sangra e doi.
- Me deixe ver! - o lobo segura sua mão e ao ver o simbolo, arregala seus olhos surpreendido.
- Senhor, aconteceu alguma coisa ? - o principal sacerdote, pertencente a Casa Kazimier se aproxima e ao ver o que havia acontecido, se ajoelha rapidamente.
- O quê ? Por quê ele está de joelhos ? Levante-se! - Desmond fala ansioso, não entendia o motivo de tanto alvoroço.
- Desmond, você é o novo oráculo... - o Rei sussurra.
- Não, isso é... - ele hesita, ainda tentando entender a situação.
- Olhe para trás. - Ambrose acena com a cabeça em direção a entrada do templo. Desmond se vira e vê todos os lobos que antes estavam ansiosos e agitados, quietos e ajoelhados diante dele.
- Que porra...
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