Sexta-feira chegou, enfim. E meu estômago deu várias voltas, pensando e repensando se eu tinha tomado a decisão certa em mandar mensagem para o tal de Alex. Porque não foi somente uma mensagem aleatória.
Foram várias.
A madrugada se tornou dia aos poucos enquanto eu ainda mandava mensagens para ele. Conversamos sobre várias coisas, no começo, apenas para passar o tédio. Ao menos, era essa a minha desculpa. Apesar de ainda ter recebido duas mensagens bem convidativas de Kurt, eu ainda queria evitá-lo. E Alex parecia uma perspectiva ainda melhor. Ele era simultaneamente interessante e ouvinte. Não me forçou a falar sobre o que aconteceu naquele dia entre nós, mas ao mesmo tempo, não me deixou afogar nos sentimentos que me levaram àquela ponte em primeiro lugar. E mesmo quando eu parei de responder, ele mandou um gif bonitinho de gatinho, me desejando uma boa noite, mesmo que o dia já estivesse claro no céu.
Fofo.
Ou era a carência.
Por isso confirmei pela manhã o encontro. Não costumava sair com a mesma pessoa duas vezes, ainda mais seguidas (Kurt sempre sendo a minha exceção), mas... tinha eu saído com ele uma primeira vez? Tínhamos apenas dormido juntos, e ele tinha me rejeitado. Ainda contava aquele encontro como uma “primeira vez”. E depois, iria decidir, a depender da qualidade dele na cama. Ainda queria saber qual era o mistério daquela tatuagem nas bochechas. Será que ele teria mais alguma...? Anotei na minha grande lista de afazeres descobrir. Esperava que o que diziam sobre pés grandes também se aplicasse, o homem era enorme...
Quando me olhei no espelho, reparei no meu sorriso leve. Seria um bom dia, decidi.
Vesti-me de acordo. Uma calça jeans de lavagem escura apertada, que evidenciava minha bunda, um cropped branco, minha jaqueta vermelha e acessórios diversos. Brincos, anéis, pulseiras. Eu iria com tudo para conquistar esse boy. Ele era bonito demais para deixar a oportunidade escapar.
Uma vez arrumado, eu segui pelo corredor, segurando meus tênis em uma mão, e na outra mandando uma mensagem para Alex. Havia combinado de avisá-lo antes de sair de casa, para nos encontrarmos no caminho, quando ouvi as vozes.
Eu sabia que meu irmão estava em casa. Desde quando retornei, mal lhe dirigi duas palavras. Não que Chase não estivesse acostumado a preencher silêncios com sons de televisão, pipocas estourando, e a presença dele.
eu te amo, jesse
suspiros contra a boca sedenta
Eu o odiava. Quanto mais me aproximava mais as memórias vinham, intrusivas, de algo ido e bonito.
— Tudo bem continuar?
— Sim…
os lábios partidos e rubicundos
sua mão em meu peito
Claro que Chase aproveitaria todas as chances que nossa mãe não estivesse em casa para trazê-lo. Não era diferente de mim nesse sentido, apesar de eu preferir um cardápio mais variável de homens. Mitchell era o único ficante premium de Chase — que tinha passe livre na nossa casa, porque ele era nosso amigo de infância.
As lembranças vinham como navalhas em minhas mãos, o momento em que o conhecemos tão vívido quanto o presente; o sol do dia caindo sobre nossos os nossos ombros e aumentando nossas sardas, os adultos insistindo para que passássemos protetor solar, um cartaz perto da mesa de comida anunciando que o número sem fim de convenção de médicos e enfermeiros estava acontecendo. Mitchell era mais velho que nós por dois anos, mas não queria dizer que ele era mais alto que eu e Chase aos onze. O ajudante quase nos barrou de usar o brinquedo, menos por nossa altura de criança e mais pelo estado precário que ele estava. Eu decidi que ficaria muito melhor na parte mais rasa da piscina, apesar de saber nadar, enquanto Chase queria se aventurar. Proibições não eram um impedimento para ele. Naquela época, não pensávamos em consequências.
Chase e Mitchell, à época, seguiram uma estranha rivalidade. Era antipatia logo de cara, Chase veio a me explicar alguns anos depois. Ele simplesmente não gostava dele, algo em seu olhar o enervava.
Em retrospectiva, eu devia ter imaginado.
Os dois brigaram o dia inteiro. Primeiro os funcionários tentaram separá-los, mas depois de nossos pais simplesmente não ligarem, eles desistiram. Naquela rivalidade estranha, os dois imperavam. Especialmente quando quiseram subir no tobogã que caía diretamente na parte funda da piscina. Os dois se encararam, decidindo que não iriam esperar pelo outro, e antes que o funcionário responsável pudesse intervir, os dois desceram pelo tubo juntos, cabeça adentro, se engalfinhando no processo.
Eu, na piscina, só pude ver o sangue subindo na água, enquanto os dois buscavam o ar. O pânico surgiu ao ponto da festa ser encerrada para nós, que ganhamos uma visita ao hospital. Meu irmão ganhou sete pontos na cabeça, uma cicatriz e um amigo para a vida toda.
E eu? Um problema.
por favor, não chore
eu te amo, chase
Cheguei no topo das escadas. A visão que eu recebi era caseira. Os dois estavam ali, no sofá, de apenas shorts, abraçados. Uma tragédia. A luz da televisão exibia um filme caseiro, ou seria um seriado? Não importava. As mãos deles estavam ocupadas com coisas que não eram a bacia de pipoca na cômoda a sua frente.
Um sentimento conhecido subiu à garganta, e eu corri escada abaixo, com a intenção de sair, mas eles notaram a minha presença.
— Jesse…
Não falei nada, e continuei indo em direção à porta. Nem olhei mais eles, mas vi quando Chase se levantou e foi até mim. Eu não queria migalhas. Não queria olhar naqueles olhos tão parecidos com os meus, ver aquele rosto que era meu espelho, em exceção à pinta perto do olho direito, e esperar que tudo ficasse bem.
Porque não ficaria.
Minha respiração acelerou.
— Você vai sair?
Não respondi, sentando-me no pequeno batente.
— Para onde vai?
— É da sua conta? — minha frase saiu rápida e curta. Fôlego me faltava. Apenas queria sair. Eu precisava sair de imediato.
Precisava de ar.
— Jesse…
— Tchau, Chase.
E calcei meus sapatos de qualquer maneira, fechando a porta atrás de mim, sem olhar para o namorado do meu irmão, que apenas disse:
— Bela conversa que vocês dois tiveram. Achei que vocês dois tinham se entendido…
— Cala a boca, Mitchell.
— Venha calar.
Eu não precisava estar presente para imaginar o resto, e quando colocava meus fones, rezava para não precisar mais presenciar aquilo.
Corri.
Quando cheguei ao ponto de ônibus, estava completamente sem fôlego. As pessoas me olhavam como um maluco, mas eu não me importava. O sangue bombeando nos meus ouvidos. Estava vivo.
Esperei mais alguns minutos, e o carro apareceu. Sentei-me nas cadeiras mais altas do fundo, sentindo meus pés balançarem e recompondo-me. Recostei a cabeça no vidro, e esperei o tempo passar, tentando não pensar em nada, e em tudo ao mesmo tempo.
o meteoro
supernovas
o calor daquela mão, a voz que dizia que tudo ficaria bem
Quando cheguei na estação, continuei em silêncio. Não olhei para ninguém. Sequer interagi, passando por elas, existindo no mar de pessoas. Mais uma estrela naquele firmamento.
— Jesse!
A primeira coisa que notei foi seu sorriso. Como se seu rosto se iluminasse por inteiro. Seus olhos verdes foram de preocupados, para se encontrar com os meus e brilharem. Tudo naquela presença em frente ao pequeno café se destacava da multidão, como se pela primeira vez visse em cores. Claro, a altura ajudava, assim como os cabelos ruivos flamejantes, que estavam domados em um rabo de cavalo, e céus, como ele parecia sexy naquele penteado. A tatuagem de Ás no rosto se destacava nas maçãs do rosto e por causa do frio, estas estavam um pouco coradas e firmes. Os olhos verdes tinham um pouco de maquiagem… Ele parecia estar arrumado. Até as roupas que ele vestia pareciam melhores do que as que ele usara durante a aula. Era uma camisa simples, branca, com uma de flanela entreaberta por cima, que combinava com seus olhos verdes brilhantes. Muito gato, decidi. A camisa branca valorizava o corpo esguio que eu queria explorar, e pensei que era uma pena nós não termos nos encontrado diretamente na casa dele. Poderíamos ter pulado muitas etapas.
Mas o rapaz queria chocolates e velas, aparentemente. Alguns queriam um pouco de romance antes do feito, e eu entendia aquele lado. Nem todo mundo podia ser como Kurt.
Meu sorriso aumentou e acenei para ele, pronto para atacar. Aquela noite seria ótima...
Era minha previsão, até notar uma pessoa ao seu lado. Era alguém muito bonito: cabelos lavanda, raspado nos lado, um cardigã enorme gráfico de uma banda cobrindo o corpo, leggings pretas e tênis branco completavam o visual. Os olhos mel encaravam a multidão assustada, e de vez em quando, olhavam de soslaio para Alex, como se quisesse assegurar que ele não fugiria.
Eles estavam de mãos dadas. Pisquei um pouco, talvez fosse um truque de luz.
Claramente de mãos dadas.
— Jesse, aqui! — ouvi de novo, mas estava pronto para dar no pé. Meu sorriso morreu mais um pouco no rosto. Droga, não dava para simplesmente fugir, não dava? Eu não me metia com caras comprometidos. Muito menos trisais. Será que tinha dado match naqueles perfis de casais?
Se era comprometido, por que Alex havia me chamado para sair?
O pânico começou a subir pela minha garganta, novamente tornando difícil respirar. Estava cada vez mais tonto, mas mesmo assim, meus passos me levaram a ele, apesar da minha vontade de sumir. O que fazer? Dar no pé naquele momento, ou dar um fora no rapaz? O namorado dele ao menos sabia que tínhamos passado a noite toda flertando pelo celular?
Ele me alcançou, ou fui eu quem cheguei próximo primeiro.
— Jesse, que bom que você veio.
Ele estava tão perto. Com uma expressão tão familiar, mas igualmente inalcançável. A decepção me atingia com pontadas de frio no interior. Ele era apenas mais uma desapontamento.
Desses, eu estava cheio. Ao menos esperava dar uma foda naquela noite.
Eu sorri, apesar de tudo.
— Oi, Alex.
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