TW: Contém conteúdo sexual consentido. Se não quiser ler, ou for menor de idade, podem pular este capítulo!
Meu celular me acordou por causa da quantidade de vibrações. O cansaço em meus ossos tinha me alcançado enquanto eu andava pela rua das Margaridas, e assim que cheguei a meu quarto, me joguei na cama, cansado, suado e ainda cheirando a sexo, apagando por completo. Mas aquelas mensagens... Aparentemente, alguém lembrou da minha existência.
Revirei os olhos, checando o teor. A quantidade de erros gramaticais e o fato de serem três da manhã denunciavam que Kurt chegara bêbado e com tesão em casa. Irônico ele só se lembrar de mim nessas horas, e não quando eu precisei dele no Halloween. Agora que tinha o ignorado a semana inteira, ele me chamava com insistência. Era o mesmo ciclo vicioso. Eu arranjava alguém, Kurt aparecia. Eu dava o pé na bunda dessa pessoa para ir atrás de Kurt, Kurt misteriosamente arranjava outra pessoa e me dava um chá de sumiço. Aí eu voltava a procurar alguém, reiniciando o ciclo.
Kurt Durand era, para todos os efeitos, meu vizinho. Mesma situação familiar: pais separados, pai ficou com a casa, a mãe foi com o marido rico e o abandonou com o pai ausente. Isso lhe deu muito tempo livre, e uma janela com uma tubulação bem fixa. Somado a isso, e dois rapazes na puberdade, só podia dar um mar de confusões.
O quarto de Kurt sempre foi meu alento quando eu precisava escapar de algum problema em casa. Ele pintara as paredes de preto em um arroubo da adolescência, e agora mantinha a cor apenas por orgulho: nem mais emo nem rock, eu sabia que a playlist do Spotify de Kurt continha artistas como Demi Lovato e Taylor Swift. Eu o conhecia tão bem quanto a palma da minha própria mão, portanto sabia o quão não confiável ele era.
— Completamente insuportável… — As mensagens não paravam de vir.
Kurt queria alguma coisa. Atualmente ele só mandava mensagem quando precisava muito de mim. Ou queria uma foda, mas desde o último boy dele, ele vinha me evitando como a peste negra. O que era ruim para mim, porque os únicos lugares onde eu podia ter um pouco de refúgio costumavam ser o meu quarto, ou o quarto dele. E até mesmo as minhas paredes me sufocavam aos poucos. Às vezes eu precisava do ar que ele me dava.
Só que ele vinha e ia quando queria. E eu tinha que respeitar isso.
Menos quando ele era um babaca de marca maior.
— Mas que merda… — eu disse, por fim, e peguei o celular da cômoda.
Foi então que notei o horário. Eu havia apagara por volta das sete da noite, com pensamentos nada santos sobre um certo ruivo e mãos calorosas, e se eram mais do que três da madrugada, eu era um duende. Apesar das poucas horas de sono, eu não me sentia nem um pouco descansado. Somado às evidências, eu soube de imediato o que Kurt queria àquela hora.
Suspirei, lendo o conteúdo das mensagens. Dava para notar pelas palavras porcamente espaçadas e pelos erros de grafia o quanto de álcool estava em seu sangue. Kurt só fodia ébrio. E não era lá uma foda muito carismática, também. Atualmente, eu tinha uma opção melhor. As mãos de Alex ainda percorriam meu corpo, e eu estava completamente duro. Ao mesmo tempo, usar minhas mãos para lidar com o problema empalidecia ante a coisa real.
Dei de ombros, e fui calçar meus sapatos. Uma foda a mais poderia me ajudar a dormir. Kurt conseguira me acordar. Peguei o par jogado de qualquer jeito ao chão, e nem cogitei sair pela porta da frente. Não sabia se Nama estava em casa, mas eu tinha total certeza de que meu irmão estaria em seu quarto, e o caminho para a porta principal passava pelo dele. Dar de encontro com meu irmão gêmeo naquele estado seria a última gota para meu suicídio iminente.
— Tsc… — reclamei, analisando a janela. Minha única opção.
Eu já tinha saído pela janela, e voltado por ela, algumas vezes. Nama já havia me dito para não o fazer, no mesmo tom professoral que pedia para que eu desistisse da profissão de modelo vivo, mas como a maioria das coisas que Nama falava, eu ignorei seu pedido. Era uma altura considerável, já que o meu quarto ficava no segundo andar. Mas quem disse que eu me importava se algum dia eu me esborrachasse no chão?
— Talvez fosse até melhor… — ecoei os pensamentos mais profundos.
De qualquer modo, eu peguei meus tênis e os calcei, já que eles serviriam de apoio melhor na tubulação do que meus pés descalços ou com apenas meias. A tubulação daquela casa era velha e rangia conforme eu descia por ela, fazendo com que meu coração desse um mini ataque cardíaco a cada vez que eu descesse, mas apenas xinguei Kurt por me forçar a sair e uma vez no chão, eu corri para o final da rua.
O número 12 da rua das Margaridas era uma parte calma do subúrbio. Era uma rua pacata, onde viviam famílias quebradas. A maioria era divorciada, no número treze vivia um rapaz de meia-idade cuja alcunha para todas as crianças era de bruxa, e no Halloween, ele fazia questão de se vestir como tal. Ainda assim, o maior escândalo daquela rua ainda estava para acontecer.
Porque eu sabia, desde o dia em que nossos pais nos trouxeram envoltos em panos de hospital, ainda recém-nascidos, que eu não iria sobreviver ao número onze da rua das Margaridas.
A casa era sorumbática, à noite. Às vezes, eu vinha observá-la. O quarto de Chase continuava lá, assim como o meu. Uma pequena luz azul vinha do quarto de Hayley, e eu sabia que era porque minha meia-irmã não conseguia dormir completamente no escuro, e precisava sempre de uma luz-guia para acalentar o sono. Eu me perguntava se aquela estrela solitária um dia se apagaria.
Fiquei alguns momentos observando a casa que um dia foi o meu lar. Eu sabia que poderia parecer estranho: afinal, eu era uma sombra de gente, de moletom e capuz, observando às três da madrugada uma casa de uma família de bem, mas não conseguia evitar. Era uma ânsia tão forte, de ter algo que não se podia obter, que me fechava a garganta.
Uma pequena estrela se acendeu.
E outra, mais forte.
As luzes da casa se acenderam.
— Merda — murmurei.
Corri em direção ao gramado do número doze, sabendo o caminho a seguir para escapar.
— Jesse? — ouvi a voz sussurrada de Kurt. — Merda, o que você está fazendo?
— Abre a porta para mim! — sussurrei, urgente, de volta.
— Quê? Não! — ele abriu a janela, chamando-me com a mão. — Sobe por aqui!
— Cê tá louco?!
— Sobe!
A movimentação na casa onze ainda era muita, mas eu não tinha muito tempo, então fiz o que me foi mandado: comecei a escalar a tubulação da casa de Kurt, e quando passei por sua janela, ele me agarrou, puxando-me com o peso do seu corpo para dentro do seu quarto.
O desgraçado estava rindo de se acabar, é claro.
— Caralho, Jesse… — ele me puxou mais um pouco. — Cê devia ter visto sua cara.
— Seu filho da puta....
— Epa, epa, eu não xingo a Dona Nama, e você não xinga a dona Karen. — Karen era a madrasta dele. A terceira que ficou. — Não tínhamos esse acordo?
— Você me manda um monte de mensagens a essa hora…
— Achei que esse era outro acordo nosso. — Como eu queria dar um soco naquele sorriso maldito.
— Você diz isso, mas me larga por outro boy quando dá na telha.
Kurt não disse nada, apenas me puxou para um beijo. Não correspondi, sentindo o seu bafo de álcool, mas me encaixei em seus braços, sentindo o conforto familiar de seu corpo, já que conhecia suas curvas muito bem. Ele não trajava nada mais do que uma cueca boxer preta, o que facilitava sentir sua ereção já despontante, então eu sabia que ele não desistiria tão fácil.
Não que eu fosse a pessoa mais difícil do mundo…
— Vamos, Jesse — ele mordiscou meu lábio inferior, me provocando. — Eu sei que você quer.
E eu queria?
Bem, eu não não queria.
Era melhor que nada.
— Seu idiota completo. — E foi o suficiente para que eu começasse a tirar meu moletom, e com eles, as minhas roupas.
O toque dele sempre era rápido, eficiente, e em
muitas ocasiões, indolor. Quase mecânico, com suas mãos frias que pareciam
cobrir meu corpo inteiro com apenas o menor dos toques. Mas suas mãos eram
largas e pareciam cobrir o meu corpo inteiro, e assim, me faziam olvidar que um
dia, eu estive prestes a queimar. Eu implodia por inteiro em seus braços e me
desfazia, para então me reconstruir aos poucos. E assim, eu emergia, vitorioso,
um pouco mais suado, mas então, são.
— Quem é o da vez?
A fumaça do cigarro nos envolvia, enquanto meu corpo ainda se recuperava dos orgasmos. Kurt era fumante, lógico que era, apesar da mãe detestar aquele hábito. Logo, ele o escondia. Apenas ficava ali, na cama, depois de fodermos, enquanto o sol ameaçava nascer nas primeiras horas do dia. Estava com muita preguiça de me levantar e pegar as minhas roupas espalhadas, e com uma réstia de esperança de que repetiríamos o ato. Mas alas, o tempo.
— Por que tem que ter um “da vez”?
— Você está com a mesma cara de peixe morto apaixonada de sempre.
— Não estou apaixonado.
— Conta outra.
Aquilo era encheção de saco suficiente. Eu não iria aturar mais uma crise de ciúmes por uma relação pela metade como aquela. Levantei-me de supetão, ignorando o cansaço do meu corpo, e comecei a procurar as minhas roupas.
— Jesse…
Ele segurou meu braço, me impedindo de sair da cama. Eu conhecia aquilo. Era um vício ao qual estava acostumado.
Só que era difícil recusar o calor quando você estava prestes a adentrar o frio do universo.
Virei-me para ele, esperando.
esperando, esperança, esperando
Cometas azuis e castanhos se encontraram. Colidiram. Um milhão de palavras não ditas.
— Tome cuidado com o buraco que você está se enfiando.
Mais uma decepção. Sentimentos e Kurt não combinavam.
— Hm. — Ele me soltou. Ele não me impediria de tomar as minhas decisões, nem me impediria de quebrar a cara. Porque no fim, ele achava
sabia
que eu voltaria para ele.
Ele se encostou de novo em seus travesseiros, e tragou seu último cigarro.
— Ou ele se enfiando no seu buraco, é mais provável… — riu.
Revirei os olhos.
— Vai se foder.
— Adoro quando você fica bravinho assim. Volte depois. Você sabe que só tem a mim, no final das contas.
Eu olhei para ele, ainda nu em cima de sua cama, e o corpo delgado que mostrava as marcas do que fizemos. Indeléveis. Inegáveis. Inexistentes.
Eu estava preso naquele ciclo.
Pulei a janela.
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