Começou com olhares sutis que eram somente isso: olhares. Levou menos de uma semana para eles mudarem: se prestasse atenção, poderia encontrar naqueles olhos um brilho de curiosidade. Assim que Bruno percebia que Luis estava prestes a olhá-lo ou a olhar em sua direção, virava seu olhar para qualquer outro lugar, não podia ser pego encarando.
— Bichinho do professor! — Bruno murmurou um dia sem nem perceber. O professor lhe fizera uma pergunta, a qual ele respondeu errado. Luis respondeu corretamente no segundo seguinte.
Sim, Bruno estava pensando aquilo, mas não pretendia dizer em voz alta. Ele fingiu que nada tinha acontecido, mas ouviu Luis bufar, o que quer dizer que ele tinha escutado.
"Bichinho do professor”. Apenas três palavras foram capazes de acender algo dentro de Bruno. Algo no outro garoto o incomodava muito, mas ele não sabia dizer o que nem o porquê.
A partir daquele dia, suas implicâncias aumentaram: desde tentativas de fazer Luis tropeçar e cair a xingamentos bem piores que “bichinho de estimação”. Mas Luis nunca mordia a isca.
Bruno nunca estava satisfeito. Sentia que aquilo não era suficiente, precisava de mais. Precisava irritá-lo mais, precisava fazer Luis se revirar na cama sem conseguir dormir por pensar nele, precisava fazê-lo perder a postura de aluno perfeito, precisava... De mais atenção.
Um dia, quando estavam na metade do segundo ano do Ensino Médio, Bruno ouviu Marcela, a melhor amiga de Luis, comentar com outra estudante que Luis tinha terminado com o namorado. Não sabia porque, mas sentiu seu sangue ferver.
— Não sabia que você jogava pro outro time — Bruno disse assim que avistou Luis.
— Do... Do que está falando?
“Ele engoliu em seco! Ele está nervoso? Toquei num assunto delicado?”, Bruno se perguntou em seu pensamento.
— Não sabia que eu era o seu tipo — disse com um sorriso.
Luis riu com escárnio. Olhou para o chão por alguns segundos e Bruno viu suas mãos tornarem-se punhos.
— Se você contar para alguém — ele se aproximou de Bruno até prendê-lo entre uma parede e seu corpo —, eu te mato.
Sem mais uma palavra, Luis se afastou batendo os pés. Bruno estava com um sorriso vitorioso nos lábios.
Essa virou a maior arma de Bruno, o segredo para levar Luis a soltar fumaça pelo nariz. Ele parou de se perguntar se Luis não conseguia dormir pensando nele, em como se vingar, porque sabia que a resposta era “sim”.
No final daquele mesmo ano, antes
das aulas acabarem, Bruno finalmente entendeu porque gostava tanto de implicar com
o outro garoto, de dar nos nervos dele, mas se recusava a aceitar. Nas férias,
percebeu que não tinha como fugir da verdade ou de seus sentimentos.
Era o primeiro dia do terceiro e último ano do Ensino Médio. O sinal para a primeira aula ainda não tinha tocado. Assim que viu Luis, andando na direção oposta, Bruno marchou em sua direção e chocou seu ombro com o do outro garoto enquanto usava um xingamento homofóbico. Para sua surpresa, sentiu uma mão segurar seu ombro e virá-lo cento e oitenta graus. A próxima coisa que viu foi o punho de Luis prestes a beijar seu rosto.
— Luis, não! — Marcela gritou antes que o amigo desferisse o terceiro soco.
— Escuta sua mãe — Bruno falou ao apontar com o queixo para a menina. Havia um sorriso malicioso em seus lábios e ele podia sentir o gosto do sangue que escorria de seu nariz.
Uma mão segurava Bruno pela gola do uniforme, a outra já estava pronta para o próximo golpe. Luis respirou fundo e empurrou Bruno com tanta força que ele caiu. Bruno, mesmo no chão, não parou de sorrir.
Ficou no chão por mais alguns segundos. Quando se levantou, foi para o banheiro mais distante, Luis provavelmente estaria lavando sua mão ensanguentada em um dos mais próximos.
Parou em frente ao espelho. Seu olho esquerdo provavelmente ficaria roxo por algumas semanas. Enquanto enxaguava seu nariz que não parava de sangrar, não conseguiu impedir um sorriso. “Não importa o que você pense, contanto que seja sobre mim”, pensou.
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