Dick decidiu pegar a rota cênica para entrar na Batcaverna, pegando a entrada na estação de metrô a alguns quarteirões da academia. Sabia o que ia encontrar logo que chegou no esconderijo: Barbara sentada de frente para a mesa de operações, seu uniforme judiado pela batalha do dia anterior estendido por cima dela, observando-o com o olhar distante enquanto afagava o curativo na mão esquerda. Ele se sentou ao seu lado, e pegou sua outra mão com muito carinho.
- Você está melhor? – Ele finalmente disse depois de um momento de silêncio.
- Não… – Ela foi franca, apertando ainda mais forte a mão dele, recobrando a consciência – Eu sinto como se a gente não tivesse feito progresso. Alguma coisa tá errada, Dick…
- Fizemos tudo o que podíamos, agora a polícia, e possivelmente o Batman já sabem de tudo, nosso trabalho tá feito.
- Não! – Ela se levantou, gritando e soltando a mão dele – Não faz sentido, cara. Pra que todos esses segredos só pra se revelar agora? Ele tinha o controle total da situação lá no porto, tudo aconteceu do jeito que ele queria… E sabe o pior de tudo?!
- O que?
- Eles não levaram nada do transporte da Stagg!
- Mas… Então por que eles atacaram?
- Exato, por quê? Tem mais nisso do que a gente tá conseguindo ver, Dick. Tudo o que eu consigo ouvir é ele com aquele bordão estranho dele, Temp Tock, Temp Tock.
- Estranho, porque ele fala assim e não tique-taque?
- Eu não sei! O que isso soa pra você? Temp Tock?
- Me soa como um apelido que eu daria pra um moleque irritante.
- É verdade, soa mesmo, não é…? – Ela observou o rosto dele por um momento, até a expressão dela se abrir – E… Se for mesmo?
- Eu falei brincando – Dick se assustou, saltando os olhos – Você acha que realmente pode ser o caso?
- Tenho um palpite muito bom, finalmente – Ela correu para se sentar na estação de computador, abrindo o laptop e teclando freneticamente, correndo atrás de algo na ampla rede de computadores – O Rei Relógio pode ser calculista e exato, mas ele não é nem um pouquinho frio, seja lá o que ele esteja fazendo, isso é um projeto pessoal, ele ta atrás de retribuição por alguma coisa, eu conseguia ver no rosto dele. Isso é algo a respeito dele, da vida dele, da história dele, sei lá. Então eu tenho uma sugestão: “Temp. Tock.” Uma Abreviação, um nome.
Após mais alguns momentos de pesquisa, e lá estava, o próprio Rei Relógio, só que caracterizado em trajes muitos diferentes. Eles se entreolharam, Barbara abriu algumas abas e começou uma leitura compreensível do criminoso, que Gordon ditou em voz alta.
- “Temple Tockman. Nascido em 12 de Dezembro de 1970. Natural de Star City, Formado em Negócios e Finanças pela Universidade de Gotham.” Preciso continuar?
- É ele.
- Agora pro possível começo disso tudo – Ela abriu o artigo de uma notícia – “Funcionário Público da Prefeitura de Gotham despedido após possível fraude de identidade. O homem que se denominava Temple Tockman foi investigado pela polícia por todo traço de registro de toda sua identidade não existir em sistema nenhum dos Estados Unidos, caso que abriria precedente para roubo de identidade, mas nenhum registro relacionado à esse homem existe em lugar algum do país ou dos vizinhos adjacentes. Esse mistério é reforçado pelo consequente desaparecimento do suspeito, que não deixou pista alguma para prosseguimento da investigação.”
- De onde você tirou tudo isso?
- Bancos de Dados da Biblioteca Pública e das Câmaras de Registros Civis de Gotham e Star City. A identidade e a notícia foram as únicas duas coisas que eu consegui tirar dele, o homem é um fantasma, não existe mais traços de Temple Tockman em lugar nenhum. Sem propriedades, sem bens, sem fotos, nem redes sociais, nada.
- Como a gente descobre o que um homem quer sem conhecê-lo?
- Eu preciso de um ar… – Gordon se levantou da cadeira, se movendo para a saída no dormitório feminino.
- Babs, certeza de que você não quer ficar e esfriar um pouco mais a cabeça? Eu to aqui pra conversar…
- Eu só preciso de um pouco de ar, e quando eu estiver me sentindo sozinha, eu converso com o Kel, ele é um ótimo ouvinte – Ela apontou para o esqueleto.
- Palhaça… – Grayson abriu um leve sorriso, ainda com muita preocupação em seu olhar – Sério, fala comigo quando puder.
- Tudo bem… – Ela concluiu, pegando o alçapão e saindo da caverna.
Ela se certificou de ser o mais discreta e silenciosa possível, e começou a andar lentamente por entre as inúmeras camas do dormitório até encontrar uma figura tão silenciosa quanto ela ainda ali. Helena estava em sua cama, montando um pequeno quebra-cabeça. Já era frequente o número de vezes em que ela encontrava a jovem Bertinelli quieta em seu próprio mundo no dormitório durante os horários de recesso. Helena percebeu a presença de Barbara, e não pareceu surpresa, mas também não abriu uma expressão de desgosto, como costumava abrir para as outras meninas. Era um avanço! Primeira vez que via aquele tipo de reação vindo dela.
- Barbara. Tudo bem? – Helena perguntou.
- Tudo… Você me ouviu chegando? – “Ou me viu chegando?” era a pergunta que retumbava na mente dela também.
- Talvez… Sinceramente, não ligo, só não me incomodo com você mesmo – Ela segurava uma pequena peça de quebra-cabeça nas mãos – O que você faz aqui?
- Eu… Só to arejando a cabeça.
- Entendo, eu normalmente monto quebra-cabeças como esse quando preciso de um tempo pra silenciar a mente.
- Eu gosto de quebra-cabeças. Mas é justamente um que está me incomodando…
- Sério? – Helena gesticulou para que Barbara se sentasse do seu lado, e assim o fez – Que tipo de problemas?
- Por exemplo… – Gordon olhou para o teto, pensando em como explicar a situação sem entregar muito do que tem feito – Eu tenho várias peças à minha disposição, mas não tenho nenhuma das peças adjacentes para montar o quadro completo, entende?
- Está faltando peças?
- É o que eu acho.
- Você não tem certeza?
- … Não.
- É aí que está a maior armadilha para solucionadores. Às vezes, você já tem todas as pessoas, é apenas questão de você encaixá-las corretamente.
- Como assim?
- Aqui – Helena levanta duas peças muito parecidas – São duas peças do mesmo quebra-cabeça, pertencentes à mesma região que é preciso solucionar, mas se eu tento encaixá-las, parece que não tenho resultado, não é? Mas é porque eu estou vendo de um só ângulo. Esses dois lados não se encaixam porque, pra mim, eles deveriam se encaixar na posição que estão, mas quando eu vejo uma posição nova, eles se completam.
Helena rotacionou uma das peças e elas se encaixaram, Barbara observou atentamente à analogia da colega enquanto ela explicava, e logo após observando ela encaixar as peças que montou no quadrante inferior do quebra-cabeças, completando metade da imagem.
- Às vezes, você já tem todas as peças que precisa, só não viu elas do ângulo certo.
- Uau… Muito obrigada, Helena, eu acho que eu já sei como resolver minha situação.
- Veja como retribuição pelo outro dia. Você e eu somos parecidas sim, acho que podemos nos ajudar nesse buraco de academia em que nos enfiaram.
- Isso significaria muito pra mim, Helena. Obrigada de novo.
- Boa sorte – Ela sorriu de novo.
Barbara zarpou silenciosamente de volta de onde tinha vindo, entrou na caverna novamente encontrando Dick prestes a desligar o gerador e ir quando ele se assustou co a entrada repentina da amiga de novo. Perguntando o motivo dela ter voltado, ela permaneceu silenciosa até alcançar seu laptop novamente, abrindo o registro e análise das comunicações da gangue. Ela parou no título dos tópicos, e apontou para a tela com determinação.
- “Ataque às Indústrias Stagg”, “Acobertamento de Rastros” e “Plano Final”. Não são três tópicos diferentes. É um tópico só, são três fases dele.
- Como se nós estivéssemos olhando pra isso como partes diferentes de um plano maior, sendo que são partes diferentes de um plano só, um completamente diferente do que a gente estava pensando – Dick disse, e Barbara concordou com a cabeça – “Ataque às Indústrias Stagg como acobertamento de rastros para o plano final.”
- Nós fomos enganados esse tempo todo. As transmissões de rádio, os relatos da gangue na Velha Gotham, as peças de relógio que o Batman achou na Torre… Dick, nós estamos no rastro falso que alguém botou para todo mundo. Pro Batman, pra polícia, e pra nós… Somos joguetes no plano do Rei Relógio até agora.
- Então foi tudo em vão… – Dick concluiu, com um tom derrotado.
- Não! Não foi tudo em vão, nós sabemos sobre a gangue, a base de operações e sobre a identidade dele. Não é o suficiente, mas é o que podemos usar pra enfrentar ele.
- Enfrentar ele? Barbara, você não tá pensando em…?
- Eu preciso, Dick! Não precisamos ter essa conversa de novo, precisamos?
- Você quase morreu ontem seguindo uma trilha falsa! Você acha que consegue enfrentar o plano real do Rei Relógio? Ainda mais voltando pra base dele?
- Se nós não o fizermos, quem sabe o que pode acontecer pra Gotham? Não temos a polícia, não temos nosso herói…
- Você não é o Batman! Pelo amor de Deus, se ele é real mesmo, ele é algum tipo de criatura que a gente não entende, você não é metade morcego de verdade! Você é humana!
- O Batman também! – Dick parou em meio a resposta, um tanto chocado observando-a retirando o Batrangue do bolso – Ele usou isso quando nos encontramos pela primeira vez naquele dia. Olha pra isso, Dick, é uma espécie de Bumerangue misturado com Shuriken, é uma arma. Alguém fez isso e usa como arma contra os bandidos. O Batman é mais homem que morcego. Caramba, ele provavelmente é completamente humano.
- Mas isso não significa nada…
- Significa sim! Significa que só uma pessoa comum pode fazer a diferença, até mesmo sozinha. Nós começamos isso por causa dele, não? Se nós desistirmos agora, sabendo do que sabemos sobre ele, trairemos tudo o que nós acreditamos, todo o poder de ser maior do que nós mesmos. E eu não estou sozinha, eu tenho você…
Os dois se entreolharam por alguns momentos enquanto a mão de Dick repousava levemente em cima da de Barbara, que ainda segurava o Batrangue, seus olhares eram profundos e o silêncio da caverna lhes davam conforto o suficiente para estarem cara a cara sem ter medo de uma possível Harley aparecer. Barbara foi a primeira que retraiu a mão, guardando a arma no bolso novamente.
- Hoje a noite é o dia em que eu vou até onde o Rei Relógio está. Vamos acabar com isso, eu e você. Tudo bem? – Ela perguntou pelo consentimento do amigo.
- … Tudo bem – Ele
concordou finalmente.
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