Alice chegou adiantada como sempre para o encontro com Tayná, mas passou algum tempo e a garota ainda não apareceu. Quando Alice estava ficando ansiosa, ela resolveu olhar o celular e ali está uma mensagem de Tayná avisando que vai atrasar uma hora por ter que ajudar a mãe com algumas caixas.
— Eu devia ter conferido o celular antes, o que vou fazer agora? - Alice resmungou.
Ela resolveu andar pelo parque um pouco, ela deu algumas voltas, foi até o meio do parque, sentou na casinha que fica no meio, depois foi brincar com os equipamentos de exercícios, tudo isso, mas continuou entediada. Daí ela percebeu que, apesar de não estar com a câmera, pode tirar algumas fotos.
Alice tirou foto da casinha, ela já tem mil fotos dessa mesma estrutura, mas sempre achou bem jeitosa e confortável, agora está tirando foto procurando ângulos que não viu antes e a garota conseguiu um ângulo em que as flores em volta do murinho parecem absorver a estrutura e ficou muito satisfeita com o trabalho, então foi direto postar a foto. Ela saiu dali e foi tirar foto dos objetos de exercícios, tentando fazer a mesma coisa que fez com a casinha, os integrar a natureza do parque e fazer parecer com que eles não são tão separados assim, outro sucesso depois de algumas tentativas.
Quando ia para o próximo alvo, Alice recebeu uma ligação do pai.
— Oi, pai?
— Olá, minha filha. Você quer que eu te busque hoje a noite ou você vem sozinha da tua mãe?
— Eu… - Alice relutou em falar.
Geralmente quando os pais dela se encontram e a mãe está no meio de um de seus processos do trabalho, que é o caso atual, eles brigam e a mãe sempre faz comentários que deixam Alice magoada, então por mais que queira que o pai vá pegá-la, ela acha que prefere ir sozinha.
O pai mesmo sabendo que a filha sempre está disposta a gerar menos conflito possível, sempre oferece porque pensa que algum dia a filha dele vai precisar, que ela pode estar cansada, passando mal de ansiedade, estar tendo uma crise por causa da mãe, algo assim. Então todo domingo ele oferece a mesma coisa, mesmo que esteja ocupado, até mesmo dormindo, ele sempre coloca um despertador por volta do horário que a filha deve estar saindo da mãe para ligar e perguntar novamente se ela precisa dele.
— Alice, meu bem? Está aí?
— Ah, sim, estou. Não precisa me buscar, eu consigo ir sozinha, pai.
— Tudo bem, então. Eu vi que você gastou bastante ontem, está tudo bem?
— Ah, foi só que eu ajudei a pagar as contas do Sol e paguei o almoço da Tayná.
— Entendi, toma cuidado para não gastar seu dinheiro todo.
— Pode deixar, pai. Eu sempre economizo, então uns gastos a mais não vão me deixar desamparada.
— Entendo. Se você tiver mais alguma coisa para dizer, pode falar.
— Tenho não.
— Então vou desligar, aproveite o domingo. Tchau, beijos!
— Tchau, pai. Beijos!
Alice guardou o celular porque ficou um pouco desanimada depois de conversar com o pai e lembrar da situação complicada com a mãe, fazendo com que ela não queira mais tirar fotos ou andar pelo parque, querendo só se sentar e esperar até Tayná chegar.
— Você e seu pai parecem próximos. - Tayná disse aparecendo do nada.
— Ah, meu deus! Que susto. - Alice arrepiou-se depois de dar um pulo de susto e colocar a mão no peito.
— Desculpa, não era a intenção te assustar, eu só não queria interromper a conversa.
— Olha o que você fez. - Alice disse pegando uma das mãos de Tayná e colocando no peito dela.
Música: “Ouvi dizer” - Melim
Tayná ficou envergonhada com o acontecimento repentino, principalmente por estar tocando a garota nessa região. Tudo que envolve a Alice deixa Tayná sem graça, ela normalmente está cheia de si e tem um ego que ninguém derruba, mas Alice a desarma de uma forma sem precedentes. E nesse momento estar sentindo o coração de Alice batendo rápido pelo susto, fez com que Tayná desejasse que não estivesse batendo rápido por esse motivo, mas sim por causa dela estar ali.
“O que diabos eu estou pensando?”, Tayná pensou sobre desejar que a outra garota estivesse ansiosa por causa dela. Quando percebeu que o coração de Alice está se acalmando, ela olhou para o rosto da garota e viu que ela está envergonhada e olhando meio de lado, foi aí que Tayná percebeu que deixou a mão por tempo demais na amiga que ainda estava com a mão por cima da dela, mas de leve, meio que esperando que a outra inicie o processo de se afastar.
— Eu… Isso… É… - Tayná tentou formular uma frase sem sucesso depois de afastar a mão.
— Tudo bem…
— Você está bem longe de onde nos encontramos ontem, eu precisei te procurar por um tempo.
— Eu cheguei antes das oito, então só vi tua mensagem tarde, aí resolvi ficar andando pelo parque.
— Faz sentido. Por que você não quer que teu pai te busque? Desculpa, eu ouvi. Você parece se dar bem com ele, então não entendo porquê.
— Ah, é só que desde que meus pais se separaram, eles vivem brigando por tudo e sou uma das ferramentas de briga, então quando minha mãe está estressada e eles se encontram é ruim.
— E ela está estressada?
— Sim, ela pegou um caso grande de um empresário da metalurgia, por isso que ela nem reclamou de eu estar aqui o dia todo ontem e vir hoje também.
— Entendi. Tua mãe é o que mesmo?
— Advogada.
— E teu pai?
— Vice-presidente de uma empresa de papel daqui da cidade. Eu acho que já te disse isso.
— Provavelmente disse, mas eu esqueço.
— Eu que nunca perguntei o que teus pais fazem.
— Ah, meu pai é professor de português de ensino médio de escola pública e minha mãe é diretora de uma das sedes da escola em que estudo.
— Entendi.
— Até por isso algumas pessoas falam que eu trapaceei na bolsa, mas minha mãe só se tornou diretora depois que eu entrei na escola, esse ano.
— Isso é ruim, as pessoas acharem que você trapaceou em algo que fez sozinha.
— É, mas acontece. Porém, eu calo todo mundo com meu tempo na piscina, ninguém me venceu ainda.
— Isso parece legal. Eu não tenho o que me gabar na minha escola, eu entrei por causa de que meus pais podem pagar mesmo.
— Eu vi você tirando foto das coisas, eu sei que aquela escola tem coisas de artes, por que não participa?
— Eu não quero ficar no meio dos outros fazendo coisas com regras idiotas.
— Entendi. Você gosta de tirar fotos mais livres, né?
— Isso mesmo.
Alice mentiu falando que era por causa das regras, mas ela é uma das melhores pessoas a seguir regra de equipamento e uso das coisas, visto que todas as câmeras e o notebook dela são extremamente bem preservados.
A verdade é que Alice não quer participar do clube porque alguns dos membros são preconceituosos com alguns tipos de arte e eles não cuidam bem do material deles e isso faz ela ficar decepcionada, não querendo fazer parte do mesmo grupo e ser associada com eles.
As duas ficaram quietas por um tempo, apenas olhando uma para a outra e se sentindo estranhas por estar com alguém que mal conhecem, conversando como se conhecessem há muito tempo. Foi quando uma delas foi falar, que de repente elas foram puxadas e forçadas a darem passos para se aproximarem, se equilibrando uma na outra. Quando olharam, Sol usou a guia para enrolar as duas e as espremer encolhidas uma na outra.
— Sol. Não! - Tayná disse.
— Sol, gato mau.
As duas se olharam envergonhadas, mas acabaram sorrindo uma para a outra pela situação e então ouviram som de foto, elas viraram e viram um garoto alto, usando óculos de sol e cabelo dreadlock preto, segurando um celular.
— Vou te enviar depois, Alice. A foto de você e da sua namorada. - O garoto disse.
— Kleber, não! Ela não é minha namorada. Aaah! Que vergonha.
— Vocês estão bonitas na foto com o gatinho de vocês, não se preocupem. Vocês são fofas juntas.
— Quem é ele?
— É meu único amigo, ele deu jeito de me perseguir até a escola que estudo também.
— É assim que fala de mim, Lili? - Kleber falou com um sorriso presunçoso no rosto.
— Já disse para não me chamar de Lili, Klekle.
— Ah, não. Klekle não, me perdoa.
— Tudo bem, agora nos ajuda porque nosso gato parece que não vai se mover.
Kleber se abaixou para pegar o gato e desenrolar as garotas, mas Sol o arranhou e mordeu, então ele se afastou. As duas garotas estavam usando as mãos para ficarem um pouco afastadas depois de meio que terem se abraçado na situação anterior, mas está ficando difícil.
— Eu vou precisar te abraçar, meus braços estão doendo. - Alice disse.
— Tudo bem.
As duas se abraçaram, então quando iam falar para Kleber pegar a guia para desenrolá-las, Sol começou a se mover e desenrolou as duas como se o plano dele fosse que elas se abraçassem o tempo todo. O abraço estava confortável, então as garotas demoraram um pouco para perceber, até que Kleber tossiu e elas repararam, então se afastaram quase que em um empurrão e um pulo.
Alice pegou Sol no colo e fez carinho nele, depois o colocou apoiado no braço e no ombro e o gato ficou com a cara virada para Kleber, Sol fez cara feia e mostrou os dentes para o garoto.
— Kleber, vem com a gente tomar sorvete. - Tayná falou, ela quer conhecer melhor o amigo de Alice.
— Eu preciso ir, tenho que fazer umas coisas para meu pai. - Kleber falou com um pouco de medo do gato.
— Ah, que pena.
— Tchau, garotas. Aproveitem o encontro. - ele saiu em sua bicicleta.
— Não é um encontro. - Alice gritou.
Um momento silencioso e constrangedor depois, Alice olhou diretamente para Tayná.
— Ou é? - Alice perguntou baixinho.
— Se você considerar que toda vez que as pessoas saem juntas, elas se encontram, então é um encontro. Mas se for no sentido romântico da coisa, a gente não saiu com essa intenção.
— Entendo, você tem razão.
— Deixa eu pegar ele, teus braços estão cansados não? - Sugeriu indo para pegar Sol, mas o gato a arranhou.
— Sol! - Alice exclamou. - Tayná, você está bem?
— Ele não tinha me arranhado ainda, mas ele fez isso com teu amigo também, até parece que ele está te protegendo.
— Ele gosta de mim. É isso.
— Bem, já que ele vai ficar com você, toma a guia dele.
— Obrigada!
— Vamos tomar sorvete que nem ontem?
— Vamos, mas eu vou com você na sorveteria. Ainda bem que ela abre domingo também, né?
— Sim, isso é ótimo. Acho que o dono acha que precisa que abra sempre.
— Deve ser isso.
As duas e o gato foram para a sorveteria, Alice decidiu que vai pegar um potinho de ninho trufado dessa vez, mas ela precisou que Tayná pegue, porque Sol dormiu no ombro dela. Tayná pegou uma casquinha de banana e de uva.
— Você pegou de frutas dessa vez?
— Sim, eu queria experimentar o de banana e para se eu me arrepender, tem o de uva.
— Entendi. Eu queria tomar o meu, mas vai ser difícil com o Sol no colo.
— Coloca ele no chão, ué?!
— Mas ele está dormindo tão tranquilo.
— Ele não vai ligar se você largar ele só para tomar sorvete.
— Vou acreditar em você.
Alice se abaixou devagar e colocou Sol no chão, ele a olhou um pouco indignado, mas logo ficou em pé e andou para o lado dela. As garotas foram para o parque de novo e Sol seguiu fielmente do lado de Alice como se fosse um cachorrinho treinado, as pessoas que viram isso acharam graça.
Sol é de longe o gato mais bem comportado que existe, ele faz tudo para deixar as meninas o mais confortável possível, mesmo implicando e arranhando Tayná, ele está sempre ali, prestando atenção às necessidades delas.
O comportamento dele apesar de ser inusitado em partes para um gato, é algo muito agradável para as garotas que estão dividindo a guarda dele porque ele dá exatamente o tipo de atenção que cada uma delas precisa na medida certa para que elas fiquem felizes e não incomodadas.
— Deixa eu experimentar os seus. - Alice disse depois que as duas estão sentadas.
— De novo? Mas a gente vai estar… - Tayná falou.
— Vai estar o que?
— Se beijando indiretamente. - Tayná falou meio baixo, mas não tão baixo quanto achou.
Alice escutando isso, começou a rir, ela riu até ficar sem ar e se engasgar com a própria saliva.
Depois de tossir um pouco, ela olhou para Tayná ponderando o que acabou de escutar, não acreditando que acabou de escutar uma das coisas mais inocentes de uma pessoa que parece tão sabida da vida quanto a amiga.
Alice nunca acreditou em qualquer coisa desde pequena, nem em deus, papai Noel ou qualquer criatura mítica. Mesmo gostando de livros desde pequena e tendo lido várias fantasias durante a vida. Nunca fez sentido para ela a existência de criaturas mágicas na realidade ou ideias como superstições.
— Bem feito por rir de mim. - Tayná alfinetou quando Alice voltou a tossir por a garganta ter irritado.
— Você… Sério que acredita nessa coisa? - questionou tentando não parecer estar fazendo pouco caso.
— Eu não acredito em muita coisa, mas eu sempre achei isso meio que verdade.
— Então isso quer dizer que a gente já se beijou três vezes e eu não sabia.
— Você está fazendo graça com a minha cara.
— Você vê muito anime e/ou lê muito mangá e novel?
— Sim, todos esses.
— Está explicado.
— O que? Você também vê, não?
— Só um pouco, mas não levo as coisas para o coração como você.
— Entendi… Não achei graça de você fazendo graça de mim.
— Desculpa. Mas se o problema é beijo, por que não me beija de uma vez e resolve a vergonha?
— Espera! Que? Do que você está falando? Não, não.
Alice começou a rir de novo da reação de Tayná, ela riu com vontade e a garota a empurrou.
— Você estava brincando? Como fala uma coisa dessas brincando e com cara séria? -Tayná se indignou.
— Eu não estava brincando. - Alice resmungou bem baixinho e para dentro.
— O que você disse?
— Nada. Agora me dê sorvete.
— Eu desisto, pode pegar.
— Não, não. Eu quero que você me dê, que nem ontem.
— Você não cansa de me fazer passar vergonha?
— Não, eu não canso.
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