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Entre Dunas

Além da Dor

Além da Dor

Dec 14, 2023

This content is intended for mature audiences for the following reasons.

  • •  Blood/Gore
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       — Isso aqui vai ficar podre daqui a pouco — suspirei, observando minha camisa encharcada com sangue já coagulado.
       O calor traria as moscas atrás de pele morta mais cedo ou mais tarde então não tive alternativa a não ser ficar na pontinha dos pés e jogar a camisa para a rua, pela minúscula, quase imaginária, janelinha no alto da parede e levei um enorme susto quando uma tosse dolorosa acompanhada de murmúrios indecorosos viera da dupla de bêbados.
      Me afastei o máximo que pude e procurei algo para me defender caso tentassem atacar, mas não esperava que a pessoa mais perigosa naquela cela, pelo menos naquele momento, fosse eu, pois um dos homens estava com a coxa gravemente ferida. A julgar pela tremedeira, tinha febre intensa e uma infecção perigosa.
     — Grillo... — o ferido falou, ofegante, cerrando os punhos e olhos azuis enquanto apertava os braços ao lado do corpo.       Estava com tanto frio que sentia dor.
     O outro homem não falou nada, mas tinha uma expressão com mistura de preocupação e raiva. Ele estava dividido entre olhar o ferimento do parceiro e afastar o perigo de ambos. Só me dei conta de que o "perigo" era eu quando o ferido também direcionou o olhar para mim.
     Não sei se me avaliando ou pedindo ajuda.
     Foi nesse momento que notei o quanto eram altos e cheios de cicatrizes.
     Medalhas de batalha.
     — Não vou machucar — levantei os braços acima da cabeça involuntariamente.
     Pareceu convencer o homem saudável, que notei manter uma barba escura trançada no queixo, pois ele teve o cuidado e paciência de mover a perna machucada para um outro ângulo de forma a tentar deixar o homem ferido longe da sujeira da parede de pedra.
      O homem machucado berrou e um odor pútrido encheu minhas narinas. Não precisei olhar para a perna dele, já imaginava o estado que podia estar. O barbudo juntou as mãos em frente ao rosto e pareceu se desculpar tanto para o companheiro, que se contorcia, quanto para a ferida que havia reaberto.
      — Não pega! — me vi dizendo —não pega lá —indiquei o ferimento com o dedo, mas já estava me aproximando.
     Imediatamente o barbudo ficou de pé como uma muralha na frente do companheiro, para protegê-lo, e me empurrou pelos ombros para longe deles sem muita força num claro sinal de que não queria confusão, mas assim faria caso necessário. Em outras circunstâncias, ele teria ganhado um chute muito covarde no meio das pernas, porém, um senso de cuidado me consumiu e novamente me aproximei, com as mãos para cima e repetindo:
      — Não pode pegar. Suas mãos. Olha. — Apontei para a camada de poeira laranja que se acumulava nas mãos dele, e principalmente no ferido, que foi quem teve maior tempo de contato com a parede — isso é cincino — expliquei mostrando as minhas mãos também. Estava mais limpa em comparação a dele porque o excesso foi pela janela junto com minha camisa suja de sangue. — é muito fino, pode contaminar mais.
      Expliquei porque ele ainda parecia confuso observando e esfregando os dedos manchados pela poeira de tom terracota.
     — Precisa limpar e proteger para que não entre mais. — Continuei, me aproximando, um passo com certa cautela, mas o barbudo apenas me encarou com desconfiança — Eu posso ajudar —mostrei as mãos para que ele tirasse as próprias conclusões.
      O barbudo não queria permitir, pude perceber, não antes do consentimento do próprio ferido, que entre calafrios e ranger de dentes sussurrou:
      — Tu-tudo be-bem, Grillo.
     Grillo e eu trocamos olhares por alguns segundos e, depois do acordo de não-agressão mútuo firmado em silêncio, quase ao mesmo tempo, nos ajoelhamos ao lado do ferido. Meu olhar foi direto no ferimento, não pude evitar.
O tecido da calça estava grudado na pele e toda aquela parte da peça estava manchada com sangue e pus.
     Engoli em seco.
    —Vamos ter que cortar aqui, está vendo? —indiquei o tecido — se ficar vai piorar.
    Grillo concordou, repassando a informação para o companheiro pelo olhar. O homem ferido assentiu, umedecendo os lábios rachados com a língua. Poucos segundos depois, ele moveu o quadril e as pernas numa posição que facilitava o manejo de duas pessoas. A muito custo, certamente, pois ofegava.
     — Ajudou muito, obrigada. — Não sei porque disse isso, mas ele pareceu sorrir. Talvez estivesse começando a delirar.
     Depois que fiquei do lado correto dele, Grillo fez menção a abaixar as calças do Ferido, mas eu segurei uma das mãos dele, o impedindo. Percebi o quanto tremia, talvez ele odiasse sangue tanto quanto eu ou até mais.
     — Vamos fazer de outro jeito.
     Então expliquei minha ideia.
     Primeiro usei um dos buracos que tinha na barra da minha calça para rasgar uma tira de mais ou menos trinta centímetros, a dobrei quatro vezes até que ficasse na espessura do meu dedo indicador, e entreguei para Grillo.
      — Coloca entre os dentes dele. —disse para o barbudo — Vai doer um pouco, sinto muito. — Avisei ao outro, que aceitou a faixa entre os dentes com afinco.
     Comecei pela ferida. Era uma fenda grossa, provavelmente feita pela ponta de uma lança. Uma das bordas foi a qual grudou e não era um pedaço longo, porém, estava colado na pele morta por uma película espessa de pus e sangue seco.
      A dor para tirar aquilo seria parecida com a de arrancar uma unha fora com um espinho, por isso, tentei fazer devagar, pegando uma pontinha, mas o ferido se remexeu antes que eu sequer aplicar pressão nos dedos.
     — Vai ser rápido, eu prometo.
     O pomo de adão do homem ferido subiu e desceu.
     Meus dedos imitaram o gesto no tecido pútrido, e num piscar de olhos depois, a ferida estava exposta. Pus misturado com sangue surgiu da ferida e descia num fluxo próprio e de odor terrível. O homem ferido só gritou quando puxei e depois ofegou, provavelmente sentindo certo alívio com a descompressão do inchaço na carne ferida.
     Não perdi tempo e pela fenda oposta fui rasgando o tecido da calça até a parte inferior da coxa. Olhei para Grillo e sinalizei para que o virasse de lado o máximo que conseguisse sem mover as pernas e assim o mesmo fez, sustentando o peso daquele outro homem enorme como se não fosse nada enquanto eu rasgava o resto do tecido. Em pouco tempo uma das pernas da calça cobria apenas menos da metade da coxa e ainda denunciava a peça íntima que o machucado usava por baixo.
      — Joga isso pela janela para não atrair moscas. — Entreguei o pano para Grillo, que fez o que pedi prontamente.        Quando ele retornou para o lado do companheiro dei uma boa olhada no ferimento pela primeira vez.
     Era horrível.
     Estava tão inchado que brilhava em tom de vermelho e branco, mas ao redor da fenda ainda não tinha sinal preocupante de necrose ,aparentemente, então, apesar de ser um ferimento fundo, consegui ver até o osso que felizmente não estava quebrado, também não sangrava tanto, acho que é um bom sinal.
      Depois de avisar os dois que arrancaria uma tira de tecido da outra perna dele para fazer um torniquete, e eles aceitarem, obviamente, passei a faixa ao redor da coxa, um pouco mais acima do ferimento e antes de fazer o nó, pedi para Grillo:
      — Segura ele.
      Felizmente não fiquei muito tempo fazendo a extração do pus restante da ferida daquele homem porque a maioria saiu voluntariamente e o mais resistente era superficial o bastante para não exigir muito nem de mim, nem do pobre homem. Mas ele ainda assim sentiu, gritou muito, se contorceu e até chorou! Grillo, ao contrário, não disse uma palavra e manteve o companheiro o mais estático possível.
      Tirei mais um pedaço de minha calça para limpar a sujeira do restante da perna do homem, isolando a coxa inteira para não contaminar de novo. A fatia de tecido restante da calça dele virou outro torniquete, dessa vez feito com cuidado para aproveitar cada centímetro da faixa e ganhou um laço para o lado exterior do corpo assim evitando que a locomoção fosse tão comprometida.
      — Grillo, você pode me dar sua camisa?
      Aparentemente, ele não pensou duas vezes antes de tirar, porém ao me entregar percebeu a camada de pó e rapidamente me encarou. Sem acusação alguma, apenas dúvida e preocupação.
       — Não se preocupa, ele vai usar um limpo.
      Bati no meu próprio peito e indiquei os metros e metros de algodão que usava para pressionar os seios. Não era um tecido de boa qualidade, na verdade era bem questionável, mas naquele momento era o melhor que nós tínhamos.
      De qualquer forma, Grillo só entendeu minha ideia quando fiquei semi nua na frente de ambos. O ferido ainda estava com os olhos fechados, então somente Grillo presenciou, contudo, apesar de uma leve demora, logo ele desviou o olhar na direção do companheiro.
      Agradeci mentalmente.
     Precisei rasgar alguns bons metros do tecido que estavam contaminados pelo meu sangue ou pelo pó de cincino de quando precisei fugir do Bigode, mas sobrou o bastante para ser dividido em dois. Com um, enfaixei a perna o mais cuidadosamente possível, e o outro deixei dobrado em cima da barriga do próprio doente.
     — Pode descansar agora. — Sussurrei, me afastando dele para vestir a blusa de Grillo. Consegui ouvir um longo suspiro de alívio em resposta.
     Era um tecido grosso, artesanal, de uma lã diferente, e tão quentinha! Me senti vestindo um abraço, de tão confortável.       Ficou enorme, porém adaptável. Tinha tamanho suficiente para esconder boa parte das pernas que minhas calças não cobriam mais, talvez numa via bem movimentada os guardas deixem passar despercebido quando eu fugir.
     Não "se".
    Quando.
    Duas batidinhas no meu ombro me tiraram de devaneios e quando me virei Grillo estava com um sorriso lhe enfeitando o rosto e uma mão estendida em minha direção, que apertei com cautela. Não por medo dele, mas por estranheza minha.
    Estava me agradecendo.
     — Nós três ganhamos, eu estava com frio. Então obrigada também. — Sorri, passando a mão pelo tecido.
     Ele fez um gesto qualquer com as mãos e sinalizou tantas coisas ao mesmo tempo que só entendi "aqui-você-roupa-ele-eu" então agradeci de novo e Grillo sorriu novamente apertando minha mão, dessa vez com mais confiança.
      — Grillo, antes de qualquer coisa... O que fiz agora é temporário, o ferimento chegou no osso, mas por sorte não foi tão grave. O problema é que essa ferida não pode ficar aberta senão vai infeccionar de novo e ele pode perder a perna. Eu poderia costurar, mas não consigo improvisar linha e agulha aqui. — Indiquei a cela ao redor com um movimento circular de dedo
      Conforme fui falando, o brilho e o sorriso de Grillo foi sumindo e dando lugar a um semblante de determinação, como se tivesse recebido ordens, e então, voltou para o lado do companheiro, dessa vez deixando uma das mãos na parede de pedra e estudando, entre os dedos, o pó de cincino.
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