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Entre Dunas

Ao Fio da Navalha

Ao Fio da Navalha

Dec 14, 2023

       Existem bastante desvantagens em morar na Crista, principalmente de dia, quando havia um sol para cada habitante. Mas, tenho que admitir, existiam algumas vantagens também. Me convenci disso enquanto subia o morro até em casa, degrau por degrau, sem a pressa da noite passada.
        Em geral, não temos contato uns com os outros porque todos são suspeitos quando existe pouca comida.
        Nos juntamos algumas vezes em comemorações (obrigatórias) do Templo, acho que é um dos poucos momentos em que ninguém é visto como concorrência. Esse distanciamento é ótimo para mim em geral e, no momento, significa que não corro o risco de ser entregue aos Extremistas junto dos estrangeiros que abrigo, e nem prejudicar os inocentes que vivem nos arredores.
        Estrangeiros, não.
        Terroristas.
        Não, o risco não estava do lado de fora.
        Estava do lado de dentro.
        — Mas o que é isso...?
        Fechei a porta atrás de mim e estreitei os olhos dividindo a atenção entre os dois.
       Povan estava sentado na minha cama, com a perna doente esticada sobre o colchão enquanto a outra apoiava o cesto de comida que ele devorava. Quando cheguei, Povan tinha acabado de jogar um pedaço de carne seca para Grillo pegar com a boca.
        — Serr? — Povan perguntou, então negou e imediatamente se corrigiu — O quê?
        — Como conseguiu isso? — Minha voz era baixa e uma mistura entre descrença e impaciência.
      A verdade é que eu estava com medo da resposta e enquanto apontava para dois barris de água novinhos que Grillo juntava aos meus, eles trocaram olhares, como se combinando uma resposta. Respirei profundamente, com tanta força que quase aspirei o véu do rosto.
       — Alguém entrou na minha casa? — perguntei, largando a bolsa pesada no chão — Maldiç..
      — Não entrou ninguém aqui. — Povan falou calmamente, deixando as mãos em frente ao corpo como se estivesse acalmando um animal.
      — E vai explicar isso aqui como?! Magia? — falei com desdém a última palavra, mas Povan deve não ter pegado pois sua expressão neutra me dizia que achava aquela resposta plenamente possível.
       — Grillo quis repor a água que gastamos ontem, eu disse que isso seria problema seu, mas ele não quis parecer mal-agradecido.  — Explicou, colocando um punhado de sementes na boca — Então pegou aquele manto que você iria jogar fora e
      — Incendiar — corrigi, apertando os ossinhos do nariz entre os dedos. Deveria ter colocado fogo naquilo tudo ontem mesmo. Agora tem alguém rondando como um estrangeiro por aí. Merda.
      — Qafnar. — Ele xingou depois de dois segundos de silêncio. Eu o perfurei com o olhar, o relembrando da ameaça de ontem. — Enfim. Trocou por água com uma dessas famílias que vivem aqui embaixo.
       Olhei em direção a Grillo, que estava de cabeça baixa quase coberta pela cortina transparente da janela de pedra, como uma criança que aguardava seu castigo. Fiz um discreto gesto de agradecimento com a cabeça em sua direção, ele me retribuiu.
        Norrah me mataria se soubesse, mas gosto de me comunicar com Grillo, nos damos perfeitamente bem.
        — Independente disso vocês não podem sair daqui... Ninguém pode ver nem as sombras de vocês. — comentei, tirando meu véu e o tecido do redor da cabeça —temos muito mais que cordas em volta do pescoç..
       — Isso é comida? — Povan interrompeu, indicando a bolsa que deixei no chão, ignorando totalmente minha colocação anterior.
       Respirei fundo e assenti, fazendo menção a me abaixar e pegá-la, mas antes que pudesse, Grillo o fez para mim, retirando o pacote de pés de galinha com um brilho voraz no olhar. Imaginei que sementes e carne seca não iriam suprir um homem daquele tamanho por tanto tempo.
        — Você não parece ser do tipo "dona de casa". — A acusação e desconfiança dançavam camufladas no comentário de Povan.
        — Não sou. — Deixei a suposição no ar, ele poderia entender como quisesse.
        — Bem... — Ele se ajeitou na cama para tentar não me encarar de baixo — E nem do tipo curandeira. — Supôs.
       — Mas aí está sua perna cheia de pontos. — Rebati.
       Acho que levei essa de novo porque ele não falou nada até Grillo lhe jogar um par das roupas que eu tinha roubado.
        — Seu marido não vai se incomodar? — Povan separou a camisa da calça, pela forma que organizou ao lado corpo acho que tentaria vestir sozinho quando ninguém estivesse olhando.
       — Não tenho marido. São doações. — O cortei antes que viesse com mais perguntas — Podem estar um pouco úmidas. — comentei, cruzando os braços e apoiando o quadril contra a parede de madeira próxima a porta, perto dos tapetes bordados que Grillo usava como cama.
        — Vai dar tempo de secar. — Povan falou baixo, passando a camisa pela cabeça. Acho que ele ficou incomodado por estar seminu na minha frente. Uma besteira, ele tem o corpo bem comum.
       — Não precisa agradecer. — Resmunguei, recolhendo pelos cantos as tigelas de barro que usamos ontem para nos limpar, e que hoje serviram comida.
       Grillo ainda estava mais interessado nos ingredientes, ele cheirava cada um que tirava da bolsa como se fossem preciosidades. Eu ainda preciso comentar com eles sobre os últimos acontecimentos, de como poderíamos tirar eles da cidade no futuro, mas estou faminta, as más notícias podem esperar até eu encher a barriga.
         Não sou a melhor cozinheira do mundo (geralmente era responsabilidade de Norrah) mas aquilo tudo que Grillo abraçava precisa se tornar algo tragável bem rápido. Me juntei a ele com as tigelas e sinalizei para que separasse nelas cada um dos ingredientes, deixando de fora a garrafa de azeite e as ervas, ele fez prontamente.
        — Estou pensando num cozido, o que acha?
        Grillo fez movimentos circulares com a mão na barriga, certamente concordando com a decisão.
         — Ótimo, pode colocar bastante água para ferver que eu faço o restante.
         — Quero fazer algo para ajudar também. — Povan falou para qualquer um de nós que pudesse lhe atender.
         — Ficar calado. É o melhor que pode fazer agora.
         Ele bufou em resposta.
         Grillo riu.
         E eu me preparei para começar a cortar os ingredientes quando notei que o caixote pequeno de madeira, onde eu guardo as duas únicas colheres que tenho não existia mais.
          A princípio não é algo que me vai fazer falta. Seria imperceptível, na verdade, em outras circunstâncias, mas não em uma na qual estou isolada com dois procurados.
       Podem ter feito das tábuas finas algum tipo de estaca perfurante.
     Que inferno! A história bonitinha de companheirismo de Grillo pode muito bem ser uma máscara para tentar me despistar, ele deve ter roubado aqueles barris como eu roubei as roupas. Deve ter usado as estacas envelhecidas para derrubar algum dos meus vizinhos e ter lhe tomado os bens.
      "Bandidos não são passarinhos de asa quebrada, Eudora."
       E aquelas cicatrizes não são marcas de bom comportamento.
       Não conheço exatamente a verdade sobre o passado deles já que a fama de "terrorista" deveria ser minha. São completas páginas em branco para mim, e isso me assusta.
       Odeio essa sensação.
        Acho que está na hora de assustá-los um pouco também.
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Entre Dunas
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Eudora Fazad cresceu em Fossa, uma cidade ressecada pelo deserto Vhail, que a circunda. A opressão que seu povo sofre não a impede de aprontar de vez em quando ,principalmente, se a barriga exigir o alimento que ela só consegue por meio do roubo e de apostas.
Eudora brinca com o destino, joga contra a sorte.
E foi numa dessas que acabou presa e condenada com dois estrangeiros perigosos, sendo perseguida por Extremistas, ameaçada por agiotas e empurrada para a magia esquecida entre dunas.
Sua necessidade por liberdade vai além dos instintos de autopreservação que aprendeu a ouvir durante toda a vida e agora, aos poucos, dá espaço para novas experiências que estão lhe mostrando a diferença entre viver e existir.
O incentivo às novas descobertas desperta quando um belo par de olhos verdes instigantes a incita a explorar e conhecer mais e mais do mundo - e sobre si própria.
Eudora só não estava preparada para encontrar o peso das consequências de suas novas escolhas, esculpidas em forças antes adormecidas.
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