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Entre Dunas

Areia Movediça

Areia Movediça

Dec 14, 2023

 Apertei com força meus ferimentos nos dedos desejando que a dor pudesse me trazer de volta. Funcionou em parte.
       Eu lembro de ter feito aquilo, eu lembro do anel só não lembrava que... que foi ali que tudo aconteceu?
        Desviei o olhar para a fachada do estabelecimento à frente e me recordei de passar por ela com uma garrafa de bebida pela metade embaixo de um dos braços. Não para ficar bêbada, eu não fico bêbada, mas criar coragem de roubar um dos lugares mais bem vigiados da região.
          Eu sabia os riscos, conhecia o perigo, e mesmo assim, o que eu precisava só conseguiria encontrar ali, meu objetivo estaria cumprido depois de algumas rodadas de cartas. Era simples, não tão fácil, mas com certeza possível. Acho que eu poderia até ter conseguido sair de lá com o suficiente...
         Mas quis o maldito anel.
         Estava numa mesa redonda, três cartas nas mãos e duas funcionais nas mangas, meu jogo era terrível e, mesmo acolhida pelo álcool, eu tinha confiança de que levaria mais aquela rodada também. Dois dos homens que estavam na mesa nem jogavam de verdade, só serviam de cuidador para o verdadeiro 'rei da mesa': Tuda, o capitão da Fossa.
          Lembro de ter pensado que se mostrasse os peitos poderia conseguir mais rápido, mas existiam boatos de que o capitão não apreciava o corpo feminino. Quase dei sorte nesse sentido porque estava com minhas roupas masculinas e ainda assim não consegui chamar a atenção do velho que estava mais preocupado com suas cartas, suas moedas de jogo e um lindo e brilhante anel que ficava girando no dedo quase o tempo todo, acredito que como um antigo costume.
         Não importava, porque naquele momento, o anel cantou para mim, e eu sussurrei de volta, lhe desejando para mim.
         —  Eudora, Eudora? — pisquei rápido, voltando ao tempo real, foi quando percebi que meu rosto estava entre as mãos de Tarek.
       Senti os calos finos nas pontas de seus dedos roçarem contra o tecido transparente que cobria metade da minha face. Os olhos dele pareciam tão profundos com aquele tom oliva de verde, misturados com o perfume de areia e azeite que emanava de Tarek, me senti a beira de um par de portais que poderiam me levar para qualquer lugar. Me bastava aceitar ir.
       —   Você está bem? — Me esquivei do toque invasivo dele, ciente em demonstrar minha desconfiança. Eu não o tinha dado sinal nenhum de intimidade então não fazia sentido ele me tocar daquele jeito.
        Mesmo assim, me vi assentindo em resposta enquanto pleno, ele parecia considerar me devolver parte do meu espaço pessoal, mas desviei levemente o olhar na direção da fachada do bar novamente.
         —   Só me distraí um pouco. — Ele puxou meu rosto de volta em sua direção.
         —   Você se lembrou dele, não foi? Do anel de pedra vermelha?
         Franzi o cenho. Ele estava tentando me hipnotizar?! Que tipo de olhar é esse?!
        —   Está com você? — Tarek perguntou com um tom de voz suave.
       —   Não. — Me livrei daquele contato visual dando a volta nele e tive que aceitar meu próprio equilíbrio já que desse lado do telhado não tinha onde me apoiar.
      Antes que Tarek pudesse fazer a próxima pergunta, Najarah sinalizou para que fizéssemos silêncio e indicou um trio cambaleante de homens saindo do prédio de Amastor direto para a rua. Dois brutamontes guiando um home magro, esguio e manco.
      Norrah...
      Me sentei sobre meus calcanhares, acompanhando os três seguirem rua acima. De onde estava, não conseguia ver se ele tinha algum hematoma e me forcei a lembrar que não me importava mais com isso, mas ainda assim, algo me sussurrou que aquela seria a última vez que eu o veria.
      Nossas recentes desavenças não apagariam os anos que sobrevivemos juntos, tanto é verdade que estava sendo preciso um autocontrole absurdo para evitar que eu o resgatasse nesse momento.
       "Sempre disse que esse seu instinto de "protetora do povo" seria sua ruína."
        Norrah tem razão, mas, felizmente, não estou com vontade de cair em ruína por ninguém agora. Não mais.
        —   Eu vi isso... — Najarah sussurrou para Tarek tão baixo que até o sibilo do vento poderia lhe abafar as palavras. — Mas não... não é nenhum deles. — Ela parecia incrédula.
       Talvez fosse comum para eles, que vagam pelo deserto, conversar como se fizessem parte o ecossistema árido das dunas, tanto que agora se pareceram se mesclar ao ambiente noturno da cidade.
      Tarek notou o desconforto porque a observou com um olhar compreensivo quase tão confortante quando a carícia que a fez nas costas —   Por isso insistiu tanto em vir aqui? —  Ele imitou o tom de voz de Najarah.
      O cuidado que Tarek demonstrava ter com ela me lembrava muito as reações parecidas entre Grillo e Povan, eles, o bando, se tratavam como verdadeiras preciosidades ou... eu não tenho... nem palavras que consigam descrever isso direito. Família talvez. Mais que isso, com certeza.
       Essa impressão me fez sentir vergonha do que há poucos segundos estava pensando sobre meu antigo parceiro.
        —   Podemos passar na prisão, mas não vamos demorar, é arriscado demais, mesmo que não estejam se concentrando lá. — A postura de líder de Tarek recobriu a máscara de bondade que carregava até agora mesmo que ele mantivesse a mão nas costas de uma silenciosa Najarah.
          Evitei contato visual com ela, mas sentia o peso de seu olhar sobre mim. De qualquer forma, espero me livrar deles antes que ela me considere uma ameaça em potencial.
           —   A prisão fica na periferia da Base, não tem telhados para ajudar, quase não tem casas próximas. Se der alguma merda não quero correr o risco de ser pega de novo. Precisam me soltar. — comentei já me direcionando a extremidade mais baixa do telhado.
          —   Mas nem pensar. — Najarah foi direta.
          —   Ninguém vai te pegar. — Tarek garantiu com naturalidade.
          —   Não faz sentido te soltar justamente quando está nos guiando para um dos lugares mais reforçados desse inferno de cidade. — Ela explicou enquanto se posicionava para fazer o processo de descida pelos beirais das janelas.
           —   Ela está querendo dizer que essas algemas são para nossas seguranças. — Um intermediador com uma pitada de manipulação quase discreta demais par ser perceptível.
          —   Não são algemas, é uma maldita coleira. — Com uma carranca na cara, prendi o lenço translucido no rosto e, dispensando as janelas, saltei telhado abaixo.
          Quando cheguei ao chão, olhei para cima e percebi que Tarek tinha inclinado um daqueles seus sorrisos debochados enquanto negava. Era irritante a forma como ele parecia sempre estar se divertindo às minhas custas.
       Esperei na escuridão da rua enquanto os dois desciam, um de cada vez, pelas janelas. Assim que nos reunimos, em silêncio, seguimos caminho de volta até a parte mais sombria da Base onde ficava localizado o antigo cadafalso. Fiquei surpresa por más memórias me corroerem ao longo do caminho que estou percorrendo, de novo. Diferente da primeira vez não dei tantas voltas porque a presença dos dois era tão próxima que tinham quase se tornado minha sombra então não fazia sentindo despistá-los. Seria perda de tempo.
        A silhueta da prisão e dos restos incinerados do cadafalso foram ganhando mais nitidez conforme o terreno se compactava em grãos finos de areia e argila úmida. Parei atrás de uma das casas da última rua entre a cidade e o antigo presídio para observar os arredores. O cheiro de cinzas ainda era forte e, contra todas minhas expectativas, o centro militar estava a todo vapor.
         Tinham pessoas demais rondando por ali, cavalos e carregamentos de madeira, além de funcionários das minas brilhando em laranja de cincino.
         —   Estão construindo um novo. — falei com nojo.
         —   Significa que os dois não estão aqui. — Tarek passou a mão pela parede atrás de nós e esfregou o pó alaranjado entre o polegar e o indicador.
         —   Existe uma chance de que estejam — Najarah comentou olhando para a mão de Tarek e depois para mim, foi quando disse: —   Lama, tem lama por aqui?
         Franzi o cenho.
         —   Fossa fica a margem do Deserto de Vhial onde você acha que possa existir lama?! — soei mais grossa do que gostaria de parecer.
         —   Tem que ter lama em algum lugar. — Ela insistiu enfurecida.
         —   Você tem certeza que era lama, Najarah? — Tarek tinha o tom de voz descontraído, mas ainda estava atento a cada um de nossos movimentos.
      —   A argila aqui é seca demais e esse pó maldito é laranja demais.
      —   Existe um lugar — interrompi, indicando a prisão com um dos ombros — que a gente chama de Pântano, mas não tem lama lá, só aligátores de areia e outros desses répteis exóticos do deserto. Talvez esteja se confundindo.
       —   Não. — A resposta dela foi incisiva.
       —   De onde é que você tirou essa história de lama afinal de contas?! — roubei a impaciência dela.
       —   Não é da sua conta.
      Num segundo nos encaramos, no outro avançamos uma contra a  outra, mas Tarek se colocou entre ambas justamente no momento que meus dedos encontraram o ângulo perfeito para arranha-la.
       —   Querem mesmo fazer isso? Agora?
       Me afastei primeiro, cerrando os olhos na direção de Najarah que apenas me encarou de volta. Deixei que olhasse o que quisesse já que, muito atrás dela, enxerguei alguns dos destroços do cadafalso rejeitados na planície atrás da prisão.
          Não existe lama em Fossa, obviamente, mal temos água. E mesmo assim atrás daquele prédio se encontrava um terreno fatal para desavisados (como os daquele bando) já que os aligátores afundavam na areia até o mínimo movimento os trazer de volta a superfície com uma bocarra repleta de dentes finos próprios para agarrar e puxar a presa de volta ao fundo da areia movediça.
           — Não é lama que você está procurando.
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Eudora Fazad cresceu em Fossa, uma cidade ressecada pelo deserto Vhail, que a circunda. A opressão que seu povo sofre não a impede de aprontar de vez em quando ,principalmente, se a barriga exigir o alimento que ela só consegue por meio do roubo e de apostas.
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E foi numa dessas que acabou presa e condenada com dois estrangeiros perigosos, sendo perseguida por Extremistas, ameaçada por agiotas e empurrada para a magia esquecida entre dunas.
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O incentivo às novas descobertas desperta quando um belo par de olhos verdes instigantes a incita a explorar e conhecer mais e mais do mundo - e sobre si própria.
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