No meio da noite, o barulho de botas pisando na madeira antiga do piso, ecoou pelos corredores apertados da base, até parar em frente uma das portas do quarto, com dois soldados ao seu lado.
Indelicado, ele abriu rudemente a porta, sem avisar nada ao guarda que permaneceu na guarida por horas ao lado dela, e entrou no aposento com pressa.
Os magos que dormiam nela acordaram quase de imediato, tanto pelo barulho que eles faziam naquele horário tão cedo quanto pela sua presença forte chegado cada vez mais perto.
- Que droga... – murmura a raposa, se remexendo preguiçosamente na cama.
- O que é isso? – exclama Nattan, impacientemente se sentando na cama de baixo, de olhos semicerrados.
- Me desculpem tê-los acordado. Mas acontece que é uma emergência. – O vice capitão disse, parando seu andar no meio do quarto, em cima do tapete – houve um alerta de avistamentos contínuos na área oeste da base. Estamos no horário de troca de guaridas, parte de nossos homens estão indo descansar e outros estão chegando dele, pode ser que aconteça uma outra tentativa de ataque externo e podemos não responder corretamente a ele.
- Então estão querendo que a gente vá fazer o seu trabalho?
- Por favor, peço o seu entendimento, senhor Ligh. – O vice capitão pediu firmemente, ignorando a reclamação de Hory.
- Hmmm... – Fyrr continuava gemendo debaixo dos lençóis desconfortavelmente, levantando um braço acima das cobertas, gesticulou com a mão para afastar seus companheiros – Vão lá vocês dois, não me façam passar vergonha, seus merdas.
- Tsc.
Com mal humor, Nattan e Hory, que dividiam o mesmo beliche, levantaram às pressas, Nattan vestia sua capa e pegava a espada oculta próxima a parede enquanto seu companheiro seguia até o vice capitão, de mãos nos bolsos, indiferente.
- Muito obrigado pela sua compreensão, senhor Ligh. Eu prometo que devolverei rapidamente seus guarda-costas. – O soldado assentiu em favor, e dando as costas para o grupo, seguiu até a porta com os companheiros de Fyrr atrás, que olharam uma última vez para seu contratante antes da porta se fechar de novo.
- Nossa.... realmente. – Jhon reclama.
- Começou então, arf... eles tinham mesmo que chegar tão cedo? Gente animada... – o garoto reclama, deitando-se de costas e fitando o teto do beliche, indiferente.
- Então, quando nos movemos?
- Espera um pouco, tô com soninho...
- Fyrr!
- Argh! Você é muito apressado, apressado come cru. Se for apressado demais, pode dar ruim, vamos esperar um pouco, não é como se eles fossem ser presos ou sequestrados com facilidade.... eu espero.
(...)
Quatro soldados contando com o vice capitão, Nattan e Hory caminhavam dentro do centro do grupo, mantendo sua mente calma enquanto atravessavam os corredores de madeira escuros da base. Já era manhã e o sol raiava, viseiras especiais espalhadas pelas paredes deixavam raios perdidos de sol entrarem e iluminarem parte dele deixando o ambiente mais obscuro ainda.
- Vai ser muito distante daqui? – Nattan casualmente pergunta, indiferente.
- Um pouco, geralmente, a maior parte dos problemas acontecem na área leste da base, onde há câmaras com cargas e uma movimentação mais agitada entre dentro e fora daqui. Não se preocupe, não vamos demorar muito pra chegar lá. – O vice capitão comenta, sorrindo falsamente para o mago, que mantinha sua postura ainda relaxada.
Assim como dito, eles não demoraram a descer as escadarias para os andares mais abaixo, se deparando com o hall de entrada do prédio central do forte, totalmente esculpido em madeira, e saíram para os campos enlameados ao redor dele.
A guarita estava realmente em baixa, com pouco movimento e o silencio matutino ainda vingava. O céu estava branco e leitoso, nublado por algumas nuvens intrusivas que não queriam deixar o sol raiar, mas logo perderiam seu lugar.
O grupo seguiu enquanto acostumavam-se a luminosidade até um bunker na parte leste da base, onde não havia ninguém presente guardando do lado de fora.
O vice capitão tomou a frente e com dois de seus soldados ao lado, abriram a porta levadiça do bunker, deixando o ar frio da manhã entrar nele após algum tempo, e finalmente se virando para o resto, acenou para que entrassem.
Hory olhou com cautela em volta, o bunker estava apertado de caixotes e barris com suprimentos e peças.
- A saída traseira daqui está ligada a um túnel que dá vazão a base, sem isso, não teria como sair sem ser alvo de alguma flecha perdida. Pode não ter parecido, mas muitas vezes, os ciranos ficam de olho em nós através das árvores. – O vice capitão contou, se unindo aos magos outra vez – na maioria das vezes não fazem nada. Mas parece que ultimamente eles vêm tentando descobrir algum jeito de invadir o lugar sem ter de passar pela segurança das muralhas. É só uma ideia do capitão Denovo, mas não podemos subestimar tanto a inteligência desses animais, você sabe.
- Sim, entendo, deve ser difícil ter de estar com tantas ameaças na cabeça diariamente, não é? – Nattan comentou.
- Você nem imagina. Aqui pode parecer bem calmo na maioria das vezes, mas nos últimos tempos, vem acontecendo uma coisa atrás da outra. Ataques, tentativas de invasões, doenças estranhas e mais ataques... – o vice capitão comentava, com um toque de irritação – e as vezes, - ele continuou olhando para os magos com mais afinco – coisa inesperadas aparecem pra servir como pedra no nosso sapato.
- Huh, - o espadachim suspirou, sorrindo de desdém – Eu também consigo imaginar isso, quando as coisas saem do controle, só nos resta tentar amarrá-las até resolver, não é?
- Huh, você nem imag...
Rápido como um relâmpago, o mago espadachim se agachou, avançando na direção do vice capitão enquanto desembainhava a espada oculta em apenas milésimos de segundos, antes que qualquer soldado pudesse reagir. vendo o corpo de Nattan se aproximar assustadoramente, ele instintivamente se afastou um passo enquanto erguia sua baioneta para se proteger do ataque que vinha de baixo, a lâmina rápida e silenciosa de Nattan partiu a arma em dois antes que o soldado percebesse, os outros soldados começavam a finamente sacar a afronta do mago espadachim e começavam a erguer suas armas, mas ao mesmo tempo Hory agiu, apontado sua mão para uma pilha de caixotes e os cobrindo com a energia ondulante de sua psicocinese e as lançando na direção deles.
Os caixotes voaram na direção do grupo como uma nuvem de fragmentos, esparramando o conteúdo e as próprias caixas pelo ar até eles, Nattan havia se aproveitado da confusão provocada no vice capitão e o havia chutado no ponto cego, acertando o calcanhar na mandíbula do soldado, o derrubando, e num salto ágil de costas, desviou da nuvem de objetos que voava pra cima dos outros soldados ameaçadoramente. Os dois ainda atrapalhados tentaram se aproximar do capitão ignorando Hory, quem havia corrido para a entrada ainda aberta do bunker, acabando ambos ficando no meio da confusão a acertados pelas peças e suprimentos do lugar numa onda única que os soterrava.
Nattan havia se juntado a Hory, e agora, ambos corriam para fora do perímetro, entrando outra vez nos campos enlameados do pátio da base sob o céu claro, sendo observados casualmente pelos soldados em volta do perímetro, atraídos pelo barulho dos suprimentos se espatifando no piso e dos gritos de raiva e angústia dos soldados lá dentro.
Ao mesmo tempo, não muito distante dali o soldado de sempre observava a entrada do quarto onde uma kitsune e um kristano dormiam, até que de repente, ele ouve uma batida suave na porta, ignorando por alguns segundos, a batida voltou, confirmando que os “convidados” estavam querendo algo. Ele cautelosamente abre a porta e se encontra com o garoto de roupas vermelhas na frente dela, o fitando com olhos serenos.
- Como posso ajudá-lo, senhor? - o soldado pergunta pressionando as correias que seguravam sua baioneta nas costas.
- Acho que sim, já que deve estar mais familiarizado com essa base do que eu. Quero ir ao banheiro.
- Será que não poderia segurar um pouco mais? - o soldado imprudentemente questiona, com um toque de impaciência na voz.
- Não, idiota, vocês me acordaram no meio da madrugada porque quiseram, agora me leve logo a um banheiro antes que eu mije em você. - Fyrr retruca violentamente.
Contraindo a cara de raiva, o soldado acena com leveza.
- Certo, me siga.
- Ok, huh, é cada uma einh?
Saindo da sala, a raposa pega na maçaneta e olha uma última vez na direção do kristano, assentindo levemente, antes de fechar a porta atrás de si.
o soldado o seguiu de cara emburrada pelo corredor durante longos segundos, passando pelas pequenas janelas curtas que mais pareciam visores onde a luz da madrugada enchia o ambiente com o branco morno e sem vida. logo chegam até uma porta mal cavada na parede interna do corredor. O soldado parou ao lado dela, fitando o pequeno semi-espírito com cautela.
- Aqui é o banheiro, por favor, seja rápido.
- Certo. - Fyrr responde moribundo e entra por ela.
O soldado ao lado da porta aproveitava o silencio mórbido da madrugada naquele corredor para observar os passos da criança dentro do banheiro. Com desagrado se obrigou a acompanhar passo por passo naquele quarto minúsculo com apenas uma pequena janela em forma de visor e um acento com buraco para armazenar o que quer que saísse de dentro de quem estivesse usando, neste momento, passou pela mente do soldado várias ideias do que supostamente um ser semi-espiritual cagava, até acabar satirizando-se, pois, a ideia por si só parecia bastante engraçada, e quando voltou a si, percebeu que não estava mais escutando os sons que o garoto fazia.
Um arrepio passou pela sua espinha na mesma hora, e quanto bateu na porta e não teve qualquer resposta, a abriu bruscamente, não encontrando ninguém do lado de dentro, apenas uma brisa fresca da madrugada saiu do visor iluminado para lhe dar bom dia.
- Porra!
Enquanto o soldado corria pra mais fundo ao corredor na direção do quarto onde o último dos “convidados” restantes supostamente deveria estar, Fyrr, em sua forma de raposa, se esgueirava pelas calhas na parede externa do prédio da base, por onde toda merda deveria passar até a fossa subterrânea em algum lugar no pátio. A vista do lado de fora era mais aberta e ameaçadora do que havia imaginado, mas quilo não fora um problema. Em poucos instantes, uma pequena ave branca de madeira surgiu em sua visão, e saltando da calha, ela o agarrou com as garras curvas de madeira articulada. A ave de madeira carregou a pequena raposa pelo ar num voo ascendente em direção as muralhas, e olhando em volta, notou que os soldados que faziam guarda no pátio e no topo das muralhas de madeira estavam ocupados afastando pequenas criaturas de mana evocadas por Jhon, um enxame de insetos marionetes voadoras feito de papel e manipulados com a magia dele.
Em seguida, a raposa viu mais aves de madeira autômatos se aproximando e carregando cada uma seus outros três companheiros, com Jhon saindo através de uma das janelas mais largas do terceiro andar do prédio, alguns soldados conseguiram se organizar o suficiente para apontar suas baionetas na direção deles e gritar ordens, mas eles já estavam altos demais e voando rápido demais para poderem ser alvejados. As aves atravessaram o topo das muralhas e para além delas, descendo lentamente e em círculos enquanto se afastavam dos limites da base, mas sem poderem ir muito longe.
Há poucos metros do chão, a ave largou a raposa, que pousou com um som abafado na terra e correu para o interior da floresta densa novamente. Com seu faro apurado, começou a busca pelos seus companheiros, não demorando muito para encontrar seus rastros, precisa ser mais diligente que o normal se queria achá-los antes que os portões da base se abrissem novamente.
Em instantes, ele salta dos arbustos e encontra com Jhon, agachado no meio da mata, olhando na sua direção. Em seguida, Fyrr volta a sua forma humana e se aproxima dele, de sentidos afiados.
- Cadê os outros?
- Hmm... já estão vindo, as aves estão guiando-os aqui. - Jhon comenta.
E em instantes depois, Nattan e Hory se reúnem a eles novamente debaixo do teto escuro de folhas da selva, após uma rápida confirmação, eles voltam a afiar seus sentidos.
- Ok, vamos logo, não quero ficar sendo perseguido de novo por esses caras.
Assim, o grupo entra na floresta outra vez.
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