Certa tarde, no meio da minha graduação em química (devia ser o terceiro semestre), eu estava sentado na cantina com minha amiga Lilian em uma mesa plástica. Esperávamos o horário da nossa aula enquanto nossos outros amigos estavam ocupados com sua própria aula, tentando lidar com a deliciosa físico-química, da qual tínhamos escapado por conta de uma humilhante reprovação na cadeira de Cálculo 2. Eu falava das bobagens que vinha à minha mente enquanto um café esfriava na minha frente e Lilian desenhava em um papel ofício à sua frente com Duckstódio, o pato-estojo escolar amarelo, ao lado escutando tudo.
Mantinha minha linha de pensamentos com um olhar perdido em direção à grande mangueira que se erguia no meio de um pátio ao lado do estabelecimento. Foi quando a Lilian, que parava vez ou outra o seu desenho para acompanhar os devaneios que saíam de mim respondendo e dando seus próprios comentários (a gente realmente falava muita besteira), vira o desenho que estava fazendo em minha direção. No papel haviam não apenas um, mas vários desenhos dos quais sequer me recordo hoje. Apenas me lembro daquele para qual meu olho focou primeiro.
Era um garoto de cabelos cacheador com roupas comuns, calça comprida e camiseta, mas usando uma máscara de corvo, sentado em algum lugar que não estava desenhado ali (ficava para a imaginação de quem visse). Aquele desenho me tocou em algum lugar.
Lilian me presenteou nesse mesmo dia com essa ilustração nessa simples folha de ofício e eu a guardei por muito tempo, e a cada vez que olhava para ela sentia uma coceira no pequeno escritor que vive enfiado no meu cérebro. Não sabia o que ele queria, apenas o óbvio — tinha alguma história ali.
Assim se passou por um bom tempo. Cada vez que via o desenho eu tentava descobrir qual história eu queria contar sobre aquele garoto-corvo sentado em algum lugar. Tentei fantasias urbanas, medievais, terror… e todas as coisas que pareciam mais óbvias. Até que um dia eu encontrei a última peça desse quebra cabeça.
Nos stories do Instagram eu passei pela divulgação de uma música de uma banda que eu nunca havia ouvido falar, Fuzzy Bumble. A música era muito boa, mas algo me chamou a atenção no pedaço de clipe que rodava enquanto a música tocava: uma das personagens era uma mulher fantasiada de corvo em uma festa de halloween. Foi então que o clipe da música Any Other Way me deu o último cenário para eu construir minha história.
Devagarinho ela foi se mostrando pra mim. Misturava e tocava em experiências recentes em minha vida, o que fazia da escrita algo bem mais visceral do que eu imaginei que seria. Quando dei por mim estava com um conto pronto na mão (bem maior do que esperava que ele fosse ser). O deixei na gaveta, revisei, revisei, repensei, revisei mais um pouco e agora resolvi publicá-lo.
Se você chegou até aqui, eu quero agradecer pela leitura. Gostaria muito de saber o que achou do texto. Se gostou, comente, siga e espere por mais. Eu sumo, mas acabo sempre aparecendo.
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