Alguns dias depois.
Henry está parado próximo a mesa, enchendo um pequeno jarro com terra e um pouco de fertilizante. Ele cantarola enquanto faz o seu serviço, mas por alguma razão, sente que está sendo observado.
- Que estranho... - Henry sussurra para si mesmo e para de cantarolar, focando sua audição para detectar algum possível barulho.
Ele acaba não ouvindo nada, mas aquela sensação não deixa de incomoda-lo.
- Tem alguém ai ? - Henry questiona de repente e gira seu rosto para o lado, mas novamente não percebe a presença de ninguém e acaba ignorando.
Mais tarde naquele mesmo dia, após o almoço, Henry vai para o segundo andar limpar alguns cômodos. Ele se distrai com suas tarefas, mais ainda sente aquela sensação.
- Isso está me irritando... - Henry murmura e deixa um longo suspiro sair. Agora estava decido a pôr um fim naquilo.
- Sei que está ai. Vamos, apareça! - ele fala alto e com convicção, mostrando que tinha certeza da sua presença apesar de não enxerga-lo.
De repente Henry ouve o barulho de passos e se assusta, mas tenta se manter calmo e saber de que direção aquele som estava vindo. Ele tira sua bengala de dentro do bolso da calça, a estira e a usa para se guiar. Sabia que havia muitos móveis ali e não queria correr o risco de quebrar alguma coisa.
- Por que está me seguindo ? - ele questiona enquanto se move pelo cômodo.
- Se não quer me machucar, por que não aparece ? - Henry estende sua mão esquerda e continua procurando, até que sente alguém se aproximar, como se estivesse passando do seu lado, e por reflexo acaba o segurando.
- Espera! - ele segura com mais força.
- Como você...? - Krodo questiona surpreso. Não esperava ser pego tão facilmente.
- Quem é você ? Está aqui para machucar o Sr. Solaram ? - Henry fala em um tom um pouco ríspido, mas que não mete medo em ninguém. Ele era adorável demais para isso.
- Eu trabalho para ele.
- Que bom, menos mal... - ele suspira aliviado e o solta.
- Já que está aqui, pode me acompanhar até lá em baixo ? - Henry lhe mostra um sorriso gentil e doce.
- E-eu ? - Krodo hesita, surpreso. Ele era muito ingênuo.
- Sim!
- Sou um Idris, não seria bom ser visto comigo.
- Se ainda não percebeu, eu sou cego. Não posso ver o seu rosto e nem te julgar pela sua aparência. - Henry sorri novamente e não há maldade ou ironia em sua voz. Krodo se sente um pouco envergonhado, mas acaba cedendo.
- Tudo bem, vamos. - ele suspira e mesmo sabendo que Henry não podia ver o seu rosto, se esforçava em esconder sua timidez.
- Okay! - Henry concorda animado. Havia feito um amigo.
- Senhor, sua refeição. - Adelea anuncia ao pôr a caixa sobre a mesa.
- Obrigado, pode ir agora. - Octavian desvia seu olhar para a caixa e deixa um longo suspiro sair.
- Senhor, não se sente bem ? - a mulher questiona preocupada.
- Estou bem, não se preocupe. - ele força um sorriso, tentando tranquilizar a mulher.
- Certo... - Adelea acena com a cabeça e sai logo depois.
Ao vê-la sair, Octavian se levanta e para próximo a mesa, ele observa a caixa por alguns instantes e logo depois a abre. Dentro dela há um coelho de pelos castanhos, que o observa com os olhos inocentes.
- Desculpe, garoto. - Octavian murmura com a voz embargada e o agarra, torcendo seu pescoço em um movimento rápido e preciso. O coelho se debate por alguns segundos, mas logo para.
Octavian sente um nó se formar em sua garganta, no entanto, não podia passar mais um dia sem se alimentar ou acabaria ficando doente novamente.
- Porra... - ele sussurra e sem pensar muito sobre o que estava prestes a fazer, Octavian abocanha o pescoço do coelho, sugando seu sangue. Enquanto se alimenta, seus olhos ganham um tom avermelhado e veias negras surgem abaixo das suas pálpebras, lhe dando um ar ameaçador.
Durante a madrugada, Henry acorda com um pouco de sede e decide ir até a cozinha. Mesmo não conhecendo muito bem todos os cômodos, ele tenta se lembrar do caminho que Adelea o mostrou.
Enquanto caminha devagar pelo corredor com o auxílio da sua bengala, Henry ouve um barulho estranho, como se algo tivesse caído no chão. Ele automática fica alerta, mas continua caminhando.
Um pouco mais a frente, ele ouve o barulho novamente, dessa vez mais alto. Ele tenta ignorar sua intuição que diz para correr para longe dali e segue em frente, mas como sua intuição nunca falha, Henry é atacado por alguém que o joga contra a parede.
Antes mesmo de que pudesse reagir ou se levantar, ele sente a pessoa que o atacou se aproximar e cheirar seu pescoço.
- Sr. Solaram... ? - Henry questiona assustado, sentindo uma forte dor em sua coluna.
- Sr. Solaram, se for você, por favor me perdoe... - ele murmura com a voz embargada e logo as lágrimas começam a brotar em seus olhos.
- Você... não deveria estar aqui. - Octavian sussurra com uma voz aterrorizante. Henry começa a tremer de medo e se encolhe no chão.
- Eu disse que poderia se machucar... - ele sussurra novamente e sente sua boca salivar. Queria devora-lo.
- Sim, eu sei... - Henry responde em meio ao choro. Octavian se surpreende e se sente estranhamente culpado. Ele se aproxima do seu pescoço novamente e lambe sua pele, que por si só, tem um gosto incrível.
- Sr. Solaram, está com fome ? - Henry questiona hesitante, mas procura pelo seu rosto e ao finalmente acha-lo, ele o acaricia com cuidado.
- Pode beber. - ele gira seu rosto para o lado, deixando seu pescoço à mostra.
- Isso... - Octavian se sente realmente tentando a beber e abre sua boca, pronto para morde-lo, mas recupera seus sentidos no ultimo segundo e se afasta de repente.
- Sr. Solaram ? - Henry o chama confuso.
Octavian o observa assustado, se perguntando o que diabos estava prestes a fazer com aquela criatura inocente e se afasta rapidamente, sumindo no corredor escuro.
- Sr. Solaram, ainda está ai ? - ele murmura, mas não consegue sentir mais sua presença. Henry deixa um longo suspiro sair e sente que sua estadia ali estava com os dias contados.
- Acho que agora acabou...
Dia seguinte.
Octavian está parado em frente a janela do seu escritório, observando o jardim, até que uma pequena figura que se move devagar chama sua atenção.
- O que esse ratinho está fazendo... ? - ele ergue uma de suas sobrancelhas e continua observado. Henry trabalha duro, carregando coisas pesadas, mas nunca perde aquela feição doce em seu rosto.
- Talvez ser tão ingênuo seja uma dádiva... - Octavian murmura e sorri. Também houve um tempo onde ele era como Henry.
- Sr. Solaram ? - Angela, outra empregada da mansão, o chama ao bater à porta.
- Entre. - ele se vira em direção a entrada.
- Senhor, desculpe interromper, mas a Adelea adoeceu.
- O que aconteceu ? - Octavian suspira. Mais uma mudança inesperada na sua rotina.
- Não tenho certeza, mas ela não consegue se levantar. Se concordar, irei redistribuir os afazeres entre os empregados restantes.
- Tudo bem, faça como achar melhor. - ele esfrega os olhos e sente uma pontada de dor atravessar sua cabeça.
- E diga a Adelea para procurar um médico. Não quero que todos acabem doentes.
- Sim, senhor!
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