Isabel estava tendo uma manhã agradável, acabando de sair da aula de história do reino e estava indo para a aula de esgrima, nada anormal.
— Princesa Isabel. - Madame Augusta a interrompeu em seu caminho.
— Sim? - O desgosto na voz da garota era quase perceptível.
— Vossa majestade deseja falar contigo.
— Obrigada.
O caminho para o escritório do pai, onde ele passava a maior parte de seu tempo, era o completo contrário da rota que estava fazendo.
Caminhando pelos corredores de pedra do castelo, acabou se sentindo um tanto arrepiada, estava entrando o inverno e o local já começava a parecer uma cadeia gelada - os quadrados sem janela do lado externo do corredor para o encaixe de arqueiros só pioravam a geada entrando.
Depois de caminhar por um tempo finalmente chegou, parando de frente para as imponentes portas de madeira, sentiu-se pequena, como se ainda tivesse seus dez anos e não fosse maior de idade como seus dezesseis anos sugeriam.
Ela deu duas batidas sólidas na porta - como passou a fazer depois de começar a não se sentir tão à vontade ali - e esperou.
Dado um tempo ela começava a cogitar que o pai não estava mais lá, quando pensou em ir embora, o general saiu da sala e o pai mandou-a entrar.
— Isabel, minha filha.
— Sim, pai. - Sua mão direita logo foi para o braço esquerdo, que estava começando a coçar
— Recebi uma proposta de aliança do reino vizinho em troca da sua mão prometida ao príncipe Nicolas.
— Mas…
— Sem mas. O dever de uma princesa é se casar para garantir uma boa aliança para o seu reino.
— Entendo.
Sentindo um desconforto crescente no estômago e uma certa coceira por toda a pele, a garota já sabia que não era uma boa ideia, principalmente porque os boatos sobre tal príncipe conseguiam chegar até mesmo ao seu reino, ainda mais depois da última visita.
Ela sempre escutou muito as reações de seu corpo e, nos últimos anos, sempre que o rei tomava uma decisão sobre a vida dela, vinha sentindo uma queimação na barriga e coceira, os médicos da cidade não sabiam o que era, mas Isabel aprendeu que é sempre que o pai fazia algo que a desagrada e deixa desconfortável.
— Ele está em seu caminho para uma visita oficial. Nós recebemos primeiro seu mensageiro, que veio em adianto para anunciar sua chegada.
— Entendi. - O estômago já doía e ela estava sentindo uma queimação pela garganta.
— Já pedi para a madame Augusta informar aos cozinheiros e encomendar coisas da cidade para que façamos um banquete para essa comemoração.
— Entendi. - A a mão coçando o braço se tornava cada vez mais frenética.
— É isso, está dispensada.
Isabel se retirava da sala e se dirigindo até a porta.
— Ah! E, minha filha, você não vai mais treinar esgrima para que sua mão esteja macia quando encontrar com o príncipe.
De tudo que o pai já lhe dissera ou já lhe fizera, essa doeu. Essa doeu realmente de verdade, como se a lâmina que o rei orgulhosamente guarda na parede direita tivesse sido usada para a cortar. O engraçado do escritório que ela sempre achava, ele era todo em branco, uma prateleira cheia de arquivo na esquerda e a espada na direita, nada de pintura da mãe dela.
Junto com a estranheza e desconforto de não ter visto uma única imagem de sua mãe a vida inteira e, depois da sentença do pai, ser arrancada de súbito de algo que ela adora, a dor estava insuportável. Ao treinar com espada se sentia viva ao acertar um golpe, vencer ou perder em um duelo.
Assim que passou pelo arco da porta, fechou-a o mais rápido que pôde, avançou alguns passos e se apoiou na parede para chorar.
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