— Cadê ela?
O horário combinado já passou e a princesa está preocupada de que os guardas a achem perto da muralha externa da cidade. E até agora nada de Natália.
— Essa cavaleira vai me fazer ser pega, quer ver?!
— Princesa, cheguei!
— Shhhhh! Não grita, idiota!
— Desculpa, cheguei.
A princesa passou os olhos pela pessoa que iria fazê-la escapar do casamento arranjado que o pai preparou e não gostou de suas chances. A armadura dela parecia ter sido colocada às pressas, estava amassada como se tivesse levado marteladas.
— Por que sua armadura está frouxa?
— É que eu…
A guerreira não sabia como dizer que tinha perdido a hora porque acabou dormindo e, por antes disso ter caído em cima da armadura deixando-a toda empenada. O capitão viu o seu estado e ela teve de mentir e não sabia como acabou escapando.
— Não quero saber, você arruma quando estivermos longe da cidade.
— Entendido!
— Como vamos sair daqui?
— Pelo portão.
— Você é doida? - Ela quase gritou.
— Confia em mim, princesa.
As duas foram para o portão e quando foram sair, um dos guardas as barrou.
— Onde vão?
— Eu estou servindo como escolta dessa senhorita porque ela precisa buscar o… é… Buscar uma flor no campo! Isso, buscar uma flor no campo.
— De noite?
— Sim, de noite. A flor só floresce de noite!
O guarda ficou desconfiado. Ninguém saía da cidade de noite, os monstros ficavam mais ativos a essa hora. E ainda mais para buscar uma flor e, além disso, ele nunca ouviu falar de uma flor que floresce só de noite na região.
A princesa colocou a mão no rosto, arranhando a face em desespero.
— Sua armadura está frouxa e amassada.
— Opa, desculpa, ainda não me acostumei a pô-la sozinha.
— Vou assinalar alguém para acompanhar vocês duas até o campo. Mas primeiro arrume sua armadura.
— Sim, senhor!
O guarda se afastou, deixando o companheiro que estava um pouco mais afastado as olhando.
A princesa já está pensando que estava tudo perdido e que ela se ferrou ao confiar naquela cavaleira. Ela já estava quase desistindo, quando Natália se aproximou dela, fingiu que ia abaixar para ajeitar a armadura do pé, mas, ao invés disso, passou a mão pela cintura da outra, a puxou e jogou no ombro e disparou em uma correria para fora da muralha.
— Ei, vocês duas! - gritou o guarda que não pôde se afastar muito de seu posto porque o outro não retornou.
A princesa estava com o coração disparado, com medo de alcançarem elas e muito irritada com Natália. Ela começou a bater as mãos nas costas da garota, reclamando.
— Você é uma idiota. Uma incompetente. Eu te odeio! - gritou e gritou enquanto era carregada igual um saco de batatas.
A guerreira só colocou a princesa no chão quando alcançaram as bordas da floresta.
— Viu? Deu certo!
— Sua idiota. - A princesa deu um tapa no rosto de Natália.
A cavaleira olhou para ela com lágrimas nos olhos por causa da dor - e um outro motivo mais profundo - e não entendendo porque ela estava tão brava.
— Mas nós estamos aqui…
— É, mas agora os guardas sabem que fugimos.
— Mas eles ainda não sabem quem é você.
— Mas vão mandar uma equipe de busca para uma guerreira desleixada e inconsequente que sequestrou uma camponesa.
— Então é melhor entrarmos na floresta.
— Urgh!
As duas entraram na floresta e depois de, provavelmente, meia hora viram o primeiro monstro. Natália levou a mão até a cintura para pegar a espada e fechou os dedos no vento.
— Ué?! Cadê?!
— Cadê o que?
— Eu…
— CADÊ SUA ESPADA?
— Eu… perdi…
— Não acredito nisso. Eu não acredito. Não, não é possível.
— Não-
— Quieta. Me deixa pensar.
A princesa começou a pensar no que fazer, se ela voltaria, se emprestaria a espada real que roubou do escritório do pai para uma simples cavaleira - na verdade, ela nem mesmo sabia se a espada tinha lâmina, ela passou os dedos nela várias vezes e nunca cortou -, morrer é pior que se casar com o príncipe Nicolas de Nortásia.
Enquanto a princesa estava indecisa pensando no que fazer, não percebeu que Natália saiu do lado dela.
A guerreira foi enfrentar a onça de chifres e seis pares de patas com as próprias mãos.
A besta desferiu um golpe com a pata que a guerreira não ia conseguir desviar, então ela juntou os braços e recebeu a pancada, perdendo o ar e cuspindo um pouco de sangue.
Antes mesmo de se recuperar da pancada, ela pegou o membro da criatura e, batendo um pé a frente e o outro atrás, puxou até ouvir o crack do osso quebrando com sem aperto e alguns tac de ossos se soltando do lugar, então puxou a pata até que o osso trespassasse a carne e fizesse o ser sangrar.
Em retaliação, o monstro acertou um golpe nas costas da cavaleira, que caiu no chão sem ar e com algumas costelas quebradas, isso, além dos hematomas da queda no castelos estavam fazendo-a quase delirar de dor. Mas logo se recuperou e deu um soco no estômago da besta que havia ficado sobre duas patas para dar um golpe, que tossiu sangue com a força absurda da cavaleira.
Em seguida, Natália rodou os braços em torno do pescoço da criatura e a sufocou até a morte, não antes dela ser capaz de quebrar a armadura da guerreira e deixar cortes profundos e sangrentos nas pernas e barriga dela.
Então, mancando, a cavaleira se aproximou e colocou a mão no ombro da princesa.
— Vamos? - ofegou e sem perceber, escorreu-lhe sangue pela boca.
— Mas e o monstro?
Foi então que a princesa olhou para a outra e percebeu o estado dela, depois viu o monstro morto no chão. Daí se lembrou porque pediu ajuda de Natália, ela foi considerada a novata mais forte da década, até mesmo superou um dos capitães em força quando era apenas uma treineira aos treze anos. E ela é defensora do livre amor, o que é mais um dos motivos para tê-la chamado, além de ser interessante, por assim dizer.
Elas andaram por mais três horas, temendo que o cheiro de sangue atraísse mais criatura, até que Natália não aguentou e, mesmo apoiada em Isabel, caiu no chão tremendo de dor, frio e fraqueza, semiconsciente.
A princesa arrastou a guerreira e a apoiou meio sentada numa árvore, para que não sufocasse com o sangue. O medo tomava conta dela.
Ela nunca teve esse medo antes, não era só de perder alguém fiel a ela. Uma pessoa apenas fiel não faria tudo que fez. E os dias que esbarrou com a cavaleira foram se tornando dias engraçados algumas vezes, até esse dia.
Natália nunca soube, mas Isabel também a observava. Claro que observava, era a guerreira mais forte já entrada no exército, “Além de ser linda como o inferno que causa para os outros.”, “O que diabos estou pensando?!”, eram coisas comuns ao pensamento dela.
Mas destinada a se casar com um príncipe e ter um filho passou a ver a cavaleira como um estorvo e agora vendo tudo isso que ela fez só para que Isabel fosse livre, seus olhos tinham tanto carinho e medo de perdê-la que ela não encontrava o que era o sentimento, que guardado, retornava com força.
Enquanto ponderava tudo isso, escutava cada vez mais criatura perto, ela sacou a espada e ficou ao lado da guerreira que tinha mais e mais dificuldade em respirar.
A primeira criatura que ousou atacar foi um macaco com duas cabeças e quatro braços. A criatura era ligeira, desferiu o primeiro golpe fazendo cortes no braço direito de Isabel, que respirou fundo, fechou os olhos e quando abriu, viu exatamente a posição da criatura pulando para ela. A garota brandiu a espada que brilhou e cortou o macaco ao meio.
A próxima rodada foram duas cobras de quinze metros e uma aranha de cinco metros. A princesa tem pavor de aranhas, mas se manteve firme “Se ela for morrer aqui, meu túmulo será com ela.”.
Quando as cobras foram dar o bote ela rolou no chão e a aranha foi dar um golpe por cima. A luta aconteceu mais correria e alguns cortes nos seres para se enfurecerem e perderem a noção, quando o momento foi oportuno, uma cobra vinha dá o bote pela direita a outra pela frente e a aranha de traz. A garota correu na hora certa e, segurando a espada paralela a seu corpo se jogou a rolar até estar com Natália de novo e as três criaturas se mataram com o veneno uma da outra.
Isabel estava com o braço esquerdo quebrado, provavelmente alguma costela furou um pulmão porque ela cuspia sangue.
— Quem é o próximo? - Tentava mante a espada de pé, mas a própria garota caiu.
Quando tudo estava perdido e elas estavam cercadas por monstros, a espada brilhou, se soltou da mão da garota e fincou no chão e, então, uma bela mulher de peles negras, em vestes lilases como o símbolo que no reino evoca a tranquilidade, além de seu belo e extremamente longo cabelo roxo com uma coroa dourada adornada de jóias apareceu no lugar da espada, meio translúcida.
— Vite, cumpra sua promessa a mim. Peço que proteja e cure minha filha e a criança proibida nascida entre um dragão e uma humana.
Só o nome dito causou medo em Isabel, Vite é a criatura da vida e da morte das florestas, motivo pelo qual os humanos nunca conseguiram se expandir tanto. Além disso, aquela era sua mãe? Como? E Natália é filha de um dragão com uma humana? Como isso é possível?
Após esperar por um tempo, a projeção virou para a princesa.
— Eu te adoro, minha filha, perdão por não estar com você, sua avó estará te esperando - beijou a testa de Isabel e desapareceu deixando a espada no chão.
Antes que a garota pudesse processar, uma criatura bípede parecida com um humano, mas com mãos com garras e coberta de madeira, assim como os pés, mas eles eram de pássaro, no meio do seu peito uma fenda mostrando dois corações, um batendo e o outro preto e murcho. Sua cabeça tinha o formato de uma cabeça de jacaré, mas ao invés de escamas, eram madeira também e a criatura tinha um belo par de asas de borboleta coloridos, mas ainda finos que se podia ver o que estava atrás. Além dos três pares de olhos todos vermelhos de cada lado da face.
Todos os monstros, os que não correram de medo se curvaram perante a presença.
Primeiro, Vite se aproximou de Natália.
— Filha da primeira humana divina, conhecida como Advinetes, aprecio vossa presença.
O braço e as feridas de Isabel se curaram, o processo foi muito dolorido, mas era como se nada tivesse acontecido
— Criatura que já tirou uma vida inocente, mas que foi para se defender, eu te absolvo por isso. Criatura filha de um dragão e uma humana, eu te dou uma segunda vida.
Ouviu se costelas estalarem, as feridas fecharem, o corpo da garota todo se ajeitar. E ela dobrou o corpo respirando com força como se tivesse tido sufocada e começou a chorar.
Isabel com seu corpo recuperado abraçou Natália.
— Nunca mais faz isso, ouviu? - A princesa chorava tanto quanto a garota.
— Isa… - disse se recuperando do choro.
— Oi, Nat?
— Eu posso te beijar?
A princesa selou os lábios das duas ao invés de dar a permissão. Se afastaram de vagar se olhando com olhos de que elas viveram coisas que ninguém entenderia e que seria só delas.
— Acredito que é hora de seguir para o reino Vitenia, crianças. - Vite sorriu, o que para as duas não era assustador como se não fosse a primeira vez o vendo.
— Claro, obrigada, ser supremo. - Natália se curvou.
— Obrigada. - Isabel seguiu o exemplo.
— A princesa deveria agradecer à sua mãe, ou melhor, a sua avó que criou sua mãe. Já que Advinetes não está mais entre os mortais.
Isabel sentiu-se meio vazia por não poder mais ver a mãe, mas ao menos conheceria a avó.
Quando finalmente chegaram ao fim da floresta, passaram meses e durante todo o caminho Vite alimentou as do melhor fruto e da melhor carne.
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