Antes que o primeiro orc chegasse ao muro, Sir Cristan pulou para a rampa e se colocou entre os orcs e a fortaleza.
Os orcs subiam a rampa de acesso criada por Dizzug, liderados por um enorme orc cujos braços tinham o triplo da circunferência dos braços de Sir Cristan e que segurava em sua mão direita um enorme machado de guerra. Diferente dos humanos, os orcs não usavam muitas peças de armadura. Basicamente usavam um elmo e um peitoral de metal, e variadas proteções de couro em diferentes partes. Gostavam de ter maior liberdade de movimento e viam o excesso de proteções como fraqueza, ou medo de se machucar. Orcs não tinham medo de se machucar e o pensamento deles era que se você matasse o seu oponente ele não teria a chance de te atacar, então bata primeiro e não tenha misericórdia.
O orc levantou seu braço e todos que vinham atrás dele pararam. Sir Cristan fez o mesmo para seus arqueiros. O orc encarou o humano à sua frente com o corpo todo coberto por armadura, dos pés à cabeça. Era possível ver apenas os seus olhos e neles focou. Encarou o cavaleiro humano por uns segundos para descobrir se por detrás de todas essas armaduras havia um covarde ou um guerreiro.
“VOU TE MATAR, CABEÇA DE BALDE!” gritou na língua dos orcs, apontando seu machado para Sir Cristan.
Sir Cristan não entendeu as palavras, mas entendeu a mensagem.
“VENHA, BESTA DE NAZARTH!” o cavaleiro gritou de volta.
O orc atacou com seu machado e Sir Cristan repeliu o golpe com seu escudo, em seguida enfiando a espada na coxa direita do orc que gritou de dor mas logo sorriu. Estufando o peito, o orc soltou um grito desafiador, segurou a haste do machado desta vez com ambas as mãos e proferiu novo golpe. Sir Cristan tentou absorver o golpe com seu escudo e realizar um novo contra ataque, mas desta vez o impacto foi grande, amassando um pouco o escudo e forçando o cavaleiro a dobrar um pouco os joelhos. Perdendo o momento do contra ataque, o cavaleiro acabou ficando na defensiva e o orc continuou desferindo um golpe atrás do outro, subindo a rampa e fazendo Sir Cristan recuar e, a cada novo golpe, seus joelhos dobravam-se um pouco mais. Batia com o machado no escudo de Sir Cristan com vontade, com tesão, babando profusamente pelas suas presas e balançando sua cabeça em regozijo a cada porrada que desferia, como se o cavaleiro a sua frente fosse apenas uma tora de madeira para ele cortar ao meio.
No próximo ataque do orc, Sir Cristan decidiu não defender. Girou seu corpo para a direita, fazendo o orc enterrar o seu machado no chão e abrindo brevemente o seu flanco para o cavaleiro, que estava perigosamente na beirada da rampa. Atacou com o seu escudo diagonalmente para cima, enfiando-o na garganta do orc, asfixiando-o e, em seguida, desferiu o golpe final decepando a cabeça do orc e chutando o seu corpo para fora da rampa, o qual caiu até o fundo do fosso. Uma queda livre de vinte e cinco metros que esmagou todos os seus ossos no impacto e pintou o chão e as paredes do fosso com a cor do inimigo.
Sir Cristan virou-se então para os demais orcs.
“Esse foi um bom aquecimento.” disse, reposicionando-se na rampa e estalando o pescoço. “POR CARMINE!” gritou, e correu para cima dos orcs. Os orcs também gritaram e correram na direção de Sir Cristan. Atacando com seu escudo e sua espada, ele decepava cabeças, braços, perfurava pescoços e jogava orcs para a direita e para a esquerda.
“POR CARMINE!”, gritaram os arqueiros, retornando aos ataques.
Devido a largura da rampa, apenas dois orcs conseguiam subir e lutar com Sir Cristan por vez. Sendo assim, com o auxílio de seus arqueiros e das rápidas e certeiras flechas de Rob, a situação na rampa que dava acesso ao muro direito parecia temporariamente controlada.
“Zique!” Azurya apontou para a muralha da esquerda da fortaleza. O orc xamã começou a erguer uma rampa naquele lado. Ambos correram para o outro lado para juntos tentarem impedir o xamã, ou ao menos atrasar a rampa de ser concluída.
“Olá Ezequiel.” disse Julius, comprimentando a chegada dos magos junto a eles na muralha esquerda. “Espero que tenha algum truque debaixo da sua manga, ou teremos problemas.”
Sem perder tempo, Zique e Azurya se concentraram e as energias de seus cajados se entrelaçaram e atingiram juntas o enorme volume de terra sendo erguido. Ouvia-se novamente um barulho parecido com o de um pequeno terremoto na medida que a terra tremia, sofrendo pressão para cima e para baixo e expelindo pedaços de terra e pedras para os lados.
“Temos mais um problema. Olhem!” disse Julius, apontando para o besouro gigante, voando na direção da fortaleza e trazendo, em cima de si, o enorme líder do exército orc, Gulk’arik.
Eu vou pegar esse filho da puta pensou Julius, acompanhando a trajetória do besouro na mira de sua flecha. O besouro voava a mais de cem metros de altura e começou a circular em direção ao final da muralha frontal esquerda. Julius girou o seu corpo, acompanhando o besouro, e percebeu que o besouro se alinhou à direção do muro. As costas de Julius estavam voltadas para a Casa do Portão e o besouro voava acima da torre que marcava a esquina do muro esquerdo. Gulk’arik via todos em cima da muralha em linha reta à sua frente.
Assim como Julius, todos os demais arqueiros e mercenários apontavam seus arcos na direção do besouro, deixando os orcs para depois e confiando na habilidade dos magos de lhes dar o tempo necessário.
O besouro parou no ar por uns segundos e então começou a descer num rasante em direção a todos posicionados na muralha. Desceu quase que verticalmente até que seu corpo estivesse na mesma altura de seus alvos.
“DOR E MORTE!” bradou Gulk’arik, assim que o besouro começou a voar em linha reta na direção dos humanos. Várias flechas voaram em sua direção, mas elas foram todas repelidas por seu escudo ou pela grossa carapaça do besouro.
Vendo que o monstro alado se aproximava e que não restava tempo para outro ataque, todos se deitaram rapidamente com a barriga no chão. Os primeiros arqueiros no alcance do besouro não tiveram tempo suficiente para tanto e um deles acabou sendo agarrado pelas enormes mandíbulas do besouro enquanto outro teve sua cabeça violentamente transversada na diagonal como se fosse uma melancia, adicionando a velocidade de voo do besouro ao golpe da pesada espada de Gulk’arik.
Os demais que se deitaram sentiram a ponta das pernas do besouro arrastando por suas costas, arranhando suas armaduras e causando pequenos ferimentos e arranhões nas partes menos protegidas, chegando a arrancar a orelha de um dos arqueiros.
Azurya e Ezequiel se viram obrigados a também se deitar e acabaram tendo que interromper o duelo mágico com o xamã. Com isso, a rampa de terra voltou a crescer e rapidamente chegou ao topo do muro.
“POR ORCLUD!” gritavam uns orcs em sua grotesca língua ao subir na rampa. “MORRAM HUMANOS!” gritavam outros. “DOR E MORTE!”
Os arqueiros levantaram-se e viram os orcs subindo rapidamente. Soltaram duas saraivadas de flechas derrubando alguns, mas viram que não conseguiriam impedir a subida.
“ORCS SUBINDO O MURO!” gritaram os arqueiros e os escudeiros subiram os últimos degraus da escadaria e se posicionaram em cima do muro, cinco de um lado da rampa e cinco do outro, formando uma barreira defensiva. Os arqueiros e os mercenários correram para a torre no final da muralha esquerda para ficarem atirando à distância.
Zique e Azurya correram na direção dos arqueiros mas pararam logo atrás da barreira de cinco escudeiros e começaram a usar suas magias para atacar os orcs que subiam.
Zique erigiu magicamente estalagmites de pedra, saindo da superfície da rampa, que perfuraram orcs em suas pernas e virilhas, fazendo alguns perderem o equilíbrio e caírem no fosso. Outros ficaram presos nas estalagmites, urrando de dor e impedindo momentaneamente o avançar dos demais orcs, até serem brutalmente arremessados para baixo pelos orcs que vinham atrás.
Azurya criou um colchão d'água cobrindo oito orcs dos pés até o joelho e depois congelou-o, imobilizando-os. Enquanto os orcs batiam no gelo com suas armas, os arqueiros os perfuravam com suas flechas. Com a maioria dos orcs presos no gelo mortos, o grupo de oito orcs tornou-se um enorme bloqueio no topo da rampa, impedindo a passagem dos demais orcs. Aqueles logo atrás começaram a unir forças para tentar empurrar o pesado bloco para fora do caminho.
Nesse momento, Gulk’arik voava alto com seu besouro, o arqueiro preso nas mandíbulas ainda gritava de dor na medida que o besouro apertava-lhe a cintura aos poucos, quebrando suas costelas, perfurando seus órgãos e causando o máximo de agonia. Gulk’arik olhou para baixo e depois olhou nos olhos do arqueiro.
“SOFR-GA…”, gritou na língua dos humanos, com certa dificuldade na dicção devido às enormes presas saindo de sua boca, soltando um grunhido entre cada palavra. “...E MORR-GA!”
Com um comando dado ao besouro, o mesmo terminou de torturar o arqueiro e partiu-o ao meio, fazendo as duas partes do seu corpo caírem em direção ao pátio da fortaleza.
O grupo de dez cavaleiros e os lanceiros posicionados ao portão olharam horrorizados o corpo de seu irmão de Caspius, que caiu partido ao meio e no impacto se desfez em muitos outros pedaços, espalhando suas entranhas e miolos pelo chão.
Torel nunca tinha participado de uma batalha e nunca tinha visto a morte de perto. Bastou um rápido olhar na cena horrenda para que desviasse os olhos. O lanceiro veterano ao seu lado pegou na nuca de Torel e virou seu rosto à força em direção aos restos mortais do arqueiro.
“Não, Torel!” ele disse, descontando a raiva que sentia dos orcs no novato lanceiro. “OLHE PARA SEU IRMÃO! OLHE PARA SEUS RESTOS MORTAIS! OLHE PARA O QUE ESSES ORCS MALDITOS FIZERAM COM ELE E FARÃO COM MUITOS OUTROS DE NÓS! OLHE!” ele gritou, apertando a nuca de Torel e impedindo-o de virar a cabeça. “OLHE E ACOSTUME-SE COM A MORTE! POIS QUANDO CHEGAR A SUA VEZ DE LUTAR, FAÇA O MÁXIMO POSSÍVEL PARA QUE SEJA O CORPO DE UM ORC NO CHÃO AO INVÉS DO SEU!”
Gulk’arik desceu em novo rasante e desta vez as mandíbulas do besouro abraçaram o grupo de oito orcs que tinham suas pernas congeladas. O besouro empurrou-os lá de cima e caíram todos se espatifando dentro do fosso, mas liberando a rampa para o resto do exército que subiu em fúria e finalmente colocou seus pés no topo da muralha.
Os primeiros orcs que chegaram ao topo foram massacrados pelas espadas dos dez escudeiros, mas os orcs não paravam de chegar e alguns pularam em cima dos escudeiros, quebrando a formação. Em poucos minutos os orcs já tinham quebrado a defesa dos escudeiros e começaram a iniciar a tomada do muro esquerdo.
Assim que a formação defensiva se desfez, os cinco escudeiros restantes recuaram para as escadas, fazendo uma nova barreira defensiva para impedir a entrada dos orcs ao pátio. Zique, Azurya e os mercenários recuaram em direção aos arqueiros no final do muro.
“PERDEMOS O MURO ESQUERDO!”, gritou Sir Merrin, que liderava o grupo dos cavaleiros na ausência de Sir Cristan. “CAVALEIROS! PARA AS ESCADAS!”
O grupo de dez cavaleiros desmontou de seus cavalos e correram para a escadaria à esquerda, para ajudar os cinco escudeiros restantes a defender o muro e impedir a entrada dos orcs ao pátio da fortaleza.
Khelgar estava ali perto, entristecido. Nenhum dos guerreiros de Caspius lhe deu atenção. Todos ignoraram a benção de Pulque. Os últimos que tentou convencer foram os cavaleiros. Isso o deixou bastante chateado, mas tentou atribuir isso ao fato do exército de Caspius já ter Carmine como deusa patrona.
Engoliu seu orgulho, junto com uma garrafa de cerveja, beijou o símbolo de Pulque e correu para as escadas, seguindo atrás dos cavaleiros.
Com a ajuda dos cavaleiros, os escudeiros conseguiram controlar as escadas. Os escudeiros carregavam escudos enormes que, quando colocados lado a lado, formavam uma sólida barreira contra os avanços inimigos. A cada oportunidade, contra atacavam com suas espadas curtas, adicionado dano aos ataques feitos pelos cavaleiros logo atrás, com suas lanças.
Como estavam no topo das escadas, a queda era de quase quinze metros e, sendo assim, nenhum orc se atrevia a pular direito ao pátio. A única maneira era passando pelos escudeiros e cavaleiros que montaram uma formidável defesa a qual os orcs estavam encontrando severas dificuldades de transpor. Some-se a isso os incessantes ataques dos arqueiros à distância os quais acabaram forçando parte dos orcs invasores a formarem um grupo para perseguir e eliminar os magos e arqueiros.
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