Um dia após Mandipha e seu grupo partirem da residência de Kemiro, de acordo com o combinado entre os dois, Kemiro fez um anúncio público:
— Dia após dia, desde nosso primeiro encontro, eu tenho sentido cada vez mais gratidão a Hein’Ra por ter entrelaçado nossos destinos.
Meus sentimentos estendem-se à sua família. Desta maneira, a fim de provar minha resolução, como demonstração de respeito, seguindo a tradição da Casa Hauveron, eu Kemiro Boronéa manifesto meu Direito à Conquista para com Mandipha Hauveron.
Para aqueles que se atrevem a ficar entre mim e minha prometida pela Hein’Ra, se preparem, pois usarei todos vocês como degraus para alcançar minha Estrela.
Estas palavras finais são para minha família Hauveron: em seis meses, irei até a porta de sua Casa com presentes e oferendas a fim de comemorarmos nossa união. Até esse dia auspicioso, eu desejo que a pura Hein’Ra possa banhar a todos. —
Tal anúncio, inicialmente, pegou a todos de surpresa. Porém, quando foi confirmada a veracidade da proclamação, uma onda de reações espalhou por toda a cidade de Nemuria.
Uma pletora de opiniões imediatamente tomou conta dos meios de comunicação, onde sua maioria centralizou-se em exaltar a arrogância de Kemiro em desafiar a Casa Hauveron, mesmo ele mesmo não possuindo nenhuma habilidade.
Seguida por tais críticas, logo um enxame de opiniões passou a se acumular em volta da afirmação de Kemiro estar se agarrando a Mandipha, tentando usá-la como artifício, a fim de melhorar sua imagem pública. Afirmação que gerou uma intensa revolta online de indivíduos que seguem e adoram a Sacerdotisa Mandipha como sua Deusa.
Uma batalha entre grupos diferentes que, se exaltam em desenvolver a melhor conspiração sobre as razões sombrias de Kemiro em usar Mandipha, parece alcançar novos patamares, inflamando os ânimos.
Entretanto, para adicionar ainda mais combustível à batalha, menos de dez minutos desde a proclamação de Kemiro se passaram, e um anúncio direto da família Hauveron foi divulgado. Porém, o que muitos esperavam ser a resposta da Sacerdotisa Mandipha acabou sendo uma resposta de seu avô, Angor Hauveron:
— Suas palavras alcançaram minha Casa. Percebo que você tem habilidades com suas palavras. Minha netinha me contou diversas coisas interessantes sobre você. Ao ponto de que me prepararei durante esses seis meses a fim de recebê-lo com as mais altas cordialidades, pois temos diversos assuntos que precisam ser esclarecidos.
Acredito em minha netinha, então, é bom que você seja pelo menos metade de tudo o que ela professa a seu favor. Caso contrário, mesmo que chegue até a porta, você não entrará na minha Casa. —
Tal resposta gerou muita confusão entre os grupos que acreditavam que, mesmo a Casa Hauveron propondo o noivado, era Kemiro quem estaria se aproveitando da popularidade de Mandipha.
Porém, analisando entre as entrelinhas, existe a concordância de que Mandipha possui uma opinião estranhamente positiva sobre Kemiro, que ninguém jamais acreditou ser possível.
Enquanto a cidade de Nemuria está polvorosa com o inesperado e desacreditado desenvolvimento em seu relacionamento, Kemiro está lendo a resposta manifestada, diferente da maneira que foi planejada, ele reflete:
“Esclarecidos”, hã? Pelo visto, eles (família Hauveron) decidiram não comentar nada sobre eu ter ajudado Almer.
De qualquer maneira. Eu tô fudido! Mesmo sob juramento, o que foi que ela disse pra ele decidir que precisa treinar apenas para me receber? Será que ele está planejando me matar e dizer que foi engano?
Durante estes seis meses, continuar o refinamento do meu corpo terá que ser prioridade. Eu terei que aguentar a dor do refinamento, caso contrário, minha vida realmente estará em jogo!
Sentindo um frio na espinha enquanto reflete entre suas opções de: ser frito vivo ou cair no fogo, ele percebe Safix se aproximando, informando:
— Lorde Kemiro. A atendente da senhorita Amira acabou de contactá-lo. Ela informa que a senhorita Amira requisita sua presença.
— Estranho. — Com uma expressão confusa, ele comenta. — Sua requisição está adiantada. Ela, por acaso, informou algum motivo?
— Não. Porém, o tom da voz da atendente parecia agitado, como se ela estivesse ansiosa. Ela pediu desculpas, mas nas palavras de Amira, ela solicita sua presença quanto antes. — Responde Safix, balançando sua cabeça.
Estranho. A condição dela tem sido estável por vários meses. Será que aconteceu algo?
— Como se eu já não tivesse preocupações o suficiente. Bem, pelo menos, eu também tenho alguns assuntos para resolver com ela. — Kemiro comenta, suspirando, ele informa Safix. — Já que parece ser algo urgente, eu irei agora. Safix, cancele qualquer compromisso que eu tiver até o dia de minha missão. Se questionarem o motivo, apenas informe que surgiu um imprevisto.
— O que devo dizer em caso a Casa Principal lhe contate?
Parando, massageando sua testa irritado, ele suspira, respondendo:
— Não muda nada. Apenas tente verificar os detalhes e me passe um relatório depois.
É irritante, mas eu ainda não possuo o necessário para ignorar a Casa Principal. Eu preciso me esforçar mais!
Kemiro se prepara para ir até a residência de Amira, refletindo nas alterações que precisa fazer em seus planos.
◆◆◇◆◆
Mesmo saindo de sua casa antes do horário do almoço, devido à colossal extensão da área da cidade de Nemuria, somado ao fato de que Kemiro costuma utilizar meios de transportes terrestres, suas viagens costumam durar até o dobro do tempo necessário. Um hábito desenvolvido a fim de camuflar seus passos.
Porém, devido ao chamado incomum de Amira que está fora de sua programação normal, Kemiro decidi alterar seu meio de transporte, escolhendo pegar um avião do setor 3, onde ele reside, até o território L2, setor 11, onde está localizada a residência de Amira. Em uma linha reta, são pouco mais de 450 quilômetros de distância, porém, distância pouco maior do diâmetro do Vazio da Ilha, que mede 449 quilômetros. Entretanto, devido ao espaço aéreo próximo ao Vazio da Ilha ser proibido, os aviões precisam fazer uma curva que estende mais o tempo de viagem.
Após duas horas de viagem, Kemiro chega ao setor 11, na cidade menor, Telran. Pegando um táxi, ele segue até a residência de Amira, trajeto que dura mais uma hora.
— Não importa quantas vezes eu venha aqui, é sempre uma visão incrível.
Chegando nas redondezas da propriedade, ele exclama cheio de emoções. A extensão do território é quatro vezes a área da residência de Kemiro, englobando uma densa floresta, com árvores enormes, que servem como muralha.
A Casa que Amira pertence à família Telffira, mesmo não sendo relacionada a nenhuma Casa Pilar, possui riqueza e influência a par com elas. Sendo uma família ancestral de Bruxas e Feiticeiros, diferentes dos Ma’Jis, essa vertente não se conecta com a Hein’Ra por abrir sua Fundação da Hein’Ra. Mas sim, fazem uso da Lei Natural para manifestar Eventos.
Devido à sua ancestralidade, o território da família Telffira possui diferentes instituições que visam treinar as novas gerações, daqueles que optam por seguir o caminho dos Bruxos. Mesmo a entrada, que dá acesso à primeira ‘camada’ de prédios e residências, possui centenas de metros em extensão, parecendo pequena, em relação aos milhares de indivíduos que trafegam dia e noite.
Com tamanha população, Kemiro precisa deixar seu táxi a quase trinta minutos de distância, devido ao constante tráfego de carros. Felizmente, para Kemiro, caminhar esta distância não é algo problemático. Tal distância, devido ao refinamento de seu corpo, não é suficiente para fazê-lo suar.
Pelo contrário, o frescor da brisa vinda da floresta faz o entardecer do dia ainda mais gélido, porém refrescante para Kemiro, que caminha relaxadamente, observando humanos e as mais diferentes raças de seres que frequentam as instituições da família Telffira.
Apreciando as enormes árvores que crescem a cada passo que ele se aproxima da entrada, Kemiro e os presentes notam um único carro de luxo vindo em sua direção. Parando a seu lado, de dentro, uma mulher humana, trajando um vestido uniforme tradicional de empregada, elegantemente se curva para frente com suas mãos à frente de seu corpo, o cumprimentando:
— Lorde Kemiro. É um prazer recebê-lo mais uma vez. Perdoe nossa incompetência em fazê-lo caminhar até aqui. Por favor, nos permita acompanhá-lo até a sede.
— Olá, Kirianna. É bom estar de volta. Você não precisa se preocupar com isso, a culpa é minha por não avisar minha chegada. Como está a situação dela?
Kemiro responde com um sorriso sincero, observando Kirianna, uma mulher alta de corpo voluptuoso, que nem mesmo seu uniforme tem a capacidade de esconder. Longos cabelos pretos trançados. Óculos redondos e luvas de seda branca.
— Muito obrigado por sua compreensão. — Indicando para Kemiro adentrar no carro, ela responde. — Por favor. Responderei sobre a situação da senhorita no caminho.
Após Kemiro e Kirianna partirem em direção à entrada, muitos que estavam próximos pararam, curiosos, porque alguns reconheceram Kemiro.
— Ei! Aquele não é Kemiro? — Um jovem indaga a seu amigo.
— Kemiro? Você diz o Enigma Excluído?
— Claro, quem mais seria? Se não me engano, ele mora no setor 3 do território N4 da região Norte, o que ele está fazendo aqui? — O primeiro jovem questiona curioso.
— Você não sabia? A senhorita Amira faz parte da equipe de Kemiro. Como você sabe tão precisamente onde ele mora? Você gosta de fofoca? Não me diga que você é um fã dele? — Questiona o segundo com uma expressão estranha.
O primeiro, responde:
— Não é “gostar de fofoca”. É estar informado de assuntos relevantes! — Balançando sua cabeça, ele continua. — Ele estar aqui, não é tão estranho, porém, aquela mulher ter vindo pessoalmente buscá-lo, é o mais estranho.
Confuso, o segundo indaga:
— Estranho? Por qual razão? Mesmo sendo de uma Casa Suporte, não é estranho ele ser tratado com cordialidade. Ainda mais que este território está sob o gerenciamento da Casa Boronéa.
Olhando para o amigo, o primeiro apenas suspira, comentando:
— Você realmente não sabe de nada. Eu preciso de amigos novos. — Ele não dá oportunidade para seu amigo protestar, explicando. — Aquela é Kirianna, conhece pelo menos este nome?
— Claro que sim! Kirianna é a Empregada Chefe, sob ordens diretas da matriarca da família Telffira.
— Exatamente! O status dela como Empregada Chefe da família Telffira é maior do que um descendente de uma Casa Suporte. Ainda mais alguém considerado sem qualificações como Kemiro. O fato da senhorita Amira estar em sua equipe não lhe dá créditos, pelo contrário, ele está ganhando muito com sua presença. Então, por que a Empregada Chefe viria pessoalmente para receber alguém como ele?
— Bem… Isso é verdade.
Ambos olham para a direção do carro, passando pela entrada exclusiva para membros da família Telffira com olhares curiosos, sentindo inveja em seus corações.
◆◇
Durante o percurso, atravessando a densa floresta com árvores, em média, passando dos 60 metros de altura, Kemiro fecha seus olhos, sentindo a brisa gelada e refrescante adentrando pela janela. Sentindo como os fios da Hein’Ra fluem, como um rio em uma planície, Kemiro, expressa:
— Tão tranquilo.
— Fico feliz que você pense assim, Lorde Kemiro.
Percebendo que expressou seus pensamentos, Kemiro se volta para Kirianna, que possui uma expressão relaxada, ele comenta:
— Kirianna, você não precisa se referir a mim como Lorde, seu status é superior ao meu. Meu Par insiste em continuar com esse hábito, mesmo eu argumentando que não é necessário.
— Status não tem nada a ver com minha inclinação em referir-me a você como Lorde. Não nego que tal inclinação veio do exemplo de Lady Azarthine, entretanto, assim como ela, apenas estou lhe dando os devidos créditos por suas habilidades e conquistas.
Quem me dera se outros pensassem assim, especialmente minha família. Minha vida teria sido muito mais tranquila.
— Fico feliz em receber tal consideração de alguém de sua Qualidade. — Kemiro expressa sorrindo sinceramente.
Após um breve silêncio, Kirianna afirma:
— Nossa matriarca também possui interesse em você. Seguindo o comando dela, eu vim lhe buscar, pois ela deseja encontrá-lo.
Kemiro quase não consegue impedir de exclamar seu choque. Ele reflete:
A matriarca quer me ver? Por quatro anos que eu venho ajudando Amira, eu nunca me encontrei com a matriarca.
Eu sempre achei estranho, ela nunca manifestar com relação à ajuda que estou prestando à sua filha. Amira também nunca comentou nada, então apenas julguei que é devido ao abismo entre nossos status.
Isso é problemático, pois não faço a menor ideia da razão do que motivou esta ação inesperada.
Notando Kemiro em contemplação, Kirianna comenta:
— Você não precisa se preocupar. A matriarca apenas quer aproveitar a oportunidade de que ela tem um tempo livre para lhe agradecer por toda a ajuda que você tem prestado à senhorita Amira.
— Desculpe-me, se transpareci estar preocupado. Apenas o prospecto de me encontrar com a matriarca já é uma honra.
Quem acreditaria que ela apenas quer “agradecer”? Espere, então, Amira precisar de ajuda, foi só uma desculpa pra não criar alarde?
Enquanto Kemiro tenta calcular diferentes cenários que levaram à decisão da matriarca, eles continuam atravessando a densa floresta, vez ou outra, passando por grandes edifícios e estruturas de pesquisa.
Após trinta minutos, eles finalmente chegam a seu destino, a sede da família Telffira.
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