A sala parecia mais fria do que o normal, ou talvez fosse só o meu corpo tentando se manter acordado. Cada piscada era uma luta contra o sono, mas não por tédio — era exaustão mesmo. Eu mal dormi. E, quando finalmente adormeci, minha mãe me acordou dizendo que eu tinha que vir pra escola.
Agora estou aqui, encarando a lousa sem enxergar nada de verdade. Meus pensamentos estão longe... estão com ela.
Ela não me mandou nenhuma mensagem. Mas ainda é de manhã — talvez esteja dormindo.
O que mais me consome é saber que, se eu quiser vê-la de novo, vou ter que esperar o dia todo. A escola é integral, e cada minuto aqui parece uma eternidade.
Sem perceber, minha cabeça vai pesando e quase adormeço ali mesmo, com o caderno em branco na minha frente.
Levo um susto com o grito repentino. Meu corpo se endireita num pulo.
Viktor está encarando meu susto com um meio-sorriso.
— Cara, que porra é essa? Você sempre senta lá na frente, perto da janela.
— Por que você tá gritando? — retruco com uma expressão de raiva, o cenho franzido e a voz mais áspera do que pretendia.
Ele se cala por um momento, e seu olhar muda. Me encara com mais atenção, como se só agora tivesse realmente me visto.
—...Foi mal.
O sinal toca, agudo demais.
— Eu sei — murmuro, me levantando devagar. Não quero passar nem mais um minuto aqui.
— Ei, vai pra onde?
Saio da sala sem responder. A cabeça começa a latejar e o ar parece pesado demais. Não quero falar. Não quero olhar pra ninguém.
— Espera! — ouço Viktor atrás de mim, os passos apressados tentando me alcançar.
Expliquei, sem muitos detalhes, que só queria um lugar calmo. Agora estamos aqui, sentados nos fundos da quadra, onde ninguém vem. O cheiro de tinta descascando e a brisa abafada da manhã cercam a gente.
Já acabei meu segundo cigarro. Um recorde pessoal, já que normalmente só fumo um por dia — e olhe lá.
— Caralho, cara... Primeira vez que você mata aula comigo, e eu nem precisei insistir. — Viktor comenta, soltando a fumaça devagar, me encarando de lado com um meio sorriso preocupado.
Mas eu não consigo rir. Só encaro o chão, como se as respostas estivessem ali, entre as rachaduras do concreto. Tudo parece errado. Longe. Pesado.
Ele me observa por alguns segundos, como se estivesse escolhendo bem as palavras.
— É por causa dela, né? — solta de repente, sem olhar diretamente pra mim.
Não preciso perguntar quem é “ela”. É óbvio.
Suspiro, soltando a fumaça devagar. Sinto meu peito pesar de novo só de lembrar do jeito que ela estava ontem.
— Essa mulher mal chegou e olha como você tá! — Viktor explode, a voz carregada incredulidade.
Ele fala como se eu estivesse me destruindo por alguém qualquer. Como se não entendesse nada.
— Você não sabe como ela está! — retruco, sentindo o sangue ferver. — Ela precisa de mim, e eu não vou virar as costas pra ela!
— Você enlouqueceu! Sabe o que é isso? — Ele ri sem humor. — Falta de buceta!
As palavras dele batem como um tapa. Eu congelo por um segundo, em choque, sem acreditar no que ouvi. E, antes de perceber, estou avançando contra ele, cego de raiva.
Ele segura meus braços, tentando me conter.
— Tá vendo o que ela tá fazendo com você?! — grita, quase desesperado.
— Olha o que você tá dizendo! — grito de volta, me soltando com força.
Me levanto, decidido a ir embora. Minha cabeça tá latejando como se estivesse prestes a explodir, e ainda tenho que ouvir esse desgraçado falar merda. Não dá.
— Dylan! Espera, foi mal! — ele diz, com a voz meio sufocada.
Eu nem olho pra trás. Só levanto o braço e mostro o dedo do meio. Que se foda.
— Você tá me assustando com essa história toda — a voz dele quebra o silêncio de novo, dessa vez mais baixa. — Eu nunca te vi desse jeito… Fumando mais do que o normal, matando aula… Tá diferente, cara.
— Eu tô com medo, cara.
O jeito que ele diz isso me faz respirar fundo. Eu não tô acostumado a ouvir o Viktor desse jeito. Ele sempre foi o idiota falastrão, Mas agora… agora ele parece sincero. E assustado.
Respiro fundo, mas o ar parece pesar dentro do peito. Me viro devagar, ainda com os olhos baixos, mas quando encaro ele… vejo. O rosto dele tá estampado de preocupação. Não é exagero, não é drama. É real.
E isso só faz minha dor de cabeça piorar.
Você sempre foi o mais forte de nós dois, mas agora… parece que você tá caindo e nem percebe.
Ele passa a mão nos cabelos e dá um passo mais perto, com cuidado.
— Você acha mesmo que consegue carregar tudo isso sozinho?
Levanto o rosto e olho firme pra ele.
— Se eu não der… quem vai?
Ele não responde de imediato. Só solta um riso fraco e sem humor, como se estivesse lidando com algo que não consegue processar.
— Eu tô aqui, Dylan. Se você precisar. De verdade.
Dessa vez, sou eu quem fica em silêncio.
Não porque não tenho nada pra dizer. Mas porque, se eu disser qualquer coisa agora… eu desabo.
E eu não posso desabar. Não agora.
Sinto alguém me sacudir com força. Meus olhos se abrem devagar, e a primeira coisa que vejo é Viktor, a testa franzida, o olhar entre irritado e assustado.
— Acorda, cara! — ele diz baixo, mas com firmeza, as mãos ainda nos meus ombros.
Eu adormeci?
Minha cabeça pesa. Tá doendo como se tivesse levado uma pancada. Pisquei algumas vezes, tentando entender o que estava acontecendo… até ouvir a voz dele.
— Pra minha sala. Os dois. AGORA! — a voz do professor corta o ar como uma navalha.
Viro o rosto devagar e encontro o olhar de decepção dele cravado em mim. Meus olhos caem pra baixo, e ali está a caixa de cigarro, jogada, aberta, com alguns ainda dentro. Merda...
Meu corpo pesa como chumbo. Tento erguer os olhos, mas tudo lateja. Quando enfim olho pro relógio da quadra, percebo que dormi por menos de 3 minutos. Quase nada. Mas o suficiente pra foder tudo.
— Sabia que andar com má influência ia dar nisso… — diz o professor, quase como se falasse pra si mesmo, mas alto o bastante pra machucar.
Viktor não responde. Nem se defende. Só abaixa os olhos, como se já tivesse ouvido aquilo mil vezes. E talvez tenha.
Tento ficar de pé, mas minhas pernas não obedecem. A cabeça lateja, e tudo gira como se eu tivesse levado um soco.
De repente, sinto mãos frias no meu rosto. Me assusto.
— Você tá drogado? — o professor pergunta, entre furioso e alarmado, apertando meu queixo como se quisesse arrancar a resposta dos meus olhos.
Minha consciência parece voltar com força. Engulo seco, empurro a mão dele.
— N-não, professor! — tento me afastar dele, mas o corpo ainda não responde direito.
— Viktor! — ele vira o rosto com raiva. — O que você deu pra ele?
— Nada! — Viktor levanta as mãos, desesperado. — Ele só… ele chorou muito, só isso. Por isso os olhos vermelhos!
Consigo ver o pânico nele. O jeito como tenta explicar, como sua voz falha. Ele já levou tantas advertências... mais uma, e a mãe dele manda ele direto de volta pra Rússia. Sem conversa. Sem perdão.
Maldita hora que pedi pro Viktor me trazer aqui.
E o pior é que… realmente parece que estou drogado.
Tudo me atravessa ao mesmo tempo, e mesmo assim não absorvo nada.
Dylan sempre teve uma conexão especial com sua tia Clarice, cuja vida se torna sombria após seu casamento forçado. Ele sente a necessidade de protegê-la e, após a morte de seu marido, acredita que pode ajudá-la a reencontrar a felicidade.
No entanto, ao reencontrar Clarice, percebe que as feridas do passado ainda a assombram. Enquanto tenta curá-la, sentimentos complexos emergem, desafiando seus laços familiares e levando Dylan a confrontar o verdadeiro significado de seu amor por ela.
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