Palmas lentas e sinistras, de repente, quebraram de vez a quietude sombria e opressiva daquela masmorra. O gesto vinha de um oficial, emergindo repentinamente bem diante da sua cela. O prisioneiro se surpreendera ao não ter detectado os passos daquele sujeito antes, embora fosse muito bom nisso. Foi como se ele surgisse das sombras que dançavam ao seu redor.
Um sorriso desdenhoso distorceu os lábios do guarda, enquanto seus olhos, manchados por um carmesim profundo, se encontraram com os de James. Dava para ver que naquele olhar havia algo além da mera presença humana; uma sombra, uma influência sombria que o dominava por completo, o que fez o homem preguear a testa e ajustar a postura.
— Ahh… achei que fosse registrar sua preciosa receita para posteridade — provocou o oficial, com sua voz carregada em um tom zombeteiro. — Mas desperdiça pergaminho com palavras tolas. — Ele arriou os braços, estalou a língua e completou: — Como a idade o tornou patético, James Jordan.
— Azaroth… — respondeu James, firme de si. — Não são palavras tolas para mim. Talvez tardias, mas sempre necessárias.
— Ainda acha que algum perdão resta para você, é? Suas mãos sangram como as minhas, James Jordan… pingam por cada alma que silenciei.
As palavras do demônio através daquele guarda ecoavam como sinos sombrios na mente do homem, mas ele não se deixou abalar. Firme em sua postura, ele respondeu:
— Já devia saber que não temo a morte. — Encarando a pedra lascada que utilizara para escrever rodopiando em seus dedos, ele completou: — De todo modo, Azaroth… a receita que tanto teme já segue bem guardada, nas mãos de outra pessoa, bem longe daqui.
O guarda sombrio retrucou com um sorriso frio, seus olhos faiscavam com uma malícia que arrepiava qualquer ser humano. Ele repousou suas mãos nas barras que os separavam e murmurou:
— Fala do menino? Ahhh, James… acha que não te conheço para não reconhecer quando está blefando? Você jamais confiaria uma informação tão valiosa nas mãos de um fedelho de quatorze anos.
— Independentemente… — disse de repente uma voz conhecida, de alguém cujos passos o homem agora conseguia captar muito bem pelo corredor.
Então, como se convocado por uma força oculta, Robert Winston surgiu ali, sua presença estava envolta em uma aura de desdém e poder. A coloração carmesim também presente em seus olhos fez James arregalar-se em sobressalto.
— Você…? — murmurou, carregado em indignação. — Você não…
— …o Gongordian estará no fundo do Mar de Arcanjos antes do soar dos sinos — anunciou o ex-diretor, convicto do que dizia. — E levará consigo qualquer rastro de ameaça à minha eminente ascensão.
A notícia atingiu a James como um raio. Uma descarga de desespero e fúria se agitou em seu peito.
— Não pode! Não! — disse ele. Com uma ira flamejante dominando todo o seu ser, ele se agarrou às grades que os separavam e berrou com toda a força de sua alma: — NÃO TOQUE NO GAROTO!
— Você o sentenciou no momento em que o trouxe para a nossa peleja, James — disse Azaroth, agora na voz debochada do oficial. — No nosso duelo de cavalheiros.
— Cala a boca, desgraçado! Não há honra alguma nesse seu coração obscuro para se denominar cavalheiro! Isso se houver algum ainda nesse seu peito infame!
O riso mordaz de Robert e do guarda se manifestou como um eco perverso, inflamando ainda mais a fúria de James. Dava para vislumbrar o prazer do demônio diante de seu desespero só de olhar a expressão dos dois que ele controlava. Não podia se dar ao luxo de se desestabilizar e dar a Azaroth o deleite do que ele mais desejava ali embaixo.
Precisava se beliscar para se certificar de que não era só mais um pesadelo, mas ao que tudo indicava, aquilo era bem real. O homem, incapaz de conter sua fúria, deixou a lasca de pedra que utilizara cair no chão enquanto martelava as grades com seus punhos cerrados.
— MALDITO! — exclamou.
O grito rasgou o ar da masmorra, tomando os corredores sombrios como um lamento amaldiçoado.
— De agora em diante… esse é seu destino, James — dizia Robert, ou aquele que se passava pelo ex-diretor, com a naturalidade de quem tinha tudo em suas mãos. — Sofrer até sua consciência queimar, assistir de perto a minha ascensão nesse vilarejo imundo, ter a sua derrota bem esfregada na sua cara… para depois, só depois, ser presenteado com uma morte vergonhosa.
Com uma força sobrenatural, o guarda possuído puxou o ex-oficial Jordan pelo pescoço, quase esmagando-o contra as barras de aço entre eles. James lutou contra aquele aperto desesperadamente, mas era impossível disputar contra tamanho poder.
— Matá-lo agora seria fácil demais — sussurrou o oficial em seu ouvido, emanando um ar gélido de sua boca como um sopro de morte. — Mas não há graça nisso. Não foi o destino que preparei para você… por tudo o que me causou.
— Pare! Me… solta! — exclamou em agonia.
De repente, passos apressados ecoaram pelos corredores. O oficial soltou James, recuando à medida que um jovem recruta da guarda chegava, com o peito arfante e os olhos arregalados.
— Se-senhor! — exclamou ofegante.
O rapaz parecia perturbado, mas livre da influência sombria que aparentemente dominava alguns de seus companheiros. Aparentemente, ele mal sabia que se dirigia agora a Azaroth no corpo de Robert Winston.
— Se-senhor! No porto, agora! Eu… eu…
Aquele jovem rostwoodiano tinha idade para ser aluno da academia. Seu posto era justamente nos adarves da muralha sul, a muralha que se ligava a região portuária do vilarejo.
Receoso, ele dirigiu seus olhos para James e se inclinou para sussurrar a notícia no ouvido de Robert.
Diante do que ouviu, o ex-diretor suspirou, exibindo um claro descontentamento. Visivelmente perturbado, ele se afastou lentamente, levou uma das mãos ao cabelo minguado e coçou a lateral da cabeça. Um sorriso sinistro brincou em seus lábios ao encarar o prisioneiro.
— Parece que treinou bem o seu menino.
O homem enjaulado estranhou o comentário, mas alarmou-se só de tentar imaginar. Deveriam estar ainda no dia da partida do Gongordian. O que fizera seu discípulo?
Sem dar qualquer tempo de questioná-lo sobre o ocorrido, em um repentino acesso de fúria, Azaroth, encarnado no ex-diretor, puxou o recruta pela armadura e, com seu punho fechado, o perfurou pela barriga, ultrapassando até mesmo a ferragem que deveria resguardá-lo.
— NÃAAO! — vociferou James de imediato, arregalando seus olhos para o horror daquela cena diante das barras de sua cela.
O pobre recruta, tremendo violentamente, cuspiu sangue no rosto do ex-diretor e tateou o braço que cruelmente o atravessava. Lutava para respirar enquanto seu olhar suplicante buscava ajuda, mas não havia nenhuma salvação para ele.
Ele perdeu a firmeza de suas pernas e Azaroth logo o deixou cair no chão, como se sua vida, de fato, não significasse nada.
Com seus últimos espasmos de vida, estatelado sobre a poça do próprio sangue, ele ainda lançou um olhar de súplica para James, seu recrutador, mas tudo o que recebeu foi um semblante desesperado de alguém que de nada podia fazer.
Era apenas um menino. Tão jovem, tão inocente quanto qualquer outro.
— SEU DESGRAÇADO! — berrou o homem, inconformado. — ASSASSINO MISERÁVEL!
— Agora as coisas tomaram outro rumo, James — disse Azaroth, limpando a mão ensanguentada com o pano que Robert guardava no bolso da veste, antes branco, agora carmesim até nas rendas que constituíam suas bordas. — Foragidos não são feitos de prisioneiros.
Inusitadamente, o guarda possuído ao lado introduziu sua chave na fechadura daquela cela, fazendo James recuar em alerta.
— Acho que ainda pode ser muito útil para nós — continuou o demônio do corpo do ex-diretor, agora guardando o lenço ensopado de sangue no bolso da veste novamente. — Nos dirá onde seu valioso pupilo pode ter se escondido.
— Quê?!
E assim, com um estalo, o guarda possuído avançou até o homem, sem retirar de sua face a expressão de ameaça.
— Espera! — implorou James, mas seus apelos foram ignorados completamente.
Aquele homem não precisava de mais sinais para entender o nível de agonia que o aguardava no subterrâneo daquele castelo dali para frente.

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